Entrevista

2478 Palavras
JUN-HO — Nossa! O que houve? Está um dilúvio lá fora? — Si-Woo falou assim que eu cruzei a porta da sala de reunião. — Se houvesse um dilúvio, estaríamos construindo uma arca, não fazendo processos. — Respondi, indo até minha sala ao lado. — E posso saber o porquê de estar molhado? — Indagou, me acompanhando. — Uma garota esbarrou em mim na rua e caímos na calçada. — Coloquei minha pasta na mesa e tirei meu sobretudo, colocando-o no cabideiro ao lado da mesa. — Ummm, que azar o dela… — Azar o meu, você quer dizer, né? Veja o que ela fez com a minha camisa. — Apontei a mancha de café que ficou estampada. — Não me diga que é uma das suas preferidas? — Ele levou uma mão ao peito, fingindo indignação e se sentando em uma das cadeiras em frente à minha mesa. — Olha, se você não fosse meu amigo e sócio, já teria dado um chute no seu traseiro. — Falei, me sentando e tirando meu notebook da bolsa. Ele riu e cruzou as pernas, apoiando o cotovelo esquerdo no braço da cadeira, pondo a mão sob o queixo e me encarando. Eu olhei diretamente para ele; ele continuava a me encarar, e eu sabia que estava tentando me dizer algo. — Tá! — Me joguei no encosto da cadeira giratória e cruzei as mãos. — O que você quer? — Como assim, o que eu quero? — Não se faça de t**o comigo. Você sabe muito bem do que estou falando, Hope. — Arqueei uma sobrancelha, vendo-o embolsar uma expressão divertida. — Nostálgico você me chamar assim, me lembra da nossa adolescência, quando dançávamos hip-hop e fazíamos raps amadores. — Urgh… — Resmunguei, pegando um lápis e girando-o em meus dedos. — Não mude de assunto, saiba que não gosto disso. — Está bem, senhor rabugento. — Ele apoiou ambos os braços na mesa e cruzou as mãos. — Sabe quem esteve procurando por você? — Quem? — Perguntei, sério, sem um pingo de interesse. — Kim Eun-ji! — Falou como se fosse algo magnífico. Revirei os olhos, mostrando todo meu tédio com afinco. — O que tenho eu a ver com isso? — Indaguei, entediado. — Como assim? Tudo! Não ouviu o que eu disse? Ela perguntou por você! — Si-Woo falava com olhos arregalados e de uma maneira exageradamente eufórica. — E o que essa mulher queria? Ela não sabe onde fica a sala do irmão dela? — Batucava o lápis na mesa, virando a cadeira com o pé devagar. — Qual é, Jun-Ho… você não sabe que ela está caidinha por você? — Então sugiro que ela pare de cair ou vai quebrar a cara. — Me indignei, pegando os óculos de grau. — Você não pode ficar solteiro para sempre e, além disso, a Eun-ji é uma ótima mulher. — Ele se encostou na cadeira novamente. — Tem algo para mim sobre a reunião de hoje? — Mudei de assunto, voltando a prestar atenção no meu notebook. — De preferência, algo que não seja sobre casos amorosos fúteis. — Aqui está. — Si-woo levantou, colocando uma pasta caramelo sobre minha mesa. — Eu quero seu bem porque sou seu amigo e sei que você sofreu muito. — Gamsahabnida, Si-Woo — Falei seco, pegando a pasta de documentos. — Agora, pode me deixar sozinho, por gentileza? — Analisei o documento. — OK, mas saiba que não era isso o que Ah-ri queria para você… Meu coração disparou e eu o olhei assim que o ouvi, levantando-me e apoiando minhas mãos sobre a mesa. — Nunca mais, nunca mais fale assim… — Pedi, calmo . Porém , algo em mim se agitava toda vez que alguém falava o nome dela . — Eu não tenho a intenção de magoar você, mas… — Mas nada! — Falei alto e Si-Woo engoliu seco, me encarando com certo receio. Ele não tinha medo de mim, mas me conhecia bem o bastante para saber que eu estava visivelmente incomodado com o assunto. — Eu preciso trabalhar agora… — Olhei para baixo, encarando os documentos. — Como quiser. Assim que Si-Woo se retirou, soltei o ar devagar e sentei, tirando os óculos e pondo as mãos sobre o rosto. — Minha Saem… — Sussurrei. — SOPHIE ON 5 dias depois Eu estava há cinco dias nervosa, vez ou outra checando meu e-mail e nada do resultado. A quem eu queria enganar? Nenhuma daquelas vagas seria minha e eu teria que voltar para meu país de origem. — Mais que saco… Passava aleatoriamente os canais na TV e nada me chamava a atenção. Aquela ansiedade estava me matando, resmunguei pela milésima vez quando meu celular tocou. — Annyeong… — Atendi sem entusiasmo. — Chinguuuuuu! Já olhou seus e-mails hoje? — Umas 15 vezes… — Bufei. — Então olha pela décima sexta vez! — Ela disse eufórica. — Vou olhar amanhã… — Anda logo, Sophs! Sai dessa cama e pega o notebook! "Espera? Como ela sabe que estou na cama?" — Tá bom… — Joguei