Capítulo 04

3842 Palavras
Seguindo as instruções de Ramon, assim que o sol atravessou o quarto Elisie se levantou, arrumou a cama, organizou as enormes almofadas nela, transformando a cama num sofá largo e confortável, pois apesar de tudo precisavam manter as aparências. Por fim soltando o ar pela boca encarou o seu marido, observando-o respirar tranquilamente. Era bonito, admitiu indo para debaixo das cobertas da cama de casal. Os cabelos caiam sobre os olhos, estava pálido e gelado quando Elisie tocou-lhe a testa, os seus olhos desceram até os lábios bem desenhados e os únicos naquele rosto branco que parecia ter sangue circulando, era rosado e chamativo. Os dedos involuntariamente o tocaram, e puxada pela curiosidade de uma jovem ingênua abaixou-se lentamente e pousou a cabeça no peito do homem adormecido, queria ouvir o seu coração, todavia ela não conseguiu escutar nada, absolutamente nada. Ergueu a cabeça perplexa, olhou o rosto do marido, ele respirava, ela podia ouvir o som baixo da sua respiração, também podia ver o mover do seu peito impulsionado pelos pulmões trabalhando, mas o coração, esse parecia morto. Ele mexeu a boca e virou o rosto na direção dela, deixando-a hipnotizada por aquele rosto adorável, e esquecendo-se do macabro coração parado ela colocou os cabelos atrás da orelha e abaixou-se lentamente para sentir aqueles belos lábios junto aos seus. Alguém bateu na porta, os olhos dele se abriram assustadoramente rápidos, como se estivesse todo o tempo acordado e então se sentou, ignorando a existência de Elisie que dera um pulo para trás e fingia dormir escondida debaixo do cobertor branco. ― Entre. ― disse ele com a voz neutra, quase recuperada Elisie fingiu acordar, deu um bocejo forçado, esticou os braços e olhou para ele, depois para a mulher que entrou. ―Alteza, eu preparei o seu banho quente, devo encher a outra banheira agora? Para compartilharem o banho? ― tinham um tom significativo na sua voz. Dixon se levantou, abotoou os botões da camisa folgada de algodão e seguiu até a porta. ― Não, eu irei primeiro. ― e pela primeira vez naquela manhã encarou Elisie, iria perguntar se ela não se incomodaria, mas parou com os lábios entreabertos e enrugou as sobrancelhas antes de completar: ― Acho melhor ela ir depois, e prepare-lhe um banho bem quente. ― Por que bem quente? Nem faz frio agora. ― perguntou Elisie arrumando os cabelos embaraçados para evitar olhar nos olhos do Cordial. ― Seu rosto está vermelho, você deve estar febril. ― disse dando de ombro e sumiu pela porta. Elisie corou ainda mais e a serva antes de dar as costas e sair disse contendo o riso: ― Não se envergonhe, pois, a primeira vez sempre é desconcertante. ― e retirou-se, deixando a jovem ainda mais constrangida se escondendo debaixo dos lençóis. *** Elisie mordeu o lábio inferior, tentando decidir se apenas terminava o seu desjejum em silêncio ou iniciava uma conversa com o seu marido, que mastigava calmamente um pedaço de pão com doce de cereja. Coçou a garganta, ele nem sequer ergueu os olhos. ― Poderia explicar-me como devo ajudá-lo na administração? ― ele limpou o canto da boca com um guardanapo e finalmente a encarou. ― Faça o que quiser. Não é problema meu. ― Eu quero ser útil, não somente cuidar do castelo, organizar a lista de alimentos, e qual chá servir aos convidados. Deixe-me ajudá-lo com coisas importantes. ― Faça o que uma esposa tem que fazer, não se preocupe com problemas que não são de seu conhecimento. ― ela abaixou o olhar, e com muito esforço trocou o assunto: ― Meu marido, não sei o seu nome, só o conheço por Cordial e príncipe regente, não o seu nome de batismo. Qual o seu nome? ― Não interessa, e nem repita essa pergunta, chame-me alteza, como todos os outros. ― Ei!