A Fusão Total

1696 Palavras
A primeira manhã após a assinatura do novo contrato foi uma turbulência controlada. Seraphina se vestiu rapidamente com a camisa de Julian enquanto ele ligava para os seus assistentes, dando ordens concisas para a transferência dos seus pertences da Suíte Leste para a Suíte Oeste. Julian observava Seraphina enquanto ela tomava o seu café, a sua expressão uma mistura de fascínio e cautela. — Os seus assistentes não vão questionar a mudança repentina? — Seraphina perguntou, a sua voz ainda um pouco áspera pela tensão. Ela lutava para manter a sua compostura de CEO, mesmo sabendo que a sua autonomia estava, agora, literalmente a metros de distância. — Eles questionarão a sua sanidade se você se recusar a viver com o homem que a ama — Julian respondeu, sem pestanejar. — Eles acreditam na performance, Seraphina. E, a partir de hoje, a performance é real. Julian não a beijou. Não a tocou. Ele estava a honrar a sua nova condição: a fusão total, que incluía a sua exigência de transparência e o reconhecimento de que ela não era mais uma posse casual. A reunião do conselho estava agendada para as 11h. Antes disso, Seraphina supervisionou a sua própria "tomada" da Suíte Oeste. Se Julian queria que eles vivessem juntos, ela garantiria que o espaço refletisse ambos, não apenas o império dele. Os móveis minimalistas e a arte angular de Seraphina começaram a surgir na galeria e na sala de estar de Julian. Livros técnicos e designs de patentes competiam com as raras edições de primeiros socorros de Julian. A Suíte Leste, que era a sua fortaleza, estava agora vazia. Seraphina sentiu uma pontada de luto pela perda do seu espaço, mas a emoção foi rapidamente substituída pela excitação do novo campo de batalha. No quarto principal, Julian já havia reorganizado o seu closet, deixando metade do espaço para os vestidos e tailleurs de Seraphina. Não havia vestígios de qualquer outra presença feminina, uma observação que Seraphina registou com um alívio silencioso. — Não sinto falta da sua outra suíte? — Julian perguntou, entrando no quarto enquanto ela pendurava um vestido. — Sinto falta do controlo que ela representava — Seraphina admitiu. — Mas agora o controlo está aqui. Eu vou aprender a gostar do seu lado da cama. — Não precisa de gostar. Precisa de aceitar. A diferença é fundamental. Julian não a ajudou a mudar. Ele observou, registando cada caixa, cada livro. Ele estava a estudar a sua vulnerabilidade. Seraphina percebeu que a sua condição de "transparência total" o obrigava a abrir a sua vida, mas ele também estava a usar a mudança para mapear a dela. A reunião do conselho foi realizada na sede principal do Égide. O ambiente era de medo e especulação, após o escândalo da noite anterior e a notícia da investigação federal sobre Marcus e Theodore Vance. Julian e Seraphina entraram na sala de reuniões de mãos dadas, uma exibição pública de unidade que era simultaneamente uma ameaça. Seraphina estava vestida com um tailleur preto e branco afiado, um uniforme de guerra para o anúncio. Julian estava ao seu lado, o seu aperto firme e inabalável. Seraphina assumiu a cabeceira da mesa, Julian sentou-se imediatamente à sua direita. Ela não lhes deu tempo para processar o drama. — Senhores. Estou aqui para vos informar que a transição de poder na Thorne Global é final. O Sr. Thorne não tem mais qualquer autoridade sobre esta empresa. Um dos membros mais antigos do conselho, o Sr. Henderson, pigarreou. — Sra. Kaine. Com todo o respeito, o conselho está preocupado com a instabilidade do capital. As ações preferenciais do Sr. Thorne ainda podem ser vendidas, desvalorizando a empresa. — Essa é uma excelente preocupação, Sr. Henderson — Seraphina respondeu, com um sorriso de escárnio. — Que eu eliminei esta manhã. Ela projetou o novo gráfico de acionistas na tela. O nome de Marcus Thorne havia desaparecido completamente. Em seu lugar, na categoria de acionista majoritário, estava: Kaine Industries: 51%. — Eu vendi as minhas ações preferenciais ao meu marido. Julian Kaine injetou um capital significativo no Égide, consolidando a nossa posição e esmagando qualquer tentativa de ataque a curto prazo de Marcus. A sala ficou em silêncio. A jogada era genial e brutal. Seraphina havia usado o dinheiro de Julian para comprar a sua vitória e a sua segurança. — O Sr. Kaine é agora o acionista maioritário. No entanto, o controlo operacional e a presidência continuam a ser meus. O meu marido é o meu escudo financeiro e o meu parceiro estratégico. Seraphina olhou para Julian, e ele deu-lhe um aceno de aprovação. Não era uma encenação; era uma exibição de poder real, e o conselho soube reconhecer isso. Julian falou pela primeira e única vez na reunião: — O Égide está seguro. A visão de Seraphina será a nossa lei. Quem tiver problemas com a nova estrutura é bem-vindo a vender as suas ações