Mayara Campbell
Acordo com as mãos do Gustavo percorrendo meu corpo. Ele não diz uma palavra — apenas me beija, já tirando minha roupa como se eu fosse um objeto, algo automático. Ainda estou sonolenta, mas ele me quer. E quando ele quer, eu obedeço.
Ele beija meu pescoço, aperta meus s***s com força, como se procurasse neles alguma resposta que não existe. Depois, se ajeita na cama, deita e me manda:
— Chupa.
E eu faço.
— Dá pra fazer com vontade? — ele reclama, impaciente.
— Eu tô fazendo com vontade, Gustavo...
— Não parece.
Então intensifico os movimentos, mesmo com a boca começando a doer. Não sei se ele gosta. Ele não reage, não geme, não toca meu rosto, não olha nos meus olhos. Nada. É como se eu não estivesse ali.
Paro e tento beijá-lo. Mas o beijo dele não tem amor, nem desejo. É oco. E, por dentro, eu sei. Ele está criando coragem. Pra dizer que me odeia. Pra me empurrar pra longe.
Monto em cima dele e começo a me mover. Subo e desço rápido, tentando arrancar alguma fagulha de prazer. Ele aperta meus quadris com força, solta um gemido rouco e logo goza. Não há carinho. Não há troca. Não há depois.
Tomamos banho em silêncio. Voltamos pra cama. E dormimos.
— Oi? — digo pela manhã, tentando me aproximar, tocando seu rosto, buscando um beijo.
Ele se afasta como se eu fosse contagiosa.
— Meu café. — diz, seco.
— O que tá acontecendo? Ontem à noite a gente fez amor... por que tá assim?
— Aquilo não foi amor. Foi fraqueza minha.
— Eu pensei que a gente estivesse se entendendo...
— A gente nunca vai se entender, Mayara.
— Mas, Gustavo...
— Chega. Será que você não tem vergonha? Já pensou no que o nosso filho tá presenciando?
— Eu penso, sim! Eu penso no Anthony todos os dias...
— Se vê. — diz ele, com desprezo nos olhos.
— Gustavo... por favor... me perdoa. Eu juro, você pode confiar em mim de novo. Eu não faço mais nada de errado. Foi um erro, eu me arrependo tanto... por Deus, me perdoa?
— Nunca. Eu não tô nem aí mais pra você. Pra mim, você não existe. Só tô aqui por causa do meu filho. Ele não vai morar comigo. E eu não vivo sem ele.
— Não diz isso... por favor... Eu te amo, Gustavo. Eu tô enlouquecendo. Você não vê? Você devia estar feliz... eu tô destruída!
— Você escolheu isso, Mayara. Agora aguenta. E fica bem caladinha.
— Isso não é vida... — digo aos prantos. — Eu tô acabando... eu tô morrendo por dentro...
Nesse momento, Anthony aparece na porta. Vem até mim com os olhos preocupados.
— Mãe... me dá um abraço. Vamos pro quarto?
Mas eu nem o ouço. Estou cega, surda, entregue à dor.
— Gustavo, me perdoa... por Deus...
— Será que eu não tenho paz nem um segundo?! — ele grita.
— Gustavo...
— Anthony — diz ele, olhando pro nosso filho —, ela não entende nada. Não adianta.
Gustavo se levanta, pega o travesseiro e vai pro sofá.
Eu o sigo. Me ajoelho no chão. Começo a beijar seus pés, a implorar com o que restou de dignidade em mim.
— Me perdoa... me perdoa...
Ele apenas empurra meu rosto com o pé, como se eu fosse um cão.
— Sai de perto de mim.
Me levanto cambaleando, com o coração em carne viva. Vou até o quarto. Tranco a porta. Me encolho na cama e começo a chorar com tudo o que tenho. O ar me falta, o peito aperta, as mãos tremem. Sinto como se estivesse morrendo ali mesmo.
E talvez estivesse.
Já não consigo mais me olhar no espelho. Sempre que tento, vejo o reflexo de alguém que desprezo. Nojo. Repulsa. Raiva. É isso que sinto quando olho pra mim.
Gustavo não merecia isso.
Eu nunca fui uma boa esposa.
E muito menos sou uma boa mãe.
Sei que ele é ignorante. Estressado. Que explode por qualquer coisa. Mas eu vivia andando em ovos, tentando evitar o caos. Nunca fui o tipo de mulher que brilha. Sempre me achei comum, apagada, sem graça.
