Confissão

2117 Palavras
Lauren Mckay. Não era uma manhã comum. Eu não sentia vontade de sair da cama, eu não queria sair da cama. A noite toda eu fiquei me revirando, mesmo após ser muito bem beijada e ter tido um sexo bom com Alec, quando ele saiu do quarto perto das duas da manhã e foi para o seu aposento, eu só conseguia olhar as fotos antigas da minha mãe e sentir um aperto estranho no peito. Eu não a conheci e tudo o que eu sei sobre ela foi contado por outras pessoas, mas todos os aniversários de morte dela, meu dia simplesmente não funciona. Deixei avisado no escritório que eu não iria estar disponível o dia todo e voltei a me afundar nas cobertas. O cheiro do meu marido ainda estava ali, mas isso não me trouxe nenhum tipo de sentimento bom. Eu senti apenas um certo nojo de mim e uma estranheza na espinha, como uma intuição. Alec cumpriu o que prometeu. Ele está participando ativamente da empresa. Todos os dias nós trabalhamos juntos e ele conseguiu deixar a igreja em boas mãos para focar nos negócios (palavras dele). Nós dois estávamos nos dando bem. Não havia nenhum tipo de comprometimento, sentimento ou ligação. Nós decidimos manter o foco e recuperar todas os declínios que tivemos por conta da falha do projeto de Biomassa começando do zero, checando e analisando o que havia de errado. Vez ou outra íamos para Nova Iorque em reuniões ou visitávamos novos acionistas. Mas felizmente estávamos juntos nessa jornada de dois anos. E ainda faltavam vinte e dois meses para eu me divorciar. Apesar do nosso casamento contratual, desde que nos pegamos na sala de reuniões, nós mantemos uma relação estreitamente profissional com uma ressalva de sexo casual. Mas não é como se ele fosse incrivelmente maravilhoso na cama. A primeira vez foi maravilhosa, mas com o tempo, sem ter i********e, nós éramos apenas dois corpos cansados após uma transa e de madrugada ele saía debaixo dos meus lençóis. Eu sei que muitas mulheres achariam esta situação emocionante, mas no íntimo do meu ser eu parecia estar insegura com algo. Eu não sabia exatamente o que era, ou se eu só estava muito sensível pela minha mãe... Ou poderia ser uma possível TPM. Minha mãe se chamava Diana. As histórias que meu pai me contou sempre foram voltadas para os negócios. De que ela era visionária, esforçada, que ajudou ele a construir uma fortuna gigante..., mas o meu irmão – e é importante mencionar que ele foi deserdado –, sempre falou muito bem dela. Ele dizia que ela era um anjo, que tinha a voz mais doce do mundo... Disse que os olhos dela eram grandes e redondos como os meus, e que nosso nariz tinham o mesmo formato... Meu irmão debochava por eu ter a pele mais clara que a dele e por ser de um mundo predominantemente branco. Mas aquilo, quando eu era criança, não fazia sentido. E depois que cresci, ele se afastou e brigou feio com nosso pai. Logan foi retirado do testamento, desligado da empresa, teve todos os bens caçados e atualmente eu não sei do que ele vive, mas eu soube que ele ficou preso por um tempo. Então eu era o rosto que restava para o meu pai, e a forma em ele me intitulava como “filha única” vez ou outra revirava meu estômago. Ter meu rosto estampado em tudo o que era relacionado à empresa também era um tipo de representatividade que ele fazia todo mundo engolir goela abaixo. Eu era a única afrodescendente da empresa. Saindo dos meus devaneios, eu me sentei na cama e olhei o relógio, vendo que já passavam das dez da manhã. Não ouvi a voz do Alec ou alguma movimentação, então imaginei que ele havia saído, ele iria assinar alguns contratos da Hastings & CO. com o Gus e então, o plano era me encontrar em casa para terminarmos de planilhar e mapear as plantas de extração do Novo México. Mas aquilo não iria acontecer. Não naquele dia. Eu