― gritou se levantando quando ele o fez. Mas arrependeu-se ao observar o seu olhar endurecer, ele bateu a colher no prato vazio, antes de repetir incrédulo: ― Ei? Pensei que a princesa de Margoth tinha mais educação, senhorita. ― aquilo foi à gota de água. Ela estava com o seu marido, não havia servos por perto, apenas os dois, ela podia falar como desejasse. ― Eu estou a sós com o meu marido, posso falar do modo que me agradar. Assim como tenho o direito de chamar o meu marido pelo nome. ― Presumo que você não leu o papel que Ramon lhe entregou para assinar. ― ele cruzou os braços, indiferente, ela fez o mesmo. Indignada. Seria errado jogar o prato de caldo nele? Ela circulou o dedo indicador ao redor do mesmo, ponderando se jogava ou não. ― É óbvio, devo manter segredo tudo o que eu ver e ouvir, mas isso não tem nada a ver com o modo como falo com o meu marido. Então, meu marido, tenha uma ótima indigestão. ― finalizou e saiu pela entrada dos serventes. ― Ok, me chame de meu marido, eu permito isso já que implorou. ― respondeu num grito indignado dando a última palavra, e contendo a respiração forçada pela dor tomou a saída do lado oposto. Ramon pendurado na porta não se deu ao trabalho de disfarçar, quando um Dixon passou por elas fazendo careta. ― Ei? Ouviu isso? Quem na sua sã consciência me trata deste modo? Ei? Eu sou um cachorro? ― sibilou para Ramon que revirou os olhos discretamente. ― Ela é sua esposa, acostume-se. Ninguém jamais falou à vontade com vossa alteza. Eu, por exemplo, sempre manteve certo espaço entre nós, bem... às vezes. Mas percebo que cometi um erro em ensiná-lo a somente ser tratado como superior, nem sempre vossa alteza será aquele no topo. É necessário aprender a se curvar em certas ocasiões e erguer-se em outras. ― Ela é superior a mim? É isso que quer dizer? ― Não, quero dizer que ela é útil para nos. Quando começará a seduzi-la? ― Já que não tenho alternativa e você nunca mudará de ideia, começarei amanhã. ― Sabe o que fazer?― O príncipe passou as mãos nos cabelos e fitou com o seu olhar de vitória o servo. ― Sei exatamente o que fazer. Foi o que pensou antes de ver o seu plano falhar miseravelmente ao notar que a sua esposa caminhava ao seu lado, silenciosa e distante, ignorando os seus esforços inúteis de tentar seduzi-la. Coçou a garganta e soltando o ar tentou puxar assunto: ― Gosta de bodes, senhorita? ― ela olhou mais distante o bode que a encarava, e deu um passo na sua direção, por sorte a corda que o prendia não era comprida o suficiente para alcançá-los, ela meneou a cabeça, e voltou a sua atenção para ele, um vinco formou-se entre as suas sobrancelhas, antes de dizer indiferente: ― Não, presumo que não me dou bem com animais com chifres. ― Dixon assentiu, devia ter formulado as perguntas antes de convidá-la para um passeio ao redor do campo. Como ele fora t**o ao pensar que alguém como ele, que passará tanto tempo desfrutando da própria companhia saberia entreter uma jovem com diálogos menos... estranhos. ― Interessante... ― resmungou, devia matá-la, jogar o corpo em alguma moita e voltar a sua vida tranquila e nem um pouco difícil? Bem, ele já estava acostumado ao monstro parasita, e as mortes brutais, aquilo apesar de causar-lhe pesadelos era o preso a pagar para continuar vivo. Ele bocejou quando alcançaram uma árvore de galhos retorcidos e folhas como cortinas verdes dançantes. Por que seduzir uma moça era tão perturbador? Ramon deu a entender que seria fácil