capítulo 11

1953 Palavras
Simon despertou devagar, como se o sono tivesse sido denso demais para ser abandonado de uma vez. A primeira coisa que sentiu foi o calor. O calor do corpo dela. Lívia estava enroscada sobre seu peito, a respiração lenta, profundamente entregue ao descanso. Um dos braços dela repousava sobre suas costelas, leve como uma pena, mas pesado o bastante para impedir qualquer vontade dele de se mover. Por um instante, Simon ficou ali, imóvel, apenas olhando o teto e tentando entender em que momento sua vida — tão organizada, tão prática, tão previsível — tinha virado isso. Ela se mexeu levemente, a ponta do nariz roçando sua pele. Ele prendeu o ar. Por que ela faz isso comigo? Ele nunca se sentiu assim. Nunca quis agradar ninguém. Nunca buscou aprovação. Ele dizia o que precisava dizer, fazia o que precisava fazer — sem floreios, sem suavidade, sem tempo para delicadezas. O mundo o conhecia assim. O lenço preto representava exatamente isso. Direto. Prático. Bruto, às vezes. Mas então veio ela. Lívia. E aquele sorriso. Aquele sorriso pequeno, quase tímido, mas que iluminava o rosto inteiro, fazia algo dentro dele se abrir como se estivesse engessado há anos. Era estranho. Inquietante. Viciado. Porque ele queria mais. Queria provocar aquele sorriso de novo. E de novo. E de novo. — O que você está fazendo comigo, hein? — murmurou baixinho, embora soubesse que ela dormia profundamente. Ele a olhou por um longo tempo, atento a cada detalhe: os cílios longos descansando sobre as bochechas rosadas, o cabelo espalhado sobre seu peito, o formato doce da boca que ainda parecia quente do beijo — o beijo que ela iniciara sem nem perceber, enquanto o sono a envolvia depois do banho, e que fez ele possuir ela mais uma vez. Simon passou a mão de leve pelos fios castanhos, afastando-os do rosto dela. Um gesto que nunca teria feito com mais ninguém. Seu estômago roncou, traindo sua serenidade recém-adquirida. Ele precisou rir baixinho. — Certo! Isso é um sinal. Levantou-se devagar, com um cuidado quase exagerado, sustentando o peso dela apenas o suficiente para deslizar um travesseiro sob seu corpo. Lívia suspirou, buscando o aconchego, mas não acordou. Simon ficou ali ainda um segundo, parado ao lado da cama. Olhou para ela como se de repente entendesse o que significava pertencer a alguém. Não apenas pelo casamento. Não pela tradição. Mas, porque seu corpo todo parecia reconhecê-la. Como se tivesse estado esperando por ela sem saber. Ele respirou fundo, sentindo uma onda quente no peito, algo que não ousaria nomear ainda. — Eu vou fazer alguma coisa pra você comer. — sussurrou, mesmo sabendo que ela não escutaria. E com passos silenciosos, desceu até a cozinha. Não sabia exatamente o que preparar. Não era um expert. Mas queria que ela acordasse com um gesto seu. Com algo que dissesse, sem que ele precisasse falar: Eu quero cuidar de você também. Abriu a geladeira, ainda com o pensamento preso naquela mulher adormecida no quarto, e começou a separar ingredientes, sentindo — pela primeira vez em muito tempo — que estava exatamente onde deveria estar. Lívia despertou lentamente, estranhando a falta de calor sob o rosto. Quando abriu os olhos e percebeu que estava sozinha na cama, seu coração apertou — só por um momento — antes que ela inspirasse fundo e ouvisse o barulho de talheres na cozinha. Caminhou até lá, ainda com o corpo relaxado do prazer, e parou na entrada quando o viu. Saimon estava de costas, concentrado em mexer a frigideira, os músculos das costas e dos ombros se movendo sob a luz branda das lâmpadas. A calça de linho pendia baixa na cintura, mostrando um pouco demais, e algo dentro dela simplesmente esquentou