Estou deitada na minha cama, daquilo que eu chamo de quarto. Meus pensamentos estão na Rosa e em seu olhar triste e de medo. Queria protegê-la do mundo, mas graças ao meu erro, eu não posso fazer isso.
- Billie? - Ótimo, é Caim. Ele não percebe que eu estou vivendo uma crise angelical de adolescente que caiu no mundo há menos de um mês?
- Fala, Caim. - Ele suspirou e se sentou na minha cama.
- Bom, antes de qualquer coisa, saiba que você está treinando e vai errar. Mas... Afaste-se da Rosa. Vejo culpa nos seus olhos. - Olhei para Caim com tristeza.
- Tarde demais, Caim. Eu me sinto muito, muito culpada por ter desistido da Rosa sem conhecê-la. Eu errei... Mas eu não queria que ela tivesse se ferrado por minha causa. E se eu tivesse continuado em missão, Caim?
- Billie, os "e se" enlouquecem a gente. E se eu não tivesse matado meu irmão? E se ele não fosse tão irritante? - Dei os ombros e cruzei os braços ao ouvir. - Eu virei um bicho imortal, escolhi isso quando derramei sangue do meu irmão inocente. E se eu não tivesse escolhido isso? Eu não sei nenhuma dessas respostas.
- A incerteza é uma das coisas que mais me deixam louca. Foi por isso que eu caí. Tudo é muito incerto no céu. Ou você acredita no que dizem, ou você vai cair. Não existe um meio termo.
- Comprei hambúrguer pra você. Tá na cozinha. E ah, na frente dos outros, ao menos me chame de "pai", tá legal? Eu tive que me explicar pra várias pessoas do porque estou morando com uma adolescente de cabelo azul. - Concordei com a cabeça ao ouví-lo. Ele se levantou e saiu andando.
Era seis da tarde. Eu tinha um trabalho de Física para entregar na manhã seguinte, que já estava pronto. Como os humanos estudam coisas tão irreais como Física? É tudo uma grande mentira. Perda de tempo.
Meu celular tocou. Rosa pegou meu número para caso precisasse de algo.
- Oi. - Falei. Ouvi uma respiração pesada do outro lado.
- Não consigo resolver o trabalho de Física. Sou péssima nessa matéria... Você pode me ajudar?
- Como posso te ajudar?
- Vem aqui em casa e me ensina, ué. Ah, eu esqueci que você fazia homeschool antes de entrar aqui. A gente geralmente faz isso, vai na casa um do outro e tenta aprender com um colega que sabe mais. E você parece saber... Sei lá, tudo. - Soltei uma risada ao ouvir o que ela disse.
- Eu te ajudo. Você vem aqui ou eu vou aí? - Questionei.
- Vem aqui na minha casa, por favor? Te mando o endereço.
Segui as instruções e cheguei a uma casa com um jardim bonito. Tive certeza que era a casa da Rosa. E aí, eu a vi sentada na varanda, sentada com o caderno em mãos. Rosa mora a dois minutos de caminhada da minha casa.
- Oi. Estou aqui. Do que precisa? - Me abaixei e sentei ao lado dela. Ela me olhou com olhos de cachorro pidão. Não gosto do rumo que isso tá tomando, não gosto da forma como me olha, não gosto da forma como eu olho pra ela.
- Eu odeio velocidade média! Não consigo entender. - Ela fez um bico com o lábio inferior. Por que diabos meu peito tá aquecendo ao olhar pra isso?
- Calma, eu te ajudo. Vamos lá. Bom, primeiramente você tem que entender que velocidade é uma grandeza que provém da razão entre duas outras grandezas... No caso, a razão entre espaço e tempo. - Ela abaixou o rosto no caderno.
- Péssima ideia. Eu não consigo ao menos prestar atenção nisso! - Ela tava surtando por causa de... Física?
- Rosa... - Eu coloquei minha mão em cima da dela. Segurei-a com carinho, a confortando. Eu senti um pouco de poder emanando de mim sem que eu pudesse controlar. E aí, a Rosa estava mais calma. - Você vai conseguir entender. Se concentra, tá bom? - Ela concordou com a cabeça. - O espaço sempre será medido em metros ou quilômetros, e o tempo sempre será medido em horas ou segundos. É legal a gente lembrar também que existe um par pra cada um... Metros e segundos andam juntos, e quilômetros anda junto com as horas. Temos que deixar as unidades de medida sempre certas, tá?
- Certo. - Eu sorri para ela.
Depois de quase duas horas, ela finalmente entendeu e fez os exercícios. Eu senti um p**a alívio e senti como se minha missão tivesse sido cumprida.
- Fico feliz que tenha aprendido, Rosa. - Ela abriu um sorriso, e eu me levantei, para ir embora.
Rosa se aproximou de mim e me olhava daquele jeito que eu não conseguia entender. Suas bochechas estavam levemente vermelhas, e eu senti meu peito queimar, de novo. Ela passou os braços ao redor do meu pescoço e beijou minha bochecha, de forma demorada. Depois, me soltou e se afastou.
- Obrigada, Billie. Você é meu anjo da guarda mesmo. Nem acredito que aprendi Física.
Meu peito ardia. Eu tô tendo uma p***a de um ataque cardíaco, né? Bom, eu espero que seja.
- De nada. - Sorri e coloquei as mãos nos bolsos.
- Te vejo amanhã na escola? - Concordei com a cabeça ao ouvir o que ela disse.
Saí andando. Eu não sabia o que fazer. O que diabos foi aquilo? A Rosa... Me dá uma sensação esquisita na barriga. Uma mistura de fome com nervoso.
Cheguei em casa e assim que fechei a porta do quarto, me encostei nela. Escorreguei até sentar no chão, e fechei meus olhos.
Os olhos de Rosa nos meus, suas bochechas coradas, o beijo no rosto. Tudo aquilo estava me fazendo querer vomitar...
- Caim! - Gritei e fui até o banheiro. Coloquei tudo pra fora, e foi a coisa mais nojenta que já aconteceu. Mais nojento que petróleo.
- Que foi, p***a! Tá passando Friends na TV! - Resmungou.
Ele me viu prostrada no vaso, vomitando, e veio me socorrer. Segurou meu cabelo e me ajudou a levantar.
- Caim... - Eu tentava falar, mas não conseguia.
- Vem, lava a boca. - Ele ligou a torneira do banheiro e eu obedeci. - Comeu algo estragado? Está nervosa?
- Comi um sanduíche que tava embaixo da cama. E sim, eu estou nervosa. - Ele fez cara de nojo.
- Comida estraga aqui, Billie. Você não pode comer coisas que você deixou embaixo da cama.
Merda!