Os Cortes

1623 Palavras
Sabem, as vezes eu pensava seriamente em começar a fazer terapia com uma psicóloga, só queria a ajuda de alguém, mas logo lembrei que aí eu seria obrigada a contar tudo o que havia acontecido comigo durante a minha infância e eu não conseguia, não conseguia contar isso pra ninguém, fora que eu acho que se eu falasse isso pra alguém seria como reviver o inferno todo, já que eu me lembraria cada minuto de tortura que eu tinha vivido ao lado daquele ser desprezível. Fui até o banheiro, me sentei no chão e continuei chorando, as vezes eu caia no choro até sem motivo, bastava eu me lembrar dele ou ver alguém parecido e eu já desabava em lágrimas. Abri a porta do armário do banheiro e peguei um canivete que eu havia escondido enrolado em um pedaço de papel higiênico, havia escondido - o na época da depressão, por sorte ningém havia achado. Liguei o chuveiro e entrei na banheira, me deitando nela. As lágrimas não paravam de escorrer pelo meu rosto. E sem pensar em mais nada, eu comecei a me cortar, cortei várias vezes meus braços, o sangue jorrava sem parar e se misturava com a água da banheira. Comecei a me sentir muito fraca, estava perdendo muito sangue. Nisso Nicolá entrou no banheiro e me viu ali. Notei sua expressão de pavor, parecia assustado. - Luna! - Gritou apavorado. - Mãe, corre aqui. Socorro! A Luna... E de repente tudo ficou escuro, não vi mais nada. Duas horas depois… Me acordei, mas não conseguia saber onde eu estava, não era a minha casa, e eu não reconhecia aquele lugar. De repente olhei pro lado e avistei minha mãe e meu irmão. - Mãe? Nick? - Finalmente você acordou. - Disse mamãe.  - Como você está? - Perguntou Nicolá. - Bem, eu acho. - Respondi. - O que aconteceu? Eu estava meio confusa, não lembrava direito o que havia ocorrido, até que meu irmão me contou tudo e aí aos poucos eu me lembrei. A minha ideia era me cortar até perder sangue suficiente e morrer, tinha visto isso uma vez em uma série e com a personagem havia dado certo, pensei que comigo também daria, ah, eu estava tão cansada disso tudo, não aguentava mais viver desse jeito, e sofrendo cada vez que eu me lembrava de tudo que eu já havia passado. Por que comigo tinha que dar errado? Eu era um fracasso até pra acabar com a minha vida, nem pra isso eu prestava. Mamãe saiu por alguns instantes do quarto. - Pensei que essa fase já tinha passado. - Falou Nicolá. - Eu também. - Falei. Mas no fundo eu sabia que nunca ia passar, que a dor duraria pra sempre e que tudo isso só acabaria quando eu morresse, e as vezes era tudo o que eu mais queria, e eu sabia que mamãe e o meu irmão sofreriam se isso acontecesse, mas eu também estava sofrendo com todas essas lembranças. Nisso mamãe retornou, mas não sozinha, estava acompanhada de um médico, sim, um homem. Comecei a ficar com a respiração ofegante, falta de ar, e passei muito m*l. Eu queria sumir, queria desaparecer, ou melhor, queria que ele desaparecesse da minha frente, e ele que nem pensasse em tentar encostar um dedo em mim, porque eu não era mais criança, e eu faria um escândalo, se fosse necessário. - Filha, o que está havendo? - Perguntou minha mãe parecendo bastante preocupada comigo. - Saia daqui. - Falei ao médico. - Eu não quero ser atendida por ele, não quero que ele me atenda. Vá embora! Vá embora! - Eu não conseguia parar de chorar. O médico ficou pasmo com a minha reação, não estava entendendo nada, nem mamãe e meu irmão também não sabiam o que tinha acontecido comigo. Pedi tanto pra ser atendida por uma mulher, que acabei conseguindo. A médica parecia ser um amor, era super simpática, e havia me tratado super bem. Ela fez alguns exames em mim e disse que eu ficaria boa, mas eu sabia que isso era mentira, pois as feridas continuariam ali, e as cicatrizes permaneciam do mesmo jeito. Foram feitos alguns curativos nos lugares que eu havia me cortado, mas eu não estava nem aí pra isso. Chegando em casa, mamãe e Nick me questionaram sobre o porquê de eu ter ter tratado o médico daquela maneira, eu acabei inventando uma mentira, e os dois acreditaram em mim. Enseguida eu fui para meu quarto, estava precisando descanar e organizar alguns pensamentos. Após chorar muito, resolvi ligar pra Naty, estava precisando muito dela, geralmente ela era a única pessoa que conseguia me acalmar, e me deixar mais tranquila. - O que foi, amor? - Me perguntou Natalie. - Eu me cortei de novo. - Falei um pouco cabisbaixa de vergonha. - Pode dormir aqui pra ficar comigo? - Claro, tô indo praí. - Ela disse. Naty chegou uma meia hora depois. A abracei fortemente e ela retribuiu o abraço, isso me fez tão bem, era muito bom tê-la por perto. Fomos para o meu quarto e ficamos deitadas em minha cama, pouco depois eu já estava me sentindo bem melhor. - Por que você fez isso? - Ela perguntou docemente. - Não sei, me deu vontade. - Falei. - Não gosto quando você se corta.  - Nem eu. Naty dormiu comigo naquela noite, era muito bom tê-la ao meu lado, era meu porto seguro.  No dia seguinte não fui ao colégio e Natalie também não, preferiu ficar comigo, eu não gostava que ela se prejudicasse por minha causa, mas confesso que achei muito fofo da parte dela. Naty e eu não estudávamos no mesmo colégio infelizmente, Nick e eu estudávamos em um que era perto de nossas casas, já Naty no que era mais perto da casa dela, sentia falta de tê-la comigo todas as manhãs, ainda bem que na minha turma eu tinha algumas amigas, não eram muitas, mas eu tinha algumas. - Como você está, meu amor? - Me questionou mamãe assim que eu acordei. - Melhor. - Falei. - Que bom querida. - Ela disse ao me dar um leve beijo no rosto. Logo Nick acordou e se juntou a nós, tomamos café da manhã todos juntos. De fato, eu já estava um pouco melhor. - Você faz tão bem a ela. - Disse Nick para Naty. - Faz mesmo. - Concordei ao dar um leve sorriso para a minha melhor amiga. Naty passou o dia todo comigo, não estava com vontade de sair, e ela fez questão de ficar me fazendo companhia, era uma ótima namorada e uma excelente amiga. Naty e Nick também eram bem amigos, acho que meu irmão gostava dela porque sabia o bem que Natalie me fazia, quer dizer, amigos em partes, pois as vezes eles pareciam que se gostavam e outras vezes parecia que eles se odiavam, juro que eu não conseguia entendê-los. Naty e Nicolá eram as pessoas mais importantes pra mim. Eu gostava da minha mãe também, claro, mas era diferente, tinha muita mágoa dela por ela nunca ter descoberto o que aquele infeliz fazia comigo, embora eu soubesse que não era sua culpa, mas os pais são feitos para proteger seus filhos, mas eu nunca tive p******o de nenhum dos dois. No dia seguinte eu já estava bem melhor, até fui pra aula. - Oi, por que você não veio ontem? - Perguntou Lindsay.  Lindsay ou Lindy, como gostava de ser chamada, era minha amiga há uns dois anos, nos conhecemos na escola e fizemos um laço de amizade muito grande, era pra ela que eu falava sobre meu namoro com Naty. Lindy me contou uma vez que quando ela era mais nova namorou por alguns meses um cara que no começo era um amor, mas depois se mostrou um ser perverso, chegando até a bater nela e quando ela não queria, ele lhe obrigava a f********o com ele, eu cheguei a dizer pra ela que isso era e*****o, mas Lindy alegou que não era porque os dois namoravam, mas pra mim que entendo muito bem do assunto, infelizmente, sei que era e*****o sim porque ninguém pode te obrigar a ter relações se você não quiser, mesmo se for seu namorado ou marido, mas e adiantou falar? Claro que não. Estávamos sentada no banco do pátio da escola, quando Tiffany chegou e se juntou a nós. Tiffany, ou melhor, Fanny fazia parte do nosso trio, ela tinha um irmão em outra turma que era considerado pela escola o garoto mais gato, eu só o via de passagem, mas pra mim ele parecia ser um bad boy, filhinho de mamãe, acho ridículo caras assim. - Ele é tão gato. - Falou Lindy entre suspiros se referindo ao irmão de Fanny que passava perto da gente. - Não é porque ele é meu irmão, mas devo concordar. - Falou Fanny. - Não acho nada demais. - Falei. - Não? - Perguntou Lindy surpresa. Na verdade eu nunca consegui achar um cara bonito, nem nunca me senti atraída por um, por conta de toda aquela história que vocês já conhecem, por isso que comecei a namorar a Naty, acho que eu queria me sentir amada por alguém (que não fosse da minha família), e por isso aceitei namorar com a garota. - Não. - Falei. - Aposto que você diz isso porque é lésbica. - Falou Lindy. - Nada a ver, eu sou hétera e acho mulher bonita. - Disse Fanny. Na moral eu não me considerava lésbica, é difícil de explicar, mas a verdade é que eu apenas me considerava uma garota que namorava outra garota, apenas isso, não gostava de ser rotulada como lésbica.
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