Andava de um lado para o outro sem saber o que fazer.
Ouço alguém bater a porta.
– Entre.
– Licença padre Albert – diz uma das mulheres que trabalha na cozinha – senhor gostaria de algo específico para o almoço?
– Não, estou sem fome. Obrigado.
A mulher sai e fico sozinho com meus pensamentos.
Acomodo-me na cadeira, e só aí percebo que Audrea esquecera sua pequena bolsa em cima da mesa.
Pego-a e sigo para o pátio. Pego o cavalo e ponho o chapéu na cabeça.
Sigo rápido rumo a sua casa.
Não havia motivos para que eu levasse sua bolsa, poderia esperar até o domingo, mas, a pesar das palavras ditas e principalmente as não ditas, queria me certificar de que chegara bem em casa. Saíra tão nervosa, temia que algo pudesse lhe acontecer.
Aproximei-me dos portões e adentrei na propriedade.
De cara, avistei o senhor Montez passando ordem para os criados.
– Padre, que surpresa – diz ao se aproximar.
– Bom dia senhor Montez. Gostaria de saber se Audrea está?
Ele me olho desconfiado.
– Não. Ela saiu cedo e não retornou ainda…
Ele olha para minha mão.
– É que ela foi até a igreja, e acabou por esquecer a bolsa. Vim devolver, pois, talvez ela precise…
– Ah, não seja por isso, lá vem ela…
Olho para trás e a vejo com seu pretendente.
Eles sorriam. Ela parecia feliz.
Quando se aproximou, o rapaz a ajudou a descer do cavalo.
– Audrea, o padre está a sua procura.
Seus olhos encontraram os meus, mas, não da mesma forma.
– Esqueceu sua bolsa na igreja – digo entregando-a.
Ela recebe e assente.
– Vamos Benicio, fique para o almoço – diz ela ao rapaz – tenho certeza que papai não se incomodará…
O rapaz me olhou fixamente, e por um instante me senti incomodado.
– Se não for incomodar… – responde.
– Claro que não – responde o pai dela prontamente – o senhor pode nos acompanhar também padre.
Sou pego de surpreso, e fico sem responder.
Audrea me olhava de desdém. Algo além de nossa conversa havia acontecido, e por mais que eu soubesse que o melhor era sair dali o quanto antes, acabei aceitando o convite para o almoço.
– Ótimo, vamos entrar então – diz o senhor Montez.
Ele entra na frente, e Audrea vai logo atrás.
O tal rapaz me fita intensamente.
– Depois do senhor padre – diz.
Entro e sigo para a sala de jantar.
– Ora – a mãe de Audrea aparece sorridente – não sabia que a casa estaria tão cheia, e muito menos que teríamos sua companhia Benicio.
– Audrea e eu nos encontramos, e ela me convidou – diz.
– Que bom – diz.
– Se me dão licença… – Audrea passa por mim e sobe as escadas.
Precisava saber o que estava acontecendo. Havia algo estranho.
– Por gentileza, gostaria de usar o banheiro – digo.
– Primeira porta ao subir a escada.
– Obrigado.
Subo as escadas e avisto a porta indicada, mas, sigo um pouco mais, e vejo uma porta entreaberta. Observo pela frecha e avisto Audrea. Seguro a maçaneta, mas, não abro. Sou puxado com força e empurrado contra a parede.
– O que pensa que está fazendo? – indaga Benicio enfurecido.
– Me solta! – afasto-me, mas ele torna a me agarrar.
– Fique longe dela – diz em tom ameaçador.
Ouço barulhos e ele me solta.
Audrea sai do quarto e nos flagra em uma posição desconfortável.
– O que está acontecendo? – indaga.
– Estava procurando o banheiro – digo e desço as escadas rapidamente.
Sigo para a porta, mas, a senhora Montez me pega pelo braço e me leva para a mesa.
– Ora, não nos faça essa desfeita. Fique.
Acomodo-me na cadeira, mas, não sentia-me nem um pouco confortável.
Todos se acomodaram, e para o meu azar, Benicio sentou-se a minha frente.
Enquanto o rapaz me fitava intensamente, Audrea parecia distante.
O almoço correu bem, e para minha sorte, não fizeram muita questão que eu ficasse para um café.
– Antes que vá Padre – o rapaz toma a palavra – gostaria de lhe perguntar a data mais próxima disponível?
– Disponível?
– Sim, para nosso casamento – ele toma a mão de Audrea.
– Oh, meu Deus! – a mãe dela solta gritinhos de alegria, enquanto o rapaz me olhava de forma desafiadora. Neste momento percebi, que ele sabia o que aconteceu entre mim e Audrea.
– Não tenho certeza, preciso verificar – respondo calmamente.
– Esta notícia é maravilhosa – diz o pai – isto é mesmo verdade Audrea?
Ela levanta a cabeça, e percebo um sorriso f*****o se formar em seus lábios.
– Tomei ciência de que tenho buscar o melhor para mim e minha família – diz e olha rapidamente para mim.
Não conseguia entender o motivo, mas, tais palavras doeram.
Tinha dito a ela que devia dizer sim, mas, acho que falei na esperança de que ela levasse algum tempo para pensar.
Mas, acho que o tempo seria mais pra mim, do que pra ela em si. Precisava de tempo pra processar tudo o que tinha acontecido, e principalmente o que estava sentindo.
– Padre, peço que olhe o quanto antes as datas disponíveis – diz sua mãe.
– Sim senhora. Bem, se me derem licença – digo.
– Agradecemos sua presença – diz.
Sorrio e saio.
Ponho o chapéu e antes de montar no cavalo, Benicio se aproxima.
– Vai me agredir de novo? – indago seriamente.
– Claro que não – responde sarcasticamente – apenas quero que saiba, que sei o quanto zela por sua posição, e sei que não gostaria de perdê-la.
– O que quer dizer com isso?!
– Que sei o que andou fazendo com ela. Se encontrando as escondidas com ela no meio da noite. Flertando com ela dentro da igreja. Padre, se não têm respeito por si, tenha pela casa de Deus.
Sentia meu sangue ferver.
Monto no animal e olho uma última vez para ele.
– Não pense que me conhece, apenas pelas roupas que visto. Não sabe nada sobre mim, por isso, não me ameace garoto. Pode se arrepender.
– Está me ameaçando padre? – indaga rindo.
– Entenda como quiser. E se eu descobrir – aponto o dedo para ele – que está obrigando-a a casar com você, por conta de ameaças e mentiras, farei com que pague.
– É mesmo – ele se aproxima e segura as rédeas – seriam mesmo mentiras? Ou verdades dolorosas demais para serem mostradas? O senhor sabe o que o pai dela fez com ela só por mau comportamento? Por gritar na frente dos amigos dele? – seus olhos brilhavam de raiva – ele chicoteou suas costas na frente dos criados. Imagine o que ele faria se descobrisse que sua herdeira está mantendo um caso amoroso com um padre. Ele não mede escrúpulos para manter o nome de sua família limpo.
Respirei fundo e tentei controlar minhas emoções.
Mas, diante de tais ameaças, lembranças de um passado que queria esquecer vem a tona, e a v*****e de quebrar a cara daquele garoto era enorme.
– Solte as rédeas, antes que eu arrume outra serventia para elas no seu pescoço.
Ele ri e se afasta.
– Pelo visto o padre é nervosinho também. E pelo que parece, não é nada do que faz parecer…
– Exatamente.
Dou a comanda e o animal vira.
– Cuidado padre, há muitas pedras no caminho até a igreja. Tome cuidado para não tombar em uma delas.
Olho-o de relance e me afasto o mais rápido possível.