Capítulo 5
Malu narrando
Dois anos se passaram.
Joana estava sentada na sala, segurando a foto do Miguel como fazia todas as manhãs, beijando a imagem com carinho.
— O papai — ela sussurra sorrindo para a foto.
Rodrigo e eu sempre fizemos questão de manter Miguel presente em nossa casa. Ele era pai de Joana, mesmo que não estivesse fisicamente ali. Estar presente no coração dela era o mínimo que poderíamos fazer.
— O resultado sai que horas? — Rodrigo perguntou, descendo as escadas.
— Eu ainda nem fiz o exame — respondi, com uma ponta de nervosismo.
— Então faz logo! — ele insistiu. — Faz de farmácia!
— Vou fazer de sangue, assim temos certeza — expliquei.
— Vamos — ele falou, determinado.
— Você disse que não iria comigo — chamei sua atenção.
— Mas agora vou. Quero ameaçar todo mundo e ter esse resultado em minutos — ele respondeu com aquele sorriso convencido.
— Rodrigo… — tentei adverti-lo.
— Eu vou falar com meu papai — Joana interrompeu, apontando para a foto.
— Falando onde? — ele perguntou.
— Na foto! — ela riu.
Troquei um olhar com Rodrigo, que apenas deu de ombros.
— Então vamos — ele disse. — Quero saber logo se você está grávida ou não.
— Vai lá fumar tua maconha, ficar de boa, e deixa que eu faço o exame — falei, com um sorriso. — Você já fica na expectativa de negativo.
— Mas atrasou… — ele reclamou.
— Que nem da última vez — suspirei.
— Vamos ter fé — ele disse, segurando minha mão.
Em dois anos, já tivemos quatro falsos alertas de gravidez. Cada vez que o resultado dava negativo, a frustração crescia. Queríamos muito um segundo filho. Um menino seria perfeito para completar o casal, mas se viesse uma menina, seria igualmente bem-vinda. Não usamos contraceptivos, seguimos tabelas e tratamentos… e nada. Era frustrante.
Fiz o exame de sangue e, sob insistência de Rodrigo, o resultado sairia em meia hora.
— Calma — falei, tentando acalmá-lo.
— Estou calmo — respondeu ele, tentando não demonstrar ansiedade. — Se der negativo, tudo bem.
— Não vamos desistir, não é? — perguntei, sorrindo.
— Não — ele respondeu firme.
Esses dois anos foram incríveis. Tudo parecia leve, calmo, feliz. Rodrigo e eu vivemos muitas aventuras, risadas, bailes, maluquices. Lembrávamos até do nosso meme pelados na moto. Era a vida que eu sempre sonhei: simples, leve, sem obrigação, apenas vivendo.
O morro estava tranquilo também. Tanto aqui quanto na Rocinha, sem grandes conflitos ou problemas com a polícia. Os negócios fluíam e a paz reinava.
O rádio de Rodrigo tocou.
— Rd, preciso de você aqui em cima — a voz de Ph soou.
— Merda — Rodrigo resmungou.
— Vai lá, eu levo o resultado — falei. — Vai, vai.
Ele me deu um beijo rápido e subiu.
Ph estava seguindo a vida dele agora. Estava firme com Rosa, cada um em sua casa, e ainda não havia assumido totalmente, mas parecia feliz. Pouco falava de Julia e parecia ter encontrado algum amor pela vida novamente. Julia… nunca mais consegui encontrá-la, nem aquela amiga dela.
Cada um seguiu a vida à sua maneira. Levamos as feridas do passado no coração, curando-as com amor e cuidado. Eu sabia que Julia estava bem, feliz, abençoada.
— Maria Luiza — minha ginecologista chamou.
— Flávia — respondi, sorrindo.
— Soube que você veio fazer mais um exame. Peguei o resultado. Podemos conversar? Seu marido está aqui? — perguntou ela, com um tom sério.
— Não, ele saiu — respondi.
— Então vem — disse, chamando-me para entrar no consultório.
Seu tom preocupado me deu um frio na barriga.
— Está tudo bem? — perguntei.
— Deu negativo de novo — disse ela, com delicadeza. — Sei que vocês estão tentando há algum tempo. Fizemos vários exames e não há problema com você. Tem uma filha linda e saudável de três anos. Mas preciso que seu marido faça exames também.
— Ele não vai fazer — falei, conhecendo-o bem.
— Se ele fizer, podemos administrar um tratamento. Quem sabe você consiga engravidar. Mas se ele não fizer, vai ser só desgaste emocional para vocês dois.
Assenti, com um sorriso fraco.
— Sinto muito pelo resultado — disse Flávia, entregando-me o exame fechado.
— Obrigada, irei falar com ele — respondi.
Saí do consultório preocupada em encontrá-lo. Entrei na boca e lá estava Rodrigo, sentado, contando dinheiro enquanto soltava vapor do cigarro.
— A médica me chamou para conversar — falei. — Deu negativo de novo.
— Ah — respondeu ele, levantando-se e me abraçando.
— Eu queria tanto esse bebê — falei, sorrindo.
— Está tudo bem — ele disse. — Quem sabe a gente para de tentar por um tempo e não ficamos tão ansiosos.
— Ela sugeriu que você fizesse exames também — falei.
— Claro que faço — ele disse firme. — Todos que forem necessários.
Sorrindo, beijei-o.
— É por isso que eu te amo — disse.
Nosso beijo selou tudo. Mesmo com os desafios, continuávamos juntos, fortes, e prontos para enfrentar qualquer obstáculo que viesse pela frente.