Voltei a acordar do pesadelo que há tanto tempo me atormentava o espirito. Sabia agora que o castelo do meu sonho era o mesmo em que me encontrava no momento. Acariciei o colar inconscientemente, encaminhando-me para a varanda. A noite ainda ia a meio, mas eu sabia que não voltaria a conseguir dormir. Lembro-me dos meus pais adoptivos e uma lágrima rola-me pelo rosto devido às saudades. Volto a entrar no quarto e estendo a mão para a boneca de trapos, que voou na minha direcção, deixando-me curiosa com o resultado e estendo novamente a mão, agora em direcção à estante. Mais de uma dezena de livros voam na minha direcção, derrubando-me com o choque.
- Bolas! – Exclamo. O barulho deveria ter acordado Eileen, que dormia num quarto no mesmo corredor que eu, pois em menos de um minuto esta batia na porta.
- Emily está tudo bem? Posso entrar?
- Sim, entre Eileen. – Vendo o meu estado, sentada no chão rodeada de livros, pareceu curiosa. – Estava só a ver se conseguia que um livro viesse a voar direito à minha mão, o problema é que vieram demasiados para os apanhar.
- Estou a ver. – Riu-se e ajudou-me a devolver os livros às prateleiras. – Da próxima vez tenta pensar num livro em concreto. – Fiz o que me disse e o livro saltou-me para as mãos. – Vês? É mais simples do que parece.
Voltei a colocar o livro na estante e contei a Eileen o sonho que havia tido quando esta me perguntou o que estava a fazer acordada aquela hora tão tardia.
- A Aurora também previu uma batalha muito brevemente – adiantou. – Sim, acredito que o teu sonho foi uma previsão do que acontecerá no futuro. – O medo estava estampado no meu rosto. – Contarei à rainha o que viste. Por agora concentra-te apenas nos treinos de etiqueta, pelo menos até ao jantar de apresentação. É fundamental que o reino volte a ter esperança, e para isso precisas de ser apresentada formalmente.
- Eliot disse-me o mesmo esta tarde.
- O meu filho cresceu no castelo e foi educado praticamente como um príncipe. Ele sabe da maioria do que se passa por aqui e pode ajudar-te a perceber qual o teu papel no meio de toda esta história. Grande parte das pessoas não percebe o porquê do Eliot ser tão estimado no palácio, mas deve-se essencialmente à tua mãe e ao teu pai. Eramos todos bons amigos muito antes de eles subirem ao trono e quando fiquei grávida eles quiseram que eu viesse viver para o castelo. A tua mãe insistiu que o deixasse ser educado como se fosse da realeza, bem como para ser um bom combatente. – Eileen falava com ternura e admiração, tanto do filho como da melhor amiga. Não havia como não gostar dela, sendo tão gentil e meiga. – Ainda hoje não consigo expressar o quão grata estou pelo que a Aurora fez por nós.
- Consigo ver o quanto gosta da rainha.
- Também gostarás dela quando lhe deres uma oportunidade de se aproximar. Eu avisei-a vezes sem conta que já não eras nenhum bebé, mas o subconsciente dela não consegue ver isso. – Não respondi e Eileen também não me pressionou. – Vou voltar ao meu quarto. Se precisares de mim não hesites em chamar. Boa noite. – Despedi-me e voltei para a cama.
Adormecera já perto das quatro da manhã, o que me fez ter dificuldades em acordar quando Jennifer me chamou. Naquela manhã ela não me levara nenhuma roupa nem sapatos, pelo que tomei um banho e vesti uma blusa fresca com pequenas alças, cor de violeta com umas pequenas estrelas brancas, um par de calças de ganga justas e uns ténis, pois os meus pés não aguentavam mais saltos e ainda tinha aula de dança, que esperava poder enfrentar o mais confortavelmente possível. Desci as escadas e dirigi-me ao salão onde tomava o pequeno-almoço. Quando vi Eliot e Dylan sentados na mesma mesa que a minha guarda achei que algo não estava bem. Cumprimentei-os e obtive uma saudação por parte de todos, especialmente de Dylan.
- Minha querida, muito bom dia. – Levantou-se e puxou-me a cadeira para que me sentasse. Senti-me com se estivesse a ser testada, pelo que respondi como Eliot me ensinara no dia anterior. Este levantou o sobrolho perante a minha atitude e riu-se, abanando a cabeça, embora eu não percebesse o porquê. – O que posso fazer por ti nesta bela manhã, minha querida Emily?
