— Teve algum problema hoje?
O ômega estava novamente sentado no sofá, dessa vez via um programa de culinária ao qual parecia muito interessado. O alfa sempre chegava da mesma maneira, mas sempre em horários diferentes, às vezes mais cedo e às vezes mais tarde, mas o novo ocupante daquela casa já estava começando a se acostumar com aquilo. Jongin tinha uma vida agitada e cansativa, mas ele sempre buscava tempo para lhe dar atenção.
— Não, foi tudo bem. — O respondeu com um pequeno sorriso no rosto — E com você?
— Nenhum problema que eu não pudesse resolver.
Jongin jogou-se no sofá bem perto de onde o menor estava, passou alguns segundos olhando para a TV e se perguntando o que havia de tão interessante em ver uma senhora de idade avançada cozinhando enquanto conversava com um passarinho de borracha, era até engraçado de se ver, talvez o ômega assistisse para ficar rindo do pássaro de borracha, ou simplesmente porque não sabia procurar um canal mais interessante.
— Quer que eu coloque alguma coisa legal pra você assistir?
— Não precisa. — o ômega logo respondeu — Eu gosto disso.
Jongin se ajeitou no sofá, ficou pensativo. Queria acreditar que aquele ômega era um jovem estudante de gastronomia que vivia uma vida tranquila e sem maiores emoções, queria acreditar que ele só tinha passado por um momento complicado antes de sofrer aquele acidente. Mas já estava mais do que obvio que não era apenas isto, que havia acontecido várias coisas ruins com ele, coisas estas que não fariam bem lembrar.
Ele precisava descobrir o que havia acontecido, e acima de tudo, precisava se certificar de que o ômega não fosse se lembrar de nada, pelo menos, não enquanto ainda não estivesse pronto para isso.
— O que quer para o jantar?
— O que você quiser comer para mim já está bom. — de todas as formas, não conhecia muitas opções, ele sempre acabava dizendo que queria pizza, e talvez Jongin já estivesse começando a enjoar — Tentei cozinhar alguma coisa, mas não tem todos os ingredientes no armário.
Realmente, o armário estava vazio, ele nunca se importou muito com isso, mas precisava se reorganizar, afinal, tinha alguém ali agora, e esse alguém precisava de comida, não podia ficar sempre esperando ele chegar para poder comer, ele podia sentir fome em outros horários. Sabia que se fosse pelo ômega, ele nunca reclamaria de nada.
— Então acho melhor irmos a um supermercado. — Jongin se ergueu do sofá, se espreguiçava e seus ossos estavam estralando, passou quase o dia inteiro sentado analisando exames e mais exames — Vou tomar um banho e depois trocar as suas ataduras, você pode ir pensando nas coisas que vai precisar, podemos comprar os ingredientes que faltam para o que você queria cozinhar.
— Tudo bem.
— Eu tenho um amigo que trabalha no setor de desaparecidos da polícia. — o alfa informou — Ele me pediu uma foto sua para comparar com a de outros desaparecidos. Tudo bem se eu te fotografar?
— Ah, não... não tem problema.
O menor ficou o olhando enquanto esperava pela tal foto, Jongin ligou a câmera do celular e apontou para o rosto meio perdido do ômega, que não sabia ao certo como ficar para aquela foto, parecia até mesmo estar desconfortável com aquilo, mas animado com a possibilidade de que isso fosse o ajudar a descobrir seu passado, ou pelo menos, seu nome, se tinha algum parente procurando por ele.
— Ótimo, vou enviar pra ele.
— Eu posso ver a minha foto?
Jongin não entendeu o motivo dele estar tão animado para ver aquela foto, mas lhe entregou o celular para que visse aquela imagem. Ele parecia feliz em se ver em uma foto, ficou um bom tempo a olhando, um pequeno sorriso brotou nos cantos da boca, mas sumiu poucos segundos depois.
— Conseguiu ver o quanto você é bonito? — fora uma pergunta inocente, mas o ômega ficou nervoso — Acho melhor eu ir logo para o banho.
Jongin tentou não demorar muito no banho, imaginava que seu hóspede estava faminto e se sentia m*l por ser desleixado a esse ponto. Se vestiu da maneira simples que preferia se vestir, a maior parte de suas roupas eram em cores únicas, sem muitos detalhes, não gostava de usar coisas chamativas, chamar atenção era uma coisa que não combinava com sua personalidade calma, e não era como se tivesse muito tempo para ficar passeando em lojas e montando combinações legais.
Quando voltou para a sala, viu o menor com um caderninho e uma caneta, fazendo uma espécie de lista e ele parecia muito concentrado nisso. Se aproximou para olhar aquilo e logo pôde notar que a caligrafia do ômega parecia meio infantil, ela era desajeitada e difícil de entender, e ele também escrevia devagar, como se não soubesse direito, também notou que muitas palavras estavam escritas erradas. Talvez ele não tivesse muito estudo, fosse um garoto rebelde que deixou a escola.
