A casa de Hanjun era simples, mas tinha uma aura de mistério que parecia combinada com a floresta ao redor. Ele a conduziu para dentro, mas havia uma tensão no ar, como se ele estivesse relutante em falar. Alice observava cada detalhe da casa, que era espaçosa, mas de uma maneira isolada e fria, como se o tempo ali estivesse suspenso. Hanjun a olhou por um momento, sua expressão séria e fechada.
— Você não deveria estar aqui — ele disse, a voz grave. — Eu não posso te ajudar. Você precisa entender que Hades é perigoso. Não é alguém com quem você deve se envolver.
Alice sentiu um calafrio percorrer sua espinha. Ela não sabia o que queria ouvir mais: as respostas que ela tanto buscava ou a verdade amarga que ele estava prestes a lhe revelar. Hanjun suspirou, como se estivesse tentando encontrar uma maneira de explicar.
— Ele... não é quem você pensa que é. O que você viu naquele calabouço, o homem acorrentado, não é apenas uma pessoa. Hades está preso ali por uma razão, e liberá-lo pode trazer consequências terríveis. Você não tem ideia do que está lidando, Alice. Ele... — Hanjun hesitou, seu olhar se distanciando. — Ele é mais do que uma maldição, ele é um castigo. Um ser antigo, que foi condenado a permanecer ali. E se você o liberar, você não será capaz de controlar o que acontecerá depois.
Alice ficou em silêncio, processando suas palavras. O medo nas palavras de Hanjun era palpável. Mas havia algo dentro dela que não podia simplesmente ignorar. Hades, apesar de estar preso, a chamava de uma maneira que ela não conseguia explicar. Ela sentia que havia mais do que ele estava revelando. E aquilo a incomodava profundamente.
Antes que pudesse falar qualquer coisa, a terra tremeu de repente. O chão ruiu sob seus pés e as paredes da casa de Hanjun estremeceram. Alice se levantou instintivamente, e o som de algo se quebrando fez o coração dela disparar. Foi um terremoto, de média escala, mas com força suficiente para causar danos em algumas casas e edifícios próximos.
Hanjun correu até a janela, e Alice o seguiu, olhando para fora. As ruas estavam em caos. Pessoas corriam para ajudar uns aos outros, tentando remover escombros e reparar os danos das construções que haviam desabado. Não muito longe, uma grande pilha de pedras estava sendo limpa por um grupo de moradores, enquanto outros organizavam abrigos temporários para os que haviam perdido suas casas.
A sensação de algo errado pairava no ar. A noite parecia mais fria, muito mais fria do que no inverno anterior. Alice sentiu um arrepio, mas não era apenas o frio. Era como se a terra e o clima reagissem à presença de algo sombrio. Algo muito maior do que um simples terremoto.
Nos dias seguintes, a cidade parecia começar a se recuperar. As pessoas trabalhavam para reconstruir o que havia sido danificado, mas Alice não conseguia afastar a sensação de que algo estava prestes a acontecer. Hanjun não a procurava mais, e ela se sentia ainda mais inquieta e confusa. Sua mente estava dividida entre seguir o conselho de Hanjun e buscar respostas para o que havia visto no castelo.
Enquanto isso, a época de Halloween estava se aproximando, e as ruas começaram a ser decoradas com enfeites de terror. As crianças estavam animadas, e muitas casas estavam cobertas com abóbora esculpidas, teias de aranha falsas e esqueletos espalhados pelas calçadas. A atmosfera estava mais divertida, uma tentativa de escapar das tensões recentes. Mas para Alice, parecia que tudo aquilo estava apenas mascarando algo mais sombrio.
Uma tarde, quando ela caminhava pela cidade, observando as preparações para as festividades, algo a fez parar. Entre as árvores, ela viu uma figura. O olhar perdido de uma pessoa observando a movimentação da cidade. Seus cabelos eram longos, pretos e lisos, caindo suavemente sobre os ombros. E os olhos... aqueles olhos. Quase vermelhos. Um brilho estranho que ela reconhecia. Era Hades.
Alice ficou parada, quase em choque, tentando processar o que via. Hades estava ali, entre as árvores, observando as pessoas com um olhar distante e profundo. Como ele havia chegado ali? O que ele queria? Ela olhou em volta, mas ninguém mais parecia perceber sua presença.
O vento balançou as folhas das árvores ao redor, como se o próprio ambiente estivesse reagindo à presença dele. Alice deu um passo em direção a ele, sem pensar, mas quase foi atropelada por um carro que buzinou, mas ao voltar seu olhar para onde estava Hades, o homem desapareceu entre as árvores antes que ela pudesse se aproximar.
O coração de Alice batia forte, uma mistura de medo e curiosidade. Ela olhou para o lugar onde ele estava, mas ele não estava mais lá. O que significava aquilo? Hades estava solto, e ele parecia observar o mundo ao seu redor, sem saber o que fazer ou como agir. Enfim, ele percebeu que não era mais a mesma época que ele estava acostumado.
Alice sabia que algo muito maior estava em jogo e agora, mais do que nunca, ela precisava entender o que havia acontecido com Hades e o que ele queria. Mas ela também sabia que, se não tivesse cuidado, poderia se envolver em algo do qual não poderia mais escapar.
Alice não conseguia mais ignorar o que havia visto. A imagem de Hades, entre as árvores, ainda estava vívida em sua mente. A sensação de frio que tomara conta da cidade, o olhar profundo e distante dele, tudo aquilo parecia um aviso. Hades não estava mais preso — e, pior ainda, ele sabia que ela o havia visto. Ele estava perto, e ela precisava entender o que estava acontecendo.
