Pré-visualização gratuita Capítulo 1
Madisson
Meus dedos estão brancos enquanto agarro o volante com firmeza, tentando navegar pelas ruas congestionadas às 20h30. As estradas estão tomadas por carros, buzinas e música alta que ecoa dos alto-falantes do Bluetooth do meu carro.
Enquanto canto junto com "Happy", do Pharrell Williams, meu estômago se revira de nervosismo. Tento me distrair do colapso iminente que se aproxima a cada minuto.
Eu odeio chegar atrasada. Odeio ficar presa no trânsito e, mais do que tudo, odeio quando meu irmão fica bravo comigo.
Como se o universo tivesse ouvido meus pensamentos, a música para abruptamente, substituída pelo som do toque do meu celular.
— Merda — murmuro, vendo o nome de Mateo surgir na tela do celular.
Coloco a mão sobre o peito acelerado e pigarreio, forçando um sorriso artificial ao atender.
— Ei, irmãozão…
— Você está a um passo de conseguir uma equipe de segurança e uma babá, Maddie — a voz impaciente de Mateo ecoa pelos alto-falantes. — Onde você está? O evento já começou!
Meu sorriso vacila, e solto um suspiro frustrado. Não é a primeira vez que ele faz essa ameaça. E nós dois sabemos que colocar uma equipe de segurança em mim seria inútil. Consegui escapar de todos os guarda-costas e fazer cada babá pedir demissão desde o primeiro dia — para a constante frustração do Mateo.
— Eu sei, eu sei! Já estou a caminho — respondo, tentando soar leve, embora minha irritação transborde. — Estou presa nesse trânsito há quase meia hora.
O suspiro exasperado dele preenche o interior do carro.
— Você não estaria presa se tivesse saído mais cedo. Ou, sei lá, deixado seu noivo te buscar.
Reviro os olhos conforme ele continua.
— John já está aqui, e está ficando irritado. Ele queria te apresentar a umas pessoas importantes.
— Eu me atrasei discutindo ideias para a padaria. Você sabe como isso é pra mim.
— Discutindo ideias? — ele zomba. — Pelo amor de Deus, Maddie.
Dou uma olhada no painel e bufo.
— Relaxa, vou chegar a tempo. A festa nem começou oficialmente até às oito.
— Mads, o evento começou há trinta minutos — ele me lembra, seco. — Eu devo ter te dito as horas umas cem vezes. Mas, pensando bem, você sempre teve audição seletiva.
— Isso não é culpa minha hoje! — gemo, sentindo o peso da cobrança.
— Hmm — cantarola ele com sarcasmo. — Onde será que já ouvi isso antes? Ah, sim. De você. Dia sim, dia não.
Seu tom me irrita profundamente. Mateo nunca gostou da ideia de eu abrir meu próprio negócio. Sempre teve orgulho de cuidar de mim, e agora que os negócios da família enfrentam desafios, está mais determinado do que nunca a me manter sob controle.
John García, meu noivo, vem de uma família influente na política e é sócio de Mateo. Segundo o "grande plano" do meu irmão, John é o homem ideal para garantir que eu seja bem cuidada.
Então, a ideia de eu abrir uma padaria? Isso o deixa louco.
— Saí com pessoas que podem me ajudar — digo, mantendo o tom calmo. — Pequenos empresários, moradores locais... exatamente o tipo de gente que entende o que funciona. E você sabe disso.
— Isso é mesmo necessário, Maddie? Você poderia estar socializando com o John, mantendo as aparências para a empresa e, quem sabe, pro seu casamento — ele resmunga, e eu reviro os olhos mais uma vez.
— Por que você precisa dessa padaria?
Quase consigo ouvi-lo andando de um lado para o outro, seu jeito superprotetor quase sufocante. Mas não fico ofendida. Isso vem de um lugar de amor. Estivemos por conta própria por tanto tempo, separados do resto da família, que acabamos sendo tudo um para o outro.
Sou tão protetora com ele quanto ele é comigo. Ok, talvez nem tanto. Mateo pode ser um pouco autoritário. Mas ainda o amo, e sei que ele me ama também. É o melhor irmão mais velho que alguém poderia pedir. Se houver uma próxima vida, quero que ele seja meu protetor, quase um pai e meu irmão outra vez.
