— Ele simplesmente me agrediu! — retrucou Angrehand, consternado.
— Lorde Litchfield irá se desculpar, — Meverick garantiu. — assim que esfriar a cabeça.
— Eu duvido. Você o conhece. Enquanto o orgulho falar mais alto, ele permanecerá calado.
Angrehand estava de braços abertos enquanto Meverick abotoava seu casaco. Angrehand se preparava para o memorável jantar com a família real Portuguesa, que seria realizado no interior do veleiro. E, do contrário de como realmente deveria estar, ele não transparecia estar entusiasmado.
— Uma observação senhor: vosso pai é indômito e presumido — endossou o criado, abotoando os botões enfileirados na região do seu abdômen. —, porém, ao mesmo tempo, mediador e ponderado, irá agir de acordo com seus princípios.
— Ou seja, está insinuando que nunca o fará?
— Não estou insinuando nada, senhor — Meverick abriu um sorriso gentil.
Angrehand sorriu também.
— Eu deveria insultá-lo perante a rainha.
— E perder a chance de fazê-lo se sentir culpado?
Angrehand estreitou os olhos.
— Se bem que... Talvez...
— Eu conheço esse olhar — disse Meverick. O que milorde pensa em fazer?
— Exatamente o que meu pai me pediu que eu fizesse. Me redimir, agindo com retidão. Como eu estou?
Meverick correu os olhos azuis de cima a baixo pelo corpo de Angrehand.
— Faustoso.
— Ótimo.
Logo após, ambos desocuparam o aposento e, juntos, dirigiram-se lentamente pelos corredores. Aquela embarcação era a maior em que Angrehand havia estado. A vista do interior porém, causava a mesma sensação que olhar os navios funerários anglo-saxões, ao menos era isso que ele sentia enquanto transcorria rumo ao refeitório.
Meverick o interpelou, antes de alcançarem o destino:
— Não faça nada que seu pai não faria — instruiu ele.
Angrehand assentiu.
Em seguida os dois adentraram a repartição.
Uma aguda sineta tilintou, informando os presentes sobre o prólogo da refeição. Feito isso, alguns criados aproximaram-se em fileira da imensa mesa de madeira, trazendo bandejas de aço equilibradas nas mãos, as quais foram postas no centro, frente os convidados, então, dispondo o banquete, afastaram-se com a mais ensaiada disciplina.
A távola retangular ficara abarrotada de lauta refeição, talheres de prata, pratos de cristal e velas. Mas, apesar da sublimidade da mesa, o destaque da noite era os sumptuosos convidados que a cercavam.
A família Litchfield.
Grosvenor, conde de Cantuária, ocupava a cadeira ao lado da esposa, Condessa Meriel, acomodada na extremidade, perto da filha caçula, Gardênia, e do filho mais velho, Godofredo, que, assim que avistou Angrehand, ficou cabisbaixo.
Ele estava visivelmente envergonhado pelo constrangedor flagrante de mais cedo, e no lugar dele Angrehand também estaria. Godofredo talvez mantivesse o temor de que Angrehand fosse expô-lo perante a família. Angrehand imaginou a reação de seus parentes caso revelasse esse segredo, mas, mesmo que tivesse vontade, ele não o faria, então tratou de descartar a hipótese de sua cabeça. Afinal tinha coisas mais importantes para se ocupar; como se portar corretamente perto de Thereford por exemplo.
Meverick pigarreou, fazendo Angrehand perceber que estava parado, olhando para os presentes, então, ajeitando a lapela de seu Trench Coat, aproximou-se, puxou uma das cadeiras e sentou-se sobre ela, cuja qual ficava próxima de seu pai, que reservara o assento ao lado para mantê-lo o jantar todo sob sua constante vigilância. Assim garantiria que ele não fosse transgredir uma simples norma de etiqueta que fosse.
As cadeiras vazias do outro lado da mesa estavam sendo conservadas para a família da realeza de Sintra, que, até então, não haviam aparecido.
— Onde está a tão especulada presença da realeza lusitana?
Mas não careceu ninguém responder.
De repente, Angrehand sentiu, vindo pelas suas costas, uma lufada de ventos gélidos.
Todos na sala olharam para um ponto atrás dele, então, estarrecidos, levantaram-se rapidamente.
