Capítulo 31 - A Noite da Revelação

2099 Palavras
A Lua Cheia pendia no céu, um disco pálido e indiferente que testemunharia o desmoronamento de um mundo. Naquela noite, a inquietação que corroía Mia por dentro finalmente se fundiu em uma decisão fria e sólida. A imagem de Logan, frustrado, e de Luke, com seu olhar desapontado para a cadeira vazia de Bryan à mesa de jantar, havia sido o catalisador final. A ansiedade que a consumia precisava de uma resolução. Ela se recusava a ser uma espectadora passiva de seu próprio casamento, esperando que a "barreira fria" de Bryan cedesse por vontade própria. Não. A Sigma, a Lua, tomaria a iniciativa e iria até seu Sol. Com os dedos trêmulos, ela discou o número do Alfa. O telefone vibrou contra sua orelha com uma intensidade que parecia ecoar o frenesi dos lobos sob a Lua Cheia. A voz de Bryan, quando atendeu, foi um golpe baixo: cansada, robótica, um sussurro oco do homem que outrora rugira por ela. — Vou ter que ficar até tarde hoje, amor. Não me espere para dormir. As palavras, que em tempos passados seriam aceitas com um suspiro resignado ao seu fardo de líder, agora soaram como uma afronta. Como um alvará para sua inquietação. Uma lógica desesperada floresceu em sua mente: se ele ficaria no trabalho, não poderia passar fome, certo? Era um pretexto frágil, ela sabia, mas era o fio de esperança ao qual ela se agarrava. A necessidade de Bryan era uma dor física, um vazio no centro do seu ser que só o calor dele, o peso de seu corpo sobre o dela, o sabor de sua pele, poderia preencher. Um calor involuntário percorreu seu corpo, uma umidade sutil e vergonhosa a invadiu, renovando a fé de que poderia reascender a chama que a distância e a desconfiança ameaçavam apagar. Era um anseio lupino, primal, que vinha do cerne de sua alma de Sigma. Ela chamou Rosê, a governanta, com uma voz que tentava soar despreocupada. — Rosê, prepare algo especial para o Alfa. Algo reconfortante. Vou levar até o escritório. Enquanto os aromas da refeição emanavam da cozinha, Mia mergulhou em seu próprio ritual, uma preparação meticulosa que era, acima de tudo, um ato de guerra silenciosa. Era uma reafirmação de seu lugar: eu sou sua Luna, seu refúgio, a única que pode aliviar o peso da coroa de espinhos que ele carrega. Do fundo do armário, ela tirou a lingerie preta, uma peça de sedução e vulnerabilidade. Era belíssima e completamente transparente, um convite e um desafio. O espartilho de renda fina definia sua cintura e realçava seus s***s como uma oferenda. A calcinha fio dental era um fio de tecido que prometia mais do que escondia. As meias de seda, transparentes como orvalho, subiram por suas coxas, presas por ligas de renda que pareciam marcar a fronteira entre a decência e o desejo. Por fim, os saltos altos e finos, que a elevavam e a tornavam poderosa, um tacão que anunciava sua chegada. A maquiagem foi sua armadura. Um smoky eye sedutor que fazia seus olhos de Sigma brilharem como estrelas em meio à escuridão, e um batom vermelho vibrante, uma mancha de paixão e determinação em seus lábios carnudos, que ainda formigavam com o eco do beijo matinal, agora uma memória amarga e distante. Não contente, ela aplicou seus feromônios mais potentes nos pulsos, atrás das orelhas, no vale entre os s***s. Garantiria que o perfume de sua intenção, doce e intoxicante, chegasse a Bryan antes mesmo de sua presença física. Por fim, vestiu o sobretudo preto de cashmere, longo e elegante. Era o véu que cobria a promessa, o invólucro do presente que ela acreditava ser. Tudo havia sido planejado com a precisão de uma estratégia de batalha. Mia seria a melhor aquela noite. Ela detalhou em sua mente como queria que Bryan se sentisse: relaxado, dominado pelo desejo, e, acima de tudo, sortudo. Sortudo por ter uma esposa e Luna que moveria céus e teras para satisfazê-lo, para trazê-lo de volta à luz. Com o pacote de comida quente em uma mão e a promessa de redenção na outra, Mia guiou sua BMW pela cidade adormecida. A excitação era uma serpente a se enrolar em suas entranhas, uma