Não se esqueça de Mim

2961 Words
Eu devo ter feito algo terrível em outra vida para ter tanta má sorte nessa. Fiquei pensando nisso enquanto o vulto n***o se aproximava de nós. Considerando minha atual posição, poderia dizer que minhas chances de ou ser morta — até possivelmente por uma queda — e uma tentativa de sequestro. Eu já tive minha cota de situações perigosas. Eu vi o mais um enorme problema voando em nossa direção. Levantei rapidamente sentindo meus pés escorregando no chão irregular do telhado. Nero pegou na minha mão antes que eu caísse, e posicionou-me atrás dele fazendo de si mesmo um escudo. Eu agarrei fortemente o casaco dele. A criatura não teve chance para sequer nos atacar e levou um tiro — levou chumbo grosso, em outros termos. Nero apontava sem pestanejar a Blue Rose para o demônio. Um grunhido estrangulado seguido de um grito estridente cortou o silencio da noite. Pensei que com o barulho Kyrie acordaria, mas não houve mais nenhum outro som depois. — Nossa, isso foi assustador... — disse eu, pousando a mão sobre o peito, sentindo o coração disparar. Nero olhou de relance para mim. — Não se preocupe, eu não acho que ele tenha vindo atrás de você. — Hm, bem... Eles são assustadores estando ou não atrás de mim. — afirmei insegura. Afastei-me abruptamente de Nero quando percebi nossa extrema proximidade. Nero coçou a cabeça e virou a cabeça para olhar para lua. — Melhor irmos dormir. — Ah, sim! Nossa noite terminou de um jeito muito tenso. Naquela manhã, acordei com uma chata luminosidade. Rolei na cama tentando encontrar a melhor posição para me livrar da luz que persistia em ficar irritantemente em meu rosto, não deixando que eu dormisse em paz — meu rosto até esquentou devido ao calor. Sem outra escolha, abri os olhos lentamente. A janela que eu tinha usado para escapulir para o telhado na noite anterior, estava aberta — não acho que tenha esquecido de fechar. Fiquei um pouco irritada. Eu já pressentia que hoje não seria o melhor dia da minha vida. Se bem que desde que cheguei nesse mundo, nenhum dia é singularmente bom — exceto, é claro, quando dormi com o Dante, mas apenas dormi, sem mais. Além de estar um caco de sono, sentia um poderoso mau humor me envolver como uma nuvem n***a. Uma das piores coisas do mundo é deixar a luz do sol entrar quando tem alguma pessoa dormindo — principalmente se esse alguém sou eu. Sendo sincera comigo mesma, sempre odiei acordar cedo o que me tornava uma garota bem preguiçosa. Levantei e arrumei a cama improvisada. Enquanto ajeitava minha bagunça encontrei um bilhete colado no armário; Bom dia, Diva! Bom dia? Não me parece tão bom assim. Sei que deve ter ficado irritada com o modo que você acordou. Nossa, você não sabe o quanto. Bem, eu tive que sair mais cedo por causa de um pequeno problema. De qualquer forma, deixei café pronto para você e para o Nero. Até mais tarde! Xxx Kyrie Eu não sabia ao certo o que faria. Era uma ocasião perfeita para estar sozinha e conhecer um personagem tão incrível como o Nero. Fiz minha higiene matinal e fui diretamente para cozinha. Nero estava tomando café tranquilamente. Assim que notou minha presença seu corpo ficou rígido, como quando um soldado que esta de frente ao seu superior. A questão é bem simples, o fato de eu estar ali, de certo modo, invadindo seu território — uma completa desconhecida — fazia-o agir em estado vigilante de total cautela. Isso não era exclusividade dele, eu sentia-me sufocada e incomodada. Peguei uma torrada e um copo de suco. Cada movimento que eu perpetrava era como se estivesse sendo vigiada. Eu definitivamente estava sendo vigiada. Podia sentir um par de olhos me perfurando. Encolhi-me no lugar assim que sentei na cadeira. Nero me encarava como se eu tivesse uma placa de neon na minha testa dizendo: "Alerta". Entendia os motivos dele para não confiar plenamente em mim, mas acho que isso é um pouco exagerado — ou ele relaxava, ou teria um troço. Eu podia até ver umas veias pulsando no pescoço dele. — Tem algo de errado na minha cara? — indaguei impaciente, lançando meu pior e mais assustador olhar mortal. — Odeio que fiquem me olhando, especialmente quando estou comendo. — Desculpe! — ele se limitou a dizer. Arqueei as sobrancelhas em surpresa. Apesar de conhecer