Refestelada sobre o leito, a princesa Maria, com as madeixas espalhadas por cima da almofada, esvaeceu. A pele perdeu a nuance, as mãos estavam cruzadas sobre os s***s, cujos quais ascendiam e descendiam em uma irregular respiração.
Rainer, debruçado sobre seu corpo, avaliou-a, então, recompondo-se, concedeu, com o cenho enrugado, seu diagnóstico.
— Não preciso de muito para saber a causa do m*l súbito. A princesa fora envenenada, majestade — confirmara ele. —, sem a menor dúvida.
A rainha, de pé a poucos passos longe, desabou sobre a cadeira de madeira com as mãos sobre a boca.
— Não! — lastimou, sufocando o som.
— Sinto muito — lamentou Rainer.
— Ela irá sobreviver, não irá? — indagou a imperatriz.
Ele hesitou:
— Bem, o cálice media até a borda com a bebida e ela ingeriu o conteúdo por completo — ele efetuou uma breve interrupção.
Depois de anos de convivência, a rainha adquiriu a capacidade idônea de saber quando Rainer se colocava a tentar amenizar um levantamento subversivo. E ele era péssimo sempre que o fazia. Pois circundava e prolongava o assunto, o que servia para enaltecer os temores da imperatriz.
— Mas depende de como o corpo irá reagir — concluiu ele. — Já vi homens com ferimentos horrendos e expostos sobreviverem com o devido tratamento.
— Eis a incógnita: que tratamento? Estamos em alto mar e, mesmo que estivessemos em terra firme, não haveria plantas e ervas com fins medicinais para combater os efeitos do veneno!
— Vou achar um jeito, majestade. Da mesma forma que pretendo capturar o responsável.
— Quem poderia ter sido?
— Apesar de ter suspeitas, não faço a mínima ideia de quem poderia ter sido.
Elisabella bufou.
— O que sabemos até agora? — indagou. — Há a possibilidade daquela bebida ter sido destinada a todos naquela mesa?
— Não. Eu chequei a embalagem e aquele vinho foi confeccionado em nossas terras em portugal, fazia parte de vosso acervo. Ou seja, a pessoa que fez isso já tinha tudo planejado. Ela sabia com antecedência da viagem e sabia que todos os presentes recusariam o vinho, exceto a princesa Maria.
— O que o proprietário do navio falou sobre o caso?
— Wellehallfax não irá pronunciar-se oficialmente a respeito do ocorrido. Acredito que não queira criar pane em seu veleiro, mas ofereceu-se a dispor da ajuda necessária para a melhoria da princesa, além de estar apto a colaborar com a investigação.
— Creio eu que você já falou com o criado que a serviu então — supôs a rainha, enervada.
— Ainda não. — Ele negou, admitindo o atraso no serviço. — Mas requeri que o chamassem — corrigiu. —, chegará a qualquer minuto.
— Vá buscá-lo agora! — ordenou ela, sem paciência.
— Mas majestade...
— Agora! — esbravejou, a voz de contralto tremeu as ripas do navio.
Rainer titubeou, fez que sim com a cabeça e, após uma rápida reverência, moveu-se às pressas até a porta. A rainha Elisabella olhou ao redor, em sua repartição, reparando, pela primeira vez, nos pormenores de sua estalagem.
Ela poderia ter optado por uma embarcação mais preservada, porém as razões recônditas não permitiriam jamais que isso acontecesse. Então deveria resignar-se com aquele simplório meio de transporte.
Assim que escutou a porta bater atrás dela, evidenciando que Rainer saiu, deixando-a sozinha com a filha adormecida, a rainha libertou as lágrimas do c*******o ocular.
Deus e seus anjos de certo estariam castigando-a. Mas o quê ela teria feito para merecer tamanha punição?
Perdeu seu marido, sua filha mais velha e agora a filha do meio seguia o mesmo destino.
A rainha déspota, habituada a premeditar seus atos, perguntou-se qual caminho rumou que a trouxe até ali.
