Convivência e Contradições

1410 Palavras
O sol nasceu sobre Manhattan, pintando o penthouse com uma luz que parecia insistir na nova realidade de Seraphina. Ela acordou na Suíte Oeste, aninhada nos braços de Julian, o cheiro dele a sândalo e a poder invadindo os seus sentidos. O contrato de fusão total era mais do que um pedaço de papel; era uma sensação física de peso e de pertença. Ela tentou sair da cama discretamente, mas o braço forte de Julian apertou-a. — Aonde pensa que vai? — A voz dele era um sussurro rouco e matinal. — Para o meu duche. E depois para a sala de conferências. Temos que capitalizar a queda da Thorne Global. Julian virou-a de frente para ele, os seus olhos azuis semicerrados, mas intensos. — Não há pressa, esposa. O mercado sabe quem venceu. Além disso, a sua sala de conferências agora está a ser transformada no nosso home office. Não pode fugir. — Eu não estou a fugir. Estou a trabalhar — Seraphina rebateu, lutando contra o impulso de ficar ali, naquele calor familiar. — O trabalho espera. — Ele a beijou, um beijo de posse que não lhe dava espaço para debate. — Os termos do nosso novo acordo incluem a eliminação do stress desnecessário. A primeira hora da manhã está reservada para nós. A recusa em deixá-la funcionar como uma máquina de trabalho era um novo tipo de manipulação. Julian não estava a controlá-la através do dinheiro; estava a fazê-lo através da i********e. Seraphina sabia que se sucumbisse a essa rotina, ele ganharia um controlo psicológico ainda maior. — O nosso acordo também inclui a transparência total. E eu sou transparente sobre a minha necessidade de estabilidade. E a minha estabilidade começa com o meu trabalho. Julian sorriu, o que suavizou o seu rosto por um breve momento. — Justo. A sua estabilidade será a nossa primeira prioridade. Ele se levantou, revelando o seu físico perfeitamente esculpido, e caminhou nu até ao armário, pegando numa toalha. A ausência de pudor era mais uma camada da sua confiança implacável. Seraphina observou-o, sentindo a atração que ele exercia sobre ela. Eles tomaram o pequeno-almoço juntos na cozinha do penthouse, o que Seraphina nunca havia feito na sua suíte. A mesa estava cheia de frutas frescas e café forte. Julian leu os relatórios de mercado enquanto Seraphina folheava as notícias de fofoca, onde o seu beijo no Met Gala era a manchete principal, ofuscando completamente a humilhação de Marcus. A convivência diária revelava contradições em Julian. Ele era implacavelmente atencioso nos detalhes (sempre a temperatura certa para o seu café) e implacavelmente frio nas suas decisões de negócios (liquidando as ações restantes de Theodore Vance sem pestanejar). Mais tarde, enquanto Seraphina observava a sua secretária e a de Julian organizarem o home office (a antiga Suíte Leste), ela sentiu-se invadida. — Este espaço tem que ser funcional para nós dois, Julian. Eu preciso do meu isolamento. — Você não terá isolamento — Julian declarou, sem desviar o olhar do seu ecrã. — Terá a minha presença constante. É uma característica do Novo Contrato. — E qual é a vantagem para mim, além da sua proteção financeira? — A vantagem é que, enquanto você trabalha, eu aprendo. E enquanto eu trabalho, você aprende. Você não pode confiar em mim se eu for uma caixa preta. A transparência total começa aqui, na guerra de spreadsheets. Nos dias que se seguiram, a rotina de trabalho partilhada tornou-se o novo campo de batalha. Seraphina descobriu que Julian era um parceiro de trabalho que a desafiava a um nível que Marcus nunca havia alcançado. Ele não era apenas perspicaz; ele era um leitor de mentes de mercado. Ele conseguia prever a reação de um conselho antes mesmo da reunião começar. No entanto, a sua proximidade constante tornava o foco impossível para Seraphina. Ela sentia-o sempre. O calor da sua mão sobre o seu ombro ao olhar para um gráfico; o som baixo da sua voz ao telefone. Certa noite, Seraphina ficou até tarde no home office, imersa na reestruturação do Égide. Julian estava