- De momento gostaria de tomar o pequeno-almoço. Penso que a minha manhã está preenchida, ou estou enganada? – Jennifer e Holly começaram a rir e Eliot já gargalhava muito alto. Fitei-os desorientada até que Holly parou de rir e dirigiu-se a Eliot.
- Muitos parabéns, não vamos ter de analisar se a Emily conseguiu aprender alguma coisa na tarde de ontem. – Virou-se de novo para mim, rindo-se, e acrescentou: - Não te estávamos a testar, mas conseguiste provar que as aulas estão a surtir efeito.
- Oh Holly, podias tê-la deixado enganada mais um bocadinho. – Jennifer já parara de rir, mas a sua observação fez-me corar. – Não achas-te graça Laila?
- Hilariante. – Respondeu sem qualquer emoção. – Despachem-se. Já que não temos de perder mais uma manhã com boas maneiras que até uma criança de cinco anos sabe vamos passar às aulas de dança. Vou avisar a professora. – Saiu sem demora e deixou as outras a suspirar.
- Mas de que é que vocês estão para aí a falar?
- No facto de a Em só estar a ser simpática contigo por pensar que estávamos a avaliá-la.
- Isso tudo são ciúmes por ela estar interessada em mim Eliot?
- Chega Dylan! O Eliot tem razão. – Suspirei e voltei-me para Holly. – Pensava que iam passar a manhã toda com a avaliação.
- Se consegues responder bem ao Dylan está tudo bem. Revemos tudo um dia antes do baile.
- Como assim se consegue? Estavas só a ser simpática, não era Emily?
- Não, não estava, e acho que já te tinha dito que me tens de tratar por princesa Emily, ou estou em erro? – Vi um olhar de divertimento em Eliot. Jennifer, por detrás do livro que estava a ler, mandou-me com um olhar que parecia dizer “tem cuidado”. Fitei-a interrogativamente, mas ela voltara a concentrar-se no livro.
Acabámos por tomar o pequeno-almoço em silêncio, até que Laila voltou para nos informar que estava tudo pronto para a aula. Dirigimo-nos até uma sala em que ainda não tinha entrado e que parecia um grande estúdio de balé. O grande espelho reflectia-nos aos seis, pois Dylan também nos acompanharia nas aulas, assim como a uma mulher alta e esbelta que deveria ter idade para ser minha avó apesar da sua excelente forma. Estava também presente um pianista, que nos cumprimentou e dirigiu-se ao grande piano de cauda que era a única coisa que estava a ocupar o espaço no salão. A professora de dança deu-nos uns embrulhos que continham a nossa roupa de aprendizagem e mandou-nos vesti-la, pelo que todos se encaminharam para os quartos. Ao chegar aos meus aposentos fiquei decepcionada por não encontrar uma t-shirt e uns calções. Em vez disso tinha um vestido salmão, caído até aos pés e, a fazer par, uns sapatos de salto e umas sabrinas. Calcei as sabrinas, pensando se me deixariam treinar com elas calçadas, e peguei nos sapatos de salto alto, dirigindo-me de novo para sala. Holly chegou à porta ao mesmo tempo que eu. Laila e Jennifer já lá se encontravam e os rapazes chegaram poucos minutos depois. Exceptuando os fatos dos rapazes, que consistiam em camisa branca, calças pretas e sapatos de verniz com um pequeno salto, estávamos todas vestidas de igual. Reparei que nenhuma delas tinha calçado os saltos altos e fiquei contente por não ser a única a desejar ficar com os pés bem assentes no chão.
Começámos a aula individualmente, cada um a tentar aprender os passos correctos. Percebi imediatamente que nenhum deles sabia dançar o que me fez suspirar de alívio, que durou pouco, pois haviam mais passos para decorar do que eu tinha pensado inicialmente. Passaram-se três horas até nos permitirem fazer uma pausa, pelo que nos dirigimos ao salão para almoçar, tão cansados que nem abria-mos a boca para rir das figuras que tínhamos feito durante a manhã. A única excepção era, como de costume, Laila, que m*l almoçara e já tinha voltado aos treinos. Para minha sorte Dylan estava cansado demais para requerer a minha atenção, pelo que tagarelei essencialmente com Holly, pois Jennifer continuava a ler o livro e Eliot tinha sido chamado pela mãe. Quando acabou a pausa do almoço fomos de novo para a aula, descobrindo que ficaríamos a pares, pelo que tinham aparecido dois bailarinos para nos acompanharem visto não termos homens suficientes. Para meu descontentamento fui posta com Dylan, que abandonou de imediato o cansaço e fez-me girar nos seus braços até me deixar tonta. Depois de ouvirmos ralhar principiámos o que deveria ser uma valsa, até nos ser possível descansar. Mais tarde, a seguir a um banho relaxante, encaminhava-me para o salão para jantar quando fui surpreendida por Laila.