Angrehand virou-se com lentidão para ver a chegada dos tempestuosos visitantes.
E ali estavam eles: quatro figuras travestidas de preto, ocultando a face sob as sombras de seus capuzes, pertencentes aos mantos que cobriam os corpos. Caminharam em uma fileira linear até a mesa. Os criados, sôfregos, apressaram-se para arredar as cadeiras, de modo que facilitasse a comodidade para eles.
Mas, ainda de pé, a rainha removeu o capuz, mostrando os cabelos pretos e lisos ajeitados entre a coroa, o rosto pálido, os olhos rutilantes, carregando uma triste expressão.
— Família Litchfield — saudou ela, anuindo com a cabeça.
— Majestade — Os presentes reverenciaram em conjunto. Exceto por Angrehand que não demonstrou tal respeito, nem sequer cogitou a ideia de fazê-lo, em vez disso, porém, permaneceu sentado, fitando a soberana com uma das sobrancelhas arqueadas. O que à seu ver não foi uma completa falta de deferência, considerando que não sabia quase nada a respeito da monarquia portuguesa. Além do mais, educação era um termo que ele não utilizava com frequência.
Seu pai, por outro lado, demonstrou uma conduta dócil e uma receptividade que nada tinha a ver com sua personalidade, chegava a destoar de sua expressão séria e rude, mesmo assim tomou a palavra para si.
— Profiro em designo de todos quando digo que não há palavras que possam descrever o quanto estamos agraciados com sua presença e de seus filhos neste jantar, Majestade. Agradecemos em primeiro lugar a Deus por nos conceder força em dias árduos, o suficiente para podermos nos juntarmos aqui, agora, neste agradável ambiente e, em segundo lugar, ao capitão do veleiro, o fidalgo Wellehallfax, que se dispôs a oferecer sua comida e ceder este espaço para que pudéssemos disfrutar deste banquete. Sem mais delongas, podemos iniciar a refeição.
Vendo aquela ação teatral provinda do nobre, Angrehand revirou os olhos, notando o quanto aquilo tudo não passava de uma farsa, seu pai não era e nem nunca foi hospitaleiro, estava sendo por conta de interesse político. Ele não agiria assim se fosse uma família de plebeus sentada a mesa.
Por outro lado um titulo real lhe disponibilizava o luxo de ser tratado da melhor forma, sendo assim a rainha já estava habituada aquela bajulação, então deveria saber que aquele comportamento não era usual dos corteses.
— Amém — ditou a rainha, acomodando-se em seu encosto, tal qual seus filhos, que, mesmo assentados a mesa, permaneceram de uso do astroso capuz.
O restante dos presentes retornou ao seus devidos lugares. Olhando cada um deles, Angrehand notou a singularidade com a qual aderiram as vestimentas, optando por utilizar peças que continham cores sóbrias ou discretas, harmonizando entre si pelo formato e ornamento, com poucos adereços.
Ele transportou seu olhar para a mesa, em reação frente a um súbito ocorrido, quando uma das princesas recolheu o capuz, expondo seus deíficos cabelos pretos, rosto excelso, olhos sublimes, cílios que elevavam-se. Devido a feição e a corporatura, Angrehand pressupôs hipoteticamente que ela deveria ter não mais que quatorze anos, pois Angrehand sentiu um toque de dulçor e deidade nela, além disto, ele percebeu, também, que seu primo Godofredo, copiando seu comportamento indiscreto, no momento em que a princesa revelou sua face, não parou de encará-la.
— Princesa Vitória — ela se apresentou, estendendo a mão para Godofredo.
— Godofredo Litchfield. — identificou-se ele. — É um grande prazer, vossa alteza. — Em seguida beijou o dorso das maviosas mãos da princesa.
Angrehand percebeu que seus tios, Grosvenor e Meriel, apesar de manterem sua postura, ficaram contentes com isto, exceto, como ele imaginou, seu pai, Thereford, que lançou um olhar de cólera, desejando claramente que Angrehand estivesse no lugar de Godofredo.
— A seu dispor — completou seu primo.