bem pouco — alias pouquíssimo quase nada — ele não parecia ser do tipo que pedia desculpa. No entanto, via bastante sinceridade no pedido dele. — Ahn... Diva, quer — ele respirou fundo — conhecer a cidade? Cogitei a ideia. Eu fiquei bastante empolgada na possibilidade que se estendia a minha frente. Poderia usar essa oportunidade para mudar a péssima primeira impressão que Nero tinha de mim. — Ah, claro! — disse eu, alegre. Depois do pequeno discurso, o café da manhã prosseguiu silencioso. Eu puxei o máximo de ar que meus pulmões permitiriam. Um dos maiores prazeres da vida é apreciar a linda vista, sentir o sol esquentando levemente sua pele, a brisa suave trazendo um peculiar cheiro de mar e poder respirar sem medo. A liberdade era algo incrível — mesmo que só percebemos sua real importância depois que quase a perde. Os chão das ruas eram de pedras enormes que se organizavam em uma sequencia quase perfeita, grandes e pequenas peças se encaixando. As casas pareciam ser da época renascentista, mas não era de um material tão diferente quanto o piso. Havia muitas coisas diferentes do que eu tinha visto no jogo. Considerando que no ataque do Salvador a cidade foi destruída. E, a diferença se deva a isso. Por outro lado, as pessoas mostraram ser bastante gentis e acolhedoras. Era bem diferente das pessoas do meu mundo. Agora, eu até creio que ser de um lugar isolado do mundo torne as pessoas menos agressivas e susceptíveis a violência. Nero me mostrou cada parte da cidade. Naquelas poucas horas, eu era parecia uma criança explorando todo um mundo novo — era exatamente o que acontecia. Nero parecia um pouco menos desconfiado. Não inteiramente, mas o suficiente para conversar comigo sem hostilidade. Eu tinha a ilusão de que talvez possamos ser bons amigos. Apesar de ser meio desajeitado, tentava fazer minha parte para uma boa convivência. Demos uma pausa no píer. Por alguma razão, eu senti como se não fosse a primeira vez que tivesse estado ali — um Déjà vu. Sentei no chão de madeira e fiquei observando o horizonte. Nero imitou minhas ações. — Esse lugar é lindo! — falei quebrando o gelo. — É tão diferente do lugar onde eu morava. — Realmente, aqui é bonito. — começou, mostrando um pouco de relutância. — Bem, onde você morava? Agora ele parecia mais a vontade. — É um lugar bem distante. Nem vale a pena falar sobre ele. — expliquei, tentando não mostrar a pontada de tristeza na minha voz. Eu não queria falar muito sobre meu mundo. Havia um lado meu que adorava toda essa aventura e ação desse mundo, entretanto, ainda tinha a parte que sentia falta do que eu tinha deixado para trás. Como queria mudar ligeiramente de assunto, pensei em algo que tirasse o foco daquela conversa. — Nero? — chamei. — Fala. — Você e a Kyrie são o que? Namorados? — perguntei, deixando minha curiosidade transparecer. Eu finalmente tinha encontrado a chance perfeita para saber. Independente de ter algo entre eles, como uma fã eu tinha que saber — ou morreria de curiosidade. — Como? — Nero engasgou. — Me responda, por favorzinho. — pedi, encarando sua expressão constrangida. — Eh... Eu... bem... Nunca pensei que ele fosse tão tímido. Vendo-o vermelho daquele jeito, atiçou uma parte minha que eu nem sabia que existia. Uma avassaladora vontade de saber até onde essa timidez ia. Afastei qualquer tipo de pensamento perverso que nublava minha mente. Passei tempo demais com Dante — tanto que tenho até medo desse novo lado meu. — Porque você quer saber? — ele indagou, apreensivo. — Curiosidade. Me responda! — respondi, cortando-o. Impensadamente, joguei-me em cima dele. Eu sempre fazia isso quando queria saber algo de uma amiga próxima. Era um modo de irritar e até mesmo divertir. Nero ficou imóvel e um pouco inquieto. Percebendo meu deslize, o soltei e voltei a minha posição anterior. — Nós poderíamos ter nos machucado, mulher insana! — resmungou, soando debochado. Eu acabei gargalhando. — Ah, não exagera. Na pior das hipóteses você absorveria o impacto sem problemas. — retruquei, mostrando a língua. A conversa começou a rolar naturalmente. — Não sou uma cama elástica. — Tem razão, mas você é bem... — pensei numa palavra para melhor descrevê-lo, enquanto o olhava de cima a baixo. — Corpulento. Ele corou. — Ah, corpulento? Assenti. Houve