Sem pensar duas vezes, Alice seguiu o caminho que ele havia tomado, voltando para a montanha onde o castelo se erguia imponente e sombrio. A cada passo que dava em direção àquele lugar, o ar parecia ficar mais denso e pesado. A floresta estava silenciosa, como se aguardasse algo.
Quando chegou à base da montanha, Alice se dirigiu diretamente à casa de Hanjun. Ele já a esperava, como se soubesse que ela voltaria. Hanjun estava de pé, com os braços cruzados, uma expressão de preocupação em seu rosto.
— Eu vi ele novamente — Alice disse, com a voz tensa e cheia de urgência. — Hades. Ele estava na cidade, observando as pessoas entre as árvores. Ele... ele está solto. O que está acontecendo?
Hanjun suspirou profundamente, como se estivesse esperando por esse momento, mas ao mesmo tempo, não quisesse que chegasse. Ele a conduziu para dentro da casa, e Alice sentiu a tensão no ar. Algo estava prestes a ser revelado.
— O terremoto... — Hanjun começou, com um olhar sério. — Ele enfraqueceu a cela. Aquelas paredes de gelo que mantinham Hades preso começaram a ceder. Depois de alguns dias, ele conseguiu se soltar. Eu sabia que isso poderia acontecer. Mas nunca imaginei que fosse tão cedo. Agora, ele está livre.
Alice o olhou, sem palavras. A gravidade das palavras de Hanjun parecia incompreensível, mas o medo em seus olhos era claro. Hanjun, que normalmente mantinha o controle da situação, agora estava visivelmente desconcertado.
— Eu tentei impedir, mas não havia muito o que fazer. Ele é mais forte do que qualquer um de nós pode imaginar. E agora... — Hanjun se calou por um momento, como se estivesse decidindo o que dizer. Então, ele a olhou diretamente, com uma expressão que misturava tristeza e resignação. — Agora, você precisa entender o que ele é.
Alice não sabia o que esperar. Ela sentiu um nó na garganta, mas não podia desviar o olhar. Ela precisava saber.
— Ninguém sabe ao certo o que ele é — Hanjun continuou, a voz mais suave. — Mas o que eu sei é que ele não é humano. Ele é... uma alma perturbada. Algo criado pelo sofrimento e pela escuridão. Nos registros da minha família, vai encontrar referências a ele como uma espécie de entidade vampírica, mas ele não é exatamente um vampiro. Ele se alimenta de sangue, mas também de desespero. Seu poder vem do sofrimento das pessoas ao seu redor. Quanto mais desesperadas as almas ao seu redor, mais forte ele se torna. Ele disse há alguns século atras para um de meus ancestrais que era um tipo de Senhor Lord Ancestral.
Alice ficou em silêncio, absorvendo cada palavra. Ela não conseguia imaginar o que era aquilo, o que Hades representava. Algo tão antigo, tão monstruoso, que até os registros mais antigos não conseguiam entender completamente.
— Ele não se limita a se alimentar de sangue — Hanjun prosseguiu. — Entre os muitos poderes que ele possui, ele tem a capacidade de assumir a forma de animais. Não apenas morcegos, como muitos acreditam, mas qualquer criatura. Sua força é sobre-humana, ele é incrivelmente rápido, e seus sentidos... seu olfato, sua audição, sua visão, são muito mais apurados do que os de qualquer ser humano. Ele consegue sentir a presença de qualquer um a quilômetros de distância. Ele pode se esconder na escuridão e atacar quando menos se espera.
Alice sentiu um arrepio percorrer sua espinha. O ser que ela havia visto, aquele olhar hipnotizante e aquele poder que ela sentira quando esteve perto dele, tudo fazia mais sentido agora. Mas o que mais a deixava angustiada era a ideia de que Hades era muito mais do que uma criatura à qual eles poderiam simplesmente se opor.
— Mas, Hanjun, o que... o que podemos fazer? Como podemos pará-lo? — Alice perguntou, com a voz cheia de medo e desespero.
Hanjun olhou para ela, e por um momento, ele pareceu hesitar. Então, ele respondeu, em tom grave:
— A única maneira de m***r Hades é destruir sua alma. Mas como fazer isso... isso ninguém sabe. Existem lendas, registros antigos que falam sobre isso, mas os detalhes estão perdidos no tempo. Meus antepassados tentaram diversas vezes, mas sempre falharam. E o pior... — ele se calou por um instante, como se tentando encontrar as palavras certas. — O pior é que, ao tentar destruir sua alma, você corre o risco de liberar um poder ainda maior. Hades não é apenas uma criatura que devemos temer. Ele carrega consigo uma maldição que pode consumir tudo ao seu redor. Ele às vezes tem ataques de raiva por causa de uma maldição que foi lançada nele o deixando ainda pior e mais sombrio.
Alice se sentiu paralisada pelas palavras de Hanjun. Ela havia começado a busca por respostas, mas agora sentia que havia se aprofundado ainda mais em um mistério perigoso, que talvez não tivesse solução. Como poderia destruir uma alma? Como poderia combater algo tão antigo e poderoso?
Ela sabia que não podia ficar parada, mas também não sabia qual seria o próximo passo. Ela olhou para Hanjun, que parecia tão perdido quanto ela, e finalmente perguntou, com a voz quase em um sussurro:
— Hanjun... o que vamos fazer agora?
Hanjun olhou para ela, e a tristeza em seu olhar era quase palpável.
— Não sei, Alice. Mas o que eu sei é que, se Hades continuar solto, ele não apenas vai destruir a nossa cidade. Ele vai destruir tudo. E a única forma de pará-lo... está em suas mãos.