Kan Ruslan
Ela se vira com toda a pose de uma líder que acredita que manda no mundo e dispara aquele veneno final, depois de dizer que não está procurando um marido.
E sai.
Rápida. Tensa. Furiosa.
E eu… rio.
Um riso curto, porque eu realmente não esperava menos. Lunara Tokatli tem o gênio do pai, e talvez algo pior. Ela fala como quem nunca teve a palavra contrariada. Caminha como quem conhece o peso de um território inteiro e reage como quem aprendeu cedo que o perigo mora em cada canto.
Maravilhoso.
Difícil.
Exatamente como eu imaginava.
Observo a silhueta dela sumindo com a amiga pelo corredor, e penso que vou ter trabalho para chegar perto. Mas eu não desisto de nada. Nunca. Principalmente de algo que me convém tão bem.
Eu não quero apenas uma esposa para manter tradições. Eu quero mais poder.
E sei que com Lunara, eu terei. Afinal, qual outra região é liderada por uma mulher que não tem mais nenhum parente de sangue? Nenhuma!
Lunara é única e aposto que eu não ou o único a pensar nesse ponto.
Dou meia-volta, ajeito o casaco nos ombros e retorno para o salão. O barulho volta a atingir meus ouvidos. Música alta, copos tilintando, risadas de homens que já passaram da conta. Nada disso me incomoda. Cresci no meio de gente pior.
Assim que passo pela entrada, encontro meu irmão. Hamit está parado, braços cruzados, me encarando como se quisesse me bater com um pedaço de madeira. Ele é certinho demais às vezes e já sei o que eu vou ouvir.
— Você está ultrapassando os limites, Ruslan. — Ele resmunga antes mesmo de eu abrir a boca. — Isso vai dar merdä. Você está brincando com fogo.
Mantenho meu sorriso. Sorriso que ele odeia, porque significa exatamente o contrário da prudência.
— Eu gosto de me queimar às vezes.
— Ruslan…
— E logo Lunara vai estar nas minhas mãos. — Digo certo disso. — O quê? Eu estou atrás da esposa que tantos pedem e de brinde... darei mais outra região. — Ele suspira. — Acha que Faruk será o único? Ele foi o primeiro...
O olhar dele se torna uma mistura de incredulidade e irritação. Mas eu conheço meu irmão. Ele é metade razão, metade impulso. E, mesmo assim, segue meu comando. Sempre segue.
Ele só balança a cabeça e deixa escapar um suspiro duro.
A festa continua, e quanto mais a noite avança mais bebida circula. As dançarinas entram, iluminando o centro do salão com movimentos ao som dos instrumentos típicos. Cinturas se movem com vida própria. Homens do Norte aplaudem, gritam, brindam, alguns já sem saber onde estão. É assim que funciona aqui: comemoração à base de exagero.
Eu apenas observo.
Bebo, mas não muito.
Participo, mas nunca me exponho.
Alguns homens locais puxam assunto, falam de comércio, de fronteira, de tensão com o Sul. Eu respondo o necessário. Não dou brechas. Eu sempre fui cauteloso em tudo.
Quando me esbarro com Osman, um dos homens mais confiáveis do território de Halit, decido que é o momento perfeito para o próximo passo.
— Osman! — Digo, fingindo simplicidade. — Preciso saber se posso dormir aqui hoje. Quero tratar de alguns acordos com o Norte agora que há uma nova líder. Sabe como é... tudo precisa ser bem esclarecido para não haver perdas.
Osman não discute.
Nunca discutiria com alguém do meu nível.
— Claro! — Ele responde, em respeito. — A mansão tem muitos quartos. Vou mandar preparar dois.
— Agradeço. Eu e meu irmão ficamos só essa noite.
Assim que Osman se afasta, Hamit chega mais perto.
— Você é maluco, Ruslan. Como consegue?
— Eu tenho os meus interesses...
Eu apenas sorrio e ergo o copo de vinho.
O resto da noite é uma mistura de música, cheiro de especiarias, discussões territoriais e homens que já perderam a linha. Eu aproveito apenas o suficiente para não parecer deslocado.
Mas observo tudo.
Cada rosto.
Cada comportamento.
