Olívia estava sentada na beira da cama, o rosto escondido nas mãos. Tentava controlar a respiração, mas seu coração ainda batia forte, carregado de frustração. O dia já tinha sido difícil, e a cena na sala havia levado sua paciência ao limite.
O som de passos firmes no corredor fez com que ela erguesse a cabeça. A porta do quarto abriu-se sem cerimônia, e sua mãe entrou, com o rosto contorcido em fúria.
— O que você pensa que está fazendo? — disse ela, com a voz afiada como uma navalha.
Olívia suspirou e tentou responder com calma.
— Estou tentando salvar a empresa, mãe. É isso que estou fazendo.
— Salvar a empresa? — sua mãe riu, mas não havia humor no som. — Desde quando você é a salvadora dessa casa? Desde quando acha que tem o direito de mandar no que fazemos ou deixamos de fazer?
Olívia levantou-se, enfrentando o olhar da mãe.
— Não é sobre mandar, mãe. É sobre responsabilidade. Não podemos continuar vivendo como se tudo estivesse bem, porque não está!
— Ah, então agora você se acha no direito de dar lições? — Sua mãe deu um passo à frente, a postura desafiadora. — Seu pai sempre agiu livremente com a empresa, sempre cuidou de tudo, e nunca tivemos problemas.
— Nunca tivemos problemas? — Olívia riu sem humor, gesticulando com indignação. — Mãe, nós estamos afundando em dívidas! E sabe por quê? Porque vocês gastam mais do que podem!
— Não ouse falar assim comigo! — gritou sua mãe, o rosto ficando vermelho. — Você está me dando desgosto, Olívia. Um verdadeiro desgosto!
Aquelas palavras atingiram Olívia como um soco. Ela recuou, a garganta apertada. Por um momento, ficou sem palavras, mas então encontrou força em meio à dor.
— Desgosto? — perguntou, a voz baixa, mas carregada de emoção. — Eu sou um desgosto porque estou tentando impedir que essa casa desmorone? Porque estou tentando salvar algo que vocês mesmos destruíram?
— Você não entende nada! — Sua mãe apontou o dedo para ela, furiosa. — Só está ocupando o lugar que seu pai sempre cuidou com perfeição!
— Perfeição? — Olívia balançou a cabeça, incrédula. — Ele está tão perdido quanto você! E, enquanto vocês fingem que tudo está bem, sou eu quem tem que lidar com as cobranças, os números, os olhares de desprezo no banco!
A mãe ficou em silêncio por um momento, mas seu olhar continuava duro.
— Talvez você devesse aprender a ser mais como nós, em vez de tentar ser melhor do que todo mundo.
Olívia sentiu as lágrimas ameaçando cair, mas não deixaria que sua mãe a visse chorar.
— Eu não estou tentando ser melhor, mãe. Só estou tentando fazer o que é certo.
Sem esperar resposta, ela passou pela mãe, saindo do quarto e descendo as escadas com passos firmes. Não aguentava mais aquele ambiente sufocante.
Olívia saiu para o jardim, o ar da noite fria batendo em seu rosto. Olhou para o carro novo estacionado ali e sentiu a raiva crescer novamente. Mas, ao mesmo tempo, havia uma tristeza que parecia mais pesada do que qualquer cobrança ou dívida.
Ela sentiu o peso das palavras da mãe. Desgosto. A palavra ecoava em sua mente como uma ferida aberta. No entanto, mais do que nunca, sabia que precisava continuar lutando, mesmo que fosse sozinha.
Olívia sentou-se no banco do jardim, os braços cruzados e os olhos perdidos na escuridão da noite. O frio da madrugada não incomodava tanto quanto o peso em seu peito. As palavras de sua mãe ainda ecoavam em sua mente: desgosto.
Ela respirou fundo, tentando afastar a mágoa, mas não era fácil. A verdade é que ela sempre sentiu que as responsabilidades da família caíam sobre seus ombros.
Desde pequena, sabia que ser a filha mais velha vinha com expectativas não ditas, mas sempre presentes. Enquanto sua irmã do meio, Beatriz, fugira cedo das pressões ao se casar e construir sua própria vida, e Leonardo, o caçula, fora mimado e protegido, Olívia ficara para assumir o papel de quem resolve os problemas.
Beatriz era o tipo de pessoa que gostava de uma vida simples e sem complicações. Nunca se interessara pela empresa da família ou pelas finanças. Depois do casamento, fazia visitas rápidas e raramente se envolvia em discussões ou problemas familiares.
Leonardo, por outro lado, era tratado como o "bebê da casa" mesmo já sendo um homem adulto. Sempre teve liberdade para fazer o que bem entendesse, enquanto Olívia era constantemente chamada a "dar o exemplo".
— Por que eu? — murmurou, passando a mão pelos cabelos.
Lembrou-se de quantas vezes abrira mão de seus próprios sonhos para ajudar a família. Quando terminou a faculdade, recusou uma proposta de trabalho em outra cidade porque seus pais precisavam dela na empresa. Eles diziam que ela era a única em quem confiavam, mas agora tudo o que recebia eram críticas e desconfiança.
Flashback
"Olívia, você é nossa filha mais velha, nossa confiança está em você", dissera seu pai na época. Ela, então com 22 anos, sentiu-se orgulhosa ao ouvir isso. Mas com o tempo, aquele orgulho transformou-se em uma carga pesada demais.
"Beatriz já está casada, e Leonardo ainda é jovem. Precisamos de alguém em quem possamos contar."
Olívia nunca percebeu que "contar com ela" significava "depositar todos os problemas nos seus ombros".
De volta ao presente
Ela olhou para o céu estrelado e suspirou. Uma lágrima solitária escorreu por seu rosto, mas ela a limpou rapidamente. Não queria se sentir fraca.
A porta da frente abriu-se, e Leonardo apareceu com as mãos nos bolsos, uma expressão desajeitada no rosto.
— Ei, está tudo bem? — ele perguntou, aproximando-se.
Olívia arqueou uma sobrancelha.
— O que você acha?
Leonardo sentou-se ao lado dela, visivelmente desconfortável.
— Olha, sobre o carro... talvez não tenha sido a melhor hora, mas...
— Talvez? — Ela virou-se para ele, a voz carregada de ironia. — Você não entende, Leonardo. Não estamos em um momento de comprar nada, muito menos um carro de luxo.
Ele coçou a nuca, evitando seu olhar.
— Eu não sei lidar com essas coisas, Olívia. Você sempre soube.
— Porque ninguém nunca me deu escolha! — respondeu, exasperada. — Enquanto você vivia como queria, eu estava aqui, tentando segurar as pontas.
Leonardo ficou em silêncio, mas ela sabia que ele não tinha nada para dizer.
— Eu só queria, por um momento, que vocês entendessem o quanto isso é difícil para mim — disse ela, a voz quase um sussurro. — Estou tentando salvar algo que talvez nem mereça ser salvo.
Ele finalmente a encarou, os olhos carregados de algo que parecia arrependimento.
— Eu não sabia que você se sentia assim.
— Claro que não sabia — ela murmurou. — Porque ninguém nunca se importou em perguntar.
Leonardo ficou quieto, e, pela primeira vez, Olívia não tentou preencher o silêncio. Ela apenas deixou que ele pensasse, talvez pela primeira vez, no peso que ela carregava.
Enquanto Leonardo voltava para dentro da casa, Olívia permaneceu ali, olhando para o horizonte. Sabia que não podia contar com ele ou com ninguém para resolver os problemas. Era ela contra o mundo, e não havia escolha além de continuar lutando.