Gisele estava encolhida, estremecendo por dentro e por fora, e tinha os olhos arregalados para Galak. Que apesar de ter uma fisionomia bonita, uma altiva postura e se parecer com um Stariano encantador, ela simplesmente não se sentia segura. A imagem de Kelly sendo jogada dentro de uma bacia e, possivelmente, morta, não sai de sua cabeça. Gisele era só uma garota que vivia numa bolha social e fazia “loucuras” com os amigos para desafiar a imaturidade humana. E só…
— Ela entrou em estado de choque, e eu não quero sedar ela. Fazer isso vai fazer ela perder o processo de entender que somos seguros. — Elaine usava uma caderneta tentando explicar a Galak o ocorrido.
— Seguros?! — Gisele berrou — Levaram ela daqui! O que fizeram com ela?! Onde está a Kelly?! O que vão fazer com a gente?!
A sala era pequena, a moça não fazia ideia de que horas eram, mas estava com as bochechas queimando de tanto chorar e com o corpo fraco de tanto estremecer. Ela não queria ceder ao medo, pois tinha medo de desmaiar e ser a próxima a ser levada. No entanto, a imagem que apareceu diante de seus olhos simplesmente fez as batidas de seu coração desacelerar.
Dariu surgiu na sala e atravessou Elaine e Galak, parou na frente da moça e virou para trás apenas para ouvir Elaine e Galak cochichando em seus ouvidos. Segundos depois, eles saíram e Gisele ficou sozinha com o Gigante dourado.
Darius colocou as mãos na cintura, olhou ao redor como se procurasse por uma solução e observou a humana encolhida no canto, com as bochechas coradas de choro. Por algum motivo ela chamou por ele, e por algum motivo ela o dever dele acalmar a criatura.
— Ninguém vai te machucar…
— Como tem certeza disso? — Ela interrompeu e falou entre os dentes.
— Porque agora eu estou aqui. — respondeu direto, fazendo Gisele desfazer o cenho, relaxar o ombro e engolir devagar.
O clima ficou estranhamente estranho, Darius se sentiu levemente desconfortável e puxou uma cadeira. Ele aprendera em seus anos de combate que para lidar com uma zona de perigo, era necessário entender a situação. Isso ajudava a clarear sua mente e lhe dar modos de pensar. Talvez isso pudesse ajudar a humana, de alguma forma.
— Criatura pequena. — Darius levantou as mãos, como quem começa a explicar uma história. — O meu mundo venera sua humanidade. No entanto, existem Starianos que conseguem acreditar que vocês são ameaças. Já ouviu falar da resistência? — Ela concordou com cuidado. — Não foram os Starianos de bem que levaram a sua amiga.
— Mas o que vão fazer com ela? — Ela perguntou baixo.
— Nada. — Darius abaixou as mãos e a olhou firme nos olhos. — Não terá um segundo em nossas vidas que não moveremos para encontrá-la.
— E se for muito tarde?
— Foi muito tarde quando protegi você? — Ela mirou os olhos claros para Darius, notou a imensidão de suas íris, reparou na seriedade da sua fisionomia e por algum motivo, sentiu-se bem. Darius vestia farda preta e dourada, tinha em suas coxas coldres acoplados e o brasão do Lorde Stariano estava em seu peito. A camisa mostrava a musculatura do braço, mas as argolas em suas orelhas lhe dava um ar jovial. — Se não confiar, jamais dará certo. — Ela conseguiu limpar o rosto com as costas da mão, relaxou a perna sobre a maca ao canto da sala e conseguiu depositar suas mãos em cima das coxas. — Agora eu preciso que respire fundo, tente não se assustar com o que viu e me conte o que viu. Eu preciso de todos os detalhes.
A voz de Gisele foi ouvida através das câmeras, enquanto Galak arqueou as sobrancelhas e Elaine colocava a mão na cintura enquanto olhava feio para Volkon. Estavam presentes mais dois capitães, apenas observando a aula através das câmeras, todos acusando Volkon por ter “cagado” no primeiro experimento.
— Porque não foi assim comigo? — ela resmungou, dando um tapa em seu braço com as costas da mão.
— Porque a humana não gosta de bonecas douradas. — Ele resmungou, sem sentir o impacto do tapa.
(...)
Darius já estava em pé e ao lado da humana. Ela estava sentada tomando uma xícara de um líquido quente e doce, semelhante a leite. Ela olhou para baixo e bateu o dedão contra a alça, segurando a xícara com a outra palma. Darius contou para Gisele o motivo das explosões da nave, a história de seu povo e os esforços de Elaine.