Só queria que ele parasse de me enxergar como aquela menininha de cinco anos de maria-chiquinha e macacão jeans, como se eu fosse feita de vidro e prestes a quebrar.
Eu nem consigo compartilhar com ele a pessoa que realmente sou, minha paixão, porque ele acredita que eu não preciso ganhar dinheiro, que deveria estar me preparando para ser uma esposa troféu.
— É um projeto apaixonante, Mateo — digo, forçando uma risada. — E quantas vezes preciso te dizer que estou fazendo isso por mim?
— Projeto apaixonante ou não, você está atrasada. Precisa priorizar a família acima de... seja lá o que for isso.
— Prometo que já estou chegando. Só me dá mais um tempinho — respondo, apertando o acelerador.
O trânsito está começando a fluir.
Ouço sua respiração pesada antes que a ligação caia.
— Rude — murmuro, zombando, e piso um pouco mais fundo no acelerador enquanto meu carro avança alguns centímetros.
A música volta a tocar exatamente de onde parou, e eu canto junto, sentindo a tensão nos ombros diminuir, ainda que ligeiramente. Estou finalmente pronta para abrir minha padaria — e não vou deixar ninguém, nem Mateo e muito menos John, me fazer sentir culpada por isso.
Viro na rua principal, os prédios altos se erguendo contra o céu noturno. Seus vidros refletem a luz da cidade como se estivessem vivos. Pela primeira vez em muito tempo, sinto que estou em sintonia com tudo isso.
Conforme avanço, as lojas chiques e os cafés elegantes aparecem, iluminando a noite com suas fachadas coloridas. Olho para o relógio e — merda — estou mesmo atrasada. Tomara que ainda dê tempo de fazer uma entrada minimamente triunfal com John. Se eu correr.
Do contrário, o inferno vai ser ter que encarar o mau humor dele. E olha, não que eu ligue tanto, mas uma noiva emburrada ao lado dele a noite toda vai ser definitivamente meu décimo terceiro motivo para não estar aqui.
Finalmente, chego ao hotel luxuoso. A entrada iluminada parece brilhar ainda mais sob o céu noturno. O serviço de manobrista está lotado e decido não usá-lo. Não estou com roupa para entregar minhas chaves com confiança.
Meu jeans azul desbotado e uma blusa branca simples parecem totalmente inapropriados para a festa chique e os convidados famosos que estarão lá dentro. Já consigo imaginar os olhares julgadores das socialites se eu for vista usando isso — ou pior, se algum fotógrafo ou paparazzi capturar uma imagem minha e ela acabar circulando online. Mateo ficaria furioso. John também. Posso até imaginar as manchetes escandalosas no dia seguinte. Estremeço só de pensar. A última coisa que quero é atrair mais publicidade negativa, tanto para mim quanto para meu irmão.
O melhor plano? Ficar dentro do carro e trocar de roupa ali mesmo. Ainda bem que trouxe algo mais adequado no banco de trás.
O ar fresco me envolve ao entrar no estacionamento subterrâneo. Luzes brancas piscam no alto, iluminando o mar de carros luxuosos já estacionados. As paredes de concreto são decoradas com obras de arte contemporâneas, e a iluminação suave cria uma atmosfera surpreendentemente elegante. Meus olhos vasculham o espaço até encontrarem uma vaga nos fundos. Sinto um alívio imediato.
As luzes do teto refletem no piso de concreto polido enquanto manobro. Dou seta e me aproximo da vaga, dando uma última olhada no relógio. Talvez eu não esteja tão atrasada quanto pensei. Mas quando estou prestes a estacionar, um sedã preto e reluzente surge de repente, cortando minha frente e roubando meu espaço. Pisco. Piso no freio com força. Os pneus guincham contra o asfalto.
Aperto o volante com força. A raiva sobe.
— Mas que droga? — sibilo, meu coração acelerado no peito. Quem é o i****a?
Estaciono o carro alguns metros adiante, saio com um movimento brusco e meus saltos ecoam no concreto. O ar frio bate no meu rosto, reacendendo minha irritação. O motorista do sedã permanece dentro do veículo, entretido no celular, agindo como se minha presença não tivesse importância alguma.