e rápido. Fechou os olhos, e ao reabrir os pousou em Elisie ainda distraída olhando o horizonte. ― Algo a preocupa? ― Temo que este mês não receba as minhas correspondências. ― revelou, desejava saber o que o seu amigo escrevera dessa vez, encolheu os ombros, devia contar ao seu marido que trocava cartas com um estranho há dois anos? Ou ocultar isso pelos próximos cinquenta anos? ― Não se preocupe, mandarei um dos nossos falcões para buscar as suas correspondências em Margoth. ― por breves segundos Dixon pensou ter visto um brilho reluzir nos olhos dela, quando o encarou sorridente, e por mais incomum que tenha sido isso fez o seu coração dar um pulo, ou talvez tenha sido Gomon. Foram interrompidos da “quase conversa agradável” por um pajem atrapalhado que não parava de olhar para os próprios pés. O Cordial reajustou a postura e com a voz grossa perguntou o que o garoto queria, sem erguer a cabeça ele respondeu gaguejando: ― Um... um problema na- na entrada da cidade, a-alteza. ― O que é dessa vez? ― Não sei de muito, só sei que tem uns doze homens armados gritando com toda a força, os guardas da cidade não conseguem para-los. ― Vá ao castelo e avise Ramon, diga também que prepare os cavalos. ― ordenou jogando algumas moedas ao garoto que girou nos calcanhares e correu de volta ao castelo. Elisie enroscou o braço ao redor do dele, ele endureceu o maxilar sentindo algo estranho no peito. ― Alteza, eles devem ser saqueadores, não devia ir, mande alguns guardas. ― Aprenda uma coisa, princesa, eu não tenho medo dos homens. ― desprendendo o seu braço do dela saiu apressado para o castelo. Nem um pouco irritada ela correu até ele e com ousadia pediu: ― Então posso ir com você? ― O que vai acontecer lá não será bonito. Nem coisa que uma dama deva ver. ― Eu sou a esposa do Cordial, devo acostumar-me e conhecer quem você realmente é. ― ele observou o rosto jovial dela, tentava parecer corajosa, como todas as outras foram. Aquilo não era coragem, era estupidez. ― Como nas histórias? ― ela ajeitou as luvas antes de responder: ― Isso só eu posso decidir. *** Na entrada dos portões, uma multidão de cavalheiros observava a briga entre os guardas e o que pareciam ser saqueadores sem um pingo de temor, todavia ao chegar perto o bastante, não passava de um único homem alterado e violento. Elisie soltou um suspiro trêmulo assim que Dixon saltou do cavalo, e dirigiu-se a multidão, sem a mínima consideração de ajudá-la a descer do animal. Bufou e saltou desajeitada. ― Ai está!― gritou o homem no centro segurando uma faca de açougueiro. A suas feições estavam contorcidas e vermelhas de irá. Havia sangue espalhado nas suas roupas, e hematomas arroxeados ao redor dos olhos ― Era com você que eu queria falar. ― apontou a faca para Dixon que continuou se aproximando, sem hesitação, os passos firmes seguiam até o homem possesso. Todos os curiosos que encaravam o homem revoltado, finalmente notaram a presença do príncipe caminhando com postura, a cabeça carregando a coroa prateada que tanto odiava e a mão na espada maldita, que infelizmente era obrigado a usar, em espanto todos se afastaram dele e curvaram-se. ― Que audácia, você e todos aqui devem se dirigir a mim como vossa alteza, não você. Nos nós conhecemos o suficiente para tal i********e? Ou melhor, somos parentes consanguíneos? Você é por acaso rei? Ou um deus? ― perguntou desviando da cabeça de um guarda abatido. O homem riu sem humor e num passo rápido chegou perto de Dixon apontando a faca diretamente no seu pescoço. ― Elisie arfou, e alguns guardas fizeram menção de se aproximar, mas Dixon os parou com