Eu sabia que estava mexendo no vespeiro. Tentei manter minha mascara, mas quando me dei conta de fui pega, quase perdi o ar.
O silêncio dele, naquele momento, era mais alto e mais ameaçador que qualquer grito. Ele me havia encurralado, não com a força bruta que eu sabia que ele possuía, mas com o peso de sua presença e o poder de sua desconfiança.
A máscara dele estava rachada. Mas a minha também estava. Vi a fúria e a raiva em seus olhos, mas eu sabia que a mentira não funcionaria mais; minha única opção era a verdade.
Eu respirei fundo, sentindo o gosto amargo do desespero. Sim, por dentro, eu estava desesperada. Sabi ao que ele podia fazer comigo.
— Eu fui procurar o homem que viu o incêndio que matou minha família — revelei, minha voz baixa e quebradiça, mas firme.
— Como?
— Eu sei que você não se importa. Para você, foi apenas um cálculo frio. Você o fez como um aviso, uma demonstração de poder. Eramos só um dano colateral.
Seu rosto ficou pálido. Os músculos de sua mandíbula se contraíram com tamanha força que eu podia ver seus ossos saltando.
Ele tentou, pela última vez, negar o que era inegável.
— Não sei do que você está falando — ele respondeu, a voz perigosamente fria, voltando ao seu modo de CEO implacável. — Você está histérica. Não me misture em suas tragédias passadas.
— Não se atreva a chamar de histérica!
O cortei, a raiva me dando a força necessária. As palavras vieram como um jato de lava.
— Meus pais, eles foram vítimas de uma guerra de máfia entre a Família Valente e outra gangue — já estamos aqui, então vamos jogar algumas cartas na mesa. — Aquele incêndio não foi um acidente. Foi um aviso da sua família, do seu império. O seu aviso.
Eu vi, mesmo pensando que podia estar maluca. Eu podia ver, ainda que de forma breve o choque. A surpresa. Era a primeira vez que ele não conseguia disfarçar uma emoção.
Estava lá, em seus olhos, Eu vi.
E o terror me atingiu. Ele estava chocado não pela tragédia, mas pela revelação de que eu era a vítima. Ele não se lembrava de mim. Eu era apenas um número, um erro estatístico em uma equação que custou vidas.
— Como posso ser leal ao homem que me tirou tudo — as palavras cortavam a mim, mas cortavam a ele também.
— Eu não... — sua voz baixa mostrava que ele havia recuado. Era estranho. Eu o via e me doía o que estava ali.
Senti vontade de chorar. Até aqui, eu já tinha passado coisas demais. Enfrentado de tudo. Sozinha. Porque ele me tirou tudo.
Mas o pior é que havia sentimentos que me sufocavam e por mais que eu não quisesse deixa-los sair. Eles ainda estavam aqui, como quem espera o melhor momento para se assumir. Mas eu não podia. Não podia deixar que ele entrasse ainda mais em mim.
— Aurora... — escutar ele dizendo meu nome tinha um gosto amargo.
— Eu não sou sua prisioneira, nem sua parceira, nem seu bem. Eu sou apenas o que sobrou. E não preciso de você para me proteger do mundo que você mesmo criou.
— O que quer dizer.
— Que eu to caindo fora. Não preciso de você.
— Acha que pode sobreviver sem mim?
— Sempre sobrevivi. Você não me deu nada, Lorenzo. Só me tirou. Você, me, tirou, tudo.
O olhei firme nos olhos. Ele sabia o que iria fazer a seguir.
Com o coração em frangalhos e a alma vazia, eu virei as costas para o homem que havia me salvado e me destruído. Eu não olhei para trás. Eu caminhei para longe dele e de seu mundo de seda e sangue.
Eu sentia raiva. Raiva por ter achado que a vida ficaria melhor depois que cheguei. Eu sabia que nada seria fácil, tudo tem seu preço.
Mas estava disposta a seguir em frente, antes de saber que o meu nada, é por cauda do tudo dele.
Ainda que eu soubesse que a porta que eu estava fechando me levaria diretamente de volta para a escuridão, ainda sim, não podia fazer outra coisa a não ser fecha-la.