— Com licença! — grito, a voz firme ecoando pela garagem. — Você se importa? Acabou de roubar minha vaga!
Nenhuma resposta. Nem um olhar.
Dou mais um passo à frente, furiosa.
— Ei! Estou falando com você!
Nada. Vermelha de raiva, bato com o punho na janela dele. A porta se abre com um clique sutil.
— Como você ousa...
As palavras morrem na minha garganta.
Um homem sai do carro. Alto. Imponente. Belo de um jeito que beira o intimidador. Maçãs do rosto marcadas, maxilar forte, cabelos escuros perfeitamente alinhados. Seus olhos verdes me encaram com frieza — intensos, impenetráveis.
Alessandro Salvatore.
O nome me atinge como um soco. Ele está mais velho, mais poderoso. Antigo melhor amigo do meu irmão e... minha antiga paixão secreta. Anos atrás, eu era só a irmã caçula irritante. Agora, ele está aqui. Em carne, osso e arrogância.
— Sim? — ele diz com desdém, como se eu fosse uma inconveniência.
E é aí que percebo: ele nem me reconhece.
Sinto um aperto no peito — uma mistura de raiva e humilhação.
— Você só pode estar brincando — rebato, incrédula. — Entrou na minha frente e agiu como se não fosse nada? Eu podia ter batido no seu carro!
Ele dá de ombros com um sorriso preguiçoso.
— Se tivesse prestado atenção, não teria sido um problema.
Meu sangue ferve.
— O quê?! — exclamo, ofendida. — Está dizendo que a culpa é minha?
— Estou dizendo que distrações têm um preço — retruca, seco.
Inspiro fundo, tentando me controlar.
— Arrogância é seu segundo nome, não é?
Seus olhos cintilam.
— E o seu é drama?
A insolência dele me atinge como uma bofetada.
— Quem diabos você pensa que é?
Ele me lança um olhar entediado. — Olha... não tenho tempo pra isso. Os funcionários não usam outra entrada?
Congelo. Funcionária?
— Funcionária?! — repito, olhando para minha roupa e sentindo a vergonha subir pelas bochechas. — Eu não sou da equipe, seu... babaca!
Ele se vira, indo em direção ao elevador como se nada tivesse acontecido.
— Você não está acostumado a ser confrontado, é isso? — grito atrás dele, a voz afiada.
Então ele foge como o covarde que é!
Nada. Nem uma resposta.
Respiro fundo. Não posso deixá-lo sair assim.
Minhas pernas se movem antes que minha mente acompanhe. Caminho a passos firmes em sua direção, a raiva impulsionando cada passo.
— Ei! Eu estou falando com você — chamo, estendendo a mão e agarrando levemente seu braço.
Ele para.
Lentamente, ele se vira — e é nesse momento que algo muda.
Nos olhos dele, vejo uma faísca. Um reconhecimento tardio. E por um breve segundo, um silêncio denso se instala entre nós.
Ele congela, o olhar caindo sobre meus dedos em volta de seu braço. Seu rosto se contorce em puro desgosto, como se eu tivesse acabado de jogar uma pilha de lixo em cima dele.
— Tire as mãos de mim.
A voz dele é fria e ameaçadora. Se eu tivesse um pingo de juízo, fingiria que foi um acidente, soltaria uma risada constrangida e sairia correndo dali. Mas não foi assim que aprendi a lidar com o mundo — e definitivamente não é assim que vou lidar com ele.
— Então você não vai se desculpar? — rosno, sem recuar.
Meu coração bate forte no peito, cada pulsação ressoando como um tambor de guerra. Tudo me diz para parar, mas minha teimosia fala mais alto.
— Pedir desculpas por quê, exatamente? — Ele pergunta, com um tom entediado que só serve para alimentar minha raiva.
Levanto uma sobrancelha, cruzando os braços.
— Hmm, vamos ver... Para começar, pelo que você acabou de fazer. Você me viu indo para aquela vaga e mesmo assim jogou seu carro na frente como se nada tivesse acontecido. E agora está fingindo que não tem ideia do que estou falando.
A voz na minha cabeça grita para eu parar, mas é tarde demais. Estou afundando nessa discussão com um dos homens mais perigosos — e mais influentes — que conheço.