meu cobertor de lado e peguei o notebook voltando para a cama. — E aí? Já abriu? — Espera, né, a minha internet é lenta. — Disse, esperando a caixa de entrada carregar. — Não precisa dessa euforia toda porque eu tenho… Arregalei os olhos, levando a mão à boca, vendo um e-mail que dizia "Bem-vinda ao estágio de verão da Seul Academic International". — Aposto que você está paralisada. — Ha-nui falou alegre. — Amiga… eu… eu passei… — Sure, baby! (Com certeza, querida) Eu te falei! — Meu Deus… — Sorri. — Agora sua vida vai mudar! — Ouvi Ha-nui falar alegremente. … Cá estava eu em frente a um prédio de seis andares, todo ornamentado em vidro com grandes portas giratórias. O nome em um letreiro, em letras grandes e prateadas, tomava destaque: "Company Korean of Lawyers Min". Estava um tanto nervosa e cheguei 20 minutos mais cedo. Mordi o lábio e conferi minhas roupas mais uma vez antes de cruzar uma das portas que me deu acesso a um amplo saguão bem decorado e com um piso lustroso. Era maior do que eu pensei que seria. À frente, quase no centro, havia um grande balcão, que deveria ser a recepção, com duas moças coreanas muito bonitas. Me aproximei devagar; aqueles saltos, apesar de baixos, eram um tanto desconfortáveis para uma pessoa que usava sempre All Star e sandálias fechadas. — Bom dia! Com licença. — Falei com uma das moças. — Em que posso ajudar, senhorita? — Ela perguntou, amigável, sorrindo com dentes brancos e perfeitos. — Eu vim pelo programa de estágios de verão da SAI. — Tirei o documento que me foi enviado pelo e-mail e entreguei a ela. — Ah, sim, claro. — Ela pegou o papel, analisando-o. — Um minuto, por favor. — Ela pegou o telefone. — Qual é o seu nome, por favor? — Sophie Oliveira. — Sorri. — A senhorita Oliveira acaba de chegar (pausa)… sim, agora mesmo, senhor. — Ela colocou o telefone no gancho e devolveu o papel para mim. — Por favor, assine aqui. — Ela levantou, colocando sobre o balcão um livro grosso, me mostrando a linha para ser assinada. Assinei. — É o elevador à sua esquerda, sexto andar. A sala é a de número 4, no fim do corredor. O senhor Min a aguarda. — Sorriu. — Muito obrigada! — Me curvei minimamente e fui até as roletas do lado esquerdo que davam acesso ao elevador logo ao lado. Entrei no elevador, apertando o botão de número 6. Me virei, checando minha roupa que Ha-nui fez questão que eu usasse. A saia ficou um pouco acima dos joelhos e levemente apertada; já o blazer vermelho ficou muito bom; eu o deixei aberto e coloquei uma blusa de tecido fino, preta, assim como a saia. Conferi o r**o de cavalo que fiz e, como estava de lentes, passei muito pouca maquiagem. — É agora… seja o que Deus quiser… — Falei para mim mesma, apertando a alça da minha bolsa quando o elevador parou e a porta abriu. Saí do elevador em um corredor de uns cinco metros de comprimento, com três salas. Caminhei até o final, até a sala de número 4, com uma porta dupla de madeira.Levantei a mão direita e a recuei com receio de bater. — Vamos, Sophie, você precisa desse trabalho — disse em voz baixa, tentando controlar toda a insegurança que eu sentia. “Você não poderá escapar de mim…" Espantei aquela voz asquerosa da minha mente e bati duas vezes na porta. — Entre! — uma voz rouca e abafada disse. Abri devagar e entrei na sala, fechando a porta logo em seguida. O homem que estava em sua mesa parecia alheio à minha presença, concentrado em escrever ou assinar algo. — Com… com licença! — pronunciei, apertando meus dedos um no outro. O homem parou de escrever e levantou a cabeça, me olhando. Eu estava junto à porta, a uns 2 metros da mesa dele. — Bom dia! — me curvei. — Entre e sente-se! Me endireitei e fui até a mesa, sentando em uma das cadeiras à frente. Ele escorou no encosto da cadeira grande de couro marrom, tirou os óculos e continuou me observando. Seus olhos sobre os meus transmitiam uma estranha familiaridade. Olhei para minhas mãos sobre meu colo; não queria parecer insegura, mas aquele olhar era intimidador. — Você tem um nome? — ele quebrou o silêncio, e eu o olhei. — Sim… Me chamo Sophie, senhor Min. — Qual a sua idade? Eu sabia que era um costume tradicional na Coréia perguntar a idade para saber o nível de formalidade a ser usado, porém me senti estranha com o tom da pergunta. — Tenho 22 anos, mas aqui tenho 23, senhor. — Apenas responda como eu perguntar, sim? — ele mordeu a haste do óculos. — Claro, desculpe. — Então… — ele se endireitou, trazendo a cadeira para perto da mesa e cruzando as mãos sobre