EManuelle Narrando
O barulho chiado do rádio dele me tirou da cabeça os pensamentos que tavam me sufocando. Aquela voz arrastada, falando código da boca, nomes de ruas, aviso de movimentação… era o som que fazia parte da minha rotina agora. Tinha dia que eu sonhava com isso. O rádio dele falava tanto quanto ele.
— Vermelho na Laje, confirma? — a voz dizia, com ruído no fundo.
Eu rolei os olhos, tentando respirar fundo pra voltar a dormir, mas o sono já tinha me abandonado fazia tempo. E, claro, ele começou a se mexer. A mão grande, pesada, quente, veio parar direto na minha cintura, me puxando pra ele como se soubesse que eu tava acordada.
— Tá acordada, neném? — ele perguntou com a voz rouca, arrastada, ainda no meio do sono.
Demorei a responder. Era como se meu corpo ainda quisesse aquele carinho, mas minha cabeça gritasse por um pouco de paz. Suspirei baixo, tentando não deixar minha voz embargada.
— Difícil dormir com esse rádio falando a noite toda…
Ele resmungou algo que eu não entendi, esticou o braço por cima de mim e puxou o rádio pela antena com uma rapidez que me assustou. Desligou com força e jogou o aparelho pro canto do quarto, onde caiu fazendo um barulho seco no chão.
— Não precisa disso… — falei, olhando pra ele de lado, meio triste com o jeito bruto.
Mas ele só sorriu, aquele sorriso de moleque marrento que ele sempre teve.
— Claro que precisa, pô… tá atrapalhando minha rainha de dormir, ué. — E completou com a voz manhosa, colando o rosto no meu pescoço: — Minha bonequinha merece dormir em paz.
A mão dele desceu pelas minhas costas, deslizando pela curva da minha cintura até chegar na minha b***a. Alisou de leve, depois apertou com força, me puxando toda pra ele. Eu senti o corpo dele colar no meu, o calor, o desejo, a mesma química de sempre que acendia mesmo quando eu tentava manter a distância.
Ele beijou meu pescoço, mordiscou minha orelha, e eu fechei os olhos, sentindo aquele arrepio tomar conta de mim.
— Tu é f**a, sabia? — ele sussurrou. — Me deixa doido, loira…
A boca dele encontrou a minha e o beijo veio quente, cheio de sede, daquele jeito que só ele sabia dar. A língua invadiu com pressa, a mão dele já subia pela minha coxa, me puxando pra cima dele. Eu não resisti. Nunca resistia.
Ali mesmo, naquela cama onde a gente dormia entre amor e briga, a gente se amou. Os movimentos eram conhecidos, o toque dele era o mesmo de anos atrás, mas ao mesmo tempo mais intenso. Mais homem. Mais possessivo. E eu? Eu me entregava como sempre, como desde os meus treze anos, quando a gente se beijou pela primeira vez escondido no portão da escola.
Ele foi meu primeiro em tudo.
Primeiro toque.
Primeiro amor.
Primeira vez.
A gente cresceu grudado. Eu com caderno na mão e ele com pipa no alto. Começamos a namorar cedo, quando ainda ninguém levava a sério, mas a gente se amava de verdade. E mesmo com todos os altos e baixos, ainda era ele. Só ele. Sempre foi.
Ele gemia baixo, com a respiração acelerada, segurando meu quadril com força, me encaixando em cada movimento como se quisesse marcar meu corpo com ele. E eu deixava. Eu gemia o nome dele, arranhava as costas, puxava o cabelo… porque mesmo com tudo, com todos os defeitos, com toda a loucura, eu era louca por ele.
Quando tudo terminou, ainda ofegante, ele me abraçou forte, colou a boca no meu ombro e ficou ali. Silencioso. Respirando devagar. E mesmo sem dizer nada, eu sabia o que ele queria dizer: “Tu é minha.”
A gente não precisava de palavras.
Ele me envolveu com os braços, e eu encaixei o rosto no peito dele, ouvindo as batidas fortes do coração.
Ali, naquele instante, era como se nada mais existisse. Nem o morro, nem a violência, nem os ciúmes, nem o rádio falando na madrugada. Só nós dois. De novo. Como sempre foi.
Mesmo com o caos ao redor, eu ainda me sentia segura nos braços dele.
Mesmo com a mente gritando que algo tava errado, o coração sussurrava que ele ainda era o amor da minha vida.
E eu acreditava.
— Tu me ama ainda? — ele murmurou, já quase voltando pro sono, com a voz baixa no meu ouvido.
Sorri sozinha, passando a unha leve pelo braço dele.
— Sempre amei.
Ele deu um beijo lento na minha bochecha e murmurou:
— Então não me larga nunca. Eu fico maluco sem você.
Não respondi.
Só fiquei ali, quieta, presa na dúvida que eu fingia não ver todos os dias.
Porque o meu coração já sabia que o amor não era o problema.
O problema era tudo que o mundo dele tava se tornando.
E até onde ele ia me levar.