Os olhos de Alessandro se estreitam, sua expressão ficando ainda mais fria, se é que isso era possível. Um arrepio me percorre a espinha, mas eu me forço a manter a postura. Não vou dar a ele o prazer de ver que me intimida.
— Você realmente não tem ideia de quem eu sou, tem? — diz ele, a voz carregada de desprezo. — Ou não cometeria o erro e******o de colocar as mãos em mim.
Dou um sorriso sarcástico.
— Não sou professora de inglês, mas tenho quase certeza de que isso não significa “me desculpe”. Vamos tentar de novo?
Seu maxilar se contrai, e por um instante, vejo uma faísca de irritação brilhar por trás daquele controle gelado.
Já vi dezenas de fotos dele nos jornais, revistas e colunas de negócios que o mordomo adora ler, mas nenhuma delas capta o impacto de vê-lo assim, ao vivo, diante de mim — arrogante, inacessível e tão bonito que chega a ser irritante.
Mesmo na adolescência, ele já chamava atenção pelos traços perfeitos, mas agora... agora ele é uma presença. Impossível de ignorar.
— Você não pode simplesmente tratar as pessoas como lixo e achar que vai se safar — digo, soltando seu braço. — Isso é coisa de babaca.
— E quem disse que me incomodo em ser um? — Ele ergue uma sobrancelha com aquele ar perigosamente encantador. Tudo nele exala uma confiança quase insuportável — o terno de corte impecável, o cabelo bagunçado de forma proposital, até a forma como ele me olha, como se tivesse todas as respostas e eu não passasse de um mosquito zunindo ao redor.
— Você mudou — sussurro mais para mim do que para ele, mas ele escuta. Claro que escuta.
— As pessoas mudam. Crescem. Você deveria tentar. — A voz dele é cortante como gelo.
De repente, ele enfia a mão dentro do paletó. Meu corpo reage antes da razão — dou um pulo para trás, o coração disparado, por um segundo esperando que ele saque uma arma. Em vez disso, ele tira um maço de dinheiro e o estende na minha direção.
— Pode ficar com isso se sair do meu caminho e esquecer que essa conversa existiu.
Olho para o dinheiro, boquiaberta, e forço um sorriso falso.
— Você não conseguiria me comprar nem se tentasse.
— Não estou tentando te comprar — retruca, a frieza se intensificando. — Estou tentando tirar você da minha frente.
Cerro os dentes, enraivecida.
— Eu nem estaria aqui se você tivesse a decência de pedir desculpas. Mas claro, isso seria esperar demais.
— Você parece gostar de ouvir sua própria voz — diz ele, inclinando levemente a cabeça, com um tédio c***l nos olhos. — Mas eu não. Você é só uma criança, e estou perdendo tempo demais com você.
Antes que eu possa responder, ele joga o maço de dinheiro em minha direção. Instintivamente, me encolho, e as notas se espalham pelo chão como folhas ao vento.
Fico olhando para o dinheiro por um momento, mas quando levanto os olhos, ele já está do outro lado da garagem. Observo as portas do elevador se fecharem diante dele. E então ele se vai. Como se nunca tivesse estado aqui.
Fico parada, punhos cerrados, os olhos ardendo, encarando o carro dele com tanta raiva que quase espero vê-lo pegar fogo. Por um segundo, penso em arranhar a lataria, mas desisto. Não sou tão suicida assim — e além disso, não vou dar a ele a vitória de me fazer perder o controle.
Respiro fundo, tentando acalmar a tempestade que gira dentro de mim.
— i****a — murmuro, virando para voltar ao meu carro. Me sinto ridícula... e, graças a Deus, não tem ninguém por perto para testemunhar essa humilhação.
Encontro uma nova vaga, estaciono e começo a trocar de roupa, ainda com a mente fervilhando. E então, um pensamento se insinua como uma agulha: Alessandro vai para o mesmo evento que eu?
Balanço a cabeça, tentando espantar a ideia. Não importa. Não posso deixar esse encontro — se é que se pode chamar assim — arruinar minha noite.
Afinal, ele não é mais aquele garoto que me levantava para alcançar o cereal na prateleira. E eu? Eu também não sou mais a garotinha que achava que o mundo girava ao redor dos olhos dele.
Esse encontro não aconteceu. Eu não o vi. Ele não existe para mim.