Capítulo 4: Falcão

1310 Palavras
Ela voltou do lavabo com o rosto úmido, os cabelos meio bagunçados, e ainda assim parecia a p***a de uma pintura. Ela tava tentando parecer firme, fingir que não sentia nada, mas eu já tinha sacado o jogo. O jeito que desviava o olhar, os braços cruzados, a respiração acelerada... Ah, doutora, tu é boa, mas não disfarça pra mim não. Quando ela chegou mais perto, me obedecendo sem questionar prendi uma mecha do cabelo dela entre meus dedos. Era macio, cheiroso. E aquela cor... parecia fogo. E eu já tava queimando faz tempo. Me aproximei devagar, daquele jeito que bota dúvida na cabeça e calor no meio das pernas. Nossos olhos grudaram um no outro, e ela prendeu a respiração. A boca dela entreaberta, os olhos indo direto pros meus lábios. Tava esperando que eu beijasse, dava pra ver. E confesso, vontade não me faltava. Mas resolvi brincar. — Como que tu se chama? — perguntei com a voz baixa, rouca, quase encostando nela, só pra ver se ela derretia de vez. — Mel… Melissa, na verdade — respondeu, finalmente me olhando nos olhos. Aí eu vi. Os olhos dela. Castanhos. Mas não qualquer castanho. Era um castanho doce, quente… avermelhado perto da pupila e mais claro nas pontas, igual mel mesmo. Com aquele cabelo ruivo caindo de leve no rosto, parecia personagem de sonho erótico. E eu tava sonhando acordado com essa delícia diante de mim. — Mel… Combina contigo, com esses olhos — falei, deixando a voz sair arrastada. — Esse cabelo é de verdade? Digo, a cor... é perfeita. Ainda tava segurando a mecha entre os dedos, jogando charme. E ela ficou ali, toda entregue no olhar, só confirmou com a cabeça, mordendo de leve o lábio inferior. Quase me perdi nessa p***a. — Onde que tu mora? — mandei, já tramando de levar ela em casa eu mesmo. — Na Barra — respondeu, com a voz mais baixa, quase num sussurro. — Vou te levar. Já posso tomar banho, Mel? — soltei com um sorriso de canto. Ela tentou reagir, coitada. Se levantou, quis se afastar, cortou o clima fingindo firmeza. — Pode, mas eu disse que o senhor deve descansar. Me põe num carro de aplicativo e eu me viro. Mano ela me chamou de "senhor", me levantei devagar, estiquei a mão e peguei a dela de leve só pra não deixar o contato morrer. — Falcão, gata. Me chama de Falcão — falei, piscando pra ela, com aquele ar sacana que eu sei que bagunça geral. A danada ficou vermelha. Mais do que já é com esse cabelo cor de incêndio. Fiquei ali só admirando o estrago que eu tava fazendo. E pensando no gosto que aquele mel teria se eu resolvesse provar. Mas por enquanto… só tava aquecendo. Fui até a cômoda, abri devagar, ainda meio travado por causa dos pontos. Peguei só uma bermuda e uma camiseta básica. Cueca? Esquece. Com a virilha costurada daquele jeito, era tortura tentar vestir. Ainda tava pelado quando senti. O olhar dela. Queimando nas minhas costas. Aquela respiração presa, aquele silêncio cheio de coisa não dita. Sorri de canto, sem olhar pra trás. Ela gosta de um pretinho. Constatei, com aquela vaidade natural de quem já entendeu o efeito que causa. Passei por ela, fingindo que nem notei o olhar. Mas por dentro? Eu tava me divertindo. Caminhei bem devagar, quando passei perto, só pra ver se ela se arrepiava. Entrei no meu banheiro, porta entreaberta. Tomei uma ducha breve, só pra tirar o sangue. A água fria ajudou a relaxar os músculos e esfriar um pouco o fogo que a doutora tava acendendo em mim. Só um pouco. Saí já vestido. Camiseta colada no corpo, bermuda larga, perfume no ponto — aquele que sempre rende comentário. Voltei pro quarto e ela ainda tava lá. Sentada na beira da cama, tentando parecer ocupada mexendo no celular, mas os olhos dela entregavam. Calcei o tênis