Frustração.

2227 Palavras
Ravana Chegamos ao Club Villino. Deixamos a via Provinciale Masoroffa e entramos na rua de acesso. O lugar é feio de desgraçar, isso porque é de noite; nem quero imaginar como deve ser durante o dia. A estrada pela qual adentramos é pequena; acredito que não dá para dois automóveis circularem ao mesmo tempo. Subimos, passamos por imóveis ao longo do caminho, que não são muitos. Logo na entrada, há uma residência; depois de um lote vazio à esquerda, tem outra. O asfalto possui alguns buracos, e Gio consegue a façanha de passar com os pneus do carro em dois. Simplesmente saiu de um e caiu em outro. _ Cazzo! Essa é a estrada do novo Club, boate ou sei lá mais o quê? Fico imaginando a merda que deve ser esse lugar! - profiro, irritada com o garoto. _ Isso importa para você, fofa? Acredito que não. O que a lindeza quer é a língua do Alessio dentro da sua boca e em outras partes do corpo, não é mesmo? - diz o menino, e eu olho para ele enfesada. _ _ Giovanni! Que mente suja! - brada Vitória, cuja voz não contém nenhum pouco de espanto e sim sinais de um riso que tenta inutilmente disfarçar. _ Mente suja uma p***a! Pensa que o garoto quer ficar só nos beijinhos e os hormônios não vão cantar para subir no momento em que ele der aquela encoxada da Ravana? - indaga, acelerando para chegarmos logo ao local. Entramos no estacionamento. Pelo vidro da janela, vejo o movimento do local: casais chegando e algumas pessoas solteiras circulando, que estão indo à caça. A pegação é evidente, rolando solta, logo na entrada. Procuro por rostos conhecidos, mas não encontro ninguém. Penso que estão na parte interna da boate ou que ninguém chegou ainda. Sinto um frio no pé da barriga e algumas cólicas de nervoso. Descemos do carro, eu com meu r**o que não passa uma agulha. Portando uma identidade falsa, onde consta que sou maior de idade, uma maquiagem pesada para me dar o ar de que tenho alguns anos a mais e a coragem farquejando dentro do meu ser. _ Engulo o nervosismo, coloco um carão de poderosa e de extrema confiança para ninguém suspeitar que duas menores de idade estão entrando em um local proibido para as suas faixas etárias. Gio se impõe, mas parece um guarda-roupa, pega a minha mão; andamos juntos para a porta de entrada do local. Meu sangue gela quando um segurança nos barra. _ Ciao, Daniele, não reconhece os amigos? - me assusto com as palavras que saem da boca do meu amigo, tentando disfarçar. _ Giovanni?! - o segurança diz piscando várias vezes - Caramba! Como você mudou, fratello! - completa, abrindo um sorriso. Os dois trocam cumprimentos com direito a abraços e batidinhas leves nas costas. _ Veio curtir a noite, mio amico (meu amigo) - o tal Daniele afirma, olhando para mim e depois para minha prima. Vitória quase se esconde atrás das minhas costas. _ _ É, trouxe a minha namorada e a prima dela para conhecer o clube. Sabe como é, fez sucesso, é propaganda de boca em boca e a curiosidade é aguçada. - Gio diz e me direciona um olhar cheio de carinho; em seguida, recebo um selinho do garoto. Meu corpo leva um choque, filho da mãe. "Mas que p***a é essa?" - indago, fervendo por dentro com a ousadia do infeliz. Dou um sorriso para o meu amigo; aquele sorriso que diz: "vou te matar, seu filho da puta." Vitória segura uma risada; escuto quando saem alguns sons estranhos da sua garganta. _ Certo, bom, irei colocar vocês lá dentro. - disse, e assim ocorreu. Pagamos nossas entradas sem ter que apresentar documento algum, recebemos as pulseiras e fomos liberados. _ Gostei do casal. - Vitória diz, dando altas gargalhadas. _ Casal, c*****o nenhum! - digo, arregalando meus olhos. Me viro para Gio e aponto o dedo na cara dele. _ Se tentar me beijar outra vez, vou arrancar seus lábios com uma mordida! - aviso, controlando-me para não gritar. _ _ Ah, vai se catar, Ravana! Pensa que gostei? Nenhum pouco! - diz e sai andando na frente com uma feição de poucos amigos. _ Sei lá, às vezes eu tenho dúvidas se o garoto é bissexual. Ele, de vez em quando, deixa escapar algumas olhadas cobiçosas, cujo alvo principal é mulher. - minha prima diz, alçando o meu braço. _ Ele