um aceno. Fitou os olhos vermelhos do homem e perguntou com aquela voz glacial: ― O que quer? ― O que eu quero? Justiça, o que parece nunca acontecer nesse lugar. ― Cordial olhou em volta, parecendo finalmente perceber o corpo dilacerado de uma dama, e em prantos ao lado dela uma mulher roliça. Ele conhecia aquelas marcas, o estado n***o quase queimado dos lábios dela, o peito aberto... Gomon. Atordoado, Dixon levou a mão ao peito que palpitou pelo puxão das correntes, as imagens surgiram como fortes bombardeios de luz nos seus olhos. Gomon após devorar aquela vida chorou? Ou fora ele próprio? Não, não podia ser; ele não se lembrava de quando Gomon matou aquela moça, além disso, ele não conseguia chorar por nada. O frio da faca tocou o seu pescoço o trazendo de volta ao presente. ― O que foi? Nunca viu um corpo dilacerado antes? Ou a mordomia do castelo tenha-lhe deixado frouxo? ― O que aconteceu? E tire essa porcaria do meu pescoço se ainda quiser essa mão. ― sibilou sentindo um ardor no local pressionado. O homem não se moveu, os olhos tornaram-se ainda mais furiosos. ― Um monstro matou a minha filha, e eu sei quem foi. ― ele aproximou a boca do ouvido de Dixon e sussurrou: ― Talvez eu me tenha precipitado, ou foi à escuridão, ou até mesmo a cerveja que eu tomei, mas era você. De alguma forma era você, alteza. ― os seus instintos gritaram para matá-lo, e Gomon rastejando por seu corpo gritava mate-o... Mate-o com as minhas garras... precisa matá-lo... Mas ele não podia arriscar fazer algo precipitado, havia muitas testemunhas. Então sorriu encarando os olhos daquele homem. ― Pobre homem, a perda da filha o fez delirar. Para expressar os meus sentimentos... ― obrigou-se a fazer uma pausa para engolir em seco, era desconfortável falar sobre sentimentos, os humanos sempre faziam parecer importante, mas para ele não passava de dor, a mais pura e agonizante dor. ― Irei pagar uma quantia grande para ir para outro reino ou continente. E irei acompanhá-lo, ainda hoje você e a sua família estará longe daqui. ― o homem descrente semicerrou os olhos, eles sempre baixavam as suas resistências quando se tratava de dinheiro, e ele não foi diferente. ― Quero o bastante para enterrar a minha filha em um lugar distante daqui. ― Prometo, tanto ela como você e a sua esposa vão ficar bem longes daqui. ― Dixon sussurrou no ouvido de um dos seus guardas mandando-o trazer uma carruagem para o casal e uma carroça para pôr o corpo. Horas mais tarde o homem orgulhoso da sua façanha abraçava a sua esposa em prantos na luxuosa carruagem. Atrás deles os seguindo como se fossem pessoas de alta importância o príncipe acompanhado da sua princesa e sete guardas de confiança. Elisie abriu a boca para minimizar aquele silêncio sombrio, mas a fechou assim que dobraram na curva da estrada dando de cara num penhasco, ela apertou o ombro do guarda. A estrada era estreita, podia-se ver o fundo do que parecia a entrada do inferno, e para seu desespero todos pararam. ― Por que paramos? ― perguntou ela, o guarda saltou e a ajudou descer antes de puxar a espada. ― Vamos terminar essa bagunça. ― disse ele fazendo menção de seguir os demais, ela parou-o. ― O quê? Vão matá-los? Por quê? ― Ele matou os guardas do príncipe. Não há perdão por m***r aqueles que protegem o Cordial. ― Elisie se virou para Dixon que se aproximava da carruagem. ― Alteza! ― gritou e desviando do guarda puxou-o pelo braço. ― Não faça isso, por favor, ele estava desesperado... Ele perdeu a filha... ― sua voz suplicante não causou sequer um tremor no olhar frio do Cordial. ― Você não queria conhecer-me? Agora