Cada fraqueza.
E penso, enquanto bebo devagar, que no dia em que eu me casar com Lunara e reivindicar o Norte, certas coisas vão mudar. Certos excessos vão acabar. E certas pessoas vão me obedecer sem discutir. Eu nunca pensei que um dia iria desejar tanto ter o Norte sob o meu poder. Mas, sinto que terei e quero vê-los diante de mim.
Porque eu não governo como os outros.
Eu governo com estratégia.
E o meu estudo sobre o Norte começa hoje!
{ . . . }
Acordo respirando fundo, ainda no quarto reservado da mansão. A claridade atravessa as cortinas pesadas. O cheiro dessa mansão é diferente da minha. Madeira antiga, café forte, especiarias.
E eu sorrio.
Hoje começa a minha caça e só de pensar nisso, sinto o ar mais quente.
Levanto, vou direto para o banheiro e tomo um banho frio, gelado, que desperta cada músculo do meu corpo. Preciso estar inteiro. Preciso estar centrado. Preciso controlar minha língua, coisa que claramente não fiz ontem.
Vista feita, botas ajustadas, pulseira de prata no pulso, abro a porta e saio. O corredor está movimentado mesmo cedo.
O Norte nunca dorme.
Desço até a sala principal e encontro Hamit sentado, mexendo no relógio.
— Que horas vamos embora? — Ele pergunta sem rodeios.
— Ainda não decidi.
— Ruslan… isso pode ser um erro. Lunara deixou bem claro ontem que não foi com a sua cara. Você irritou ela no primeiro segundo. — Ele fala rindo de mim. — Eu acho que você quer ser expulso.
— Isso muda... foi só o primeiro contato. Relaxa! — Digo simplesmente.
Meu irmão ri, mas é aquele riso de quem sabe que eu realmente vou tentar.
Enquanto conversamos, uma figura feminina aparece no corredor. A mesma moça que estava ao lado de Lunara ontem à noite.
É discreta, educada, bonita. Mas, eu não consigo lembrar do nome dela.
Ela passa por nós e inclina a cabeça num cumprimento delicado.
— Bom dia, senhores!
E segue adiante.
Na mesma hora, Hamit quase engasga e a olha sem parar.
— Ela é linda. Muito linda...
Eu concordo com a cabeça.
— Concordo, mas o meu interesse é outro.
E digo isso justamente quando Lunara surge na curva do corredor.
Ela usa um vestido mais justo dessa vez, cor mais clara e que realça os cabelos longos e escuros. É uma perfeição. Ela anda com passos firmes, braços juntos ao corpo e esse vestido me faz ter uma nova percepção de seu corpo.
Ela está mais linda do que ontem!
Logo ela me olha com a testa franzida, braços tensos, postura orgulhosa. Os olhos dela passam por mim, descem até o chão, voltam para o meu rosto. Tudo com irritação evidente.
— O que vocês estão fazendo aqui ainda? — Ela pergunta, direta, seca, autoritária. — A festa foi ontem!
Ah… como essa mulher irritada é fascinante.
Eu seguro o sorriso, faço um leve sinal com a cabeça, postura respeitosa. Diferente de ontem.
— Bom dia, senhorita Tokatli. — Digo primeiro, com voz calma. — Alguns acordos entre o Norte e o Centro precisam de renovações. Estou aqui para isso.
A irritação dela cresce. Eu vejo. Claramente.
Ela respira, olha para os lados, une as sobrancelhas, mas não discute.
— Vou fingir que acredito, mas... — Ela faz uma pausa. — Negócios são tratados depois do desjejum. E se eu tiver um tempo na minha agenda de hoje. — Ela afirma. — Com licença.
E passa por mim.
O perfume dela me atinge como um golpe. Especiarias, flor de laranjeira… poder. Ela atravessa o corredor com a postura de quem carrega um título, e eu a observo sem sequer disfarçar.
Cada movimento.
Cada traço.
Cada centímetro.
E sigo atrás. Sem pensar duas vezes. Porque esse é o começo, não do acordo, mas da conquista.
E eu nunca perdi uma conquista.
.
{O livro está com o contrato atrasado e estou aguardado para ser resolvido.}