novamente. Seu peito acelerou. Ela levou uma mão ao próprio coração. Suspirou — um suspiro que quase soou como um desejo m*l disfarçado. Aquela pele dourada dele, fez ela ficar com água na boca. E então caminhou até ele. Devagar, como se fosse algo natural. Como se já estivessem acostumados um ao outro. Sem dizer nada, Lívia deslizou os braços ao redor dele por trás, juntando seu corpo ao dele. Encostou o rosto nas costas quentes do marido e fechou os olhos, respirando o cheiro da pele masculina. Saimon congelou por um segundo — completamente pego de surpresa. O coração dele disparou com tanta força que ele teve certeza de que ela sentiu. — L-Lívia…? — murmurou, com a voz rouca, quase grata. Sem ousar se virar, com medo de quebrar o encanto. Ela apenas abraçou mais forte, encostando o peito ao centro das costas dele, deixando o nariz deslizar pela pele cheirosa dele, segurando para não deixar uma marca de seus dentes ali. Quando ela ficou assim?! Nem mesmo por Lucas ela já teve esses desejos tão insanos. Essa vontade de provar da pele, sentir o toque e sentir mais uma vez aquela sensação de explosão que ele fez ela sentir. — Você estava cozinhando. — disse baixinho, com um sorriso que tocava a voz. — E eu queria estar aqui. Senti a necessidade. — foi sincera, antes de dar um beijo nas costas largas, sentindo que poderia deitar o rosto ali, e simplesmente ficar. Saimon fechou os olhos. Satisfeito. Tocado. Completamente vencido. E pela primeira vez em muito, muito tempo, ele sentiu algo simples, profundo e impossível de ignorar: Ela é minha. E eu quero ser digno disso. Quero que o esforço que ela está fazendo para ignorar o fato de que não sou o homem que ela queria, não se torne um esforço e sim, um ato de amor. Que ela sinta que não houve lenço errado, e sim o destino certo. Saimon desligou o fogo antes de se virar. O abraço dela ainda ardia em suas costas quando seus olhos encontraram os dela. Com a mão grande e quente, ele tocou o rosto delicado de Lívia, traçando a linha do maxilar com o polegar, admirando a beleza delicada e simples. — Você não parece triste por não estar com ele — disse baixo, quase relutante. Lucas. O nome estragou o ar entre eles. Saimon sentiu imediatamente o erro, como se tivesse quebrado algo frágil e precioso. Lívia suspirou fundo. Ele retirou a mão no mesmo instante, como se tivesse queimado, mas ela não o afastou — ela mesma deu um passo atrás, recuando suavemente. Depois, com a leveza de quem domina o próprio corpo, apoiou as mãos no balcão e se impulsionou, sentando-se sobre ele. Seus pés balançaram no ar, e o olhar distante fixou-se no vazio da cozinha. — Estou casada com você, Saimon — disse, num tom sereno, mas firme. — Não posso lamentar por isso. Ele prendeu a respiração. — Lívia… — Hoje mais cedo, Lucas admitiu que estava comigo apenas porque eu pareço com a minha irmã. — ela continuou, com um sorriso triste, porém aceito. — Sempre foi dela que ele gostou. Eu só estava ali ocupando um espaço que não era meu. Não quero isso pra mim. Quero algo que seja meu. Somente meu. E se a deusa me guiou até você, vou fazer o possível para isso ser o certo. Se não funcionar, não quero que seja porque eu estava apegada a um passado sem sentido. As palavras dele sumiram na garganta, com a declaração dela. O silêncio que se espalhou não era desconfortável — era íntimo, profundo. A verdade pairava como um véu entre eles. — Esse é o sentimento real dele. — ela concluiu com calma. — Então tudo está como a Deusa quis. Se minha irmã foi até ele, e ele já gostava dela. Só lamento por ter perdido tantos anos me esforçando por algo que não me pertencia, mas, o passado não volta, o presente não muda e o futuro apenas