- Também vens jantar Laila?
- Sim princesa, mas primeiro tenho de vos pedir desculpa pelo meu comportamento nos últimos dias.
- Não precisas de me tratar por princesa, aliás preferia que não o fizesses.
- Peço desculpas Emily – reparou. – Fui apanhada desprevenida quando a rainha me contou que Dylan era o teu prometido.
- Já te tinhas apaixonado por ele há muito tempo? – Olhou-me nos olhos, suspirou e anuiu.
- Desde criança que gosto de Dylan mas ele nunca mostrou nenhum interesse por mim. Não sei porque fiquei com esperança que algum dia isso viesse a acontecer, mas não consigo apagar o que sinto por ele. – Fez um pequeno sorriso, mas esmoreceu de imediato. – Observar como estás infeliz com esse compromisso fez-me ver que a culpa não é tua e por isso vou-me portar à altura dos meus deveres. Perdoas-me o que te fiz passar estes dias?
- Claro que perdoo. Espero que possamos vir a ser amigas.
- Conto com isso.
Seguimos juntas para o jantar, conversando cordialmente, fazendo com que os olhares de todos os presentes se virassem para nós, fitando-nos interrogativamente. Aurora e Eileen também estavam presentes mas não teceram comentários. Cumprimentamo-las e sentámo-nos nos respectivos lugares, estafadas e esfomeadas. Assim que acabei de comer, e sentindo-me com sono, dei as boas noites e dirigi-me ao quarto. Dylan levantara-se, seguindo-me pelo corredor, desejoso de um momento a sós e, quando me apanhou, quase a correr, pegou-me na mão, impedindo-me de subir a escadaria que dava acesso aos meus aposentos.
- Emily espera. – Bufei de indignação, mas não lhe dirigi a palavra. – Queria dar-te um beijo de boa noite. – Antes de ter tempo de responder, já Dylan me agarrara a rosto e aproximava os seus lábios dos meus. Empurrei-o com toda a força que tinha e dei-lhe um estalo. – Para que foi isso?
- Nunca – disse a gritar -, mas nunca mais me tentes beijar sem o meu consentimento! – Subi as escadas a correr, segurando o vestido com as duas mãos, esperando que Holly não me visse, e tranquei-me no quarto. Tinha de ter mais cuidado com Dylan e era isso que Jennifer me queria avisar.
Enquanto me vestia para dormir pensava em como podia livrar-me de Dylan, mas adormeci antes de ter qualquer ideia.
Acordei, com o sol a despontar no horizonte, completamente descansada. Tomei um banho demorado, entrancei o cabelo, vesti o vestido de dança e calcei as sabrinas, sabendo que hoje já não as usaria, mas conservá-las-ia até há hora da aula. Desci para o pequeno-almoço e encontrei, pela primeira vez, a sala vazia. Uma das criadas informou-me que a rainha e a senhora já haviam comido e que era provável que os restantes demorassem. Pensei em dar um pequeno passeio pelo jardim, mas desisti quando avistei Eliot à porta do salão.
- Já acordada? Depois dos últimos dias pensei que não te conseguissem tirar da cama.
- Adormeci cedo ontem. Estas aulas estão a m***r-me de cansaço.
- A quem o dizes. Com sorte hoje será o último dia de dois para a frente, dois para trás, rodem… - Rimos da maneira como nos eram ensinados os passos durante uns minutos, até Laila aparecer e se juntar à conversa.
- Espero bem que hoje as aulas de dança fiquem encerradas, estão a dar-me cabo dos pés e ainda nem começámos a usar os saltos. – Reparei num pequeno saco que deveria conter os seus sapatos e sorri-lhe. Para meu espanto fui correspondida.