Do mesmo modo, a segunda princesa removeu seu capuz, revelando madeixas aneladas, ela usava adornos como uma fina tiara de ouro que transpassava sua cabeça, era mais baixa e mais rechonchuda que a primeira, e diferente desta, deveria beirar a casta dos dezesseis, mas era tão airosa quanto. Ela tinha olhos iguais os da princesa Vitória — porém havia alguma coisa no olhar desta segunda que era atraente, sedutora. Ela não se parecia muito com a mãe, então, ela deveria ter puxado a maior parte dos traços para o pai, imaginou Angrehand.
— Princesa Maria. — Ela somente falou isso, depois abriu um sorriso debochado que sumiu tão rápido quanto surgiu. Angrehand, com isto, deduziu, em um conceito prévio, que ela era a mais aparatosa e arrogante entre os seus.
O príncipe, por outro lado, não fez questão de se apresentar, permaneceu sentado, em silêncio, oculto pelo manto.
— Por que estão de preto? — Angrehand perguntou, vendo todos na mesa recolherem-se com sua audácia.
— Angrehand... — Seu pai vociferou, pisando em seu pé por debaixo da mesa. Depois virou-se para a rainha. — Perdoe a insolência de meu filho...
— Não, tudo bem — disse a imperatriz, se inclinando para olhar nos olhos de Angrehand. — As vezes é comum, por um impulso, reagirmos a uma situação a qual não entendemos, falando coisas sem pensar.
A resposta dela foi mais ofensiva que a pergunta dele.
— Estamos de luto pela recente morte de nossa herdeira ao trono, Jennifer — a princesa Vitória respondeu. — Ela estava gravida, e havia acabado de se casar, morreu de causas não identificadas pouco antes de sua coroação e do nascimento do bebê.
Angrehand recordou-se que há algumas horas atrás, no convés, ressoava a notícia que a filha mais velha da rainha Elisabella havia falecido inexplicavelmente enquanto dormia em seus aposentos. Mas tudo o que ouviu foi por altos, nada que relatasse detalhismo ou intelecção.
— Peço desculpas a vossa alteza se fui indelicado — disse Angrehand, por fim. — Non erat intentio mea.
— Et non contemnant — A princesa Vitória respondeu, em latim, abrindo um afável sorriso. E embora ela tenha negado, Angrehand se sentiu inconveniente.
Grosvenor, pigarreou, arrebatando a atenção para si, forçadamente.
— Eu reparei, pelo que a vossa alteza disse, que aprecia o Latim. — Seu tio dirigiu a palavra a princesa Vitória. — Meu filho Godofredo é fluente em diversas linguagens nativas não só na Europa como no continente Asiático também.
— Mesmo? Que Maravilha. Vossa graça deve se orgulhar disto — congratulou a princesa, com uma face de amabilidade, enquanto pegava seus talheres. — Godofredo seria uma excelente companhia para viagens por que, até mesmo com meus bons estudos concebidos pela igreja, tenho dificuldades em aprender mandarim.
— Eu poderia lhe instruir, em algumas aulas particulares, no período que estivermos no navio. — Se ofereceu Godofredo, contendo uma malicia. — Se assim desejar, é claro, vossa alteza.
Os demais sentados à mesa tossiram.
— Eu iria adorar — disse a infanta, com o rosto corando.
Thereford, ínvido, chamou a atenção do filho por debaixo da mesa com um pequeno chute na canela.
Thereford pigarrou.
— Então, Angrehand, me conte sobre sua viagem a Marselha e o que aprendeu sobre o comércio europeu. — Seu pai o encarou, dando uma piscadela.
Angrehand ergueu uma das sobrancelhas. O que era aquilo? Uma competição de aptidão pela atenção das princesas?
— Viagem a negócios? — Grosvenor conteve uma risada. — Pensei que Marlowe tivesse sido claro quando escreveu-nos alegando que Angrehand escapulia de sua jurisdição para se juntar a plebe.
Ali não era lugar para levantar questões a respeito de problemas familiares, porém, Angrehand nem precisou refletir duas vezes para saber que seu tio tinha a intenção de denegri-lo. Nada melhor para destacar as qualidades de Godofredo ressaltando os defeitos de Angrehand. Tudo não passada de uma jogada. E seu tio maledicente era do tipo que fazia qualquer coisa para adquirir vantagem.