Talvez sua vida inteira foi uma via que lhe deu acesso à aquela ocasião.
No reinado de seu falecido pai, 50 anos atrás, sua mãe, a rainha Hyakinta, querida do povo, durante o parto, deu à luz, em um momento infausto. Elisabella às vezes culpava-se pelo que ocorreu a mãe quando centenas de tropas marcharam em direção ao castelo.
No decorrer de uma tentativa de invasão ao reino, Hyakinta entrara em trabalho de parto.
O brado rasgou as cordas vocais de Hyakinta, se propagou pelo alojamento de pedras e pôde ser ouvido do lado de fora do recinto.
Tamanho era o tormento e inquietação que ela considerou a ideia de tascar a adaga que localizava-se ao lado para utilizá-la e cessar o seu martírio – caso os invasores não se dessem o trabalho.
Apoiada pelos braços, ela cravou as mãos no cobertor do leito onde sentava-se, de pernas abertas, usando uma camisola branca, maculada de sangue na região vaginal, experenciando a dor em sua pele ao expandir-se e rasgar-se a medida que a criança se arrastava lentamente para fora de seu ventre.
Ela podia sentir o tremor do abalo causado por detritos arremessados dos trabucos e catapultas contra o edifício.
Podia ouvir os sons das espadas raspando umas contra as outras no outro lado da porta.
Mesmo assim respirou fundo e se esforçou mais uma vez. O suor grudava os cabelos escuros em seu rosto.
Secreções corriam por suas partes íntimas. Foi quando Hyakinta sentiu o odor de fezes e urina.
Percebeu então que sentava-se sobre seus próprios excrementos.
Porém, ignorando o fato, ela respirou de forma reentrante. Em seguida contraiu a parede do abdome e empurrou para baixo.
Hyakinta sentiu algo escapulir do interior de sua v****a. Elevou a mão com a esperança de sentir a cabeça do bebê, mas, ao tocar, constatou que se tratava do bracinho dele.
Neste instante se deu conta de que a criança estava posicionada de maneira errônea em seu interior. Ela tinha que fazer alguma coisa antes que aquilo culminasse na morte do bebê.
À vista disso ela pegou a adaga e inseriu na própria barriga.
Quando Alphonsus, seu marido, escancarou as portas de seu aposento, horas depois, com um sorriso no rosto, para declarar a vitória, se deparou com o bebê deitado sobre o corpo de Hyakinta. Mãe e filho haviam morrido, pensou. Sua expressão se entristeceu.
Deu as costas para a cena e ordenou que a criada preparasse os corpos para serem velados. Se moveu para ir embora. Mas deteve-se, ao ouvir um ganido, e, assim que tornou a olhar para onde jazia sua mulher, viu a criança mexer as mãos.
Após tomar a criança entre os braços, o rei notou, pela racha entre as pernas, que tratava-se de uma menina. Ele bem-fadou a criança. Nomeou-a. E conforme ela crescia ele lhe relatava a bravura da mãe.
Em momentos procelosos, Elisabella memorava o relato, o arrojo e intrepidez da genitora, o que lhe outorgava denodo o suficiente para que erguesse a cabeça.
Elisabella enrijeceu a fronte.
Ela precisava descobrir a identidade do responsável por atentar contra a vida de Maria.
O envenenamento a fez recordar-se de alguns meses atrás, quando suas pálpebras escancararam-se em resposta a um brado assustador.
Ela estendeu o braço com a intenção de tocar o rei, que ainda estava vivo na época, e indagar se ele também o havia escutado. Porém, apalpando a superfície da cama, notou, estreitando os olhos, que o lado em que Dom Paulo deveria estar dormindo encontrava-se vazio.
— Paulo? — ela ergueu uma das sobrancelhas.
Não houve resposta ao chamado.
Onde ele poderia ter ido?
O rei tinha o costume de ir ao aposento do príncipe toda noite. A relação de pai e filho fazia com que o nobre se preocupasse em demasiado com o garoto, afinal era seu herdeiro. Mesmo assim aquele barulho que a rainha ouviu era estranho, de certo acontecera alguma coisa.