me levantei e tomei um banho, depois, percebi que eu nunca havia de fato, em dois meses, observado a casa de Alec... Era tudo tão certinho que parecia ter sido montado como um cenário de filme. Obras de arte caras, tapeçarias e lustres... Eu até descobri que havia uma escadaria totalmente temática para um cinema. Sem contar a sala de jogos, piscina, sauna. Ele vivia em um palácio de rei, mas aproveitava como um camponês. Na minha mente, algumas coisas eram tão perfeitamente moldadas naquela casa, que parecia uma pegadinha, uma montagem... Até a forma em que os carros ficavam dispostos na garagem era estranho. Eu até havia formulado uma teoria na cabeça. SUVs e Trucks na frente para proteção dos veículos de trás... Sem contar o Rolls Royce, ele estava sempre coberto e sempre havia um segurança olhando e rondando os arredores da casa. As vezes eu tinha a sensação de que iria entrar alguém atirando. Mas eu sabia bem que todos esses pensamentos eram gatilhos. Depois de andar pela casa toda, eu apanhei um vinho na adega e uma taça, e me sentei no sofá, soltando o ar dos pulmões. Eu não queria beber até ficar atordoada, mas eu queria ao menos sentir sono e dormir o resto da tarde. Quando pensei em ligar a televisão, o meu celular vibrou. Era uma mensagem da Julienne. Imediatamente abri o chat. Eu estava esperando alguma atualização sobre o tal cheque. E a resposta que tive foi um tanto frustrante. “Amiga, sinceramente, está impossível de rastrear esta transação bancária. Eu vou precisar apelar para um Software mais agressivo. Talvez algo até meio ilegal. Não sei quanto tempo vou levar, mas te atualizo. Beijo, amo você.” Revirei os olhos e enviei um emoji, vendo várias notificações. Entre elas, uma mensagem de Alec perguntando se eu estava bem, e em seguida, ele disse que eu era melhor em persuadir as pessoas do que ele. Respondi com outro emoji e bebi o vinho até pegar no sono. — Você está bem? — Alec perguntou enquanto jantávamos, olhando nos meus olhos — Lauren? Respirei fundo e assenti. — Você sumiu a tarde toda, eu cheguei e você estava fazendo o jantar... Você nunca cozinha. Tomei um gole de água e dei risada. — Eu gosto de cozinhar. Me relaxa. Na verdade, eu costumava cozinhar quando estava muito triste. — E você cozinha bem — Elogiou — mas me diga, o que aconteceu com você hoje? Minha garrafa mais cara de vinho rosê está vazia e eu te encontrei dormindo no sofá enquanto passava um reality indiano na televisão. Dei risada. — Hoje é um dia sensível para mim — mordi meu lábio, abaixando o olhar — É estranho falar sobre isso com você, sabe? — Então finja que eu não sou o Alec... pense que eu sou um apenas um pastor e você vai se confessar. — Não quero falar sobre os meus pecados — eu dei risada e ele riu junto, segurando a minha mão. — Confissão não precisa só ser sobre pecado. Pode ser sobre um sentimento, uma dor ou queixa. Eu prometo que não vou te julgar. Respirei fundo e assenti. — Hoje fazem vinte e sete anos que a minha mãe morreu — sussurrei. Alec entendeu o que eu disse e deixou a comida de lado — eu não lembro nada dela. Nada. Eu tenho algumas fotos, porém as fotos são só lembranças e memórias dela com outra pessoa. — E como você se sente? — É estranho eu sentir falta de alguém que eu não convivi? É como se tivesse alguma coisa faltando, sabe... O câncer dela, eu já fiz um milhão de exames para ver se eu tenho algum risco, e geneticamente eu sou super saudável, o médico já me disse umas trinta vezes que eu não tenho nenhum histórico. Eu não entendo como... — nem eu sabia mais onde eu queria chegar — sei lá, eu só acho que com ela a vida seria diferente. — Em qual sentido? — ele voltou a comer e eu sequei a lágrima que ameaçou cair. — Alec, a primeira vez que eu vi você, eu tinha quinze anos. Duas