Ou que foi tirado dela.
— Vamos trocar as ataduras?
O menor assentiu com a cabeça e deixou a lista para depois, logo se sentou na mesma posição que sempre se sentava para que o médico trocasse suas ataduras, já estava começando a se sentir acostumado com aquilo, quase não sentia mais tanta vergonha em ter que subir suas roupas para isso.
Aproveitando que o outro estava distraído em seus próprios pensamentos, Jongin conseguiu fotografar as feridas em suas costas, mandaria para o mesmo amigo que trabalhava na polícia, a fim de que ele soubesse detalhadamente o que aquilo poderia significar. Ele sabia o que havia feito aquilo, mas alguém de dentro da polícia poderia identificar algum padrão talvez feito por algum criminoso conhecido. Ele torcia para que no fim tudo fosse um engano seu, mesmo sabendo que não era.
— Pronto.
O ômega ajeitou as roupas.
— Agora vamos, já está ficando tarde.
Não havia saído do apartamento desde que chegou, desta vez eles desceram as escadas, ainda sentia um pouco de dor e Jongin o segurou delicadamente pelo braço enquanto desciam para dar apoio. O supermercado não ficava muito longe, mas preferiu usar o carro, pois seria cansativo demais para o ômega ir andando.
Ele era do tipo que ficava quieto, mas observava tudo durante todo o caminho, e era impossível que o médico não prestasse atenção nesse detalhe, era impossível que não prestasse atenção em absolutamente tudo o que ele fazia, queria entender mais daquele rapaz.
— Vamos pegar um carrinho bem grande, vamos aproveitar e levar tudo o que está faltando em casa.
Depois de estacionar o carro, o alfa caminhou com o menor até onde ficavam os carrinhos e saiu empurrando o maior que encontrou. O ômega parecia encantado com o lado de dentro do lugar, que era bem iluminado e cheio de coisas bonitas, o rapaz olhava tudo como se fosse a sua primeira vez em um lugar como aquele, ou que pelo menos, fazia muito tempo que não entrava em um.
— Podemos ir passeando pelos corredores, o que achar de comestível pode ir jogando no carrinho.
Obviamente que o ômega não estava pegando quase nada, e tudo o que pegava esperava uma autorização, demorou até que começasse a simplesmente pegar o que queria e colocar no carrinho. Depois de um certo tempo, o alfa não estava mais olhando para as prateleiras, ele havia preferido olhar o jeitinho meio infantil que o ômega olhava para as caixas de cereal, e como ele parecia fofo quando tentava alcançar algo em uma prateleira mais alta e não conseguia, um biquinho inconformado sempre surgia em seus lábios.
— Tem uma degustação de chocolate bem ali, por que você não vai experimentar um pedaço?
Uma moça estava parada com uma pequena bandeja, o ômega acabou indo até ela, mesmo meio receoso quanto a como deveria dizer que queria um pedaço, ele sequer sabia como funcionava uma degustação. Mas a moça sorriu e lhe ofereceu um pedaço, que foi aceito de uma maneira muito feliz.
E ele parecia ter gostado muito.
— Hum... Isso é muito bom! — não sentiu vergonha quando elogiou, era como se tivesse comido a melhor coisa do mundo — Posso pegar mais um pedacinho?
— Claro. — logo a moça lhe entendeu mais um em um guardanapo — Inclusive, estamos com um estoque novo de diversos tipos de chocolate, temos do ao leite até o mais amargo, não quer dar uma olhada? Pode provar antes de levar.
— Eu não sei se posso.
Eles não pareciam ser baratos. Mas Jongin surgiu em suas costas, curioso quanto ao que ele tanto conversava com aquela moça, aquele ômega não parecia ser muito aberto para qualquer tipo de aproximação, mas ele parecia estar bem com ela, e isso era bom.
— Pode experimentar. — o alfa disse, quase o assustou, pois não havia percebido sua aproximação — Pode ficar com o que mais gostar, só não coma muito para não se sentir m*l. Vou estar na sessão dos frios, é só seguir as placas.
E tão cedo ele seguiu caminho com o carrinho de compras ainda meio vago.
— Seu namorado parece ser muito legal com você. — ouviu o comentário da funcionária do supermercado, ela estava sorrindo — Queria ter essa sorte.
O ômega pareceu ficar sem jeito com o que ela havia dito, mais sem jeito ainda de dizer que ele não era seu namorado, não saberia como explicar que ele era na verdade seu médico, que estava sendo acolhido na casa dele por ter perdido sua memórias, qualquer coisa que dissesse acarretaria em várias perguntas, perguntas estas que ele não se sentia à vontade para responder, e diante disto, limitou-se a apenas dizer:
— O Jongin é um cara legal... eu tenho sorte de ter ele.
E isso era verdade. Talvez não fosse o momento certo para refletir sobre aquilo, mas ele era realmente um ômega de sorte por ter encontrado aquele médico, ou melhor, ter sido encontrado por ele. Claro que sentia que havia alguma coisa errada, que Jongin estava escondendo alguma coisa, já passara a notar que ele não estava mais tentando instigar suas lembranças, não fazia mais nenhuma pergunta sobre nada, desviava do assunto até.