Com certo receio, ela ergueu o tronco, sentou-se sobre a cama e retirou o cobertor que embrulhava seu corpo. Então, pisando com os pés descalços no chão frio, andou até a porta.
Ao abri-la, o passadiço alongava-se a frente, repleto de venesianas com vista para a lua e as nuvens plácidas em torno desta. Pé ante pé, a monarca moveu-se rumo ao quarto do principe Dom, reparando, ao chegar lá, que, assim como o pai, ele não estava no dormitório. Onde pai e filho poderiam ter ido tarde da noite? O que estava acontecendo? O desespero dava seus primeiros sintomas: aperto no peito, suor frio e uma leve pressão nas têmporas.
Esta era uma sensação pertinente desde a batalha épica que enfrentaram contra os aliados de Belvedere. Procurar por sua família na calada da noite apenas piorou.
Logo após, Elisabella foi ao aposento das duas filhas, Ana e Vitória, que dormiam juntas. Porém, elas também não estavam.
Contudo, assim que foi ao quarto de Jennifer, filha mais velha, encontrou todos lá.
Só que ao invés de sentir alívio, a rainha desesperou-se mais.
Jennifer, Dom Paulo Filho, Maria e Vitória aglomeravam-se em torno do leito. E, detado no centro do circulo humano estava o rei, Dom Paulo Pai, ensanguentado.
Com olhos arregalados, Elisabella aproximou-se.
Então indagou o que acontecera.
Dom Paulo Filho abriu a boca para falar. No entanto, antes que pudesse dizer algo, Dom Paulo Pai o interpelou.
— Belvedere — ele disse. —, nosso servo de confiança, tentou estuprar a princesa Vitória. Mas Dom o viu e gritou por ajuda. Então, ao escutar o clamor, corri até o quarto, mas Belvedere, acuado, me desferiu um golpe com uma adaga e fugiu.
A rainha uniu as sobrancelhas em uma expressão de fúria.
Com os olhos repletos de lágrimas, ela perguntou:
— E para onde ele foi?
— Rumou o leste em um cavalo branco.
— Mandarei uma guarnição de soldados atrás dele. Belvedere não irá longe.
Semanas depois, o rei Dom Paulo I, infelizmente, não resistiu aos ferimentos e veio a falecer.
Dias Atuais
Apesar de nunca ter demonstrado, naquela época, a rainha entrou em estado de desespero, pois teria, além de lidar com a miséria do luto, ascender sua filha mais velha, Jennifer, como nova rainha, para assim Elisabella aposentar-se dos serviços reais.
A princesa Jennifer proseava com um príncipe francês, conhecido como Friedrick o grande, e a prova disto, além dos diversos encontros informais as escondidas, cujo qual a rainha assistia da janela do palácio resignada, havia também uma protuberância na barriga de Jennifer — deveria existir alguma coisa que as pessoas usassem para prevenir filhos. Entretanto Elisabella ficou contente com as boas novas da criança. Devido a isso, Elisabella acreditou — ou preferiu acreditar — que seria um júbilo apressar um casamento real, que aconteceu em abril deste ano, um mês depois do luto da morte do rei. E na semana passada, seria realizada a coroação dela como nova rainha de Portugal. Não obstante, sem ninguém esperar, a princesa Jennifer dormiu e não acordou mais — ela morreu em sonhos —. Foi então que Elisabella começou a suspeitar que a morte rondava sua família, ou, talvez e bem mais provável, um serviçal da morte. Então, com mais um luto de fardo para carregar este ano, a rainha velejou naquele funéreo navio. Estava indo, ao lado de seus três filhos, até o palácio na Inglaterra, para esposar seu filho mais velho, o príncipe Dom Paulo Filho, com a princesa Liana.
