Pré-visualização gratuita PRÓLOGO
— Nicolas, levanta logo. — A voz abafada do meu pai, vindo do lado de fora do meu quarto, me faz soltar um grunhido baixinho, enquanto enrolo-me no cobertor quente e macio.
— Qual é, pai. Hoje é domingo. — Respondo, embora não tenha certeza se ele entendeu ou não o que eu disse. Acho que nem eu entenderia as minhas palavras caso não fosse eu mesmo quem tivesse falando.
— Você precisa ajudar na mudança, eles já chegaram. — Ele continua, dando duas batidas rápidas na porta do quarto, antes de se afastar, fazendo os seus passos ecoarem pelo corredor.
Ah é. Laura, a namorada do meu pai, vai vir morar aqui no nosso apartamento à partir de agora. Ela e o seu filho misterioso, da qual sempre fala.
O pensamento me faz soltar um grunhido de tristeza e sentar na cama, perdendo totalmente o sono. A claridade que entra pela janela do meu quarto me faz fechar quase que totalmente os meus olhos sensíveis, enquanto tento encontrar uma maneira de me livrar dos trabalhos e conversinhas medíocres da qual meu pai quer me obrigar à passar o dia inteirinho participando.
Não é que eu não goste da Laura. Na verdade eu gosto bastante. Ela é simpática, divertida e parece gostar bastante do meu pai (além de fazê-lo bastante feliz, que é o que realmente importa). O problema é que durante os longos meses que eles namoraram, eu achei que não daria em nada, ou pelo menos torcia para que esse relacionamento continuasse como estava: Com meu pai aqui no nosso apartamento, e Laura e o filho misterioso dela na cada deles.
Agora, nós quatro vamos ter que viver no mesmo lugar e sermos uma grande família feliz (pelo menos tentarmos ser. E caso não dê certo; fingirmos ser).
O nosso apartamento fica em Copacabana, perto da praia. Ele foi uma das grandes conquistas do meu pai e da minha mãe (quando ela era viva), e custou longos e árduos anos de trabalho para ser comprado. O problema é que colocar outras pessoas aqui dentro sem mais nem menos parece tão... Errado? Estranho? É como se fosse um desrespeito com a minha mãe.
Não que eu tenha a ousadia de falar isso para o meu pai. Minha mãe morreu à mais de 10 anos, e seria uma babaquice minha não apoiar quando meu pai finalmente decidiu seguir em frente. Além disso, Laura e ele realmente parece estar bastante apaixonadinhos, e o mínimo que eu posso fazer é ficar feliz por eles, ou pelo menos aguentar calado caso alguma coisa me irrite.
Eu levanto da cama e faço uma nota mental para arruma-la logo que sair do banheiro, porque metade do edredom está no chão, e a colcha está tão amassada que nem parece que era um ser humano que estava dormindo sobre ela.
O meu quarto é grande, mas há tantas coisas dentro dele que faz com que ele pareça bem menor. Eu tenho um banheiro só para mim, mas ele é compartilhado com o quarto de hóspedes ao lago do meu (que está vago, e espero que continue assim).
Estou vestindo apenas um velho pijama desbotado, mas que é tão confortável que não consigo sequer pensar em me desfazer dele, apesar das insistências do meu pai para usar os mais novos ou comprar outros para substitui-lo.
Assim que entro do banheiro, meu olhar segue até o espelho, focando automaticamente no meu reflexo. Meu cabelo cacheado é do mesmo tom avermelhado que o da minha mãe era, e mesmo que meu velho também insista para que eu apare pelo menos as pontas, gosto do tamanho que ele está agora.
Já os meus olhos azuis, são graças à herança genética do meu pai, embora a baixa estatura e as milhares de sardas cobrindo cada centímetro da minha pele ainda sejam um mistério. Meu pai sempre dizia que o meu avô (pai da mamãe) também tinha tantas sardas quanto eu, embora eu não tenha nem uma fotografia ou lembrança sobre isso, já que ele morreu bem antes de eu nascer.
Eu também estou um pouco acima do peso, não que isso me incomode de alguma forma. Já passei da fase de não gostar de mim mesmo, mas agora simplesmente amo a minha aparência, mesmo que algumas pessoas sejam idiotas o suficiente para acharem que podem dá opiniõezinhas sobre como acham ou não que eu devo ser.
Escovo os meus dentes rapidamente e jogo um pouco de água no rosto para tentar me livrar das linhas vermelhas causadas por ter dormido de m*l jeito sobre as dobras do edredom, enquanto tento me preparar psicologicamente para a minha nova tarefa: fingir ser o filho adorável que está amando o fato de que duas pessoas vão invadir o seu espaço pessoal por tempo indeterminado em poucos instantes.