ela. Apesar de sério, tinha traços delicados e joviais. Seu cabelo era n***o e liso, cortado levemente repicado ao mesmo tempo que social. Apesar de os coreanos terem características asiáticas bem distintas, não os achava iguais como muitos estrangeiros dizem. Mas não era isso; eu já o tinha visto antes. Aqueles olhos, aquele olhar me prendia, e eu me sentia intimidada, mas não ousaria desviar. — Senhorita Oliveira, Sophie Oliveira, não é mesmo? — eu concordei com a cabeça. — Vamos direto ao ponto. Estou à procura de uma tutora de inglês para minha filha primogênita. E o programa de estágios da SAI foi muito bem recomendado por um amigo meu. Eu soube que vocês são escolhidos a dedo e que a maioria são estrangeiros como você, que vêm como bolsistas e são muito bem aplicados. Sinceramente, espero que a senhorita possa cumprir seu papel. — Oh… muito obrigada por essa oportunidade, senhor Min, eu fico m… — Entretanto… — ele me interrompeu. — Espero realmente que faça muito bem seu trabalho e quero deixar bem claro que não tolero deslizes. Eu li sua ficha e você é uma excelente aluna, e seu teste teve uma nota muito boa. Engoli em seco. — Eu cumprirei com meus deveres, senhor Min, eu prometo. — Nada de promessas, senhorita Oliveira. Apenas execute um bom trabalho. — Claro, desculpe, senhor. Ele me analisou por um instante e rapidamente desviou o olhar, parecendo envergonhado. Pegou um bloco e começou a escrever algo. — Aqui está. Esse é o endereço da minha casa. Esteja lá amanhã às 8 da manhã. — entregou-me o pedaço de papel bege claro com uma caligrafia impecável. — Claro, estarei lá. Muito obrigada! — me levantei e me curvei agradecendo. — Com licença, senhor Min. Me curvei minimamente mais uma vez e dei as costas para sair. — E senhorita Oliveira — parei e me virei — poderia usar roupas… menos… justas? Olhei para minha saia e senti meu rosto esquentar de vergonha. — Sim… desculpe. — Hum… — ele murmurou, ainda me olhando e colocando o óculos — Chega de desculpas por hoje. — falou, voltando sua atenção ao notebook. No momento em que ouvi aquela frase, lembrei do homem caído em minha frente, me olhando com cara de poucos amigos e olhar penetrante. "Meu Deus! É isso! É o cara daquele dia!" Pensei parada em frente à porta, como uma i****a. — Há algo errado? — ele me perguntou ao voltar a me olhar. "Eu já vi você antes?" Era a pergunta que eu queria fazer; não sabia porquê, mas eu queria ter certeza. Ele ainda me olhava esperando uma resposta. — Não… eu já vou, senhor Min. — Abri a porta e saí da sala, indo direto para o elevador. "Nossa, que coincidência foi essa?" Pensei , ao entrar no elevador. Antes que a porta se fechasse, alguém pôs a mão a segurando. — Ufa! Bom dia. — Um cara alto e bastante eufórico entrou no elevador. — Bom dia. — respondi. — Desculpe parecer curioso ou algo do tipo, mas você veio para a entrevista de emprego para ser a nova secretária da recepção? — ele perguntou, e eu o olhei um tanto incrédula. — Ah… não. Na verdade, eu vim para uma entrevista, mas não para ser secretária daqui. — respondi sincera. — Ah! Claro. — ele pôs ambas as mãos nos bolsos da calça social de linho azul-marinho impecável, olhando para frente. Olhando bem, ele era realmente um cara bonito, alto e jovem. Desviei o olhar para não parecer uma estranha olhando demais para um cara que nem conheço. — Sabe, o Jun é bem exigente e as secretárias não aguentam muito a pressão. — ele começou novamente a falar — Não é que ele seja uma má pessoa, só não tem senso de humor às vezes. — ele olhou para mim e sorriu. "Então esse tal de Jun deve ser um mala sem educação, que acha que suas secretárias são uma categoria inferior de assalariados e que, por isso, têm que aguentar toda e qualquer coisa." Essa era minha resposta, mas não seria muito saudável falar isso para um estranho que possivelmente estava falando de um dos sócios desse lugar. — Hummm… — me limitei a dizer. A porta do elevador abriu na recepção. — Bem, esse é o meu andar. — achei justo dizer antes de sair. — É o meu também. — ele disse, saindo junto comigo. — A propósito, sou o Si-Woo. — disse, estendendo a mão direita, que com receio, eu apertei. — Sou a Sophie. — Então, até mais, Sophie. Foi um prazer ter sua companhia. — disse, simpático, colocando óculos escuros. — Tchau. — acenou, passando pelo saguão na minha frente.
Leitura gratuita para novos usuários
Digitalize para baixar o aplicativo
Facebookexpand_more
  • author-avatar
    Escritor
  • chap_listÍndice
  • likeADICIONAR