Talita
Depois de tudo que aconteceu, confesso que estou mimando meu pequeno mais do que deveria. Ele sentiu a nossa conversa, eu sei que ele sentiu. Hoje de manhã ficou disputando atenção com a Catarina, parece que ele tem medo de perder o seu lugar, só por eu não ser a sua mãe biológica.
Isso jamais aconteceria. Eu amo os meus dois filhos da mesma forma. O Bruno e a Catarina são como os dedos da minha mão, qualquer um que for cortado, sentirei a mesma dor. Não distinção, mas sinto que ele precisa mais da minha atenção nesse momento.
Chego no escritório e sinto uma paz imensa ao ver que tudo está organizado. Tenho uma somente uma cliente no período da tarde. Confiro as redes sociais e não consigo controlar minha curiosidade, procuro aquela tal mãe do Vitor, coleguinha do Bruno. Acho seu perfil e posso notar a pompa que ela vive. Só posta fotos de espumantes, tem tanto dinheiro e não cuida daquele Chanel loiro seco que dá sede.
Fora que usa umas roupas ridículas. Qual a necessidade de mostrar para os outros que a roupa é de marca? Só usa grife da cabeça aos pés, mas não arruma aquela barriga de c****a prenha dela... Nossa, eu devo estar misturando as coisas, estou com raiva da situação e canalizei tudo para essa mulher. Agora qualquer coisa que ela fizer eu vou achar que é pessoal, preciso me controlar.
O dia passa voando e eu decido que vou buscar meus filhos na escola hoje e depois vamos jantar no shopping, aí eles brincam por lá. Aviso o Juliano e me surpreendo quando ele diz que vai conosco. O homem tomou um choque de realidade mesmo, até ontem ele vivia para o trabalho, agora está priorizando inteiramente nossa família. Não vou nem pensar muito nisso para as coisas não darem errado.
Ele sugere vir me buscar e eu deixar o carro no estacionamento do prédio, acho uma boa ideia e o espero vir me buscar. Retoco minha maquiagem, meu perfume e me sinto bem melhor. Triste sim, feia nunca. Ou quase nunca. Alguns dias temos licença poética para ser feia, chega a ser gostoso...
Entro no carro e Juliano me dá um beijo e um abraço.
- Até depois de um dia intenso de trabalho, você continua linda e cheirosa. – Ele fala e eu dou um sorriso.
- Que sorte a sua, né bonitão. – Falo como se eu não tivesse passado perfume e retocado minha maquiagem.
- Muita, meu amor. Vamos buscar nossos pequenos e viver a aventura do shopping. Você sabe que eu adoro esse ambiente. – Ele fala debochando, porque sei que odeia shopping.
- Eu sei que você adora, ainda mais comer na praça de alimentação...
Ele bufa e dá risada.
- Isso não, podemos comer em algum restaurante por lá. Mas, praça de alimentação não. Me sinto em um aquário, sendo observado pelas outras pessoas. – Ele fala e eu não controlo minhas risadas.
O Juliano nunca teve frescura de nada, sempre se adaptou e nunca foi metido. Mas, se tem uma coisa que esse homem odei4, é comer em praça de alimentação do shopping. Ele reclama do barulho, da bandeja, das mesas. Fala que se sente em um presídio na hora da refeição.
- Tudo bem, amor. Tem um restaurante italiano que o Bruninho adora nesse shopping. Aquele que vem a saladinha e o pãozinho brioche antes. Ele gosta tanto daquele pãozinho....
- Amor, eu sei que tudo isso mexeu com você. Também sei que você é muito inteligente e já percebeu as reações do Bruno depois que ele ficou sabendo que é adotado. Mas, não podemos deixar que isso interfira na educação dele. Mimar de maneira exagerada não será um ato de amor, será uma irresponsabilidade nossa. Você sempre foi muito amorosa com ele, mas sempre impôs limites e soube conversar. Não podemos criar um homem sem valores. – Ele me fala essas palavras com muito carinho e vejo que ele quer o nosso bem.
- Eu sei, ele está mais ciumento mesmo. Mas, isso vai passar. Ele é um menino de ouro, estou tentando dar mais atenção para os dois. Sinto que eu poderia ser mais presente, talvez tudo isso que aconteceu, nos sirva de lição...
- Com certeza serviu. Olha os dois xeretinhas olhando na fresta da porta... – Ele fala e eu me viro para a porta, vejo a cena mais linda que meus olhos poderiam comtemplar. O Bruninho de mãos dadas com a Catarina, ambos sentados no banco esperando a gente chegar. A escola estava vazia, porque atrasamos 10 minutos. Eles não sabem que hoje os dois vieram buscar e quando nos veem, correm para nos abraçar.
- MAMÃEEE, PAPAIIII... – Bruninho pega a irmã pela mão e os dois correm na nossa direção.
- Oi meus amores. Hoje viemos os dois para buscar nossas preciosidades. Adivinhem onde vamos agora? – Pergunto e eles ficam pensativos.
- Comer comer – A draguinha Catarina já responde faminta, como sempre. Essa puxou o pai, não pode ver uma oportunidade de rebolar o queixo, que aproveita.
- Brincar mamãe... – Bruno completa.
- Acertara. Vamos jantar naquele restaurante do shopping que vocês adoram e vamos brincar muito. – Juliano responde e os dois pulam de alegria.
Chegamos no shopping e decidimos ir à brinquedoteca antes de jantar, porque ainda era muito cedo e não seria boa ideia essas crianças brincando e pulando de barriga vazia. Foi uma festa, pulavam, gritavam, fizeram amigos...
Enquanto eles brincavam, eu e o Juliano ficamos observando e tomando um drink, no restaurante em frente. Não tirávamos os olhos dos nossos filhos nem por um segundo. Alguns pais têm a coragem de deixar os pequenos lá e sair para fazer compras, nós somos totalmente contra porque, como advogados, já vimos situações absurdas e sabemos até onde pode chegar a maldade do ser humano.
Pegamos os pequenos e entramos no restaurante, o cheiro está maravilhoso e escolhemos uma mesa um pouco maior. Para ficarmos confortáveis. Repentinamente, o Bruninho acena para alguém com um sorriso, olho na mesa ao lado e vejo aquela mocréia do Chanel seco, sentada a mesa com uma garrafa de espumante. Seu filho acena para o Bruninho e eu vejo que os dois se gostam, que essa maldade não é proveniente da criança. Ela está com o seu marido, é um senhor de uns 75 anos, o luxo realmente tem um preço bem caro para ela.
Ela vira na minha direção e para a minha tristeza, se levanta e vem até a nossa mesa. Peço sabedoria para Deus e Juliano me olha sem entender nada, afinal ele não sabem quem ela é, nunca a viu nada.
- Que coincidência um... Colega, do meu filho aqui. – Ela diz e eu já sinto o desprezo na sua voz e me preparo para ser falsa.