mistura tóxica de adrenalina e expectativa. A noite que a aguardava não era apenas sobre ele; era sobre reivindicar seu lugar, sobre lutar contra o fantasma silencioso de Lívia e as sombras insidiosas de Daemon Hemlock que ela sentia se fechando em torno de seu marido. Mia estacionou no subterrâneo, seu coração um tambor de guerra solitário e descompassado no silêncio do concreto. Seus saltos ecoaram como tiros nos corredores polidos do prédio da alcateia, um som penetrante que anunciava a chegada da tempestade. As portas de entrada estavam apenas encostadas, e ela ouviu o murmúrio abafado de vozes e viu luzes acesas em salas de reunião. Claro. Onde o Rei Lycan trabalhava, toda a sua corte de leais — Deltas, Gammas, Tenentes — permanecia de vigília. Mas então, algo mudou no ar. À medida que se aproximava do andar executivo, o cheiro amadeirado e familiar de Bryan começou a se intensificar, mas estava... contaminado. Impregnado de uma nota floral-doce, enjoativa, que ela reconheceu com um frio súbito na espinha. Era o perfume de Lívia. Um pressentimento lupino, um uivo de alerta no fundo de sua alma, tentou detê-la. Uma pontada de dor gélida, uma intuição ancestral, gritou para ela fugir. A Luna Blackwolf, porém, enterrou aquele aviso no fundo da alma, sufocando a verdade em prol da frágil esperança que a trouxera até ali. Nada, nem mesmo os deuses, a impediria agora. O coração galopava em sua garganta, uma fera enjaulada. Ela suplicou silenciosamente para que seu corpo não a traísse, para que nenhum tremor, nenhum fio de suor, denunciasse seu nervosismo. A antecâmara estava deserta. Um silêncio pesado, omisso. Um arrepio percorreu sua coluna, mas ela o atribuiu ao frio do mármore ou ao calor da expectativa. Sem hesitar, com a mão que m*l conseguia segurar o pacote de comida, ela empurrou as grandes portas de carvalho do escritório de Bryan. O mundo desabou. A cena que se desenrolou à sua frente não foi apenas vista; foi sentida como uma garrada gelada no peito, dilacerando-a de dentro para fora, rasgando o próprio tecido de sua realidade. Mia congelou no umbral, uma estátua de horror e descrença. Bryan Blackwolf, seu marido, seu Alfa, estava de pé, imponente e animalesco, de frente para a enorme mesa de reunião de mogno. E sobre a superfície polida, como um sacrifício profano, estava Lívia. Suas pernas estavam abertas para ele em uma pose de obscena vitória, seu vestido arrancado, os s***s expostos. A camisa de Bryan estava aberta, o peito musculoso ofegante e coberto de um leve suor. Suas calças, arriadas até os joelhos, eram a bandeira de sua traição. O ar no escritório estava pesado, saturado, quase irrespirável com o cheiro inconfundível, primal e doce de sexo. Um aroma que deveria ser sagrado, exclusivo deles, agora violado, manchado pelo suor de outro corpo. E no mesmo instante, o vínculo que os unia – aquele laço de almas destinadas, forjado não só em juramentos, mas no próprio sangue e essência de suas bestas interiores – se contorceu como se tivessem jogado ácido sobre ele. O que era uma corrente dourada e quente, um rio de confiança e pertencimento que fluía constantemente no fundo de seu ser, foi corroído, derretido em um instante, deixando para trás apenas um fio fumegante e envenenado, um m****o fantasma que latejava com uma dor agonizante. E do mais profundo de seu ser, de onde sua loba, Mika, governava seus instintos mais puros, ecoou um ganido. Não era um uivo de fúria, mas um som dilacerante de lamento e desespero, o lamento de uma parceira que sente a outra metade de sua alma ser brutalmente arrancada e assassinada. Lívia gemia, um som gutural, sujo e teatral que ecoava nas paredes e encontrava um eco agonizante no coração de Mia. Bryan, com uma ferocidade que ela nunca vira dirigida a si mesma, enterrava o rosto no seio de Lívia e a penetrava com uma força brutal e ritmada, os corpos se chocando em um ato que era mais sobre poder do que prazer. Ele estava tão perdido naquele frenesi, tão cego pela lascívia, que a presença de Mia passou despercebida. Foi