Anos atrás
— Nīsan (mano) onde você está indo? –Minha irmã Sana me perguntou, toda vez ela pergunta a mesma coisa, onde vou, quando vou chegar, com quem estarei.
—Apenas dar uma volta e você? –perguntei.
—Tenho aula de violino hoje à tarde, ouvi o papai dizer que vai precisar de você para colher os vegetais, ok? – ela me avisou.
Que ótimo, odeio colher vegetais, meus pais vivem em uma fazenda, eles plantam muitas coisas, batatas, milho, cada parte da fazenda está cheio de plantações e nos dias de colheita eu chego morto de cansado em casa.
—Então eu vou aproveitar e fugir logo agora. –falei. –Até mais.
—Nīsan –ela me chamou. Eu parei de andar e olhei em sua direção. –Eu amo você.
Eu sorri e respondi:
—Também amo você.
Se existir um momento na vida em que você se arrepende amargamente de suas ações, é esse momento, minha irmã Sana me disse isso e eu gostaria de ter abraçado ela, beijado, ou eu gostaria de oferecer para leva-la no maldito lugar onde estudava piano. Mas eu fiz tudo diferente.
Encontrei uma galera da escola no centro da cidade e nós fizemos o que jovens nessa idade fazem, eu tenho dezesseis anos e tenho uma vida inteira pela frente, quero conhecer novos lugares e em hipótese nenhuma eu quero ser um fazendeiro, é trabalho demais.
A gente bebeu, havia algumas garotas por perto e a gente deu uns amassos, coisa normal para minha idade, ou não, tem uma garota na minha turma que ela nunca deixou nenhum garoto dar um beijo nela, sempre vai com roupas longas e uns vestidinhos até bonitinhos, acho que ela é uma exceção.
Para fugir do trabalho no campo, eu passei a tarde inteira no centro, recebi umas mensagens do meu pai, mas não respondi, depois eu diria que estava fazendo algum trabalho da escola e ele entenderia. Quando chegou a hora do jantar eu voltei para casa, achei que fosse receber uma bronca ou algo assim, mas meus pais estavam na sala, andando de um lado a outro, os dois com telefones no ouvido.
Subi a escada e fui tomar um banho, passei no quarto da minha irmã, mas ela não havia chegado ainda, então fui logo tomar banho e depois eu falaria com ela, eu estava no chuveiro quando meu pai abriu a porta do banheiro repentinamente.
-Ei..
—Sana sumiu, ela não apareceu na escola de música hoje. –ele disse nervoso.
Eu acho que desliguei água antes de estar totalmente limpo, vesti uma roupa por cima e corri para a sala, meu tio, irmão da minha mãe estava lá, ligava para a polícia e meu pai avisava alguns vizinhos sobre o ocorrido.
—Eles só podem começar as buscas amanhã, por conta do horário. –meu tio disse.
—Ela não está na casa de nenhuma amiga? –perguntei.
—Não, já ligamos para todas as colegas que eu conheço. –mamãe quem respondeu. –Quero minha filha de volta, Muichiro. –minha mãe disse ao meu pai e o abraçou.
Aquilo não poderia estar acontecendo, eu falei com Sana esta manhã, com certeza ela só está na casa de alguma amiga que meus pais não conhecem, ou talvez ela está com algum namoradinho, Sana é muito bonita e eu sei que os rapazes do ultimo ano gostam dela.
Subi para o quarto e comecei a enviar mensagens perguntando se alguém a viu por aí, falei com meus colegas de escola mas ninguém sabia ou havia visto minha irmã hoje.
A noite foi horrível, porque nenhum de nós dormiu, todo mundo ficou acordado olhando para a porta da sala, aguardando Sana entrar e se explicar.
Mas ela não entrou.
No dia seguinte, começamos as buscas, eu não desejo esse sentimento para ninguém, porque nenhum de nós tinha pista nenhuma e tudo o que fizemos foi imaginar e desejar que ela estivesse bem e viva.
Não encontramos nada no primeiro dia, nem no segundo, no terceiro também não e foi assim durante toda a semana, começamos realmente a trabalhar com a hipótese de que Sana estaria morta, mas meu coração desejava ansiosamente que ela voltasse para casa.