uma segunda explosão de gargalhada. Os dias passaram sem nenhum evento significativo. Eu e o Nero nos tornamos amigos. O tempo que passei com ele e Kyrie foram incríveis. Nesse meio período, eu me dediquei a ajudar Kyrie no trabalho voluntario no orfanato. No entanto, ainda tinha saudade de Dante. Se ao menos pudesse vê-lo mais uma vez. Queria tocar nele e se tivesse força o beijaria — no calor do momento tudo pode acontecer. Tudo bem, confesso, eu estou desesperadamente e pateticamente apaixonada por ele. E que não ficaria encantada com o jeito protetor, arrogantemente sedutor dele. Conforme passavam os dias, percebia a evidente distancia que tinha entre mim e Dante — a questão sentimental, mas a física também. Por um momento, pensei que ele tivesse se esquecido de mim. Será que eu era um fardo para ele? Um que ele tinha conseguido se livrar? — Algum problema, Diva? — Kyrie perguntou, percebendo que estava aérea. — Não... Sim... Não... Quer dizer, sim! — rebati nervosa, engoli em seco. — É por causa do Sr. Dante, não é? — ela sentou ao meu lado no sofá. A Kyrie bem que podia tentar a carreira de adivinha. — Seu rosto diz tudo. — Eu acho que ele se esqueceu de mim! — confessei, deprimida. — Você o ama? — ela perguntou repentinamente e sem rodeios. O calor subiu até meu rosto. Nunca pensei que ela perguntaria algo assim. Ela não era a pessoa que eu pediria conselhos amorosos, principalmente vendo ela e Nero “nesse chove não molha”. — Bem, ele salvou minha vida varias vezes... — enrolei, envergonhada. — Isso não respondeu minha pergunta. Kyrie arqueou as sobrancelhas. — Faremos o seguinte, no almoço nós conversamos. Com a insistência eu aceitei. As horas passaram num borrão. Encontrei com Kyrie num restaurante simples e bastante bonito. Normalmente, nessas horas o restaurante estaria lotado. Principalmente num horário de pico como agora. Aproveitei comer na paz e na tranquilidade do lugar. — Diva! Diva! — Kyrie invocou. — Hm! — chiei, dando uma garfada numa apetitosa macarronada com molho rose. — Podemos conversar agora? — Sim... — rebati sem empolgação alguma. Eu sabia bem o assunto, e não queria falar sobre ele. — Então, você gosta do Sr. Dante? — repetiu a mesma questão polemica de antes. — Não o chame de senhor... é estranho. — afirmei, fazendo careta e torcendo para que isso desviasse atenção dela. — Ok! — respondeu resignada. — Me responda. — Sim. Eu gosto dele! — Gosta? — Ah! Não engrossa, Kyrie. Eu gosto! Ponto. — Você esta protelando! — Kyrie acusou. — Não estou! — me defendi. — Está protelando, sim! — Kyrie! — repreendi. Eu sentia como se tivesse conversando com uma velha amiga — rolou até uma briguinha. Com a Kyrie a conversa era tão íntima. Fiquei com uma pontada de culpa por ter uma queda por Nero. Mas, com isso não podia fazer nada — ninguém além de mim mesma sabia. Como um velho provérbio dizia “O que os olhos não veem o coração não sente”. Discutimos mais que comíamos. Terminamos o almoço, Kyrie continuou trabalhando e eu voltei para minha casa temporária. O caminho foi calmo e sem muito entusiasmo. O que era péssimo e que dava sentido à expressão "Cabeça vazia, oficina do d***o". Meu pensamento insistia em me trair. Quanto menos queria pensar em Dante, mais eu o queria por perto. Entrei fechando a porta atrás de mim. Encostei-me à porta e escorreguei sentindo o chão frio nas minhas pernas. Encolhi-me envolvendo meu braços ao redor das minhas pernas, enterrando minha cabeça ali. — Diva? — ouvi Nero falar. Elevei a cabeça e o encontrei ajoelhado na minha frente com um olhar preocupado. — O que houve? Eu tentei buscar palavras para explicar. Na minha mente, apareciam apenas frases e imagens confusas. Um soluço irrompeu no meu peito. Meus olhos ardiam pelas lagrimas que queriam descer. Por sorte, não chorei. Nero me ajudou a levantar e me guiou para fora. Eu sabia onde ele estava me levando. O píer se tornara o lugar que eu usava como válvula de escape. Desde a primeira vez, que tinha vindo — eu não tinha certeza que era a primeira vez —, Nero me trazia sempre que eu precisava de um refugio — um cara apaixonante, não? O vento soprou por entre nós. O cheiro de mar e areia invadiu minhas narinas trazendo boas lembranças. Aquilo despertou minhas memórias. Lembrei-me