querida, aprecie quem o seu marido é. ― disse se virando, o homem e a esposa foram arrastados para fora. ― P-por favor... t-tenha p-piedade, deixe-me ir. ― Você não teve piedade dos meus... Isso é a justiça pelos meus. ― disse analisando o lugar. Fazia quase um mês que ele não botava os pés ali, algumas plantas nasceram na estrada, e mais urubus se juntavam aos demais, no fundo do penhasco. A mulher remexeu-se e conseguiu se soltar. Que lástima pensou Dixon, ele cogitou a ideia de deixá-la livre se permanecesse quieta, tirando de algum lugar uma pequena faca a jogou sem se virar para mirar o alvo que caiu urrando de dor com a faca no meio das costas. Elisie gritou. ― P-por fa-favor alteza, e-eu –eu… estava fora de mim, não quis ameaçá-lo. Vo-vossa alteza j-jamais m-ma-chucaria... ― Dixon se aproximou um pouco mais do homem, e repetiu o gesto de horas atrás, aproximou a boca do ouvido dele e sussurrou: ― Maldita hora em que você me viu, ou melhor, começou toda essa bagunça, e eu odeio bagunça, causa-me muita dor, e você não imagina o quanto... ― o homem tremia como as ondas em dia de tempestade. ―N-n-não, n-não era vossa a-alteza... ― Cordial ergueu outra pequena faca e levava de encontro à barriga do homem quando ele revelou aos tropeços: ― T-tinhaolhosazuis. ― a confusão nublou as feições inabaláveis do Cordial que abaixou a faca e com a outra mão apertou o queixo do homem para encará-lo. ― O que disse? ― C-contarei se m-me deixar viver. ― Cordial fez um aceno positivo e os guardas soltaram o homem, que caiu quase deslizando para o fundo do penhasco. ― Diga! ― O-o h-homem tinha olhos azuis e cabelos p-pretos. ― Só isso? A sua vida vale apenas isso? Não é de nenhuma utilidade para mim. Lamento. ― Deixe-me ir... prometo nunca mais voltar. Mate-o... mate-o ou ele colocará a nossa vida em risco... Use as minhas garras... as minhas garras... eu permito... Então Dixon ouviu um grito, virou dando de cara com uma Elisie pálida se contorcendo nos braços de um guarda que tentava impedi-la de fugir ou de se aproximar. Um instante de distração foi o bastante para que o homem puxasse a faca e a enfiasse na barriga de Dixon. Que rosnou e o ergueu pelo pescoço, as mãos tornando-se garras pontudas partiram o homem ao meio. Por fim, o príncipe jogou o corpo inerte no penhasco, e limpando as mãos no vestido da mulher ergueu os olhos. Elisie com o olhar queimando de algo que ele vira muitas vezes nos olhos das vítimas de Gomon. Ela iria fugir, como todos os outros, e se fosse tola o suficiente correria para pedir ajuda e contaria o seu segredo, mas ela não era tola, sabia que se abrisse a boca Jhonattas Allen seria morto, e nunca mais veria a feroz rainha plebéia. Elisie por fim soltou-se, correndo para dentro da mata. Só queria manter-se longe daquilo. Ele soltou um suspiro de exaustão e relutante seguiu a sua esposa. Corria segurando as saias, as lágrimas de desespero lhe cobrindo a face, então era esse o segredo que ela prometera guardar? Foi por isso que redigiram um documento para que ela o assinasse, eles queriam o seu silêncio. Era obvio, ele era um assassino. Mas o que era aquelas mãos? Confusa e com o coração pulsando como louco no peito Elisie corria pela mata adentro. Até ser lançada para baixo em um empurrão. ― Finalmente a sós, querida. ― disse à voz que há muito tempo ouvira num lugar como esse, a voz do bruxo. E como o seu pai previu, ela estava sozinha, sem ninguém para protegê-la. Ele usava uma capa desbotada para cobrir as belas feições, tinha olhos castanhos claros contrastando com a sua pele bem bronzeada. O pânico deu lugar à admiração e a um