é bonito, Vitória, chama atenção. Se eu não gostasse do Alessio, pegava o Gio daquele jeito. Ele podia ter os peguetes dele, mas a fatia maior iria ser minha. - digo, recordando que tive uma quedinha, aos meus onze anos, pelo menino de queixo quadrado. _ Ravana do céu! - minha prima exclama, rindo, suas bochechas corando. Dou de ombros, porque é a mais absoluta verdade. Entramos no espaço amplo, com iluminação parca, muitas pessoas dançando ao som de uma música agitada. _ Está lotado, daqui a pouco esse lugar vai cospir pessoas pelas vias de acesso. - profiro, segurando no blazer do meu amigo. _ _ Temos que marcar um ponto de encontro para não nos perdermos - diz Vitória. Miro poucas mesas vazias no fundo do local. _ Vamos para uma mesa; lá será nosso ponto de localização - digo, com meus olhos procurando pelo menino que faz o ar me faltar nos pulmões. Em comum acordo, ocupamos uma das mesas. _ E agora, bebidas para esquentar o clima - diz Gio e vai em busca do líquido que sequer sei se irei beber. Eu nunca provei nada alcoólico, embora na minha casa tenha uma bandeja com bebidas em várias partes: sala, escritório, o quarto dos meus pais e até na cozinha. Contudo, nunca me deixaram provar nada. Certa vez, aos meus dezesseis anos, senti vontade de beber um cálice de conhaque. Lembro que enchi o pequenino cálice, mas bem no momento em que eu iria beber, meu pai surgiu, vindo sei lá de onde, e tomou o líquido da minha mão. Foi uma das vezes em que vi meu Don estranho, com os olhos totalmente negros; pupila e a esclera eram uma coisa só. Sinto arrepios só de pensar nessas ocasiões, em que o senhor Vittorio não parecia ser ele, e sim outra pessoa em posse do seu corpo. Retorno ao tempo real, deixando às memórias no fundo da minha mente. Meu intuito maior é ficar com Alessio, ganhar uns beijos, dançar coladinha no corpo dele, sentir o cheiro do seu perfume e dar a carta que escrevi, abrindo o meu coração. São palavras que transbordaram da minha alma e coloquei impressas em caligrafia redonda, bem legível. Para esse ponto que considero alto do nosso encontro, levarei o menino para longe dessa barulheira toda. Quero que seja algo especial, algo nosso que possamos recordar quando estivermos bem velhinhos e juntos. _ Ansiosa? - Vitória pergunta, e acho que nem preciso responder, porque isso é visível para qualquer um. Não demora para Giovanni retornar de mãos vazias, mais branco que a neve, e um olhar desconcertado nos brinda. _ Vamos embora, meninas, esse lugar não é bom para nós. - diz, segurando-me pelo braço. Estranho essa atitude do garoto e dirijo-lhe um olhar interrogativo; um vinco surge no meio da minha testa. Eu não queria ir embora; tinha aprontado um monte para ir ao clube. Queria poder curtir a liberdade, namorar o meu gatinho sem pensar em todo o peso, regras e uma vida toda programada que tem por trás do meu sobrenome. Muitas vezes desejei ter uma família normal, comum e pacata. Pais que fossem limpos diante das esferas das polícias. Mas não passou disso, apenas desejos vazios. — O que houve, Giovanni? Está pálido, viu fantasma? — minha prima indaga, arrumando o cabelo de um lado só do ombro. Acho estranho quando vejo duas amigas nossas que estudaram conosco antes de mudarmos de colégio. As meninas desviam os olhos de nós, não promovem uma aproximação e aquilo me causa uma sensação r**m. Percebo que meu amigo fica agoniado quando me levanto da cadeira. Contorno a mesa e Gio tenta bloquear o meu caminho. Vitória deixa o seu assento e olha na direção do balcão; vejo minha prima engolir em seco. Acompanho o seu olhar e meu coração é quebrado em milhares de pedaços. A cena é pesada para quem carrega dentro de si, por bastante tempo, um sentimento terno. Alessio está aos beijos com outra menina. Os dois parecem querer que seus corpos se fundam, tornando-se dois seres em um só. Tudo fica pior quando reconheço Iolanda, uma garota de quem eu acreditava que gostava de mim, que era minha amiga. Não era segredo para o grupinho de meninas do qual fazíamos parte os sentimentos que sempre alimentei por Alessio Sarratore. Ela sabia, assim como muitas outras. Minhas pernas