Capítulo 2

1712 Palavras
Alice não falou nada sobre o que aconteceu no castelo. A experiência foi tão estranha, tão fora da realidade, que ela não sabia como lidar com isso. As imagens de Hades, o homem acorrentado e o ambiente gelado, ficaram gravadas em sua mente, mas ela sabia que não podia contar a ninguém. Sua vida precisava seguir em frente, mesmo que de uma forma desconectada daquela experiência surreal. No trabalho, ela se viu cada vez mais distante, até que um dia o que ela temia aconteceu: o assédio do chefe. Magnus tentou se aproximar de uma forma invasiva, como se quisesse mais do que uma relação profissional. A situação se tornou insuportável e Alice não pensou duas vezes antes de pedir demissão. Ela não estava disposta a enfrentar mais esse tipo de situação. Quando chegou em casa, a mãe de Alice, preocupada com o desemprego, perguntou o que havia acontecido. Alice, sem querer entrar em detalhes, apenas disse que havia se sentido desconfortável com o comportamento do chefe e que tinha decidido procurar outro emprego. Ela não queria preocupá-la com coisas que não poderia entender. Logo, Alice retomou sua rotina de estudos para a faculdade. A cada dia, sentia-se mais focada e, de certa forma, determinada a criar um novo futuro para si mesma. Mas no fundo, havia algo que ainda não conseguia tirar da cabeça. O homem, Hades, e os mistérios daquele castelo permaneciam com ela, como uma sombra no fundo de sua mente. Nos finais de semana, após longas horas de estudos, Alice encontrava um tempo para sair e procurar um novo emprego, mas algo a impulsionava, de maneira quase irresistível, a retornar ao castelo. Ela sabia que deveria seguir em frente com sua vida, mas não conseguia esquecer a sensação que aquele lugar e aquele homem haviam provocado nela. Num sábado à noite, depois de mais uma tarde de estudos, ela tomou uma decisão. Com o coração acelerado e um misto de curiosidade e inquietação, Alice se dirigiu ao castelo, tentando manter tudo em segredo. Não queria que ninguém soubesse, especialmente sua mãe. O castelo parecia ainda mais desolado e distante à medida que ela se aproximava, mas a mesma não hesitou. Ela sentia que precisava voltar, como se algo a chamasse para lá. Ela atravessou o portão de ferro enferrujado e caminhou pela floresta até o castelo. A noite estava fria, e a névoa tornava o ambiente ainda mais misterioso, como se ela estivesse entrando em um mundo paralelo. Quando chegou à entrada, a porta estava entreaberta, como se esperasse por ela. Alice entrou, o som dos seus passos ecoando nas paredes antigas, e desceu as escadas que levavam ao calabouço. Ela se aproximou da cela, hesitando por um momento. A sensação de estar sendo observada a fez parar, mas, ao olhar para dentro, viu os olhos de Hades fixados nela. Ele estava ali, como da última vez, acorrentado e imóvel, mas havia algo diferente. Seus olhos eram agora de um castanho avermelhado brilhante, como se brilhassem com uma intensidade sobrenatural. Alice ficou paralisada por um momento, fixada naquele olhar profundo e penetrante. — Você... você voltou... — a voz de Hades soou, arrastada, mas clara. Ele parecia surpreso e, ao mesmo tempo, quase como se esperasse por sua presença. — Uma caída... Não deveria falar comigo, muito menos voltar. Alice não compreendeu o que ele queria dizer com "caída", mas a palavra ecoou em sua mente. Ela se aproximou ainda mais, sem poder evitar. Algo nela a impulsionava a estar perto dele, a entender quem ele era, o que ele significava. — Eu... eu não sei o que você está dizendo. — Ela se inclinou mais perto da porta, tocando o gelo que cobria a entrada da cela. A sensação de frio extremo atravessou sua mão, mas algo mais aconteceu. Ela sentiu uma dor de cabeça súbita, como se algo dentro dela estivesse se rompendo, uma pressão crescente em sua mente. Hades a observou, seu olhar agora mais sério e carregado de uma tensão crescente. — Não toque nisso! — ele disse, sua voz agora mais forte e urgente. — Você não sabe o que está fazendo! Não deve abrir esta porta. Eu estou pagando pelos meus pecados. Não compreende o que isso significa. Mas Alice não podia parar. A dor na sua cabeça aumentava, e algo dentro dela parecia a obrigar a continuar. Ela tocou o gelo novamente, sentindo uma dor lancinante, como se uma força invisível estivesse tentando impedi-la de continuar. E então, tudo ficou em branco. O mundo à sua volta desapareceu, e Alice desmaiou, caindo pesadamente no chão do calabouço. Alice acordou com uma sensação estranha, como se o mundo ao seu redor estivesse em um borrão, desfocado. Quando abriu os olhos, encontrou-se de volta à sua cama, na segurança de sua casa. A luz suave da manhã entrava pela janela, iluminando o quarto de forma acolhedora. Porém, o sentimento de desconforto e confusão não a deixou. Ao seu lado, estava sua mãe, que parecia visivelmente preocupada. Alice sentiu o calor da mão dela em sua testa e ouviu sua voz suave, mas tensa. — Alice, você está