Dom era o único que não estava livre para se casar por amor, pois o trono da realeza tinha pressa em ser ocupado. Além do mais já o havia prometido a princesa Liana antes mesmo dele ser condecorado herdeiro. Ao contrário das duas princesas que poderiam escolher para se casar, quem quisessem e quem as quissem. Desde que, é claro, o candidato fosse da nobreza.
A rainha achava que a viajem náutica seria divertida, uma forma de livrar a cabeça, ao menos por um instante, da dor, do luto, da tristeza e de todos os pensamentos ruins, porém, isso teve que acontecer?
Quem poderia querer o nosso m*l? perguntou-se ela. Quem além de... Belvedere.
Ele foi conselheiro do rei, falecido esposo de Elisabella, porém fora expulso do palácio por traição e pela tentativa de e*****o. Aquele carrasco do Belverede conseguiu embarcar no veleiro. E agora? Eles não traziam guardas a sua disposição. Eles estavam em perigo, isso até aportarem na Inglaterra. Mas ainda estava longe. Até lá Belvedere poderia atentar contra a vida de seus outros filhos. Ele era um sujeito perigoso, imprevisível, e extremamente mortal.
Era óbvio. Como ela não pensou nisto antes? E, pior, como ela foi deixar isso acontecer?
A porta foi aberta.
Rainer, seu conselheiro, pôs a cabeça por entre a fresta.
— Majestade?
Ela fungou, limpou as lágrimas e aquiesceu:
—Entre.
Elisabella virou-se, vendo Rainer emergir, trazendo o criado que serviu sua filha com o vinho envenenado.
O lacaio era indecoroso e desfavorecido, com a postura curvada, trajava um gibão de couro, e deslocava-se de maneira canhestra.
Ela fez um gesto para ambos pararem onde estavam, alguns metros longe de seu assento, reparando que o olhar do criado se derramou sobre a princesa dormindo na cama, por conta deste ocorrido ela deduziu que ele, de certo, tinha algo a ver com o envenenamento.
— Vou dar a oportunidade de você se explicar — a rainha encarou o criado com uma face acusatória. — e caso eu pelo menos imagine que está mentindo você será enforcado no primeiro lugar onde esse navio aportar. Você me entendeu?
Ele fez que sim com cabeça.
— Ah...? Majestade... — começou Rainer.
— Calado! — Ela o deteve, fuzilando ele com o olhar. Depois tornou a encarar o outro criado. — Foi você que serviu aquele vinho para minha filha? — perguntou, mas em tom acusatório.
Ele afirmou com a cabeça.
— E para quem você trabalha?
Ele não respondeu, mas continuou a encarando. Depois fez um gesto que não com as mãos.
— Me responda! — Ela ordenou, exaltada. — Me responda agora e eu penso em, talvez, poupá-lo de ser linchado depois que esse navio atracar no cais.
Ele fez gestos com as mãos de novo.
— Está zombando de mim? — A rainha se levantou da cadeira.
Mas Rainer explicou tudo:
— Ele é mudo, majestade. — disse, cabisbaixo. — O criado é mudo. Ele teve a língua cortada por um marujo há pouco tempo.
Um criado mudo, irônico.
— Você não é s***o ou é? — Continuou a rainha, sem baixar o tom de potestade.
Ele negou.
— Sabe ler? E escrever? — Ela perguntou.
Ele confirmou.
A rainha dirigiu-se até o outro lado da cabine, elevou o tampo de seu baú, pegou um papiro e uma caneta feita com pena de pavão da índia, retornou ao seu acento e, depois, o criado foi até ela e a rainha lhe entregou os objetos. Em seguida ele se afastou meio passo.
— Não sabe falar, então escreva. — sugeriu Elisabella. Perguntou; — Quem ordenou que você colocasse veneno no vinho da família real?
Ele escreveu algo no papiro, depois lhe mostrou.
Sinto muito majestade Mas não sei do que você está falando...
A letra dele era um garrancho f**o e repeleto de erros gramaticais, mas era ao menos legível.
— De onde você pegou aquele vinho? — indagou a rainha, sem baixar o tom.
