Benício Mendelerr
Desço as escadas ainda com o ódio ainda pulsando na cabeça. Paulah está sentada no sofá, conversando com Sara e a televisão imensa ligada em um programa aleatório. As duas riem baixinho, como se dividissem algum segredo e isso me incomoda mais do que deveria.
Elas estão próximas demais. Paulah, com aquele jeito doce, parece ter conquistado Sara de um jeito que ninguém mais conseguiu. Não que eu ache que minha sobrinha seria capaz de conspirar contra a própria família, mas Paulah é sedutora... Até demais!
— Bom dia, Sara. Seu pai está em casa?— Forço um tom neutro, parando ao lado delas.
Sara se levanta de um salto, sempre animada. — Bom dia, tio Benício! Sim, ele está.
Cumprimento a pequena com um aperto de mão firme, ignorando o olhar curioso de Paulah e não digo nada a ela, não quero dizer. Apenas viro e saio, deixando-as, sem olhar para trás.
Saio de casa e respiro fundo, tentando deixar a tensão para trás e entro no carro. O caminho até a sede é curto, mas minha mente já está a mil.
Assim que entro na sede, sou recebido pelo caos habitual. Pilhas de documentos, telefones tocando, vozes se sobrepondo. Kevin me encontra antes mesmo de eu alcançar minha mesa.
— Senhor Benício, temos um problema com o lote de armas para o Brasil. Foi extraviado no transporte.
— Como isso aconteceu? — pergunto, passando a mão pelo rosto.
— Parece que houve um erro na logística. Estamos rastreando, mas...
— Resolva isso, Kevin. Quero uma solução antes do fim do dia! Minha cabeça está atribulada demais para lidar com mais prejuízo.
Ele assente e sai rapidamente. m*l tenho tempo de me sentar antes que o telefone toque. Atendo, e a voz do outro lado é direta.
— Senhor Benício, um dos nossos maiores fornecedores de armamento, estará em Culla del Crimine na próxima semana. Ele quer discutir novos acordos, trata-se de Elton Mariaga.
— Ele vem até aqui? — pergunto, surpreso. Ele é o mais importante de todos os contatos e se conseguirmos firmar um acordo com ele, teremos um lucro inestimável.
— Sim, e espera uma recepção à altura. O senhor sabe como ele é...
Claro que espera. Esses homens sempre esperam. Uma festa, luxo, algo que mostre que estamos no controle. Desligo o telefone e chamo Kevin de volta.
— Preciso que delegue a organização de uma recepção para Elisa. — Minha voz sai firme, sem espaço para discussão. — Mande-a preparar um lote de garotas, as melhores que temos!
Elton Mariaga é um conquistador, amante de mulheres belas. Nada como oferecer as melhores vadias que temos no bordel da cidade e isso ajudará a formar o acordo.
— Elisa? — Kevin parece hesitar. — Tem certeza?
— Absoluta. Não quero lidar com isso pessoalmente. — Respondo seco. — Diga a ela que quero algo grandioso, mas não entre em detalhes.
Kevin assente, mas não parece muito confortável. Eu não me importo. Não quero outra conversa desnecessária com Elisa. Não hoje! E apesar do prejuízo que ela me dera há uns dias, é a melhor para organizar esses eventos.
Finalmente sozinho, por impulso, abro o laptop. Não sei exatamente o que estou procurando, mas minhas mãos já digitam o nome dela. O perfil aparece imediatamente. Não costumo perder tempo com redes sociais, mas algo em mim quer saber mais sobre ela, além do que vejo todos os dias e do dossiê que mandei fazerem sobre ela no dia em que chegou.
Muitas fotos de viagens e do trabalho dela como fotógrafa. Em quase todas, Paulah sorri. Não aquele sorriso contido e desconfiado que ela exibe aqui quando está com Sara, mas um sorriso genuíno, de alguém que parecia estar em paz com o mundo.
Paro em uma foto dela em um parque, o cabelo solto, um decote delicioso. Em outra, ela segura um café e ri para a câmera, como se a vida fosse simples e fácil...
