Lisa Hernandez
Passava da meia-noite.
Olhei mais uma vez para o relógio, o coração apertado.
Nada do Arthur chegar.
Será que ele está com outra mulher?
Mesmo com o nosso casamento à beira do abismo, preferi acreditar que ele jamais faria isso comigo. Ainda não. Ainda não...
Ouvi a porta abrir e corri de volta para a cama, fingindo estar dormindo.
Ele entrou silenciosamente, tirou a roupa e se deitou. Ficamos costas com costas.
Como eu queria poder abraçá-lo, sentir seu calor, dormir aninhada em seus braços como antes...
Mas ele já não era mais o mesmo.
Na manhã seguinte
A cama estava vazia.
Levantei, fui direto para o banho e desci até a cozinha — até parar na escada ao ouvir vozes vindas de lá.
A voz da Antônia cortava o ar como faca afiada:
— O divórcio é o certo, Arthur. Você precisa se livrar dela.
— Bruxa… — sussurrei, sentindo o estômago afundar.
Sempre foi o desejo dela: me ver longe do filho dela.
Mas Arthur jamais concordaria com algo assim. Ou... concordaria?
Permaneci em silêncio, escondida, ouvindo cada palavra.
E quando foi Arthur quem disse que sim, que o divórcio era o melhor...
Foi como se o chão se abrisse sob meus pés.
Voltei para o quarto em desespero. Fechei a porta e desabei no chão.
As lágrimas jorravam. O peito doía. O corpo inteiro tremia.
Me sentia perdida, traída, quebrada.
Peguei o celular com as mãos trêmulas. Liguei para Louise.
Ligação — ON
— Lou... — falei entre soluços.
— Lisa? O que houve? Você tá chorando? O que aquele desgraçado fez?!
— Lou... o Arthur... quer o divórcio...
— O quê?! Tem certeza?
— Sim. Eu ouvi ele e a mãe dele falando na cozinha... Ele concordou com ela.
— Filho da mãe! Eu sabia! Aquela bruxa meteu o dedo, como sempre!
— Lou, o que eu vou fazer? Eu não posso perdê-lo… eu não sei viver sem ele…
— Lisa, escuta aqui. Você não precisa desse homem. Você é uma mulher formada, uma advogada brilhante! Você pode recomeçar!
— Nunca exerci, Lou… nunca tive um caso. Eu sou filha de empregada, não tenho apoio nenhum. Você sabe disso.
— Você tem a mim. Eu vou te ajudar no que for preciso.
— Isso não é justo.
— E ele foi justo? Quando ele falou isso?
— Ele ainda não falou nada pra mim. Eu apenas ouvi a conversa.
— Então não se desespera ainda. Pode ser que ele só disse aquilo pra agradar a velha desgraçada. Espera ele te dizer alguma coisa primeiro.
— Tá bem…
— Agora enxuga essas lágrimas. E não esquece quem você é. Eu te amo.
— Te amo também. Obrigada.
Ligação — OFF
Mas por mais que eu tentasse me convencer...
Por mais que Louise tentasse me levantar...
Algo dentro de mim dizia: você já perdeu ele.
Mais tarde...
Tomei outro banho, me vesti, peguei minha bolsa e desci. Precisava respirar. Pensar. Fugir.
— Já vai sair de novo? — perguntou Antônia, cruzando os braços com deboche.
— Sim.
— Não sei o que tanto faz na rua. Com certeza, gastando o dinheiro do meu filho.
— O que eu faço não é da sua conta, Antônia. E se saio todos os dias, é pra não enlouquecer trancada nessa casa com você.
— Muito bem! Mostrou as garrinhas!
Você nunca me enganou com esse ar de boa moça. Aposto que até essa história das pernas é invenção. Você não passa de uma golpista!
Quase avancei nela. O sangue fervia.
Mas me controlei.
Bati a porta ao sair.
— Cobra maldita. — murmurei, subindo no Uber.
Ela usava uma doença que ninguém via ou confirmava para se fazer de mártir.
E o Arthur… um fantoche cego nas mãos dela.
Pedi que o motorista me levasse ao shopping.
Queria fazer algo. Qualquer coisa.
Quem sabe... talvez ainda desse tempo de conquistar meu marido de volta.
No shopping
Entrei numa loja de lingeries. Fazia anos que não comprava algo sexy.
— Boa tarde, posso ajudar?
— Quero ver algumas peças... bem sensuais.
Experimentei uma preta, uma rosa e uma vermelha, todas com cinta-liga.
Me senti bonita, mesmo com a insegurança mordendo meus calcanhares.
Mesmo com as cicatrizes.
Escolhi a vermelha.
À noite
Estava no closet, me olhando pela centésima vez no espelho.
A lingerie vermelha emoldurava meu corpo.
As cicatrizes ainda estavam ali, mas hoje… tentei não vê-las como defeitos.
Tentei me ver com os olhos de quem um dia me amou.
Ouvi a porta abrir. Meu coração disparou.
Respirei fundo, saí.
Arthur me olhou dos pés à cabeça.
Mas sua expressão permaneceu inalterada.
— Oi... — sussurrei.
— O que significa isso?
— Queria te surpreender. Gostou?
Me aproximei e comecei a tirar o paletó dele.
Mas ele segurou minhas mãos. Forte.
— O que você pensa que tá fazendo?
— Arthur… eu te quero. Transa comigo, por favor. Eu... eu te amo.
— Eu tô cansado.
— Só hoje… me toca. Me ama, só mais uma vez...
— Já disse que não. Se vista. Você está ridícula. E essa maquiagem então… um horror.
Ele me empurrou.
Caí sobre a cama.
Fiquei lá, imóvel. Humilhada.
Levantei. Fui ao banheiro. Tirei a maquiagem com pressa. Vesti meu pijama.
Odiava aquela versão de mim: a que implora, a que rasteja.
Ele voltou para o quarto e deitou, como se nada tivesse acontecido.
— O que te deu na cabeça pra se vestir daquele jeito?
— Só queria te surpreender… sinto sua falta. A gente não se toca há semanas. Sempre é dor de cabeça, cansaço…
— Eu trabalho. Diferente de quem passa o dia sem fazer nada.
— Eu não trabalho porque você nunca permitiu! E quando pedi para atuar como advogada na sua empresa, você riu da minha cara!
— E como você acha que ia conseguir trabalhar? Com essa sua… deficiência?
Silêncio.
— Deficiência? É assim que você me vê?
— Você vive reclamando das pernas, não vive?
— O que eu sinto não me torna inválida.
— Chega. Vamos dormir.
— Não. Não antes de você me dizer o que está acontecendo com o nosso casamento!
— Quer saber?
— Sim.
— Eu quero o divórcio. Nosso casamento acabou faz tempo. Eu não te amo mais, Lisa. Fingir que ainda somos um casal só te machuca mais.
— Eu… eu não quero me divorciar de você. Eu te amo.
— Mas eu não te amo mais. E não quero te enganar.
Aquilo foi uma facada direta.
Sem anestesia.
Sem compaixão.
Caí sentada na beira da cama, os olhos arregalados, o peito em ruínas.
E percebi…
Ele não me via mais.
Nem como mulher.
Nem como esposa.
Nem como nada.