leve rubor ao notar que ele estava com o peito nu, exibindo a pele brilhante e cheia de depressões. Ele sorriu e abaixou o capuz, exibindo enormes cachos perfeitos, então Elisie viu a mão, as unhas negras como o fundo de um poço ao anoitecer com as nuvens cobrindo a lua. Eram pontudas, não como as que ela viu minutos atrás, essas eram tortas, deformadas e apodrecidas, como raízes profundas de árvores mortas no pântano; eram as unhas de um bruxo mergulhado nas trevas. O medo voltou, ele pareceu decepcionado ao notar que ela o temia e aproximou-se. ― Meu amor, não me olhe assim. Você me ama, assim como eu a amo. Deixe-me sentir o seu gosto, tocar os seus s***s róseos e aconchegar-me nesse seu corpo quente ― os olhos dela se arregalaram à medida que ele retirava o casaco. ― Deixe-me em paz, eu m*l o conheço. ― gritou se levantando, o pé esquerdo latejava. Ele não gostou de seu tom, e furioso acertou um t**a em seu rosto e a jogou no chão, caindo por cima dela. As mãos foram ágeis em rasgar os muitos tecidos do vestido. ― Você me ama, eu vou provar-lhe isso, não ama aquele príncipe amaldiçoado, eu ainda sinto o seu perfume, e é tão bom... deixe-me compartilhar dele com você.― murmurava mergulhando o rosto no pescoço e no vão entre os seus s***s. Ela tentava gritar, chutá-lo, mas era ferida pelas unhas. Ele mordeu-lhe o ombro, Elisie fechou os olhos com força, as lágrimas descendo incessantes, e como se os deuses tivessem ouvido a sua prece silenciosa o bruxo foi puxado para longe dela que soltando um grito encolheu-se trêmula. Sons de luta e garras e urros eram ouvidos, contudo, ela não queria ver. Até um grito de dor familiar penetrar no seu casulo de medo: seu marido... Levantou à cabeça, ele sangrava na barriga e nos braços, o bruxo estava colado a uma árvore, o rosto carregando um enorme e horrendo corte que ia até o canto direito da testa passando pelo olho, pelo nariz e bem no cantinho do lábio até o maxilar esquerdo. Eles se olhavam com fúria. ― O que você quer? Ela não é sua... Sempre foi minha, eu conheci-a primeiro, seu amaldiçoado imundo. ― Dixon iria avançar, mas a dor no peito foi intensa o fazendo cair de joelhos. O bruxo aproveitou para atacar, Elisie foi rápida e agarrando uma pedra jogou contra ele, acertando o peito musculoso. Seu olhar foi de incredulidade, decepção e algo parecido com mágoa. ― Sua ingrata, eu te amo tanto e o que você faz? Se junta com esse inútil. ― Ele moveu-se para alcançá-la, mas Dixon o segurou pela canela. ― Solte-me, seu lixo. Vou fazer você matá-la, assim como Mercúrio matou a sua mãe. ― Vociferou dando vários chutes no rosto do Cordial que caiu sem energia na terra úmida. Elisie engoliu em seco, os seus pés não respondiam aos comandos desesperados que o seu cérebro lhe gritava. Ela prendeu a respiração quando os olhos raivosos dele alcançaram-lhe e como se tivessem colados ela não conseguia desviar. ― Quando se passar dois minutos diga Dixon, bem alto, ouviu-me?― ela assentiu sem piscar, ele sorriu como se lamentasse, deu-lhe um beijo na testa e sumiu como um vulto. Elisie caiu perplexa no chão, e olhando em volta para se certificar que a criatura fora embora, se aproximou do marido que abriu os olhos, fitando-a. ― Fuja... fuja por favor...Elisie. ― Não vou deixá-lo ― Vá, você preci... ― tossiu, a dor no peito parecia querer matá-lo. E então involuntariamente o nome saiu dos lábios dela. A dor ficou mais forte, Dixon se levantou e a empurrou com força. ― Você precisa sumir. ― berrou vendo-a ser arremessada contra uma árvore. Mas era tarde demais.
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