Capítulo 9

1245 Palavras
Owen entrou no estacionamento e seguiu para o carro; Eva passaria a noite com os avós. Mas, ao entrar e dar partida, teve uma sensação estranha: não era muito tarde para que uma jovem andasse sozinha pela rua? De ônibus? Esperando numa esquina? Sentiu certa culpa por tê-la atrasado. Owen Walker queria acreditar que nada com cor de vida lhe importava, mas isso era uma mentira. Anna trocou de roupa e saiu pela porta lateral do prédio, a destinada ao pessoal. Despediu-se do segurança quando um carro preto parou bem na sua frente. Owen desceu e, só com o olhar, fez o segurança voltar para dentro imediatamente. — Por minha culpa você está saindo mais tarde. Pelo menos me permita te levar até sua casa — disse ele, abrindo a porta do carro. Hã? — Não é necessário… — Entra — ordenou. Ali parado, com a mão na porta, o rosto rígido e a postura dura… era quase cômico. Em vez de se assustar, ela apenas sorriu. Que diferente ele era de sua prima. Lali estava sempre animada, irradiava alegria, sorria e parecia dançar ao caminhar. Ele, ao contrário, era uma estátua de mármore: lustrosa, brilhante, porém imóvel. Outro sorriso surgiu no rosto dela. Algo o divertia? Ele estava acostumado a mulheres que o olhavam com a cabeça baixa, assustadas ou com olhos ardentes — mas nunca assim. Anna caminhou até o carro e entrou. — Obrigada — disse ela enquanto ele fechava a porta. Ela indicou em que parte da cidade morava, e Owen colocou o carro em movimento. Não falava, apenas dirigia, e embora Anna não se sentisse intimidada, também não dizia nada. Só lembrava do que Lali havia comentado sobre ele: que parecia de pedra, mas era um homem bom e afetuoso. Que sempre parecia irritado, mas com sua pequena Eva era um pai amoroso. — Desde quando você é amiga da minha prima? — perguntou ele de repente, sem tirar os olhos da rua. — Desde que comecei a universidade, nos conhecemos lá. — Você tem a idade dela. — Não, sou um pouco mais velha; comecei a estudar tarde. — Mmm. Num semáforo, ele a observou de relance. Estava diferente com aqueles jeans gastos, a bolsa no colo e a camisa azul. Com o cabelo solto e sem maquiagem, parecia muito simples. Não era de se admirar que Lali tivesse insistido tanto para que ele a empregasse — ela realmente precisava. Ao chegar ao prédio, Anna olhou para cima e viu que as luzes estavam apagadas; provavelmente Alex já estaria dormindo. E ela começava a sentir o peso de sempre voltar ao mesmo: deitar-se tarde para colocar tudo em ordem. Suspirou. — O que foi? — Nada, obrigada por me trazer. — De nada. Ela desceu; ele esperou até que ela entrasse, mas Anna girou sobre os calcanhares antes de abrir a porta e se despediu com a mão. Ele observou um pouco o prédio e os arredores; aquele lugar era de baixa renda, certamente o apartamento era minúsculo. Ela não era feia; ao contrário, era muito bonita em sua simplicidade. Tinha o cabelo longo, cacheado, levemente claro. Uma mulher assim, com um pouco mais de dinheiro investido, poderia virar cabeças. Por um segundo, ele se perguntou se ela teria habilidades para ser sua assistente, mas logo descartou a ideia: era amiga de sua prima e muito jovem. Conduziu de volta para casa inquieto; ela o tinha feito sentir algo estranho. Pelo visto, aquela mulher não tinha medo dele — embora também não o conhecesse o suficiente. Por um momento, esqueceu Elena e se concentrou nos sorrisos quase zombeteiros que Anna lhe havia dirigido. Fazia muito tempo que nenhuma mulher lhe sorria daquele jeito; até lhe pareceu uma ousadia. Owen havia deixado para trás qualquer calor que pudesse vir de um sorriso franco e sincero. Algo estranho aconteceu dentro dele, algo que acendeu no peito e subiu pela garganta, como um lagarto se esgueirando por uma parede. Por um instante, teve o impulso de seguir para o apartamento que possuía no centro da cidade, onde aconteciam seus encontros das nove. Parte de sua “boa vontade” para com as mulheres que dormiam com ele incluía disponibilizar aquele apartamento pelo tempo que durasse o acordo. A dama que aceitava as condições do trabalho podia morar ali, se quisesse. A que trabalhava atualmente para ele havia se instalado no local assim que Owen mencionou a possibilidade. Não era para menos: era um imóvel muito bem localizado em um dos condomínios mais exclusivos e elegantes da cidade. Um espaço amplo e finamente decorado, com todos os dispositivos possíveis fabricados ou programados pela sua empresa; com serviço de segurança 24 horas; uma piscina privativa na cobertura para os moradores; além de academia, spa e sala de jogos. Assim, se ele quisesse, a mulher estava disponível sempre que ele precisasse. Mas, apesar de seu conveniente distanciamento emocional, Owen mantinha certos limites “corretos”, dentro do que aquela situação representava. Por isso, simplesmente aparecer ali sem um encontro marcado estava fora de questão. Mesmo sendo sua propriedade, ele respeitava a privacidade de quem estivesse usando o lugar temporariamente. Seus “encontros” das nove seguiam sempre o mesmo padrão: ele chegava pontualmente, abria a porta e sua secretária já o aguardava na cama. Tirava a roupa aos poucos, sem dizer uma palavra; aquilo não exigia conversa. Ela cumpria seu segundo trabalho. Ele nunca havia forçado ou obrigado ninguém — isso não era o que o excitava. O que incendiava seu corpo era outra coisa: ele dominava, ele manipulava, ele decidia. E usava toda a intensidade que quisesse, tudo o que o desejo ordenasse. Quando ia embora, a mulher que ficava no apartamento permanecia com o cabelo desgrenhado e marcas das mãos e mordidas dele por todo o corpo. Como se tivesse levado uma surra — o corpo virava gelatina. O vigor e as exigências que ele impunha eram tão rigorosos e inflexíveis quanto os que exigia na empresa. Submetê-las: era só isso que ele precisava. Algumas não suportavam aquele ritmo e eram transferidas; outras, as que aguentavam, tornavam-se alvo de toda a fúria que ele acumulava e liberava quando as tinha. Às vezes, ouvia da boca delas palavras carinhosas ou declarações que Owen simplesmente ignorava; todas estavam dispostas por um único motivo: dinheiro. Porque todas, quando deixavam seus “deveres”, saíam com um cheque que resolvia dois anos de dificuldades. E, para Owen, todas eram como Elena. Por que se arriscar de novo? Assim era mais fácil: ele se desligava sentimentalmente de qualquer vestígio do passado e libertava seu monstro. Mas sua b***a e sua raiva só apareciam entre os lençóis. Se a mulher não estivesse disposta, ele se desculpava e ia embora. Mas, se estivesse — e seu apetite fosse voraz demais —, uma única palavra bastava para detê-lo. Ao que parecia, por baixo de toda aquela sujeira que manchava sua alma, ainda restavam vestígios de lucidez e consideração; ainda lembrava como ser um homem, e não apenas um animal. E aquela jovem — tão simples, tão comum — demonstrando coragem e sem baixar a cabeça, fez com que sua fera interna se movesse. Ela havia perturbado o seu sono e o monstro quis se espreguiçar e abrir os olhos, mas Owen o apaziguou, voltou a trancá-lo e simplesmente seguiu para casa. Durante todo o trajeto, apenas uma coisa ocupava sua mente: o sorriso honesto e cristalino de Anna.
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