de como meu pai brincava falando sobre as crenças das antigas civilizações de que o horizonte era o fim da linha. Se o cruzasse teria a surpresa de dar de cara com um monstro. Dancing alone again, again, my rain falling Dançando sozinha novamente, novamente minha chuva cai Only the scent of you remains, to dance with me. Só seu perfume restou, para dançar comigo Nobody showed me how to return the love you give to me Ninguém me mostrou como retornar o amor que você me deu Mom never holds me, dad loves a stranger more than me Minha mãe nunca me protege, meu pai ama uma estranha mais do que a mim — Quer conversar? — indagou gentilmente. — Não muito! I never wanted to ever bring you down Eu nunca quis, de forma alguma, lhe deixar triste. All that I need are some simple loving words. Tudo o que preciso são simples palavras de amor You touched my body once, it burns me, still softly Você já tocou meu corpo uma vez, isso me queima, ainda suavemente Never forgets, never again will be, I cry. Nunca esquece, nunca novamente será, eu choro Escovei meus curtos fios castanhos com minhas mãos. Eu sentei na beira do cais, tocando a água fria com a ponta dos pés. Uma brisa fria arrepiou minha pele. A temperatura mudara bruscamente. Nem me importei e fiquei com os olhos vidrados no horizonte. O sol estava se pondo deixando as águas brilhando com sua luz alaranjada. A visão era perfeita para uma foto. Concentrada, ouvi um ruído de passo firmes e fortes no piso de madeira lascada. Não dei importância. Out of my head and I don't know what I found Fora de minha cabeça e eu não sei o que achei Over and over I feel it break me down. Repetidas vezes eu sinto que isso me deixa nervosa. On the sidewalks of the city, Na calçada da cidade, Are my screams, just a whisper meus gritos são apenas sussurros? Busy people going nowhere, Pessoas ocupadas indo a lugar nenhum. See me soak in the rain, Veja-me ensopada na chuva. No compassion, nothing matters, Sem compaixão, nada importa. My resistance is waiting, Minha resistência está esperando, Like a flower in the basement waiting for a lonely death Como uma flor num porão esperando por uma morte solitária. — Uma bela vista, não? — comentou uma voz familiar. Olhei por cima do ombro. Meu coração batia acelerado, quase saltando do meu peito. — Dante... — gemi. Virei-me abruptamente, escorregando na beira do cais. Uma mão segurou-me antes que eu caísse, puxando para longe da beirada e chocando-me com um peito duro e quente. Fui envolvida num abraço reconfortante. Finalmente poderia acalmar aquela inquietação no meu coração. O vazio que a falta daquele meio demônio arrogante fazia. Respirei inalando o doce perfume que Dante exalava. O mesmo frescor que eu experimentei na primeira vez que cheguei a esse mundo. Braços fortes serpenteavam minha cintura trazendo ainda mais para perto. — Pensei que tinha me esquecido! — choraminguei, afundando meu rosto em seu peito. — Achei que não me queria por perto, por isso não vinha me buscar... Eu sei que ando causando muitos problemas... — ele pousou o dedo indicador nos meus lábios, impedindo que eu continuasse. — Ah, baby! Eu nunca te esqueceria. — ele começou, sussurrando no meu ouvido. — Calma doçura. Estou aqui, seu herói esta aqui. Não pude segurar a risada com esse comentário. Dante ergueu meu rosto. Meus olhos castanhos encontraram-se com os azuis intensos dele. Então, ele se aproximou. Tão perto que podia sentir sua respiração. No minuto seguinte, nossos lábios se tocaram. Dante pressionou-me contra si, aprofundando o beijo. No começo, era um beijo rápido e quente, mas transformou-se em um beijo intenso cheio de paixão e calor. Um braço se mantinha na minha cintura e o outro na minha nuca. Acabei suspirando em meio ao beijo quando Dante me puxou ainda mais para perto — quase a ponto de nos fundirmos. Passei as mãos por seu sedoso cabelo liso, bagunçando-os delicadamente. Ofeguei quando senti as mãos dele deslizarem sobre minha camisa branca de algodão — que ironicamente tinha um desenho semelhante a Dante, uma silhueta de um demônio e sua espada que parecia ser a Rebellion. Eu me sentia extremamente quente. Aquilo me pegou de surpresa. Mas ela era muito agradável.
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