Melione, com seus poucos anos de vida, balançava as pernas pequenas no banco de trás, impaciente.
— Falta muito para chegar em casa? — perguntou, olhando para sua mãe com olhos curiosos e um leve traço de cansaço.
— Calma, querida. — respondeu Carlotta, com sua voz suave, quase uma melodia que parecia sempre acalmar os filhos.
— Melione, você já perguntou isso umas cinco vezes. — Dante, o irmão mais velho, não conseguiu resistir à oportunidade de provocá-la.
A menina franziu a testa, cruzando os braços em um gesto dramático.
— Eu não estava falando com você.
Do volante, o pai solta uma risada baixa, achando graça do comportamento dos pequenos. Mas seu riso logo some, dando espaço para uma expressão de tensão em seu rosto.
— Droga. — murmurou ele, os dedos apertando o volante com força.
Mais à frente, uma van estava parada no meio da estrada, aparentemente inofensiva, mas para Malthus aquilo era um sinal claro de perigo. Ele girou o volante abruptamente, fazendo o carro dar meia volta enquanto acelerava.
— O que está acontecendo, pai? — A voz de Melione estava carregada de nervosismo, seus olhos brilhando com lágrimas que ameaçavam cair.
Malthus, estende uma pistola para Carlotta, que a toma em suas mãos sem hesitar, segurando o objeto com firmeza.
Antes que pudessem ter mais alguma reação, um tiro estridente cortou o silêncio da noite, ecoando pelos ares. O carro perde o controle no exato momento, as rodas derrapam na estrada molhada, e em questão de poucos segundos o veículo sai da pista, descendo por uma ribanceira.
No momento em que o carro começou a capotar, tudo dentro dele parecia desacelerar. Para Melione, era como se o tempo tivesse congelado. As lembranças de sua curta vida passaram diante de seus olhos como cenas de um filme: as brincadeiras no jardim, os abraços apertados de sua mãe, o riso reconfortante de seu pai.
Do lado dela, Dante estendeu a mão, agarrando a dela com força. Quando seus olhos encontraram os dele, ela pode ver lágrimas silenciosas caírem.
E de repente, tudo se apagou.
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Melione acorda sendo arrastada pelo pai, que a deixa deitada na grama e volta correndo para o carro já em chamas. Seus pequenos olhos escuros paralisam de medo quando vê a figura de seu pai ao longe tentar atravessar o inferno de metal para salvar sua família.
— Mãe... — A voz de Melione falha. Instintivamente, sua mão foi ao pescoço, onde uma dor ardente a fez estremecer, quando ela encara os pequenos dedos seus olhos se arregalam ao ver o sangue que escorre. — Dante...
A dor física se misturava com algo muito mais profundo e avassalador. As lágrimas começaram a cair descontroladamente, embaçando sua visão. Tudo o que podia enxergar era o brilho incandescente do fogo, consumindo o carro que ainda há poucos minutos era um espaço seguro e cheio de risos.
Enquanto o sangue escorre...
A silhueta de seu pai surge diante das chamas ardentes, seu pequeno corpo treme quando nota que ele não conseguiu.
O sangue escorre...
O grito de dor pode ser ouvido ao longe, a garganta da pequena dói, mas não é o suficiente para aliviar a dor que sentia por dentro, o vazio que crescia dentro dela.
As lágrimas caem...
Seu pai se aproxima, se ajoelha e toma o corpo da filha em seus braços trêmulos, querendo tomar toda sua dor para si, lágrimas escorrem pelo rosto do homem mais velho, lágrimas de culpa, enquanto ele tenta proteger a criança de todo o perigo que passou e ainda virá.
O sangue escorre ...
— Mãe...— Os soluços impedem que a voz da criança seja ouvida com clareza, mas ele sabia. Ele sempre saberia. — DANTE!!!
O grito final e estridente de Melione parte o silêncio da noite, enquanto pai e filha compartilham uma única dor.
As lágrimas caem e se misturam com o sangue que escorre.