Me recosto na cadeira, os olhos fixos na tela. "Será que ela era realmente feliz lá fora?" A pergunta me incomoda mais do que deveria. Em Culla del Crimine, cercada por tudo isso, será que ela conseguiria sorrir assim de novo? Será que ela conseguiria sorrir... comigo?
Fecho o laptop com força, irritado comigo mesmo. Que tipo de pensamento é esse? Eu não deveria me importar com a felicidade dela.
Mas, quanto mais tento afastar essas ideias, mais elas voltam. O jeito como ela olha para mim, como se estivesse sempre à beira de fugir... É excitante!
Levanto da cadeira e caminho até a janela. A vista da sede é imponente, mas não me dá a paz que deveria.
Preciso voltar ao trabalho. Não posso me dar ao luxo de me perder em pensamentos sobre essa mulher. Mas, mesmo enquanto pego o telefone para resolver mais um problema, o sorriso dela ainda está lá, como uma sombra que se recusa a ir embora.
Ouço passos firmes no corredor e não preciso levantar o olhar para saber quem é. A porta se abre sem cerimônia, e Lui entra, com aquele ar de quem sempre tem algo a dizer e fecho com velocidade a tela do computador a minha frente.
— Esperava te encontrar em casa, irmão. — Ele começa, cruzando os braços enquanto me encara. — Achei que, em lua de mel, você não sairia assim para vir trabalhar.
Solto um suspiro e me recosto na cadeira, tentando controlar a irritação que já está à flor da pele.
— Lua de mel, Lui? — Minha voz sai seca, quase sarcástica. — Não se iluda. Nada mudou.
Ele dá uma risada curta, sem humor, e se aproxima da mesa. — Nada mudou, mas você saiu de casa irritado. Algo me diz que essa "lua de mel" já está te desgastando.
— Não tenho tempo para isso. — Respondo, abrindo uma pasta com documentos que preciso revisar. — Tenho encomendas para despachar, problemas para resolver. Não é exatamente o cenário ideal para romantismo, caso você não tenha notado!
— Ah, eu notei. — Lui puxa uma cadeira e se senta, como se tivesse todo o tempo do mundo. — Eu ainda não entendi nada sobre esse seu casamento repentino, a mulher é linda... Mas Elisa também tem seu charme, no entanto nunca conseguiu te levar ao altar.
Fecho a pasta e olho para ele. — Eu só quis ajudá-la, imagine-a casada com Tony ou com qualquer um dos idiotas daquela mesa de jogo.
— Ou seja, você gostou mesmo dela — Lui pergunta, arqueando uma sobrancelha.
— Eu não disse isso!
— Mas eu sei, ela te deixa louco e nunca se casaria se isso não fosse verdade. Mas me conta, já conseguiu t*****r com ela?
— Todos querem saber o mesmo! Sua audácia está indo longe demais Lui.
— Sou seu irmão, ninguém pode nos ouvir... Mesmo que seja só por prazer, sei que não conseguiria estar com ela sem ao menos experimentar.
— Não chegarei sequer perto dela!
— O que foi, não gosta mais de mulher? — ele sorri.
— Claro que sim, seu m***a! Mas com ela é diferente...
— Essa mulher tem mel. Você está de quatro patas por ela!
— Cala a boca, vamos falar de negócios. Elton Mariaga chegará aqui em breve e teremos que dar uma festa para recepcionar! Já mandei Kevin delegar isso para Elisa. Não vou lidar com mais nada além do essencial.
Lui me observa por alguns segundos, como se tentasse ler algo que não digo. Finalmente, ele se levanta.
— Você sabe que, cedo ou tarde, vai ter que lidar com tudo, certo? Não dá para delegar tudo para sempre... Mas está certo, vamos dar uma festa para o milionário.
Ele dá de ombros e se dirige à porta, mas para antes de sair. — Ah, e sobre seu amor por Paulah... espero que você saiba o que está fazendo.
Não respondo, mostro o dedo do meio e ele sai.
Me recosto na cadeira novamente, mas, em vez de voltar ao trabalho, meus olhos acabam no laptop fechado. A imagem do sorriso de Paulah ainda está lá, na minha mente...