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Liz
Atuo nessa cadeia há quatro meses e, mesmo nesse curto período, consegui impactar o psicológico de alguns detentos mais intensos que aqui estão. Trabalhando com mais uma psicóloga, a Dr. Samanta, dividimos as responsabilidades e desafios diários. Quando não posso estar presente, ela cobre minhas ausências. Minhas faltas ocorrem apenas por dois motivos: a minha folga programada ou a gravidade da saúde da minha mãe. Tendo em vista que a saúde dela é uma prioridade, quando falto, é porque realmente é necessário. Fora isso, estou sempre aqui, honrando um trabalho pelo qual tanto lutei e que realmente amo.
A trajetória até aqui não foi fácil. Cresci em uma família que não tinha muito dinheiro, e tudo que tenho e sou é fruto do meu esforço em estudos e superação. Desde o Enem até a escolha da universidade, cada passo foi desafiador, mas sempre busquei aprender. Se tenho dúvidas, procuro um livro e me dedico a ler tudo sobre o assunto. Essa busca incessante por conhecimento me orgulha, assim como enche de alegria a minha mãe, que sempre foi meu maior apoio.
Nos últimos anos, nossa vida tem sido repleta de desafios, especialmente porque somos só nós duas. A família que temos mora em outros estados, e desde os meus cinco anos, vivemos lado a lado, enfrentando tudo juntas. Essa conexão é profunda, mas também traz um peso, pois a responsabilidade de cuidar uma da outra recai sobre nós.
Rotina Diária
Liz
Vivemos em um bairro bom, e, apesar das dificuldades, hoje consigo proporcionar um pouco mais de conforto à minha mãe. Posso arcar com seus medicamentos caros e, assim, retribuir um pouco do que ela fez por mim ao longo dos anos. Isso traz um sentimento de realização e gratidão.
O despertador tocou, e, ao olhar para a tela do celular, percebi que era 4h30 da manhã. Esse é meu horário habitual para acordar. Levantei, lutando contra o sono e desejando permanecer em minha cama quente. Fui à cozinha, peguei um copo de água e um comprimido que estava em cima da geladeira, e então fui ao quarto da minha mãe. A acordei gentilmente, dei o remédio e, após isso, ela voltou a dormir.
Tomei um banho rápido e me vesti apressadamente. O atraso tem se tornado frequente, e eu não quero me prejudicar. Para entrar no presídio, não posso usar roupas apertadas, decotadas ou saias. O ambiente é tenso e deve-se evitar qualquer situação que possa ser interpretada de maneira errada. Os homens ali estão há anos sem visitas femininas e, por isso, é essencial manter a seriedade no vestuário. Optei por uma calça de moletom larga, que não marcava nada, e um moletom que ostentava o nome do presídio, meu uniforme. Prendi meu cabelo em um coque e dispensei a maquiagem, pois o foco deve estar no trabalho.
Depois de me vestir, dei um beijo na minha mãe e entrei no meu carro, que é bem simples, mas tenho esperança de conseguir um melhor no futuro. A jornada até o presídio leva cerca de 30 minutos, já que fica na minha cidade. Durante a viagem, não consigo deixar de pensar nas histórias que vou ouvir ao longo do dia.
Assim que cheguei, passei pela revista, algo ao qual já estou acostumada. Sim, até eu tenho que tirar a roupa e passar por esse procedimento. Cumprimentei alguns funcionários e me apressei até minha sala, acompanhada por um policial. Um dos policiais tirou um grande molho de chaves e abriu a porta da sala. Entrei e tudo estava do jeito que deixei na última vez. Peguei as fichas dos detentos para me preparar para o próximo atendimento. Cada caso é único e fascinante; cada história carrega uma loucura que me chama a atenção, essa mistura de ousadia e desafios que esses homens enfrentam.
Organizei as fichas e recebi três presos, um de cada vez. É impressionante a diversidade de situações que encontrei: um deles chorava, outro dizia que queria matar todo mundo, enquanto o terceiro apresentava sinais de depressão. Minha sala é feita de vidro, permitindo que policiais do lado de fora monitorem tudo, embora não escutem o que se passa aqui dentro. Posso fechar as cortinas, mas não me sinto segura fazendo isso. Os detentos ficam algemados, com as mãos e pés presos a uma cadeira de concreto, impossibilitados de se levantar e tentar algo contra mim. Se isso acontecer, há cerca de sete policiais do lado de fora, prontos para intervir.
Essa dinâmica diária é intensa e desgastante, mas é também gratificante. Em cada conversa, busco entender o que se passa na mente deles, quais são as razões que os levaram a cometer crimes. Através da escuta ativa, tento ajudá-los a refletir sobre suas escolhas e, quem sabe, encontrar um caminho de redenção. É um desafio constante, mas a recompensa de ver pequenas mudanças em seus comportamentos e pensamentos faz tudo valer a pena. Cada dia é uma nova oportunidade para impactar vidas, mesmo que seja de forma sutil.
Após atender os três presos, registro o que observei e planejo as próximas sessões. O trabalho não se resume a apenas ouvir; é um processo de construção, tanto para mim quanto para eles. Sinto que, apesar das dificuldades, estou contribuindo para um futuro melhor, não só para os detentos, mas também para mim mesma. Cada um deles, em sua própria história, me ensina algo sobre a vida, sobre superação e resiliência. E, assim, o ciclo se repete, com novos desafios e novas lições a cada dia.