Quase como se o alfa não quisesse mais que ele lembrasse.
Acabou ficando com o chocolate ao leite, e descobrindo que não gostava de chocolate branco. Tentou encontrar o setor de frios, mas não sabia para onde ir, também não estava conseguindo ler as placas direito, elas estavam muito altas e sua vista era embaçada. Não sabia a quem deveria pedir alguma informação e acabou andando de um lado para o outro sem ter noção do que fazer.
Depois de longos minutos procurando pelo alfa, ele percebeu que estava perdido e sentiu medo, sequer conseguia encontrar a saída para ir até o carro, as prateleiras pareciam estar ficando maiores e maiores, estava começando a se sentir desesperado e a querer chorar. Ele queria chorar. Estava quase se encolhendo no chão quando uma mão tocou seu braço, se virou abruptamente para ver o que estava acontecendo, mas seus olhos assustados cruzaram os olhos confusos de alguém já bastante conhecido e ele parou com a ideia de sair correndo.
— Jongin!
— Eu estava te procurando. — o alfa disse — Estava chorando?
— Eu não achava você. — ele disse — E... e fiquei com medo de não o encontrar mais.
O ômega estava muito nervoso, e devido a isso achou ser melhor que o abraçasse até o acalmar, e foi o que fez. Ele ainda tremia enquanto era abraçado, mas aos poucos começava a se sentir mais seguro. Não sabia o motivo de ter ficado tão desesperado, mas a ideia de ficar sozinho novamente parecia ser a pior do mundo, ele não queria ter que ficar só, ele não queria ter que ficar longe de Jongin.
Precisava dele.
Só se sentia seguro com ele.
— Pensei em te chamar pelos autofalantes, mas você não tem um nome. — o disse, ainda o abraçava — É isso, precisamos te dar um nome o mais rápido possível. Só vamos terminar as compras e em casa nós escolhemos um nome para você.
Não respondeu com palavras, mas mexeu a cabeça concordando.
Jongin não ficou mais do que dois metros distante do menor, não tirou os olhos dele em nenhum momento, se fosse possível amarraria um lacinho em sua camisa para que não fosse muito longe. E de todas as formas, o ômega agora estava muito quieto, provavelmente com medo de acabar se perdendo de novo. Quieto ao ponto do alfa se perguntar o que poderia estar passando por sua cabeça agora.
— Quer mais alguma coisa?
— Não.
— Não fica fazendo essa cara, foi só um susto.
Mas o menor apenas balançou a cabeça, não era uma resposta muito boa, pensaria em algo que pudesse o alegrar assim que chegassem em casa.
Demoraram um pouco na fila do caixa, mas não o suficiente para se irritar. O mais demorado fora colocar tudo no porta-malas do carro, Jongin acabou rasgando acidentalmente uma das embalagens de farinha e se sujado, teria ficado irritado em outras ocasiões, mas ficou feliz ao ver que o ômega havia rido com aquela situação, aproveitou para o sujar também e descontrair ainda mais aquela situação. Logo tudo parecia estar bem de novo, sem susto nenhum.
Ainda demorara mais para subir com tudo, mesmo usando o elevador, o menor estava carregando apenas uma sacolinha pequena, e mesmo assim a carregava como se fosse a coisa mais pesada do mundo, o que chegava a ser engraçado. Quando tudo já estava no apartamento, já eram 10h da noite, se começasse a cozinhar agora, era provável que jantassem de madrugada.
— Podemos usar a lasanha de micro-ondas e fingir que tivemos uma refeição incrível e bem preparada. — o alfa sugeriu enquanto sacudia o pacote com a lasanha congelada.
— Sou obrigado a concordar.
Logo o mais velho a colocou no micro-ondas, iria demorar um pouco, tempo perfeito para pesquisarem um nome para o ômega, que necessitava urgentemente de um. Pegou o notebook para ajudar com as pesquisas, seria bem melhor para ver muitas coisas ao mesmo tempo.
Era engraçado, pois era parecido com escolher o nome de um bebê.
E fora difícil escolher um, eram muitas opções que pareciam muito boas e o ômega era bastante indeciso, precisava ser um bom nome, afinal iria usá-lo por um tempo que sequer podia calcular, pois chegar a ser anos, ou talvez pela vida toda. Ele não sabia.
— Acho melhor você escolher um nome para mim. — ele disse em algum momento — É, eu quero que você me dê um nome, Jongin.
O alfa ficara muito surpreso com aquilo, mas ficou pensativo por um longo tempo, milhares nomes estavam se passando por sua cabeça naquele momento. Ele então fechou os olhos, para logo em seguida os abrir e olhar diretamente para o rosto do menor, esperando que o nome certo viesse para dentro de sua cabeça.
— Kyungsoo, eu vou te chamar de Kyungsoo.