Ele tornou a escrever.
Do estoque de vossa realeza...
— Ele não sabe de nada majestade, deixe o ir... — disse Rainer, cansado, e talvez com pena do criado.
Mas a pena de pavão que Elisabella entregou, era a única pena que ela tinha para dar a ele.
— E você viu alguém entrar ou sair do estoque? — perguntou ela para o criado, ignorando Rainer.
Ele escreveu de novo.
Além dos criados?
— Sim, além dos criados! — A rainha revirou os olhos, alterando-se mais do que já estava.
Ele escreveu algo breve, e virou para a rainha ler. Por pouco ela não teve uma síncope quando visualisou aquelas letras carregadas de acusação, implicando num novo repertório de investigação.
O que estava escrito era:
Seu filho, majestade. O príncipe Dom. Ele foi o único que entrou no estoque.
Elisabella engoliu em seco.
— Agradeço a sua colaboração — disse ela, e viu que o criado retesou-se em um cumprimento formal. — Rainer?
— Sim?
— Leve este criado até a prisão no porão deste navio — ordenou ela. — Será enforcado assim que esta embarcação aportar na Inglaterra.
Rainer retornou depois de levar o criado até a prisão.
— O que vai fazer quanto ao que o criado alegou? — perguntou ele, as mãos para trás, e em seu rosto uma preocupação verdadeira.
— Não levarei em conta — Elisabella respondeu, sem delongas, como se quisesse encerrar o assunto por ali.
Ela virou-se, colocou as mãos sobre a testa da filha. Em seguida enxugou com um pano úmido o suor e evitou contato visual com Rainer.
A rainha Elisabella estava ciente que Rainer iria protestar, sobretudo por que aquilo era uma situação que merecia a mais completa observação, coisa que a rainha não estava com condições de fazer. Ela tinha que admitir que precisa de conselhos. Mas não um que condenasse seu filho.
— Mas, majestade...
— Chega! — Ela interrompeu. — Não quero ouvir mais nada! — decretou. — Meu filho é inocente. — disse a Rainer, tentando transparecer certeza quando, na verdade, nem ela sabia.
— Majestade — ele contradisse. —, como o criado alegou: seu filho foi o único que entrou no estoque. E isso o torna suspeito. Pelo que eu sei, além do mais, essa não é a primeira vez que ele é pego no local do crime.
Rainer não mentiu quando dissera isso, pois fora o príncipe Dom quem descobriu que a futura rainha Jennifer falecera enquanto dormia, quando ele foi até os aposentos dela, pela manhã, para acordá-la, mas ela não respondia aos seus chamados. (A rainha imaginou o filho colocando o travesseiro no rosto da princesa enquanto ela dormia). Mas baniu esse pensamento.
— Isso não faz sentido — argumentou Elisabella, em protesto. Todavia o ouviu não só por que Rainer era o seu conselheiro, mas por que ele era seu amigo confiável. Um dos poucos que ainda tinha.
— Claro que faz — Rainer se aproximou da cadeira onde a rainha sentava-se, os olhos dele estavam azuis e tristonhos. Então conduziu sua teoria; — Veja só — ele pigarreou. — Dom quer ser rei. Porém há um empecilho, sua irmã, no caso a princesa Jennifer, é a escolhida para o trono por ser mais velha. Então ele a elimina, e finge encontrar o corpo, por que sabe que as suspeitas não pesaram sobre si, afinal não faria sentido alguém m***r, e depois se delatar indo falar do ocorrido.
Isso era coisa que acontecia em livros de romances, não na vida real, pensou ela. Mas não foi isto chegou a dizer:
— E como sua teoria sem fundamentos explicaria o envenenamento da princesa Maria? — A rainha ergueu as sobrancelhas, intrigada com tamanha imaginação e ao mesmo tempo temerosa de que, talvez, de alguma forma, Rainer tivesse razão.