A elegante rainha não escutou ou fingiu que não o fez, assim como, acreditou Angrehand, o esbelto príncipe, que não mostrou a face, ainda escondido sob a sombra do capuz, já a bucólica princesa Vitória foi toldada com um rubor sutil pela notória disputa, mas, referente ao acontecido, não se pronunciou, enquanto a princesa Maria conteve uma risada.
Mais pareciam bárbaros que nobres.
Meverick observava a cena recostado na parede do outro lado do refeitório. Ao lado de um sujeito que, pelo brasão bordado em sua vestimenta, se tratava do conselheiro da rainha.
Porém, mesmo que não se importasse com nada daquilo, ainda havia uma forma de reverter a situação para si agindo com retidão.
— Na verdade — Angrehand se dirigiu a todos. — Marlowe, que ele me perdoe por estar tocando em seu nome durante sua ausência, preocupava-se mais com sua reputação que com os interesses populares, e eu percebi que somos nós, os nobres, que decidimos por todos sem saber qual a opinião de nosso povo, por isso ingressei, escondido de meu tio, na plebe, para saber o que pensa a sociedade que vive nos campos, já que é a maioria. E com isso, afirmo eu, vi muita coisa ultrajante. A pior de todas, no entanto, enxerguei na corte: o interesse de alguns fica acima do interesse de todos. — Ele ajeitou a lapela do casaco. — As coisas ficam claras quando você vê dos dois ângulos.
— Isso se chama ordem. — Grosvenor impôs, porém, ao perceber como soou rude, controlou-se. — É obvio que você ainda tem muito que aprender sobre politicagem, caro sobrinho — ele fingiu estar se servindo para não olhar nos olhos de Angrehand.
O restante dos presentes preenchiam os pratos com frutas e carne.
— Eu gostei de suas ideias — disse a rainha Elisabella, olhando para Angrehand, para a surpresa dos presentes. — Faz um tempo que venho tentando pensar em uma forma de tornar a política mais democrática, porém a sociedade não está pronta para uma mudança brusca, futuramente, talvez, quem sabe. Mas, caso estivesse, pode ter certeza que eu seria a primeira a adotar. Você, meu jovem, apesar da pouca idade, é um visionário.
— E que outras conclusões você tirou de sua viagem, Angrehand? — Indagou Thereford, aproveitando-se da situação. Ele parecia orgulhoso demais para alguém que dizia há poucas horas alegava estar decepcionado.
A atenção da rainha era uma coisa que poucos poderiam se dar o luxo de ter, então Angrehand se sentiu beatificado por ter tido a honra de recebê-la. Mais que isso, ele estava orgulhoso de si por poder mostrar ao pai o quanto era independente. Sem falar no restante de seus familiares, que estavam tão surpresos quanto Thereford pelo modo com o qual o garoto fora tratado pela monarca.
— A cobrança de impostos. — Ele disse. — Os camponeses, assim como nós, têm seus tempos difíceis. Às vezes quando a plantação não surte como esperado, eles têm de pegar um fundo reserva para cumprir com os deveres do estado e acabam não tendo o suficiente para a boa alimentação, e isso piora nessa época de alta de preços. Fora isso sua alimentação não é variada, eles podem comprar pouca coisa além do pão de trigo, cevada e centeio. No seu dia a dia, o pão é misturado com uma sopa rala de vegetais colhidos nas próprias hortas.
Angrehand furou com o garfo a carne dura e seca em seu prato, elevando-a até sua boca. A carne era salgada, ele sabia por que, além do gosto de sal, era assim que a carne era preservada no inverno. Aquela que ele comia foi cozida com especiarias (cravo, canela, pimenta, noz-moscada e gengibre) mesmo assim não conseguiu tirar o gosto de estragado.
— E vossa alteza — perguntou Angrehand, redirecionando a questão a princesa Vitória.
— Tem algum ideal que vá ajudar-nos a crescer socialmente?
Ela engoliu uma talagada de brócolis.
— Não tão importante quanto a suas ideias — ela disse, humildemente.
— Ora, vamos, tudo que vá contribuir é importante — Angrehand insistiu.