No final da segunda semana, eu e meu pai decidimos sair sozinhos, fomos o mais longe possível, uma área totalmente fechada pela floresta, eu fui na direção sul e ele na direção norte. Eu seguia devagar por uma trilha quando ouvi um grito alto e desesperado. Então meu corpo ficou imóvel, esse grito só significa uma coisa.
Encontramos minha irmã, morta e jogava muitos km de distância da minha casa, meu pai não parava e gritar, eu corri para o campo aberto e liguei para a polícia, avisando que sua busca incompetente não seria mais necessária.
Eu odiei, não sei quem, mas eu odiei tudo naquele momento, eu quis punir o culpado daquilo, Sana estava muito longe de casa, impossível ela ter ido sozinha naquele caminho, não havia nada que ela quisesse fazer ali.
Minha vida mudou muito depois que Sana morreu, primeiro porque eu deixei de ser um garoto, e segundo, eu passei a ser um assassino.
Ouvi meus pais falando no quarto que meu tio era o principal suspeito, eu sabia que não deveria dar a chance dele fugir, então tomei a decisão de ir até sua casa, a esposa dele não estava lá, ele estava sozinho.
Eu armei uma emboscada e consegui deixa-lo desacordado com uma pancada bem na cabeça, eu aproveitei para amarrá-lo em uma arvore em seu quintal, minha visão estava muito enevoada, só conseguia ver os olhos da minha irmã e seu sorriso sempre feliz.
—O que... –ele começou a acordar.
Levantei do chão e fiquei de frente para ele.
—Bran... o que eu é isso? –ele perguntou com dificuldade.
—Foi você? –perguntei baixo.
—O que? Bran, me tire daqui, essa brincadeira...
—Foi você? –perguntei novamente.
—Bran, claro que não, estão dizendo que sou suspeito, mas você sabe, eu amava a Sana. –ele disse e começou a tentar se soltar das amarras.
—Se disser a verdade eu te deixo sair e você será preso, mas enquanto não disser nada, vai ficar aqui. –disse.
—Brandon, pare com isso, você é só um menino, me solte, estou mandando. –ele falou sério.
—Não. –falei.
Eu não tinha certeza, mas algo dentro de mim me dizia que ele era culpado sim, eu só levei uma faca comigo e decidi usá-la contra ele. Fiz pequenos cortes em sua pele, superficialmente mesmo, ele começou a gritar e ordenar que eu o soltasse.
—Se falar a verdade eu deixo você ir embora vivo. –falei novamente. Voltei a cortar sua pele e ele gritou.
—Tem que acreditar em mim, eu não quis matá-la, Sana era linda, eu sempre gostei dela, mas quando eu tentei beijá-la, ela fez um escândalo, tive que acalmá-la de alguma forma, mas acabei batendo forte demais em sua cabeça e ela caiu desacordada, obviamente se ela acordasse iria contar tudo, então eu... eu não queria matá-la, Brandon, me escute, me desculpe, eu não queria...—ele falou nervoso.
—Tudo bem, eu também não queria. –respondi.
Eu fui para cima dele com a faca e enfiei a lâmina bem fundo em seu coração, eu lembro muito bem que esses olhos arregalados de medo foi a última coisa que eu vi antes dele apagar, e minha faca entrando e saindo de seu corpo, foi a única coisa que ele viu e sentiu. Eu esfaqueei meu tio tantas vezes que nem consigo contar.
Quando a névoa de fúria cessou. Eu me vi preso em um dilema, deveria dizer ao meu pai e minha mãe o que eu fiz? Deveria voltar para casa e me entregar à polícia? Eu fiz o que achei certo, meus pais já perderam um filho, não deveriam perder o outro. Eu liguei para minha mãe e contei tudo o que aconteceu, exatamente da forma que eu fiz, acho que ela acabou desmaiando porque meu pai assumiu o telefone e me convenceu a voltar para casa e ligar para a polícia.
Mesmo tendo dezesseis anos e um bom motivo para matar, eu fui condenado a prisão em um reformatório para adolescentes com problemas, mas eu não senti nada, nem medo e nem tristeza, eu só conseguia pensar em quantas facadas eu ainda aguentaria dar naquele m@ldito.
Todo dia eu via o rosto de Sana na minha frente, sempre sorridente feliz. O que me ajudou a passar por tudo isso de cabeça erguida.