— É uma história triste, sobre sobrevivência e guerra. — Darius concluiu.
— É uma história triste porque ainda não chegou no final. — Gisele já não chorava mais. — Volkon e Elaine, são felizes, não são? — Ela o olhou com atenção e fez Darius pensar.
— Volkon parece feliz.
— Olha… — Gisele captou seu olhar. — Eu sinto muito. — Gisele confessou. — Eu não queria que se ofendesse, mas eu sei que falei… que falei coisas pesadas.
— Não se pode adorar o que teme. — Darius interrompeu. — Os humanos para mim não são lá a coisa mais inteligente do mundo, forte ou bonita. — Ela franziu o cenho e o olhou de boca aberta. — Mas eles tem a chave para o meu mundo e eu os respeito por isso.
— Não acha os humanos bonitos? — Gisele perguntou sorrindo.
— Aqui, os terráqueos são os alienígenas. — Ela riu abertamente, enquanto ele se manteve observador. — Nós Starianos não somos guiados pelos olhos.
— E como são guiados? — Ela realmente parecia curiosa, enquanto bebericava o caldo com efeito calmante e doce.
— Bom… Uma fêmea precisa ter bom cheiro. Eu gosto de… cheiros. Cheiro de fêmea. — Gisele piscou e por algum motivo ela virou sorrateiramente e cheirou a beirada das suas axilas. Darius percebeu. — A fêmea tem um bom cheiro, não se preocupe. Só está exalando o aroma do Stariano que a segurou durante o ocorrido.
Ela enrubesceu, abaixou os olhos e bebericou a xícara, um tanto sem graça. Darius a olhou com atenção e então mirou a porta. Ele ia citar sobre seu gosto pela mudança de tom na pele do rosto dela em como ele acha isso interessante nos humanos, mas ela o interrompeu.
— Consegue sentir o cheiro de outras pessoas em mim? — Ele concordou.
— E está terrivelmente desagradável. Se a fêmea fosse minha eu o chamaria para um combate e bateria nele o suficiente para que ele tivesse vergonha perante todos, e a fêmea pudesse olhar para mim com orgulho.
Gisele engoliu devagar, Darius percebeu o que falou e desviou os olhos sérios, sentindo o ar um tanto rarefeito para respirar. Esse era o instinto impetuoso que o fazia agir de forma descabeçada? Que maldição era aquilo?
— Se eu fosse sua? — Gisele repetiu pensativa, sentiu as bochechas coradas e se recordou do dia que acordou na nave e o viu nu dentro daquele tubo cheio de água. — Não tem como ser sua, tem? — Ela tentou brincar. — Digo… Eu… Bem… — Ela riu sem graça, sentiu as mãos tremer e o coração disparar. — Acho que aquelas meninas no pátio querem ser sua. — Tentou desconversar.
— Eu não as quero. Elas fedem. — Ele soltou sem problemas, franzindo o cenho e se recordando daquele momento.
E Gisele sorriu. Apenas sorriu.
— Obrigada por estar aqui. — soltou com toda sua sinceridade e respirou profundamente tranquila e sem medos.
— Porque estava andando sozinha pela noite? — Ele perguntou, agora que identificou um pouco mais da confiança da humana, mas ela deu de ombros. — sente falta da sua casa? Do seu lar?
Gisele olhou para o lado, levantou o olhar e encontrou os olhos preocupados de Darius. Ela sabia que ele não precisava estar lá e nem perder tanto tempo com ela apenas para terminar em uma conversa de cheiro, mas ele tinha um modo de tocá-la de um jeito diferente. E então ela assentiu. Porque desde quando chegou, não teve tempo de pensar nos pais que não veria mais, nos amores que não viveu e nos irmãos que ficou na Terra, e Darius foi o único que percebeu isso. Ele viu que o que mais aterroriza Gisele é que ela está sozinha.
Sem que ele pudesse premeditar, Gisele deixou as lágrimas escorrer e apoiou a cabeça na costela do homem ao seu lado. Ele chegou a levantar as mãos quase como um alerta e observou a diminuta humana se encolher em choro com ele. E devagar ele desceu as mãos, tocou em seus ombros e se virou, para que Gisele pudesse se aninhar confortavelmente. Então ele respirou fundo, sentiu o cheiro dela, o temor dela e tocou em seus cabelos, desejando matar o maldito Stariano que grudou nela desse modo.
— Corte os cabelos, humana. — Ele pediu. — O Stariano está em seus cabelos.
E no meio do soluço e do seu choro, Gisele riu. Enquanto Darius se perguntou porque diabos ela achara isso engraçado?