— Tudo bem — ela rendeu-se com um suspiro. — Meu falecido pai me contou, certa vez, que, em uma viagem até a Antártida, ele teve o prazer de comer carne de veado, e o sabor era simplesmente apaixonante, mas não por que a carne era nova, pois o cozinheiro havia afirmado que fazia dois meses que haviam matado o animal, e sim por que ela fora preservada, por estar conservada no gelo. Não sob o sal como estamos acostumados a fazer. Mas é claro que aqui não neva sempre para conservarmos a carne em gelo. Então, certo dia, tive o pensamento de criar uma repartição que armazenasse gelo, ou uma que produzisse, assim comeríamos carne de qualidade. E todo tipo de bebida.
— E por que não botou em prática? — perguntou ele.
— Mamãe diz que isso é tolice — ela respondeu.
— Pois eu apoiaria — ele anuiu, sorrindo.
Ela enrubesceu.
O príncipe não falou nada, ficou parado o tempo todo com o capuz cobrindo a face, como se fosse a personificação da morte retratada nos contos nórdicos e célticos — mas sem a foice. Aquilo estava começando a incomodar Angrehand.
— E quanto a vossa alteza Maria? — Angrehand dirigiu-se a outra princesa. — Tem alguma ideia produtiva?
— Não — disse ela, dando de ombros para a conversa como se o tema lhe fosse fútil. — Para mim está bom do jeito que está. Dou tanta importância a plebe quanto a vara de porcos no chiqueiro do palácio em Sintra.
— Maria? — repreendeu a rainha.
Ao contrário de como aprendera de como uma figura da realeza deveria se portar, a princesa não parecia ser do tipo clichê que Angrehand estava habituado a ver. Observando-a desde que chegou, ele percebeu que ela não possuía temor de demonstrar o que era, e o que pensava, mesmo que fosse desagradar a terceiros. Dava para ver em sua postura perante a mesa, no modo como usava os talheres e a forma como se diria a todos.
— O que?
— Não, tudo bem — disse Angrehand. — Vossa alteza foi sincera. Essa é a visão que a maioria de nós têm a respeito dos menos favorecidos, a princesa Maria apenas admitiu. Eles são em suma analfabetos e nojentos, mas, o que não sabemos, é que a causa disso é devido ao ambiente degradante onde vivem. A situação em que nós os deixamos viver.
A princesa Vitória olhou para o próprio prato, pensativa.
— Muito nobre da sua parte expor isso — congratulou ela.
Um criado se aproximou, trazendo na bandeja equilibrada uma garrafa de vinho, ele transcorreu em volta da mesa oferecendo o vinho exclusivo para a família real.
— Eu não bebo — disse a princesa Vitória. — Obrigada.
— Eu renunciei ao álcool — respondeu a rainha. — Eu pensei ter sido clara com Wellehallfax...
— Mãe! — Vitória interrompeu. — Um simples “não quero” já basta.
Todos recusaram, exceto, como Angrehand previu, a princesa Maria.
— Preencha o cálice até a borda — ela ordenou, e o criado fez como decretado.
— Espero que você não ingira bebida alcoólica em excesso, como fizeste no último verão em Sintra, você ficou incontrolável. — Retrucou a princesa Vitória.
Angrehand conteve um riso.
— Não me importune — a princesa Maria entornou o cálice de vinho na boca, bebendo o liquido em apenas uma deglutição. — Um regalo ao paladar — disse ela, acompanhada de uma eructação, de um jeito que deixaria até os mais ébrios boquiabertos.
Mas, no instante em que ela elevou a mão para depositar o cálice sobre a mesa, o curso no qual transcorria o jantar fora modificado. A princesa Maria deixou cair o cálice no chão, em seguida rompeu uma crise de tosse, que progrediu, elevando-se, até se transformar em espasmos, consequentemente ela escumou pela boca. Todos na mesa se apressaram para acudi-la.
Exceto o príncipe, ele continuou sem se mover na mesa, parado, escondido sob o capuz.
E no meio do pandemônio, Angrehand ouviu a rainha gritar para o médico abordo.
O que poderia ter ocasionado isso?
A princesa só estava...
Nesse instante, Angrehand viu o cálice rolar pelo chão até seus pés, então se abaixou, pegou-o em mãos, cheirou, encostou a ponta dos lábios e percebeu, com os olhos arregalados, o que realmente havia acontecido.
— A princesa foi envenenada