sentado no sofá, lendo relatórios. — Sinto a sua tensão daqui, Seraphina — ele comentou, sem levantar os olhos. — É uma tensão produtiva. — Não. É a tensão de uma mulher a tentar manter duas vidas separadas quando elas já estão fundidas. Você tem que parar de lutar contra o que está a sentir. Seraphina fechou o seu laptop com um estrondo. — Eu sinto gratidão por me ter ajudado a conquistar o Égide. E sinto desejo. Mas eu não sinto submissão, Julian. E o seu controlo está a apertar. Ele pousou o relatório, e o silêncio preencheu a sala. — O meu controlo é o seu escudo. Eu não a vou dominar, Seraphina. Eu vou complementá-la. E se o preço for que durmamos na mesma cama e trabalhemos na mesma sala, então é um preço justo pela nossa permanência. Julian se levantou e foi até a janela, olhando para a escuridão da cidade. Ele hesitou. Seraphina sabia que ele estava prestes a cumprir a sua promessa de transparência total, revelando algo pessoal. — Há um motivo pelo qual eu me interesso pelo seu controlo. — Ele se virou. — Há anos, eu tinha uma parceira de negócios. Uma mulher brilhante. Ela não tinha a sua resiliência emocional. Ela tentou a mesma fusão de negócios e vida pessoal. E eu a perdi. Ela se tornou instável sob a pressão e cometeu um erro que a levou a... sair do meu império. Seraphina sentiu um calafrio. Ele nunca havia falado do seu passado pessoal. — O que aconteceu com ela? — Ela escolheu o fim. — Julian disse, a voz completamente desprovida de emoção, o que a tornava mais assustadora. — E eu jurei que nunca mais estaria com uma mulher que pudesse ser quebrada. Você não pode ser quebrada, Seraphina. É por isso que eu exijo que você esteja sempre à vista. Não por controlo possessivo, mas por segurança. Eu não posso perder o meu maior ativo novamente. A revelação foi devastadora. Julian Kaine era motivado não apenas pela ambição, mas por uma profunda cicatriz de perda. O seu controlo era uma forma de proteção, e ele estava a projetar a sua tragédia passada sobre ela. — Eu não sou ela, Julian. Eu sou mais forte. — Prove-o. Na manhã seguinte, a primeira crise séria do Novo Contrato começou. Seraphina recebeu um e-mail. Não era de Marcus. Era do conselho do Égide. Eles estavam a organizar um voto de não-confiança. Julian, que estava a tomar café ao lado dela, viu a sua expressão. — O que é? — Ele já sabia a resposta, mas exigiu a informação. — O conselho está a tentar anular a venda das minhas ações para si. Eles alegam que foi feita sob coação, após o escândalo da noite de noivado, e que a fusão de 51% das ações na Kaine Industries lhes dá direito a uma nova votação de liderança. O verdadeiro inimigo não era Marcus, mas o próprio sistema que ela havia tentado salvar. Eles a queriam fora, e agora estavam a usar Julian contra ela. — Eles estão a usar o nosso casamento como arma — Seraphina disse, a fúria a crescer. — Sim. Eles não podem atacar o seu controlo, então atacam a sua moral. Eles alegam que a sua parceria connosco desestabilizou a empresa. — O que fazemos? Julian sorriu, o seu sorriso de Rei no campo de batalha. — Nós não vamos lutar contra eles no conselho. Vamos lutar contra eles no palco. O conselho vai reunir-se amanhã. E você fará a sua defesa final. E eu vou estar lá, Seraphina. Como seu acionista majoritário. Mas desta vez, você não vai apenas falar. Você vai dominar. Ele estendeu a mão para ela, não para a tocar, mas para lhe passar o seu laptop. — É hora de provar que a Rainha de Fogo não é apenas um título. É hora de mostrar ao mundo que a sua aliança comigo é a força mais poderosa do mercado. E que você não pode ser quebrada. O desafio estava lançado. A convivência havia tornado Seraphina mais forte, mas o verdadeiro teste da sua união estava prestes a começar: ela teria que provar a sua estabilidade e o seu controlo perante o mundo, enquanto lutava contra o homem que a havia seduzido para essa mesma instabilidade. O preço do Novo Contrato estava a ser cobrado.
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