A conversa continuou animadamente, enquanto Jennifer e Holly se juntavam ao g***o. Já acabáramos de comer e Dylan ainda não tinha chegado, mas ninguém a excepção de Laila se parecia importar com o facto. Dirigimo-nos para a aula, onde o pianista já escolhia as partituras cuidadosamente, enquanto os bailarinos aqueciam, e Dylan estava a falar com a professora, fazendo um sorriso algo estranho assim que nos viu. Ao encaminhar-se para o g***o pensei que teria de suportá-lo por mais um longo dia, mas para minha surpresa, e principalmente para surpresa de Laila, foi a mão desta que ele buscou. Corada, Laila seguiu-o para um lado da sala e começou a trocar de sapatos. Um dos bailarinos perguntou-me se poderíamos começar e segui-lhe o exemplo. Os sapatos de dança não eram completamente desconfortáveis, mas após duas horas de treino os meus pés já se queixavam. Quando a hora de almoço chegou Laila e Dylan desapareceram, o que me sugeria que Dylan concluíra finalmente que eu não queria nada com ele. Calcei de novo as sabrinas e segui os restantes até ao salão, onde comemos calmamente, voltando em seguida para a nossa aula, à qual Laila e Dylan não compareceram, não aparecendo durante o resto da aula nem ao jantar. Jennifer alegou querer praticar os seus bordados e retirou-se m*l acabou de jantar e eu, novamente demasiado cansada, segui-lhe o exemplo e dirigi-me ao quarto, mas não antes de receber um resumo do dia seguinte por parte de Holly:
- Já só tens mais três dias para treinar, portanto amanhã vamos nos dedicar essencialmente à forma como te tens de apresentar no jantar e no baile. Veste um vestido longo pois terás de descer a escadaria principal sem tropeçar. – Acenei positivamente e despedi-me.
Ia a caminho do quarto quando avistei Laila a ser beijada por Dylan, no exacto local onde este me tinha tentado beijar na noite anterior. Tentei passar despercebida, mas sem sucesso.
- Emily – chamou Dylan com escárnio. – Vês o que andas a perder? – Apontou para Laila, cujo olhar brilhante se desvanecia à medida que o ouvia. – Ainda estás a tempo de me teres minha querida. Eu sou todo teu, é só me procurares. – Largou Laila e afastou-se no sentido oposto ao meu.
Os minutos passavam sem que conseguisse desprender o meu olhar do rosto de Laila, que ficara paralisada a tentar entender o que se passava. Dei um passo em frente, preparada para a consolar, quando reparei numa pequena lágrima que lhe corria pela face.
- Tu! És sempre tu! – Gritou-me. Correu pelo mesmo caminho por onde fora Dylan e desapareceu por uma escadaria que levava ao andar de baixo. Suspirei. Parecia que as nossas tréguas haviam terminado.
Dormi m*l, sonhando com os meus pais adoptivos e com a passagem florida que atravessava todas as manhãs. Sonhei também com Laila, triste e zangada comigo pelo seu amor perdido, e depois vestida de noiva no altar com Dylan, apesar de este ter um sorriso perverso no rosto. Acordei sobressaltada e encharcada em suor. Quando vi as horas decidi levantar-me e tomar um banho e, em seguida, vesti um robe e peguei num livro para me distrair e tentar relaxar do sono atribulado. Ao chegar ao horário em que me deveria levantar fui procurar, no meu imenso roupeiro, algo que combinasse com o que Holly me pedira. Achei um vestido longo, azul meia-noite, traçado nas costas e com aplicações no formato de flores nas pequenas alças, justo até à cintura e descaído até aos pés. Havia duas opções de calçado, e optei pelas sabrinas, também azuis e com as mesmas aplicações. Encaminhei-me para o espelho e assustei-me ao ver o tamanho das minhas olheiras, não me importando realmente com isso. Apanhei o cabelo num r**o-de-cavalo, preparando-me para sair quando bateram à porta.
- Não quero saber o que se passou até porque já tenho uma ideia, mas precisas de me responder a isto: deste algumas esperanças ao Dylan? – Ainda m*l tinha entrado no quarto, mas o olhar de Jennifer era o mais explícito que poderia ser.
- Claro que não, eu não o suporto.
- Então porque é que a Laila está novamente fechada no quarto? Pensava que já tinha esquecido o assunto…
- Já tinha, até ontem à noite. – Contei-lhe os pormenores do que se tinha passado, ao que ela não pareceu surpresa.
- Tinha medo que isso acontecesse. – Interroguei-a acerca dessa afirmação, mas não adiantou. – Não é nada com que tenhas de te preocupar, só não pensei que o Dylan descesse tão baixo para te tentar conquistar.
Jennifer arrastou-me até ao salão, onde só Holly estava, e comemos em silêncio. Ao acabarmos a refeição acompanhei-as até uma escadaria que dava para o hall, onde os convidados iriam aguardar a minha aparição. Não percebi a dificuldade da tarefa até me dizerem que tinha de descer com o detestável livro sobre a cabeça e sem me agarrar ao corrimão. Nas primeiras vezes deixaram-me pegar no vestido com as duas mãos mas quando comecei a apanhar o jeito mandaram-me largar o vestido e aí começaram os meus problemas. Passava o tempo a tropeçar, a olhar para baixo e por vezes quase caí. Como à hora de almoço ainda não conseguia descer a escadaria em condições, treinámos a etiqueta do jantar nesse momento, voltando à escadaria à tarde. As minhas pernas já não aguentavam quando chegou a hora de jantar, na qual também tive de treinar. m*l me libertaram dirigi-me ao quarto e adormeci em cima da cama, ainda vestida.