— Talvez a princesa soubesse de algo que ameaçou contar a alguém. Mas preferiu, antes, coagir o indivíduo. Você mesma já presenciou cenas de brigas dos dois onde ela o ameaçava a contar um segredo. A morte de Jennifer, talvez?
Fazia sentido, mas não lhe parecia certo. Elisabella não podia acreditar que seu filho seria capaz de tamanha atrocidade. Ela o conhecia. Ela o concebeu. Ela o criou.
O príncipe Dom sempre foi mais aclamatório e mais enobrecedor que as princesas. Ele gostava de se arrumar — e ainda gosta —, ele gostava de vagar, conhecer pessoas, ouvir música na orquestra do condado, e escrever sonetos lisonjeiros. Quando era pequeno, a rainha o flagrou usando um dos vestidos de suas irmãs. Ela não aprovou e botou a culpa no rei que não lhe deu devida educação, todos temiam por sua virilidade. A partir de então o príncipe frequentou a academia onde treinavam os guardas do castelo, e isso o ensinou a ter disciplina, educação, e conhecimento na adolescência. No entanto tudo mudou quando ele completou os dezesseis, ele se tornou rebelde, fugia do castelo todas as noites e só retornava ao amanhecer. E começou uma implicância com a princesa Maria que a rainha não entendia e acreditava que ninguém também não. No fundo a rainha achava que nem eles entendiam.
Elisabella não tinha o achismo, entretanto, que ele seria capaz de machucá-la.
Ela sentia que foi outra pessoa que envenenou sua filha, uma pessoa a mais malígna.
Belvedere jurou vingança a família real e voltou para cumprir sua palavra — se sua intuição estivesse certa, ele foi responsável pela morte do rei, pela morte da princesa Jeniffer, e do envenenamento da princesa Maria.
— Pois eu tenho outra teoria — afirmou a rainha. Agora fixando seus olhos nos de Rainer. — Belvedere retornou das sombras, como o cavaleiro do d***o e a b***a fera da bíblia, e de alguma forma soube que embarcaríamos sem a guarnição em uma viagem de lazer, então achou o momento apropriado para uma vingança a seu estilo, e subornou o criado para que colocasse veneno no vinho real. Precisamos contratar alguns criados para nossa p******o.
— E quanto a seu filho...
— Silêncio! — ordenou a rainha, exaltada. — Belvedere está solto nesta embarcação e meu filho precisa ser defendido e não acusado.
— Temo que vossa senhoria esteja tapando seus olhos para a verdade uma segunda vez. Agora temos uma princesa morta e uma envenenada, o que vai vir depois?
Elisabella levantou-se em um sobressalto.
— Como ousa falar isto a sua rainha?
— Sou o conselheiro real. — Ele deu de ombros, arqueando uma sobrancelha.
— Eu ouso falar muitas coisas se for para o bem do reino e o seu próprio.
Ela não descartava nenhuma hipótese. Mas preferiu optar por acusar Belvedere. Ele era o verdadeiro responsável por tudo de r**m que aconteceu em sua vida e na vida de todos. Ela tinha que tomar providências quanto a isso. As coisas ruins estavam acontecendo rápido demais e o que ela pudesse fazer para impedir mais uma catástrofe, ela o faria sem medir esforços.
— Chega de teorias de conspiração. — A rainha deu o ponto final. — Agora desça até o andar de baixo e traga os dois jovens Litchfield que sentaram-se à mesa conosco.
— Com qual fundamento?
— Será dito assim que estiverem em minha presença.
Dom se afastou da porta.
Para ele bastou. Já ouvira o suficiente. Sendo assim recuou um passo para longe do acesso, com os olhos semicerrados.
Como Rainer pôde ser tão hipócrita? Quem ele pensava que era para proferir tamanha acusação contra o príncipe? Mas aquele conselheiro medíocre não perdia por esperar.
Dom colocou o capuz sobre a cabeça. A seguir, deu meia volta para ir embora. Mas, ao se virar, espantou-se, pois a sua frente, acabou deparando-se com Vitória.
Ela estava ali no escuro, observando-o.