E, ainda assim, o que eu mais queria era que ele se orgulhasse de mim. Que me olhasse como alguém que vale a pena. Mas falhei. Só o decepcionei.
Às vezes eu peço a Deus. Peço para mudar. Para ser aquilo que o Gustavo quer. Mais ousada, mais bonita, mais... viva. Mas não consigo. Não sei como agradá-lo. Já tentei de tudo.
E o pior é que, apesar de tudo, eu ainda o vejo como alguém bom. Ele é um bom pai. Mesmo com os gritos. Mesmo com o jeito duro. Mesmo quando chama o Anthony de burro ou inútil, dizendo que é brincadeira — eu sei que aquilo machuca.
E eu também sei que meu filho já entende.
E talvez um dia ele também vá embora. Como o pai dele me deixou. Só que em silêncio. Só que aos poucos.
E aí, sim… eu terei perdido tudo.
•••••••••••
Ele entra em casa com o rosto fechado, o olhar sombrio, os passos duros.
Anthony, ingênuo, corre até ele.
— Pai... tá tudo bem?
Gustavo solta o ar pelo nariz, visivelmente irritado.
— Fui demitido. Mas também... não gostava daquela merda de trabalho mesmo.
No fim das contas, é até um alívio.
— Por quê? O que aconteceu? — pergunto, baixinho.
— Sei lá.
Ele dá de ombros.
Mas não é verdade. Ele sabe. E mesmo sem dizer, já sei o que virá.
— Entendi...
Ele me encara. Frio. c***l.
E atira.
— Tudo que tá dando errado na minha vida... é culpa sua.
Eu apenas abaixo a cabeça.
— Eu sei... — sussurro. — Me perdoa, Gustavo. Por favor...
Ele não responde. Apenas se levanta e vai pro banheiro.
A porta bate. O som do chuveiro logo começa.
Termino de preparar o jantar. A mesa está posta.
Espero ele sair, para que possamos comer juntos.
Como uma esposa faria.
Mas sabe quando você já não sabe mais como respirar?
Sabe quando parece que o fundo do poço está afundando ainda mais... e agora ele começa a se encher de água?
E você tá ali, afundando. Sem ar. Sem corda. Sem ninguém.
Não vou mentir. Já pensei em acabar com tudo.
Já me imaginei me jogando de um carro em movimento.
Já encarei as lâminas no banheiro.
Já olhei frascos de remédio com uma calma perturbadora.
Mas então... lembro do Anthony.
Ele é meu motivo. Meu único respiro.
Por mais que eu me sinta a pior mãe do mundo...
Não quero deixá-lo. Não posso deixá-lo.
Quero estar com ele.
Nas festinhas da escola. Nos primeiros amores. Na formatura.
Nos momentos que importam.
Mesmo que, pra isso, eu precise morrer um pouco a cada dia.
Só que está difícil demais.
Eu estou destruída.
E não vejo saída.
Às vezes penso que Deus me esqueceu.
Ou que talvez... ele nunca tenha me amado.
Talvez Ele nem exista.
Ou talvez seja eu quem tenha virado as costas primeiro.
Talvez tudo isso seja o castigo que mereço.
E se for... só peço que acabe logo. Porque não sei até quando aguento.
Jantamos em silêncio.
Ele mastiga sem me olhar.
Anthony tenta puxar assunto, mas desiste quando percebe que entre nós só existe ruído.
Depois, lavo a louça, guardo tudo.
Tomo banho.
Me deito.
E essa... é a pior hora.
Porque quando a casa adormece... a minha cabeça desperta.
E ela não tem piedade.
Minha mente corre, gira, grita.
Repassa erros. Repassa palavras.
Volta pro dia em que tudo começou.
Volta pra conversa com o Lucas.
Volta pro momento em que eu destruí tudo.
E me pergunta: por que você fez isso?
O sono não vem. Só vem a culpa. E o desespero.
Ah, como eu queria voltar no tempo.
Mas não posso.
Agora... só me resta seguir.
Seguir carregando o desprezo dele como uma cruz.
Seguir suportando a frieza.
Seguir tentando provar que ainda sou alguém.
Mas, no fundo...
Eu não acredito mais nisso.
Tento me convencer de que não sou uma vagabunda.
De que não sou uma qualquer.
De que tenho valor.
Mas não consigo.
Me sinto suja. Pequena. Fraca. Um nada.
Uma fracassada que ninguém vai querer por perto.
Uma mulher que destruiu tudo.
E que agora... sente nojo de si mesma.