Lívia quem a viu primeiro. A mulher virou a cabeça, e seus olhos, límpidos e sóbrios, encontraram os de Mia. Um sorriso largo, obsceno e vitorioso estampou-se em seus lábios. Não havia vergonha, apenas a pura, cristalina satisfação da conquista. Deliberadamente, ela gemeu mais alto, um uivo de posse, e Bryan, alheio, rosnou de prazer em resposta. O som foi a gota d'água. O estômago de Mia contraiu-se violentamente. Uma onda avassaladora de nojo, tão física quanto um pontapé, subiu por sua garganta. O mundo girou. Sem conseguir conter, sem tempo para dignidade ou fuga, ela vomitou. O jorro ácido e amargo explodiu no chão polido, o som áspero e visceral quebrando o feitiço daquele pesadelo. — p***a! QUE MERDA É ESSA? — a voz de Bryan rugiu, cortante com o choque. Ele se afastou bruscamente de Lívia, as mãos tremulas puxando as calças para cima em um movimento desesperado e patético. Ele ainda tremia, todo o corpo agitado pelo sexo de momentos antes. E Mia viu. Com uma clareza hedionda que queimaria sua retina para sempre, ela viu o p*u dele, exposto e vulnerável, a ereção ainda imponente e úmida, pingando o próprio fluido da traição. A visão era desprezível, nauseante, uma profanação de tudo o que eles haviam tido. O fedor do suor deles, misturado ao cheiro do sexo e ao odor ácido de seu próprio vômito, criou um perfume de horror que lhe invadiu os pulmões. Mia precisava sair dali. Seu olhar, um abismo de nojo puro e absoluto, encontrou o de Bryan. Ele ofegava, o peito nu subindo e descendo freneticamente, a vergonha e o pânico lutando pela posse de seus traços. O sobretudo preto, esquecido em seu braço, escorregou e formou uma poça n***a no chão. Por um instante, a lingerie transparente, a renda cuidadosamente escolhida, os s***s realçados pelo espartilho, tudo ficou exposto. A ironia era uma faca serrada, torcida em suas entranhas, mais cortante do que a própria traição. Bryan, agora semi-vestido, deu um passo hesitante em sua direção, a mão estendida em um gesto vão. — NÃO SE ATREVA! — o grito de Mia rasgou o ar, uma fúria primordial que fez as janelas vibrarem. A voz não era mais a dela; era a voz da Lua traída, da Fêmea ferida. A força sísmica daquele único comando o prendeu no lugar. Lívia, ainda sentada na mesa, parecia radiante, seu sorriso um escárnio mudo. Bryan estava pálido, os olhos arregalados, a magnitude de seu fracasso finalmente atingindo-o como um raio. — Mia, calma, por favor, deixa eu explicar! — ele suplicou, a voz rouca e fraca, os braços ainda estendidos como um mendigo. Os olhos de Mia, inundados de lágrimas que não traziam alívio, apenas ardiam como ácido, encontraram os dele. Ela o encarou e viu, pela primeira vez, não o seu Alfa, mas um estranho. Um homem fraco e desprezível. — Você conseguiu me enganar perfeitamente — ela cuspiu as palavras, cada sílaba um estilhaço de vidro saindo de sua garganta. A voz embargada pela dor, mas a resolução, fria como o aço. — Mas foi a última vez que você fez isso! Com aquela sentença final, Mia se virou. O mundo era um borrão de mármore e luzes. O cheiro do vômito e da traição ainda a seguia, um fantasma repugnante. Seu estômago era um nó de convulsões, seu coração, não mais em pedaços, mas pulverizado, reduzido a pó. Ela correu. Seus saltos, outrora símbolo de poder e sedução, agora batiam no piso como os de uma condenada em fuga. O corredor alongou-se diante dela, um túnel sem fim. A visão escureceu nas bordas, o som abafou. A dor no peito era uma âncora a puxá-la para o abismo. O cheiro, o cheiro ainda em suas narinas... era demais. O mundo girou uma última vez, uma rotação feroz e sem piedade. Antes que seus joelhos pudessem ceder, antes que suas mãos pudessem encontrar a parede, a escuridão veio e a consumiu por completo. Mia desabou no corredor frio e vazio, seu corpo um pequeno e frágil ponto de ruína no imponente coração do reino de seu marido. A Lua Cheia, lá fora, testemunhou impassível o silêncio que se seguiu, mais aterrorizante que qualquer grito.
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