acordada... Que susto você me deu, menina! — a mãe disse, com os olhos marejados. — Você desmaiou! Eu... eu não sabia o que fazer. Um homem encontrou você lá perto da floresta. Ele disse que te encontrou perto do estacionamento, tão próxima da floresta que parecia que estava prestes a cair... Eu... Alice, você me assustou tanto! Alice estava atônita. Ela tentava processar as palavras de sua mãe, mas as lembranças ainda estavam embaçadas, misturadas com a sensação estranha da dor de cabeça que a havia acometido antes de desmaiar. Ela tentou se sentar, mas a cabeça ainda estava pesada, e a voz da sua mãe parecia distante, como se ela estivesse falando de um mundo separado do que Alice havia vivido nas últimas horas. — Mas... que homem? — Alice perguntou, tentando se lembrar do que havia acontecido depois de tocar no gelo da porta no calabouço. Sua mãe suspirou e olhou para ela com uma expressão que misturava alívio e confusão. — Um homem, na faixa dos 40 anos, alto devia ter uma 1,80, corpo atlético, usava óculos, cabelos castanhos lisos partido no meio,disse que te encontrou perto da floresta. Ele te trouxe para casa. O médico que te examinou disse que você estava apenas muito cansada, provavelmente do trabalho e do estresse... Mas Alice, você estava tão pálida, quase como se... — Ela parou, tentando encontrar as palavras certas. — Como se não estivesse aqui. Alice se sentiu estranha. Como se as palavras da mãe não explicassem o que realmente havia acontecido. O médico a dissera apenas cansada demais? Ela não se lembrava de estar apenas cansada. A dor de cabeça, a sensação de perda de consciência e a visão do calabouço... tudo parecia mais do que uma simples exaustão. Enquanto tentava juntar as peças, sua mente começou a girar em torno do que ela já sabia. O homem que a trouxe para casa... Ela lembrou de Hanjun. O homem com quem havia cruzado no castelo, alguém que parecia ter uma conexão inexplicável com Hades. Hanjun... o nome não saía de sua mente. Ela passou dois dias inteiros em repouso, tentando se recuperar, mas a sensação de que algo estava incompleto não a deixava. O castelo, Hades e Hanjun... todas as imagens voltavam para ela em flashes, tornando sua mente cada vez mais atormentada. Ela não conseguia esquecer o olhar do homem acorrentado, o brilho avermelhado de seus olhos, o medo que ele havia expressado ao tentar impedi-la de tocar a porta. Por que ele estava preso? E o que significava aquela sensação de pagar pelos seus pecados? A sensação de que havia algo mais — algo maior — a envolvia e Alice não podia mais ignorar. Determinada a descobrir mais, ela decidiu que precisava ir atrás de Hanjun. Ele parecia ser a única pessoa que poderia ter as respostas para as perguntas que a atormentavam. Se ele a havia encontrado e a levado para casa, ele devia saber algo sobre o que estava acontecendo no castelo e, principalmente, sobre Hades. Após algumas investigações discretas, Alice descobriu onde Hanjun morava. Sua casa ficava em uma área isolada, perto da entrada da floresta, não muito longe do castelo. Ela não sabia exatamente o que esperava encontrar lá, mas algo a empurrava para agir. Precisava entender o que havia acontecido e, se possível, libertar o homem que ainda habitava seus pensamentos. Quando Alice se aproximou da casa, percebeu que o lugar parecia tranquilo demais. A casa, simples e isolada, estava rodeada por árvores altas e densas, quase como se fizesse parte da própria floresta. A luz da tarde começava a se apagar, e uma sensação de melancolia parecia envolver tudo ao redor. Ela se aproximou com cuidado, tentando não ser notada, e ficou parada por alguns minutos, observando a casa à distância. Hanjun estava lá, ela tinha certeza disso. Por um instante, Alice hesitou. Será que ele a receberia? Será que ele a ajudaria a entender o que estava acontecendo? Sua mente estava cheia de perguntas, mas ela sabia que não poderia voltar atrás agora. Ela precisava de respostas. Com um suspiro profundo, ela se aproximou da porta, batendo levemente. O som ecoou na quietude da floresta, mas ninguém respondeu de imediato. Ela esperou alguns segundos, o coração batendo forte em seu peito, até que a porta se abriu lentamente. Hanjun apareceu, com uma expressão séria, mas sem surpresa. Ele a olhou, seus olhos escuros refletindo a luz suave da tarde. — Alice, você? — ele disse, com uma leve tensão na voz, como se já soubesse que ela viria. Alice se manteve firme, sem saber exatamente o que dizer. — Eu... preciso entender. O que está acontecendo? Quem é Hades? Por que ele está preso? E por que você me ajudou? — Sua voz soou mais firme do que ela esperava, mas a angústia estava evidente em seus olhos. Hanjun a observou por um momento, como se ponderasse algo, antes de abrir a porta e convidá-la a entrar. — Você tem muitas perguntas. Eu vou explicar. Mas antes, você precisa entender que nem tudo o que você sabe sobre este lugar está certo.
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