Pinturas

1101 Palavras
Já faz duas semanas que eu estou na escola e só consigo pensar em como os humanos perdem tempo. Os professores sabem bastante coisa, principalmente a professora Vera de Física. Na verdade, eu acho que a professora Vera é o ser humano mais inteligente que conheci até agora... Tirando o Caim. Mas o Caim é um demônio, então ele não conta. Hoje teve prova de Física. A professora Vera olhou para mim e disse que usaria minha prova de gabarito, e eu sorri satisfeita. Tenho prazer em impressioná-la. É satisfatório ver sorrisos no rosto daquela velhinha baixinha com bochechas gordas. - Billie! - Ouvi Rosa me chamando. Percebi que estou atenta a Rosa mesmo quando ela não está por perto, e acho que isso tem a ver com o fato de eu ter sido destinada a ser seu anjo da guarda... Antes de eu estragar tudo. Sério, eu posso ouvir a Rosa chorando no banheiro quando estou em outro andar. E ela não faz barulho quando chora. Eu sinto o cheiro das lágrimas dela. Como hoje de manhã, antes da prova de Física. - Oi! - Ela me deu um abraço apertado e eu retribui. Logo, ela se afastou de mim e sorriu. - Tirei noventa e oito na prova de Física graças a você. - Ela disse pra mim. Aquilo me fez sorrir. Mas ela sabe que não foi graças a mim, né? - Não foi graças a mim, Rosa. Você prestou atenção e conseguiu entender. Então, parabenize a você mesma. - Ela estava com um sorriso no rosto. Eu e ela andávamos pelo corredor da escola. - Você é sempre tão modesta... - Ela falou, soltando uma risadinha. - Olha, os meus amigos vão dar uma festa hoje. Vai ter bebida alcoólica, mas a gente não precisa necessariamente beber. - Tá me chamando pra ir com você, Rosa? - Ela concordou com a cabeça. - É óbvio! É uma ótima oportunidade pra você conhecer pessoas novas. - Como se eu quisesse. m*l sabe ela que eu odeio humanos e só me importo, literalmente, com ela e com a professora Vera. Bom, no início, eu só me importava com ela... Quem sabe eu não melhore, não é? - Combinado. Você pode me encontrar na minha casa se quiser. - Ela concordou. - Vai vestir o que pra festa? - Eu olhei pra baixo. Estava vestindo uma camiseta branca, short branco e tênis branco. Olhei para ela e dei os ombros. - Algo parecido com isso serve? - Ela concordou. - Sim, serve. Acho que você devia colocar mais disso. - Ela apontou para as duas correntes que eu usava. - Eu gosto quando você usa. - Então tá decidido. Vou cheia de correntes e anéis. - Rimos e fomos para a sala de aula. Era aula de artes, e a gente fazia junto com a p*****a da Ellen. Ela é um ser humano que eu detesto. - Oi, fracassadas. - Ellen deu um tapa na cabeça da Rosa. Aquilo me subiu o sangue, mas me controlei. - Não fui eu que fiquei com trinta e dois na prova de Física. - Falei, em alto e bom tom. Ellen odeia ser chamada de burra, porque ela realmente é. - Não tirei trinta e dois, tirei quarenta e sete, sua i*****l. Como você sabe que não passei na prova? - Soltei uma gargalhada ao ouvir. - Eu não sabia. Chutei porque sei que você é burra. - Abri um sorriso irônico. - Vá pra sua mesa e deixa a gente em paz. - Vocês vão ver a burra acabar com a reputação de vocês. - Ela piscou um dos olhos pra mim e saiu andando. Rosa estremeceu. Eu segurei a mão dela e a olhei. - Tá com medo? - Ela concordou. - Eu morro de medo dela. Ela já quase me fez ser demitida na loja de flores... E eu amo trabalhar lá. - Ela respirou fundo. Eu entrelacei nossos dedos, acariciando um dos dedos dela com meu polegar. - Relaxa. Eu não vou deixar ela te f***r de novo. Respira fundo. - Ordenei. Ela me obedeceu. Após respirar fundo, ela parecia mais calma. Hoje, era dia de pintar. Havia um quadro para cada pessoa, bem pequeno, do tamanho de uma capa de CD. Eu achei divertido porque sou realmente boa em pintar. Na verdade, não há nada que eu seja r**m porque eu sou um anjo e nós aprendemos muito rápido qualquer que seja a coisa. As tintas estavam disponíveis, e então, cada um começou a fazer a sua obra prima. O tema da pintura era "Sentimento". Como que se pinta um sentimento? Eu não faço ideia, mas posso aprender. De repente, me vi fazendo o sentimento que foi mais intenso, que mais me feriu durante a minha existência: O sentimento de cair na terra. E foi isso que pintei. Um anjo caído molhado no petróleo. Essa era eu, antes de pintar os cabelos de azul. - Como você consegue ser boa em tudo, Billie? - Rosa espiava minha obra. - Isso tá incrível. Eu só pintei uma paisagem em azul porque me parece triste. - Ela me mostrou o quadro, com um desenho bem infantilizado de uma paisagem. Eu sorri. - Você olha pra ele e sente o que? - Questionei. - Pro meu? Eu olho pra ele e fico triste porque não sei desenhar. - Ela soltou uma risada que eu acompanhei. - Agora, quando eu olho pro seu quadro... Eu sinto um abandono e uma solidão que... Fazem meu peito doer. - Então transmite o que eu senti quando isso aconteceu. - Ela me olhou confusa. - Quando isso aconteceu? - Merda. Por que eu falei isso? - É, quando eu pintei... É uma metáfora pra algo que aconteceu. - Disfarçado com sucesso. Ela sorriu. - Como você pode ser tão profunda, Billie? Isso é incrível... - Ela sorriu mais uma vez. Acho que se ela soubesse que sou o anjo da guarda que devia cuidar dela, não ficaria feliz de ver essa pintura. - Eu aprendo rápido. É só isso. - Falei. - Billie, depois da aula, vamos dar uma volta na cidade? Eu quero comprar uma roupa nova para a festa de hoje. Minha chefe me deu o dia de folga... O que acha? - Concordei com a cabeça. - Claro. Vou na porta da sua sala pra te encontrar quando minha aula acabar, então. Eu tô ansiosa pra sair desse lugar e fazer algo diferente. Ser um ser humano é muito chato! Vamos ver se algo me traz emoção ou coisas diferentes para sentir.
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