falham; meu amor-próprio desce escorrendo pelos meus olhos. Sinto uma raiva enorme de mim. Sou a própria burra encarnada. Acreditei tanto nas palavras do garoto; ouvir dele que me queria, que gostava de mim, que eu era única, me colocaram nas nuvens e agora o próprio quebra as minhas asas. Foram doces colocados na minha boca, pura enganação. Levo minha mão esquerda ao curativo em meu pescoço. "Tive a coragem de fazer um corte a sangue frio em meu corpo por causa dele e recebo isso! Ele disse que esperaria por mim..." A mistura de sentimentos é como uma avalanche em meu interior, varre tudo, joga-me no mais baixo chão. _ Então, era por isso que a Helena e a Gemma fingiram que não estavam nos vendo! - digo com a voz trêmula. _ Vamos embora, você não precisa passar por isso. Ele é um completo i****a. - Gio profere, e Vitória olha-me com compaixão. Esse tipo de sentimento fere ainda mais meu orgulho agonizante. _ Ele... - solto o ar com força e jogo a minha bolsa em cima do tampo da mesa. _ Ah! p***a! Sem barraco, Ravana, não quero o seu pai comendo nossos fígados depois de nos tirar de uma delegacia. - Giovanni brada, segurando meu braço. Ergo minhas mãos para o alto. _ Sem brigas, só preciso dizer algumas coisas que estão entaladas em minha garganta. - minto _ Eu irei com ela, pode ficar tranquilo. - Vitória tenta persuadir Gio, que não acredita nas palavras da minha prima. _ Se nós três formos presos na p***a de um galpão, pendurados de cabeça para baixo e levando choques pela língua, me lembre de que, no inferno, eu atormentarei as duas. - diz, apontando para minha prima e depois para meu rosto. Giovanni solta o meu braço e caminho na direção do maldito, pronta para dar um soco no miserável. Decido mandar o maledeto para o setor de lanternagem de qualquer hospital. Depois, será a vez da relambida dos infernos; irei mostrar quem é Ravana Grecco. De repente, um grupo de pessoas entra em minha frente. Fico tentando desviar delas e, quando consigo, Alessio não está mais no lugar onde eu o vi. Fico procurando no meio do aglomerado de gente e não obtenho sucesso. Saio para o espaço externo e chego bem no momento em que ele está entrando no carro. _ Alessio! - grito, e o homem vira a cabeça para ver quem o chama. Seus olhos deparam-se com os meus, para logo desviarem. Tento andar apressada até o veículo, mas as sandálias e o meu vestido não ajudam. Antes que eu consiga chegar perto, acompanho, devastada, o rapaz para quem dei o meu coração manobrar o veículo e partir. Alessio Sarratore deixou-me plantada no meio do estacionamento, com muitos olhares voltados para mim. A humilhação é dolorida, gigantesca e amarga. Retorno para dentro da boate, arrastando minha cara no chão. — Caramba, Ravana! Você me deixou preocupada! Saiu entrando no meio dos outros e me largou para trás. Retruca Vitória, fazendo caras e bocas, assim que me aproximo. Não respondo e retorno para a mesa, me sentindo péssima. _ Conseguiu ter a conversa? - Gio pergunta, segurando um copo de bebida na mão. Retiro o cilindro de vidro da posse do garoto e tomo o líquido de um só gole. A bebida desce queimando meu tubo digestivo; sufoco com o álcool e a sensação é a de ter engolido fogo puro. - Cazzo, Ravana! É whisky, não pode beber dessa forma! - meu amigo ralha, e eu não lhe dou ouvidos; estou vendo todas as minhas feridas sangrarem. - Acho que deu, né? Vamos para casa e esquecer que essa noite existiu. - Vitória profere, olhando-me. - Eu estou aqui para me divertir, e é o que irei fazer. Não vai ser a descoberta de que tenho o dedo podre que vai me fazer chorar minhas mágoas no colchão da minha cama. - digo decidida. - É assim que se fala, Ravana, não deixe ninguém apagar o seu brilho. - Giovanni exprime e abre um sorriso em minha direção. O que eu escondo deles é que estou aos pedaços; meu primeiro amor foi também minha primeira decepção. Tento mostrar-me intacta, estando um farrapo por dentro. O destino é uma praga que tem os seus preferidos, e acredito que um deles sou eu. Nasci no meio da escuridão, e até o amor me engana. O que me restará, então?
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