- LARGA ELA, REINIER.- A voz de tia Aurora ecoa pela sala.
As duas viram tudo, que degradante. Tia Aurora morde os lábios furiosa, enquanto minha mãe olha Reinier como se estivesse imaginando a forma mais dolorosa de o torturar. E provavelmente ela faria isso, se ele não fosse filho de uma de suas melhores amigas.
Me sinto humilhada. Ainda mais que as duas assistiram tudo. Solto-me das mãos de Reinier, e subo as escadas. Entro no banheiro, trancando a porta, sei que logo minha mãe estará aqui.
Dito e feito, escuto-a batendo na porta.
- Anya. -Me chama.
- Preciso de um tempo.
Sento no chão do banheiro e começo a chorar. Escuto a voz de tia Aurora conversando com minha mãe. As duas são muito próximas, só o que falta brigarem porque fui uma boba apaixonada.
Eu gosto do Reinier desde que me entendo por gente, mesmo quando nem entendia o que era amor. Pra mim ele sempre foi o homem mais lindo do mundo... meu maior sonho sempre foi ter um lugar em seu coração.
Para ele fui apenas mais uma que ele passou a noite. Sempre soube que ele ficava com muitas mulheres, Reinier é igual meu irmão Damon, um mulherengo, até ciúmes eu tinha quando contava das aventuras dos dois.
Enquanto eu me guardava para o dia que meu príncipe me notaria. E ele notou... só que não foi nem um pouco como imaginava.
Choro tanto até meus pulmões doerem, coloco toda a minhas frustração para fora com lágrimas. Ficar aqui escondida não vai resolver nada. Tenho que encarar minha mãe e o mundo lá fora.
Saio do banheiro, minha mãe está na janela fumando, ela sempre fumou mas quando está brava ou nervosa piora bastante. Ela se vira esperando minha reação, corro para seu abraço, o colo de mãe sempre cura tudo.
- Mãe, eu quero ir embora.- Digo em meio ao choro.
- Claro, minha princesa.
Começo a ajeitar minha mala, coloco todas as minhas roupas, lavo meu rosto, respiro fundo. Desço as escadas, e estão me esperando tia Aurora, Athena e Sophie. Minha mãe desce logo em seguida com minha bagagem.
- Nós vamos para San Petersburgo. -Minha mãe fala.
Tia Aurora apenas concorda de cabeça baixa.
Athena e Sophie vem me abraçar.
- Liga pra nós.- Sophie fala.
- Amiga, sinto muito- Athena sussura em meu ouvido.
Que vexame, todos viram como sou uma tola apaixonada.
- Anya, eu... eu...- Tia Aurora procura palavras.- Desculpa.
- Não tem pelo que se desculpar.- Digo a abraçando.
Tento sair com alguma dignidade.
No jatinho sob os olhos atentos de minha mãe me permiti chorar mais um pouco, ela sabe dar espaço, e sabe quando precisa de consolo ou apenas tem que deixar tudo sair.
Conhecendo minha mãe, sei que ela deve estar fervendo de ódio, mas dona Ava Wallerius é muito boa em esconder sentimentos. Queria ser assim também. Acho que sou uma Wallerius defeituosa, não sei enterrar os sentimentos iguais todos fazem. Que azar o meu.
- Mamãe...
- Sim, Anya?
- Não conta nada para o mano.- Peço.
- Seu irmão está em missão, não sei se já chegou em casa.- Suspira.- Posso até não contar, mas acha mesmo que ele não vai desconfiar?
Damon me conhecia melhor que qualquer pessoa, ele sempre dizia que eu era o bem que habitava nele. Somos gêmios, sempre estivemos juntos, nossa conexão é muito forte.
Após algumas horas chegamos em casa, é de madrugada, e todos estão dormindo.
- Cobrinha?- Vovô Damon aparece na escuridão.
Meu irmão ganhou o nome em homenagem ao mentor de minha mãe, acho que dá até pra dizer que ele que criou nossa mãe. Ele mora conosco... acho que desde sempre, e o chamamos de vovô.
- O que está fazendo acordado à essa hora, velhote?- Mamãe, beija sua testa.
- Depois de uma certa idade o sono não vem.- Ele responde me olhando.- Anya não ia ficar na Itália mais um mês?
- História complicada.- Mamãe passa as mão pelo cabelos.
- Bem-vinda, princesinha. - Vovô me abraça.
- Obrigado. Eu vou ir deitar.- Coloco meu melhor sorriso.
É bom estar em casa. Tomo um banho demorado, ainda estava com as roupas daquela maldita festa. Minha cabeça dói tanto, ainda mais quando começo a relembrar a cena de Reinier beijando outra garota.
Ela era bonita...
As lágrimas voltam a surgir, será que não sou bonita? Olho-me no espelho, sou muito parecida com minha mãe, se comparar as fotos de quando ela era jovem então nem se fala. Ela é uma mulher bonita, muito bonita mesmo, mamãe nunca foi muito vaidosa, mas sempre teve uma beleza hipnotizante.
Ficar procurando defeitos em mim não vai diminuir a dor da rejeição, e não devia querer rivalizar com outra mulher. Meu lado feminista se sente ofendido com esses meus pensamentos. O melhor à fazer é dormir, e deixar minha decepção para depois de oito horas de sono. Deito na cama...
Mas quem disse que consigo dormir.
Já deve ser perto das cinco da manhã, escuto passos e a porta do meu quarto se abre. Nem preciso olhar para saber que é o Damon. Sempre quando ele se ausentava pelo treinamento, eu ficava com tanta saudade que pedia para ele dormir comigo. E virou mania que quando ele sai por dias ao voltar dorme comigo. Mania estranha de irmãos.
Sinto ele deitar ao meu lado sem fazer barulho, tentando não me acorda. Damon faz carinho nos meus cabelos e deposita um beijo carinhoso.
Não aguento e começo a chorar.
- Anya!- Ele me puxa.- Teve um pesadelo?
Acende a luz do abajur.
Ao olhar o rosto do meu irmão as lágrimas que eram ralas começam a surgir com força.
- O que houve, Anya? Me fala.
- Não foi nada.- Tento disfarçar.
Damon segura meu rosto, me encarando com aqueles olhos herdados da mamãe, mesmo olhos que os meus.
- Reinier.- Resmunga.
Ao ouvir o nome dele, tento segurar o choro.
- Eu vou matar o D'Angelo!- Damon esbraveja.
Claro que meu irmão sabia do meu amor platônico.
- Não, eu que entendi tudo errado.- Baixo a cabeça.
- O que ele te fez? Me fala. Nunca houve segredos entre nós dois, lembra?
- Por favor, hoje eu não quero falar sobre isso. Só esquecer.
Damon passa as mãos pelo cabelo, mania herdada da minha mãe. Tenho que dizer que meu irmão herdou a personalidade dela.
- Vou para o meu quarto.
Sei que Damon ia fumar, mas eu precisava do meu irmão agora.
- Fica aqui, preciso da tua companhia.- Seguro em sua camisa.
- Está bem.- Tenta dar um sorriso gentil.
Ele deita do meu lado, fazendo carinho no meu cabelo para eu dormir melhor.
Sei que teria que contar para meu irmão o que aconteceu, e nem adiantaria contar qualquer desculpa furada, ele descobriria. E não sou uma boa mentirosa.
O pior era que Damon e Reinier eram amigos... mas não sei que rumo as coisas tomariam de agora em diante. Damon sempre foi ciumento comigo e superprotetor, nem podia imaginar o que aconteceria daqui pra frente.