Clima tenso

1104 Palavras
Georgina estava sentada no sofá da sala, abraçada aos próprios joelhos. A chuva batia leve nas janelas, abafando os sons da casa. Chloe estava ali, perto. Jovem, bonita, com o cabelo preso num coque desarrumado. Mais do que funcionária — era amiga. A única com quem Georgina ainda conseguia falar de verdade. Sentaram-se juntas, dividindo uma manta fina, como faziam desde que Chloe chegara à casa, meses atrás. Ela havia sido contratada como assistente pessoal, mas acabou se tornando confidente. — O casamento está chegando, Chloe… — Georgina disse, a voz falha. — E eu não sei o que fazer. Não sei mesmo. Chloe ficou em silêncio, os olhos atentos, sem interromper. — Às vezes eu tenho vontade de me jogar de um lugar alto. Só pra acabar com tudo. Só pra não ter que ser dele. — Georgina… — Chloe tocou de leve a mão dela. — Eu entendo. Ele também me dá medo. E olha que eu nem estou no lugar que você está. — Ele é o pior homem que eu já conheci. Tenho pavor. Não quero que ele me toque. Não quero ser esposa dele. Chloe apertou os lábios. Havia verdade nos olhos dela, e também dor. — Eu queria tanto que Ralph fosse o capo… — Georgina disse, num sussurro. — Ralph… — Chloe olhou para o lado, como se buscasse as palavras certas. — Ele também não é um homem bom. Você sabe disso. — Eu sei… — Georgina respondeu. — Mas nunca ouvi dizer que ele machuca mulheres. Nunca. Louis, sim. Todo mundo sabe. Já Ralph… pelo menos isso ele respeita. Chloe assentiu, devagar. — Às vezes, isso já parece muito. Mesmo quando não deveria. Georgina se deitou no sofá, virando o rosto para o encosto. E o choro veio. — Eu sinto falta do meu pai. Da sensação de segurança que eu tinha, mesmo sabendo que ele era um homem duro. Ele me protegia. Agora sou só uma peça… só uma moeda de troca. Chloe passou a mão nos cabelos dela, em silêncio. — Você não está sozinha — sussurrou. — Eu tô aqui. E vou estar até o fim. Georgina apertou os olhos, deixando as lágrimas caírem livres. E por um instante... o mundo lá fora parecia um pouco mais longe. Ralph estava parado no corredor, de costas para a sala. Tinha ouvido tudo. Cada palavra dita por Georgina. Cada tremor na voz dela. Não entrou. Não disse nada. Virou-se e foi embora, sem olhar para trás. Estava vacilando, e sabia disso. Se continuasse ali, ia acabar fazendo uma escolha da qual talvez não pudesse voltar. Lá dentro, Georgina limpava as lágrimas com o dorso da mão. — Quando eu me casar, vai voltar pra sua casa, Chloe — disse, olhando para a amiga. — Eu vou pedir pro Ralph te ajudar. Ele tem influência, ele pode te tirar daqui. Chloe balançou a cabeça. — Eu vou com você, não vou a abandonar justo agora, não mesmo. — Não vai — respondeu Georgina, firme. — Porque se Louis voltar a atenção pra você, se te enxergar… ele é capaz de qualquer coisa. E eu não vou deixar isso acontecer com você. Chloe tentou protestar, mas Georgina continuou: — Você é minha amiga. E eu amo você como uma irmã, Chloe. Mas você… eu nunca vou deixar que você viva no inferno comigo, , não mesmo. Eu não tenho nem o direito, o fardo é meu, eu carrego o sobrenome do meu pai, não você. — Georgina... — Você vai pra sua casa. Sua mãe tá lá, e você vai ficar mais segura. Chloe segurou a mão dela com força. — E você? — Eu fico. E se eu não suportar… eu fujo. — Ele te ma.ta se você fugir — murmurou Chloe. — Então eu morro. Mas vai ser melhor assim, não vê? Não vou suportar viver como esposa dele, o asco tenho dele, vai o meu estômago embrulhar. Georgina respirou fundo, os olhos cansados, mas ainda brilhando com uma última faísca de algo que ela já teve um dia: esperança. Depois, deu um sorriso triste. — Eu vou dançar um pouco. Chloe suspirou — Dançar? Como consegue dançar com tudo isso acontecendo, como? — Dançar me ajuda a fingir que eu não sou a noiva do monstro da Inglaterra. Georgina subiu as escadas devagar, o celular nas mãos. Escolheu uma música suave, uma daquelas que a lembrava de tempos mais simples, onde o medo não vivia grudado na pele. O quarto estava vazio. Silencioso. Ela ligou a música e, com passos lentos, caminhou até o centro do quarto.Começou a girar sozinha.De olhos fechados, como se o mundo não existisse.Como se ainda fosse livre, mas não era.Era uma prisioneira sofrida, aterrorizada e pronta para o abate. Como uma ave que já sabe que está ferida, mas ainda tenta abrir as asas. Uma dança desesperada antes da queda. Ela era a presa e a ave de rapina era Louis. Doente. Imprevisível. E c***l. Georgina continuou girando, devagar. A música preenchia o quarto com uma melodia triste, quase infantil. E, por um instante, ela fingiu que tudo aquilo era só um pesadelo. Mas, no fundo, já sabia: o verdadeiro monstro da Inglaterra a esperava. E ele não ia parar, não ia. Ela continuou girando até as pernas falharem, e então caiu no chão, o corpo desabando devagar, como se já não houvesse mais força alguma para resistir. Ficou ali, de joelhos, o rosto escondido nas mãos, soluçando baixo, tentando conter um choro que há tempos já não cabia mais dentro dela. Chloe observava da porta, em silêncio, os olhos molhados, sem saber se devia se aproximar ou respeitar o espaço daquela dor. Era difícil ver a amiga daquele jeito, tão entregue, tão frágil, tão longe de quem um dia foi. Georgina tremia. O vestido rosa colava na pele pelos movimentos e pela umidade da emoção. Dentro dela, a certeza se repetia como um sussurro c***l: só Ralph podia libertá-la. Ele era a única pessoa naquele mundo sujo e perigoso que poderia tirá-la daquele destino. Mas ela também sabia, sabia desde o primeiro momento, que ele amava Louis. Sabia que Ralph carregava o irmão no peito.. E se algum dia Ralph fosse forçado a escolher... ela temia não ser a escolha. E era isso que mais doía. Porque Ralph podia salvá-la, podia romper aquelas correntes invisíveis que a prendiam a um casamento forçado, a uma vida de medo, mas talvez... talvez ele nunca tivesse coragem de trair quem ele mais amava, ela era só uma peça. O que Georgina ignorava, era o amor que Ralph sentia por ela.
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