agora. Não tolerarei a incerteza. Ninguém falou. Seraphina encerrou a reunião. Ela havia-o feito. Ela não era apenas a CEO; ela era a rainha apoiada por um império maior. Eles voltaram para o penthouse ao anoitecer. O Égide estava salvo. A vingança estava completa. Agora restava a condição mais difícil de todas: a convivência. Seraphina havia tomado um duche e estava vestida com um roupão de seda, sentada na sala de estar da Suíte Oeste, sentindo-se estranhamente perdida no seu próprio lar. Julian estava a preparar bebidas no bar, a atmosfera era de uma tensão antecipada. Ele entregou-lhe um copo de whisky puro. — Pensei que precisava disto — disse ele. — Você se portou de forma admirável no conselho. Você é a mulher que eu vi naquele primeiro jantar. Fria, implacável e brilhante. — Isso é o que você compra com as suas ações — Seraphina respondeu, tomando um gole. — Agora, a sua parte do acordo. Julian sentou-se em frente a ela, no sofá de couro macio, a distância entre eles era deliberada. — A transparência total — ele confirmou. — Pergunte. Eu responderei com verdade. Mas a verdade é uma espada de dois gumes, Seraphina. — Eu aceito o risco. Quem é você, Julian Kaine? Eu sei o que você faz, mas não sei quem você é. De onde veio o seu dinheiro? Não foi herdado. Julian sorriu tristemente, a máscara de confiança a cair ligeiramente. — O meu pai era um homem pobre de recursos. A minha mãe era a sua única riqueza. Ele a perdeu para uma doença que ele não podia pagar. Eu jurei que nunca mais seria controlado pela falta de dinheiro ou poder. — E como você conseguiu bilhões? Não em 10 anos, Julian. Em 5. — A minha primeira fortuna veio da mineração de dados. Encontrei uma falha de segurança num dos maiores agregadores de informação e utilizei-a para prever tendências de mercado com meses de antecedência. Foi... quase ilegal. Mas eu soube como navegar pelas zonas cinzentas. A minha segunda fortuna veio da tecnologia espacial. Eu invisto no futuro. Você já sabe disso. — É por isso que você não confia em ninguém — Seraphina concluiu. — Você conhece os segredos de todos. — Não confio. Mas confio em você. A sua ambição é mais limpa do que a minha. Seraphina bebeu o whisky. O álcool não a estava a aquecer; Julian estava. — E por que este casamento? Por que não apenas comprar o Égide? Por que o circo da vingança? Julian endireitou-se, a sua expressão tornando-se dura. — Eu não o podia comprar. Se eu o fizesse, o preço teria triplicado. E se eu o fizesse, a sua lealdade nunca seria minha. Eu precisava de uma aliança, Seraphina. Uma que me desse controlo total sobre a sua mente. Você nunca aceitaria ser parceira de um homem que a comprou. Mas você aceitaria ser parceira de um homem que a salvou. Ele se inclinou para ela, o seu olhar perfurante. — Eu a estudei por anos, Seraphina. Desde a primeira vez que você recusou um acordo com a Kaine Industries. Você é o maior gênio que este mercado viu em décadas. Eu queria-a ao meu lado. Marcus Thorne me deu o motivo perfeito. Eu não me casei por amor. Eu me casei por uma parceria que iria durar para sempre. E o meu método era a paixão. A honestidade dele era um golpe avassalador. Ele havia usado o seu coração partido para manipulá-la para o seu leito. — E o beijo? A noite? Isso também foi por estratégia? Julian hesitou. Foi a primeira vez que ele mostrou vulnerabilidade. — O beijo foi o meu único erro estratégico. Não começou como tal. Mas rapidamente se tornou real. Eu não pretendia que fosse tão... necessário. Agora, você é o meu maior ativo. E o meu maior vício. Ele estendeu a mão e pousou-a suavemente na perna de Seraphina. A eletricidade entre eles era inegável. — O contrato está morto, Seraphina. Não há mais regras. O único termo é a nossa permanência. Agora, a sua vez. Fale-me de Theodore. O que foi mais difícil: perdê-lo como primo ou como aliado? Seraphina olhou para ele, sentindo a dor da traição, mas também a nova segurança que ele lhe dava. Ela havia negociado o seu corpo pelo poder e pela verdade. E a verdade era que, apesar de tudo, ela o desejava. — Foi mais difícil perder a ilusão de lealdade — ela admitiu. — Mas agora, não tenho ilusões. Eu sei quem me odeia e sei quem me apoia. Julian sorriu, triunfante. Ele não se importava que ela o odiasse, desde que ela precisasse dele. Ele a puxou para si. — O meu apoio é absoluto. E agora que você é oficialmente a minha esposa, a sua suíte Leste será transformada no nosso home office. Temos um império para gerir. Ele a beijou. O beijo não era mais uma arma de guerra, mas um selo de aliança. Seraphina se rendeu ao calor, sabendo que havia trocado o seu controlo pela maior paixão da sua vida. A sua nova vida estava prestes a começar: um casamento de fusão total, onde a linha entre o parceiro e o predador seria permanentemente indistinguível.
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