— Isso aqui vai me m***r — Cassie disse, largando os livros na mesa da biblioteca com um suspiro dramático.
— A prova ou a vida universitária em geral? — perguntei, puxando meu caderno de química e prendendo o cabelo num coque malfeito.
— As duas. E talvez o fato de que meu professor parece odiar mulheres inteligentes. Ou mulheres com vida social. Ou só mulheres, mesmo.
Ri, mas por dentro entendia. A semana tinha sido puxada. Trabalhos, provas, anotações amassadas no fundo da mochila e noites m*l dormidas. Mas hoje, pelo menos, a gente tinha combinado uma pausa: estudo até as cinco, depois café com o pessoal da sala, e talvez uma festa no alojamento do Bloco G — se a gente sobrevivesse.
Cassie mordeu a tampa da caneta, depois me lançou um olhar afiado.
— E aí, como tá o relacionamento com o furacão Maddox?
— Silencioso — murmurei, focando nas fórmulas à minha frente. — O que é... estranho. Mas também tranquilo. Ele tá tentando ser "normal".
— Mas ele não é normal.
— E nem eu.
Ela riu e deu de ombros.
— Toca aqui, rainha do drama funcional.
Bati a mão na dela e voltamos ao foco. Ou tentamos.
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Às 17h01, fechamos os cadernos. Fomos direto pra cafeteria em frente ao campus, um lugar chamado Bean & Beat, com poltronas coloridas, música ao vivo às sextas e um brownie de Nutella que podia curar qualquer ressaca emocional.
O pessoal da nossa turma já estava lá: Danny (nerd engraçado que andava com três mochilas), Marla (aspirante a atriz que só usava preto) e um garoto novo que ninguém conhecia ainda.
— E aí, Ellie — Danny disse, levantando o copo de capuccino. — Sobreviveu à Química Avançada com o temido professor Costa?
— Sobrevivi. Mas acho que perdi um pedaço da minha alma na aula de hoje.
O garoto novo levantou os olhos. Tinha cabelo escuro, bagunçado, óculos redondos e um olhar curioso.
— Você é a Ellie? A que anda com o Jace?
Cassie se enrijeceu ao meu lado.
— Depende do motivo da pergunta — respondi, sorrindo de leve.
— Eu sou o Theo. Transf. Vim de Chicago. Ele me viu no pátio outro dia e comentou que você era fera em laboratório. Perguntou se podia te indicar pra um projeto da professora Lúcia.
Aquilo me pegou de surpresa. Jace não tinha comentado nada. Mas era típico dele fazer esse tipo de coisa por trás, sem falar — como se tivesse medo que, se dissesse em voz alta, eu rejeitasse.
— Legal. Tô interessada, sim — falei.
— Ótimo. Porque o projeto começa amanhã. E vão ser só quatro pessoas: você, eu, uma garota chamada Jo e... — ele fez uma pausa curta — a Kayla.
Cassie virou o rosto lentamente.
— Sério?
— Tem algum problema? — Theo perguntou, confuso.
— Não. Quer dizer, só o fato de a Kayla ser uma víbora disfarçada de gente — disse Cassie.
— Isso é um problema menor — murmurei, tomando um gole do meu café.
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Mais tarde, voltamos pro campus andando devagar, já com o céu escurecendo e a brisa fria da noite começando a soprar. Cassie falava sobre um podcast de crimes reais, enquanto eu respondia no automático, a cabeça a mil por hora.
Na entrada do Bloco E, Jace estava encostado no corrimão, mexendo no celular.
Quando me viu, deu aquele sorriso que fazia meus joelhos ficarem menos confiáveis.
— Você tá atrasada pra não responder minhas mensagens — ele disse, guardando o celular no bolso da jaqueta.
— Estudo intenso. Café com gente nova. Conflitos internos com uma rival silenciosa. O combo completo.
Ele arqueou uma sobrancelha.
— Rival?
— Kayla tá no meu grupo de projeto. E você me meteu nisso.
— Eu sabia que você ia dar conta.
— Você também podia ter me avisado.
— Se eu avisasse, você ia pensar demais. E talvez dissesse não. E eu sou egoísta quando se trata de ver você brilhando.
Por um segundo, só fiquei encarando ele. A franqueza. O jeito descomplicado com que dizia verdades difíceis.
— Você complica tudo e, ao mesmo tempo, torna tudo mais simples — murmurei.
— É meu superpoder — ele respondeu, se aproximando até o espaço entre nós sumir. — Quer ir na festa no Bloco G comigo hoje?
— Achei que você não curtia festas universitárias.
— Não curto. Mas você vai. E eu gosto de ver o mundo pela sua perspectiva.
Sorri. Sem pensar. De verdade.
— Me dá dez minutos pra trocar de roupa.
Ele assentiu, encostando de novo no corrimão enquanto eu subia as escadas. Antes de entrar, olhei pra trás.
Ele estava ali, me esperando.
E pela primeira vez, aquela imagem me pareceu não só real... mas segura.