minhas atitudes de hoje podem definir. Lívia ergueu o olhar para Saimon, e havia algo novo ali. Não dor. Não arrependimento. Mas uma sinceridade suave, quase um convite para que ele entendesse quem ela realmente era. Saimon deu um passo à frente, ficando entre seus joelhos, as mãos pousando ao lado dela no balcão — sem tocá-la, mas perto o bastante para sentir a respiração dela esbarrar no seu queixo. — Eu não queria te machucar perguntando isso. — ele murmurou, a voz mais baixa que antes. — Só queria entender você. Ela piscou lentamente, absorvendo a frase. E algo no peito dela — e no dele — pareceu se aquietar. Lívia o puxou para seus lábios, as pernas se envolvendo na cintura dela. As mãos descendo pelos músculos do abdômen. — Vai me marcar um pouco mais?! — Ele perguntou nos lábios dela, sentindo as unhas dela fazer um caminho por seu abdômen. — Talvez. — Ela declarou mordendo levemente o queixo dela. — Acho que você gosta. — Ela disse e ele sorriu. — você é minha esposa, e pode me deixar com suas marcas se quiser. O beijo voltou e um segundo depois os dois já estavam gemendo e entregues mais uma vez. Ali mesmo no balcão da cozinha. O brilho do suor em suas peles, o cheiro se misturando e a euforia de quem está descobrindo algo novo e intenso. A comida estava pronta. O cheiro quente de ervas e manteiga preencheu a cozinha enquanto Saimon ajeitava os pratos na mesa. Lívia ainda estava com as pernas penduradas sobre o balcão, respirando mais fundo do que gostaria de admitir. Quando ele terminou, aproximou-se sem aviso. — Vem — disse apenas. Antes que ela pudesse questionar, ele segurou sua cintura e a ergueu como se fosse leve demais, ignorando o suspiro indignado que ela soltou. Em vez de colocá-la na cadeira acomodou-a em seu colo. — Saimon! — ela protestou, as mãos se apoiando em seu peito firme. — Eu consigo sentar sozinha. Você não estava reclamando de está cansado da subida?! — Exato! Estou cansado da subida. Não de você. — ele respondeu, com aquela calma perigosa que parecia nascer do fundo da voz. — E eu quero você aqui. Lívia corou até a alma. Tentar sair foi inútil. Ele segurou sua cintura com uma das mãos, firme, mas sem apertar. A outra levou o garfo à comida, como se fosse a coisa mais natural do mundo. — Abre a boca — ordenou suavemente. Ela o encarou, incrédula. — Eu sei me alimentar, Saimon. — Eu também — ele deu um meio sorriso, aquele que parecia sempre prestes a virar provocação — mas estou com você no colo. Então aceite minha ajuda. Era controlador. Sem dúvida. Mas havia algo no modo como ele segurava o garfo, como esperava pacientemente, como seus dedos descansavam na lateral da cintura dela que a confundia. Não era uma ordem fria. Não era um gesto autoritário. Era cuidado. Carinho, até. E isso foi o que a desestabilizou. Lívia abriu a boca devagar, aceitando a primeira garfada. O sorriso satisfeito que ele deu em seguida quase a fez perder o ar. — Boa menina — ele murmurou, sem pensar. Ela engasgou no ar. — Saimon! Ele riu baixinho, divertido pelo desespero dela, e ofereceu outra garfada. — O que foi? Estou alimentando minha esposa depois de um dia exaustivo. Não vejo problema nenhum. Ela tentou desviar o rosto, mas ele inclinou o queixo dela de volta com a ponta dos dedos, delicado e teimoso. — Olha pra mim, Lívia. Quando ela obedeceu, o sorriso dele suavizou — não provocativo, não malicioso. Algo mais profundo, quase inesperado. — Eu gosto de cuidar de você — ele confessou. O coração dela deu um salto. E ele continuou a alimentá-la, pacientemente, como se aquilo fosse o momento mais importante de todos. O sorriso que ela dá, paga qualquer coisa. ...
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