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1011 Palavras
Cinco anos antes... Aline narrando Observo Maurício no banho enquanto me sento na beira da cama. As p************s da minha mãe ainda ecoam na minha cabeça. Ela me expulsou de casa por causa de um deslize que mudaria minha vida para sempre. "Eu não te criei para ser mulher de bandido." Nem eu queria isso para mim. Mas como eu poderia imaginar que aquele homem alto, loiro, de olhos verdes, seria um dos maiores traficantes do Rio de Janeiro? Eu fui a única que não enxergou a verdade. — Você acordou — ele diz, saindo do banheiro com a toalha no pescoço. — Bom dia — respondo, tentando disfarçar a tensão. — Acho que precisamos conversar — sua voz é firme, e ele me encara com frieza. — Sobre essa criança que você está esperando. — O filho é seu, mas podemos fazer um exame de DNA quando ele nascer — digo, tentando soar segura. — Tá tranquilo — ele responde, dando de ombros. — Eu acredito em você. No começo, tudo parecia perfeito. Mas, com o tempo, o verdadeiro Maurício se revelou. As agressões verbais vieram primeiro, depois as físicas. Mesmo grávida, ele chegava em casa drogado e descontava em mim toda a sua raiva. — Você quer me matar? — perguntei uma vez, encolhida em um canto do quarto, as lágrimas escorrendo pelo meu rosto. — Só não faço isso porque você está esperando uma filha minha — ele respondeu com frieza. Eu já estava de seis meses de gestação, mas parecia uma eternidade. Ele me lembrava todos os dias que meu sofrimento estava apenas começando. Eu vivia em um pesadelo constante. Certa tarde, enquanto tomava um sorvete na entrada do morro, os foguetes começaram a estourar, anunciando uma invasão. Meu coração disparou. A casa de Maurício ficava no topo do morro, e cada passo era uma batalha com minha barriga de quase oito meses. — O que você tá fazendo fora de casa? — ele me puxou pelo braço e me empurrou para dentro de um beco escuro. — Eu só queria um sorvete — murmurei, assustada. — Se esconde aí e torce pra ficar viva — ele ordenou, me jogando entre duas paredes estreitas. — Se sobreviver, eu mesmo cuido de te matar. Os tiros ecoavam cada vez mais perto. Eu me encolhi, rezando para aquilo acabar logo. De repente, um policial apareceu diante de mim, sua arma apontada diretamente para o meu peito. — Moradora? — ele perguntou, o rosto parcialmente coberto pela touca. Seus olhos eram intensos, e uma corrente brilhava em seu pescoço. — Sim — respondi, afastando os braços para mostrar minha barriga. Ele tirou o colete à prova de balas e o estendeu para mim. — Coloca isso — ordenou. — Não precisa — tentei recusar, mas ele insistiu. — Quer morrer com uma bala perdida? — perguntou, firme. — Fica tranquila, eu me cuido. — Obrigada — murmurei, vestindo o colete. Ele saiu correndo para se juntar aos outros policiais, e eu vi uma corrente no chão. Era o escapulário dele. Peguei-o e o escondi comigo. Quando os tiros cessaram, Maurício anunciou pelo megafone que eles haviam vencido mais uma vez. Corri para casa e tomei um banho, tentando apagar a memória do policial que, sem saber, havia salvado a minha vida. (...) Uma semana após o nascimento de Helena, Maurício m*l olhava para mim. Só aparecia para ver a filha. — Quem é você? — perguntei, ao encontrar uma mulher na cozinha. — O que você ainda faz aqui? — ela retrucou, desdenhosa. — Eu moro aqui — respondi, confusa. — Não mais — Maurício surgiu atrás dela, sua presença sombria enchendo o ambiente. — Os vapores vão te levar até a sua nova casa. — Como assim? — minha voz tremia. — Quando Helena desmamar, ela vem morar comigo. Eu e a Tici vamos criá-la — disse, sem um pingo de emoção. — Você não vai tirar a minha filha de mim! — gritei. — Quer morrer agora? — ele apontou uma arma para minha cabeça. — Então vaza daqui. Ali começou meu verdadeiro tormento. Tici, sua amante há anos, planejava roubar minha filha. E eu sabia que, enquanto estivesse viva, Maurício não desistiria de me destruir. (...) Dois meses depois, a situação piorava a cada dia. Eu estava vigiada constantemente pelos vapores e não podia sair do morro. Numa tarde, outra invasão começou. O tiroteio se intensificava, e eu sabia que precisava salvar Helena. Arrumei uma pequena bolsa com suas roupas, enrolei-a em uma manta e, em um momento de desespero, deixei minha filha dentro de uma viatura da polícia estacionada. — Tem um bebê aqui — ouvi um dos policiais dizer. Reconheci a voz: era o mesmo que tinha me dado o colete. O nome em sua farda confirmava: Leonardo. — Quem deixou ela aqui? — outro policial perguntou, confuso. — Tem um bilhete — Leonardo leu em silêncio o pedido desesperado que eu havia escrito para que levassem minha filha em segurança. Observei, escondida, enquanto a viatura partia com Helena. Meu coração apertava, mas eu sabia que era a única forma de salvá-la. — Eu vi tudo — a voz de Kleiton, braço direito de Maurício, me arrepiou. — Por favor, não conta para ele — supliquei. — Pode me entregar, mas não diga onde está minha filha. — Você acha que vou esconder? — ele debochou. — Ele vai matar ela! — implorei. — Ela é só uma criança! — Onde tá a Helena, sua desgraçada? — Maurício surgiu, com os olhos cheios de ódio e a arma em punho. — Eu não vou contar — respondi, desafiando-o. Ele me chutou, socou e me trancou em um quarto escuro, onde fui torturada sem piedade. Mas eu nunca contaria onde estava minha filha. Jamais. — Por que você não me mata de uma vez? — cuspi, com o sangue escorrendo da boca. — Porque isso seria fácil demais — ele respondeu, com um sorriso c***l. E eu sabia que o pior ainda estava por vir.
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