semanas depois eu fui sequestrada. Eu fiquei três dias dentro de um buraco que até hoje eu não sei onde se localiza. No mesmo mês que isso aconteceu, meu irmão foi deserdado e eu perdi todas as coisas que eu tinha da minha mãe em uma batida da polícia na minha antiga casa. Eu acordei em um dia qualquer, saí para ir para a escola e o meu motorista estava morto no jardim. Uma van avançou contra mim, dois homens enormes saíram de dentro e “boom”... — eu estava perplexa — duas coronhadas e eu apaguei. Fiquei quase trinta horas ouvindo um homem negociar com meu pai sobre o quanto eu valia... Eles me fizeram brincar de roleta russa... Me aterrorizaram. Todas as minhas emoções estavam muito afloradas. Eu não sabia o que sentir, como me acalmar ou como eu iria controlar o aperto no meu peito. — Você é uma mulher muito forte. Neguei com a cabeça. — Uma mulher forte controla a própria vida, Alec. Uma mulher forte decide com quem vai se casar e se impõe quando vê corrupção dentro da própria empresa — respirei fundo — eu acordo todos os dias e me convenço de que isso aqui entre nós vai fazer sentido daqui um tempo. Eu coloco na minha cabeça de que é uma obrigação e eu vou cumprir com maestria. Depois daquele sequestro, eu descobri que a minha cabeça pode rolar por um, dois, três... dez milhões de dólares. Eu aprendi defesa pessoal, aprendi a usar uma arma, fiz aulas de luta. Foi assim que eu segui em frente... E eu me pergunto, será que isso é seguir em frente? Em frente para onde, Alec? — Eu sinto muito, Lauren. O que eu posso fazer é garantir o meu total apoio a você a aos nossos objetivos durante este contrato que temos e sempre te proteger enquanto você estiver aqui. E quanto a tudo o que você está sentindo, eu sei que você não acredita em espiritualidade, mas eu sei que Deus não dá um fardo maior do que podemos carregar. Eu ri com desdém e neguei com a cabeça. — O seu “Deus” não fez nada pela minha mãe, nem por mim aquele dia enquanto eu mesma puxava um gatilho contra a minha cabeça rezando para não ter nenhuma bala. O seu “Deus” não fez nada por mim, Alec. Mas eu agradeço por me ouvir. Ele ficou me olhando e se levantou, vindo ao meu encontro. Alec me abraçou com força e secou meu rosto. — Quer abrir outra garrafa? — ele indicou o vinho. — Era tudo o que eu queria ouvir. Nós nos servimos e nos sentamos no sofá da sala novamente. — Você vai se casar de novo um dia, Lauren — Alec afirmou — e vai ser feliz. Quem sabe com o seu motorista... — Está com ciúme? — brinquei e ele revirou os olhos — mas o Geralt é só um funcionário. Eu e ele nunca pensamos em nada além da minha segurança. ­— Então ele é o seu segurança pessoal? — Sim... Depois de tudo o que aconteceu comigo, meu pai o contratou. Ele é um ex soldado. Alec fez uma cara de admiração. — E você só tem ele de segurança? — Que isso? Um questionário? — o encarei dos pés a cabeça, com sarcasmo — inclusive, você fica bem de moletom, estou cansada de tirar seus ternos caros. Moletons seriam bem mais fáceis na hora do rala e rola. Alec me seu um empurrãozinho e bebeu um pouco. — E eu tenho mais uma segurança — o respondi — , ela foi treinada pelo Geralt. O nome dela é Heidi. — Alemã? Uau. — Ela é a essência da disciplina. Quem sabe eu te apresento um dia. Tenho certeza que ela colocaria seus seguranças para correr. Meu marido fez uma expressão de “eu duvido” e olhou a televisão. — E qual é a do Reality indiano? — Ele se chama “Eu amo a Rupali” — dei risada — adoro assistir esse tipo de vergonha alheia. São cinco homens tentando conquistar o coração desta moça — indiquei uma mulher na TV. — Espero que ela tire a roupa de um deles mais rápido do que você tira a minha. Nós rimos e passamos a noite ali. Como bons amigos.
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