Duda
Uma mistura de alívio e tristeza, aqui sempre foi a minha casa e sair assim para nunca mais voltar, deixar a minha vida, a minha casa.
Meu coração só vai comigo porque, de certa forma, tenho um serzinho dentro de mim, vou embora por ele, por nós.
Vai ser difícil e provavelmente ele vai vir atrás de mim, ele se transformou em alguém que eu sempre tive pavor, eu amei e amo tanto esse homem que estar indo embora é como estar indo de luto, enterrando o Silas, e isso só existe o sinistro e o meu filho é órfão de pai.
Estava com uma enxaqueca horrível de tanto pensar e chorar. Fiquei pensando para onde ir, com certeza ele ia me procurar, a menos que eu fosse para outro morro onde ele não possa me rastrear.
E também uma casa na favela era o único lugar que eu ia conseguir alugar uma casa e comprar o básico.
O dia logo amanheceu e eu me preparei para ir ao encontro do contato da Gabi, nem com ela eu vou ter mais contato, vou sumir desse morro e me desligar de tudo.
Peguei meu celular olhando para a mensagem que eu escrevi... apertei em enviar e saí dali com lágrimas nos olhos.
Saí pela parte de trás do hospital, algumas pessoas trocando o turno, fingi não estar vendo ninguém e fui o mais rápido possível.
- Você é a mina?
Duda: Sou.
- Sobe e eu vou dizer logo, eu nunca te vi na vida, ok? Não sei quem é esse teu marido maluco aí e não quero b.o pro meu lado.
Duda: Eu nunca mais volto, e se por um azar fosse achada nunca vi você.
- Bom, não é muito confortável e você tem que ir no meio das roupas, tá ligado na barreira né.
Duda: Eu sei, vou me manter embaixo delas, pode ficar tranquilo.
Ele não falou mais nada, eu entrei e me encolhi embaixo dos lençóis sujos. Poucos minutos depois, sinto a van parar. Tentei segurar a minha respiração para os lençóis não se moverem. Ouço ele falar com os vapor e logo seguir viagem.
Foram algumas horas até ele parar e falar da pequena janela que tinha ali.
- Já fiz mais que a minha rota, vou ter que dar uma desculpa, tá ligado? Só posso ir até aqui.
Duda: Onde estamos?
- Niterói. Daqui tu escolhe. Parei aqui porque tem algumas pousadas, tá ligado?
Duda: Valeu, só por uma noite. Eu vou para outra cidade, pego um ônibus até a rodoviária.
- Já era. Boa sorte aí, e como eu disse, eu nunca te vi.
Duda: Obrigada. Se não fosse a sua ajuda, eu estaria perdida. Que Deus te pague.
Eu desço em uma rua pouco movimentada. Preferi dizer que estava indo para outra cidade. Se o sinistro ligar os pontos, ele dirá que eu ia para a rodoviária.
- Eu estava perto do jacaré, então é pra lá que eu vou.
Peguei um ônibus e fui em direção ao morro, rezando para ser fácil conseguir subir e achar uma casa bacana.
(***)
Como no outro, eu estava na barreira esperando o chefe ou o sub, mas logo ele veio.
JP: E aí, mina, suave?
Duda: Tudo bem, é com você que eu falo para conseguir uma casa?
JP: É, mas o Chefe tem que saber também, então vamos lá na boca, entra aí.
Duda: Não, obrigada, eu vou andando, só me mostra o caminho, por favor.
JP: Eu vou ter que esperar por você, porque vou te levar na casa se der certo, tá ligado? E a pé eu não vou, então pode entrar, eu não mordo não.
Entrei no carro dele e logo chegamos na boca.
Tinha um homem com a feição nada calma sentado fumando um baseado, a fumaça tapando a cara dele.
JP: Vacilão, não disse que ia trazer alguém aqui? A sala tá até cinza, pô
Ares: Disse, mas não disse que eu não podia puxar um. Então, mina, indo direto ao assunto, por que tá mudando?
Duda: Estou com as condições apertadas, não ia conseguir pagar outro aluguel. Perdi o meu marido e a minha casa foi o primeiro lugar que eu parei, então era esse.
Ares: Teu marido morreu de quê?
Duda: Não me sinto bem em falar disso, mas foi um acidente. Eu estava no hospital até hoje de manhã. Só preciso de uma casa para morar, pode ser bem pequena.
Ares: Tem uma arrumadinha, tá ligado, mas tem móveis novos dentro porque era de um doido aí que morreu antes de inaugurar a casa. Fica mais caro se tu for querer os móveis ou tu tem?
Duda: Sim, tenho essa mochila e o dinheiro do aluguel. Aqui é fácil de emprego? Preciso de um e posso ir pagando.
JP: Tu é certa, mina?
Duda: Como assim?
JP: Anda na linha, não usa drogas, essas coisas. Se for trabalhar, eu arrumo um trampo aí pra tu e tu vai me pagando os móveis.
Duda: Por mim, tudo bem, a casa é sua, eu pago para você?
JP: É isso aí, esse o****o aí brinca demais, tudo certo, Ares.
Ares: Tudo certo, senhor caridade. Leva a mina lá e fala das regras direitinho, e tudo que vacilar é vala sem segunda chance.