com calma, olhei no espelho e ajeitei o cordão no pescoço. Peguei minha Glock no canto da gaveta. Sempre comigo. Quando me viu com a arma, deu aquela olhada rápida, tipo quem entende que a vida real é diferente do consultório. Cheguei perto e peguei ela pela mão. Calma, firme, do jeito que mexe com a cabeça de mulher decidida. — Me dá teu número, Mel… Acho vou precisar dos seus servidos mais vezes. Ela piscou. Processando o que eu tinha dito. Quase ri da reação dela, meio assustada, meio lisonjeada. Em vez de falar, só estendeu o celular desbloqueado pra mim. Inteligente. Prática. Disquei meu número ali mesmo. Deixei chamar só pra ela salvar. E desliguei. — Agora se quiser te ver de novo, não preciso fingir que é urgência médica — falei, devolvendo o celular, com um sorrisinho malandro. Os olhos dela me fitaram mais um tempo. Meio indignada, meio curiosa, totalmente entregue. Essa doutora ainda vai dar trabalho. E eu adoro um desafio. --- Saí puxando a mão dela com calma, sem dar muita opção. Melissa me acompanhou, ainda com aquela postura de quem tenta manter o profissionalismo, mas os passos dela entregavam. Tava mexida. Eu sabia. Descemos até a garagem e o segurança abriu o portão automático assim que me viu. Não falei nada, só destravei meu carro. Uma Hilux preta blindada, discreta por fora, nervosa por dentro. — Entra aí, doutora — falei, abrindo a porta do carona. Ela hesitou um segundo. Um. Mas entrou. Ajeitou a saia e sentou, cruzando as pernas com elegância demais pra quem jurava que ia me tratar com distância. Entrei, fechei a porta e liguei o som no volume baixo. Um rap antigo, batida suave, letra suja. Combinava com o momento. — E aí, Mel… Cê sempre cuida assim dos seus pacientes? — perguntei, olhando rápido de canto enquanto dirigia. — Só os que quase morrem na minha frente — ela retrucou, tentando soar firme. — Hm... então vou tentar quase morrer mais vezes — falei rindo, e ela me lançou aquele olhar reprovador, mas com a pontinha do canto da boca querendo sorrir. Pegamos a linha reta da avenida e o cheiro dela tava dominando meu carro. Doce. Quente. Um perfume caro que grudava na memória. — Tu sempre foi ruiva? — perguntei, do nada. — Sempre. Natural. Por quê? — Porque essa cor aí... parece feita sob medida pra tua pele. — Falei encarando o semáforo, mas sentindo ela se remexer no banco. — Te deixa com cara de veneno. — Eu sou veneno — ela disse baixinho, com a voz firme. Não sei se foi aviso ou provocação. — Adoro um veneno. Principalmente quando vem em frasco bonito. Silêncio por uns segundos. Só o som do carro e nossa respiração dividindo o mesmo ar. — Cê tem namorado, Mel? — perguntei, mesmo já imaginando a resposta. — Noivo. — Ela falou firme, mas com um tiquinho de peso no tom e levantou a mão com o anel caro. — Ah... então é por isso que você tá fugindo, né? — Eu não tô fugindo de nada — ela rebateu. — Tá sim. Tá fugindo de mim. Mas o seu olhar não mente. Teu corpo muito menos, Mel. Ela ficou muito mais vermelha. Estacionei em frente ao prédio dela, na Barra. Lugar chique, segurança na porta. Dei um leve toque no freio e virei pra ela. — Valeu pela visita médica. E pelo cuidado. — Foi meu trabalho — ela disse, mas os olhos ficaram presos nos meus. A gente ficou assim. Uns longos segundos. O mundo lá fora existindo, e a gente num universo paralelo dentro daquele carro. — Boa noite, Falcão. — ela disse, abrindo a porta. — Sonha comigo, Mel — respondi, e ela fechou a porta rindo, balançando a cabeça. Mas eu vi. Ela tava com vontade. E eu? Eu já tava com planos.
Leitura gratuita para novos usuários
Digitalize para baixar o aplicativo
Facebookexpand_more
  • author-avatar
    Escritor
  • chap_listÍndice
  • likeADICIONAR