O dia seguinte não foi melhor, pois ainda havia muito para aprender e pouquíssimo tempo. Depois de recapitularmos várias vezes a minha entrada, que consistia em descer a escadaria e fazer tempo cumprimentando as pessoas, até que Aurora nos pedisse para nos dirigirmos ao salão onde seria servido o jantar, revimos os lugares que cada um ocuparia à mesa, assim como me fizeram decorar um monte de falas que me poderiam vir a ser úteis durante a noite. A seguir ao almoço dirigi-me sozinha para a aula de dança, devido a Jennifer e Holly terem outros assuntos a tratar, encontrando Eliot sozinho com o pianista na sala. m*l tive tempo de o cumprimentar e já a professora chegara e nos mandara começar a treinar. Horas decorridas, e já sem fôlego, dirigi-me ao quarto descalçando os sapatos pelo caminho. Pela primeira vez desde que chegara a Cyon ocorrera-me agir como uma princesa e chamei as minhas aias. Mia e Pauline apareceram em menos de um minuto, aparentemente surpreendidas mas corteses. Em seguida a algumas vénias, e várias reclamações da minha parte para que não o fizessem, pedi-lhes que me trouxessem o jantar e informei-as que não queria ser incomodada. Tomei um longo banho, vesti um fato de treino e peguei num livro, mas não cheguei a abri-lo, pois Pauline chegara com o meu jantar e com um recado da rainha, que pedia para me encontrar com ela na manhã seguinte. Feliz por ter um tempo só para mim jantei calmamente e escrevi uma carta aos meus pais. Quando acabei a carta preparei-me para dormir e em poucos minutos estava a sonhar.
Corri para o salão, atrasada para o pequeno-almoço por ter acordado tarde. Logo a seguir a ter engolido alguns alimentos, encontrei-me com Aurora na sala do trono. Como não sabia a quem pedir para entregarem a minha carta, levei-a comigo e perguntei à rainha a quem me podia dirigir.
- Essa carta não será entregue – clamou. – Não haverá mais comunicação com outros mundos, é demasiado perigoso. – Antes que eu tivesse tempo de argumentar, prosseguiu. – Quero-te informar como deves agir no baile. – Depois de meia hora de recomendações, quando pensei estar finalmente livre, veio a revelação da qual eu não esperava. – Deves dançar com todos os solteiros, sem excepção. Conversar cordialmente com cada um deles também é algo que deve suceder.
- Como assim dançar com todos os solteiros? Ninguém me falou nisso!
- Estou eu a falar agora. E para que pensavas serem as aulas de dança? – Vendo-me sem argumentos, concluiu. – Farás como ouviste. – Voltou-me as costas e saiu da sala, deixando-me sozinha com a minha carta, que nunca chegaria ao destino, e com a minha dor.
Saí da sala e dirigi-me ao jardim. Agora que começava a conhecer o palácio já não me perdia com tanta facilidade e demorei pouco tempo a descobrir o caminho. O ar puro, perfumado com mil e uma fragâncias florais, fazia-me bem e rapidamente me fez esquecer as horas. Quando Mia me encontrou já eram horas de almoçar e Jennifer aguardava-me na sala onde me davam aulas. Certificou-se que conhecia toda a etiqueta do jantar e todos os passos que teria de dar na noite seguinte, passando a tarde a rever tudo o que me ensinaram durante a semana e só após o jantar pude ficar livre.
- Amanhã tenta dormir um pouco mais, pois o dia vai ser cansativo – aconselhou Jennifer. – Já instrui Mia e Pauline para te levarem o pequeno-almoço e verificarem os restantes pormenores. – Assenti e despedi-me, indo em direcção ao corredor.
Ao chegar ao quarto sentia-me exausta, o que fez com que não me custasse a adormecer. Acordara às dez da manhã, pensando no dia que teria pela frente e tentando-me acalmar. Tomei o pequeno-almoço na cama, vesti uns calções e uma blusa em tons rosa claro, e saí dos meus aposentos. Deambulei pelo palácio em silêncio, passando por criados várias vezes, e encaminhei-me para o jardim, onde passei o resto da manhã.