Pré-visualização gratuita Capítulo 1 – Mudança de Estação
As janelas do carro estavam parcialmente abertas, deixando o vento quente de verão entrar e bagunçar ainda mais o cabelo já rebelde de Gabriela. A trilha sonora da viagem era uma playlist antiga do pai, cheia de músicas dos anos 80 que ela fingia odiar, mas sabia cantar de cor. A estrada parecia infinita, e o calor grudava na pele como um lembrete de que tudo estava prestes a mudar.
Ela olhava pela janela sem realmente ver a paisagem. Seus pensamentos estavam longe dali — na cidade que tinha deixado para trás, nos amigos que não pôde abraçar o suficiente antes de partir e na vida que agora parecia uma lembrança distante. Mudar de cidade no meio do ano não estava nos seus planos. Mas, como sempre, a vida decidira por ela.
— Está animada, filha? — a mãe perguntou, com aquele tom esperançoso que só as mães sabem ter.
— Super — respondeu Gabbie, sem desviar o olhar da estrada.
Era uma mentira, claro. Ela não estava animada, estava apavorada. Começar do zero era cansativo, especialmente quando tudo o que ela queria era estabilidade. Mas como explicar isso para seus pais, que pareciam tão certos de que aquela mudança era o melhor para a família?
A nova cidade era menor, mais ensolarada e, segundo seus pais, “cheia de oportunidades”. Gabbie não enxergava nada disso ainda. Para ela, era apenas o lugar onde teria que começar do zero. De novo.
Quando chegaram, o calor pareceu mais intenso do que nunca. As ruas tranquilas, o barulho distante do mar e o cheiro de maresia deixavam claro que ali a vida tinha outro ritmo. E ela, acostumada com o caos urbano, estranhou aquele silêncio todo.
— Vamos descarregar só o básico hoje — o pai sugeriu, já abrindo o porta-malas.
Gabbie ajudou em silêncio, subindo as escadas do novo apartamento com caixas pesadas e um coração ainda mais pesado. O quarto era simples, com paredes brancas e uma janela que dava para um pequeno jardim. Ao menos tinha uma boa vista.
Quando finalmente ficou sozinha, jogou-se na cama e encarou o teto. Pegou o celular, mas não tinha mensagens. Nem dos antigos amigos. Nem do ex-namorado que já tinha seguido em frente há meses. Foi então que decidiu abrir a loja de aplicativos.
**"Talvez fazer amigos por aqui não seja tão difícil..."**
Deslizou o dedo pela tela até encontrar um app de amizade — ou algo assim. O ícone era colorido e prometia conexões reais. Criou o perfil sem pensar muito: uma selfie, idade, e alguns gostos. Nada muito pessoal.
Logo começaram a surgir perfis de pessoas próximas. Muitos caras exibindo o tanquinho, frases genéricas como "sou diferente dos outros" ou "vem me conhecer". Gabbie quase desistiu, até que um nome chamou sua atenção:
**Eiden.**
A foto era simples, mas o sorriso dele era verdadeiro. Tinha olhos claros e um boné virado para trás. Nada de frases clichês, só um “vamos conversar?”
Ela hesitou por um segundo... e então clicou em “curtir”.
Minutos depois, uma notificação apareceu.
**Eiden: “Oi, Gabbie. Curti teu estilo. Nova na cidade?”**
Ela sorriu. A primeira mensagem era simples, mas tinha algo ali... algo leve.
**Gabbie: “Acabei de chegar, literalmente. Ainda tô me adaptando ao calor e à vibe praiana haha.”**
**Eiden: “Então vou ter que te dar um tour. A praia é mais legal à noite. Menos turistas, mais real.”**
Gabbie largou o celular por um instante, sentindo um frio na barriga que não sabia explicar. Aquela cidade parecia menos estranha agora. Talvez, só talvez, ali tivesse espaço para recomeçar.
Ou, quem sabe, para se perder um pouco — antes de se encontrar de verdade.