CAPÍTULO 8

1548 Palavras
LYRA VONS. Estávamos de volta à mansão, Kael não disse uma palavra depois de tudo o que aconteceu naquele armazém. Ao chegar, fui para o meu quarto, se é que podemos chamá-lo assim, enquanto ouvia Jak levar seu novo brinquedo para o porão. Tentei dormir um pouco, mas não acho que tenha sido uma boa ideia. Caí num sono profundo, lembrando-me daquela lembrança da minha mãe na coluna, acorrentada enquanto os homens do meu pai profanavam o corpo dela da maneira que queriam, obrigando-me a olhar. As palavras do meu pai ecoam alto na minha cabeça. *** “Algum dia você será como ela, sua garota estúpida” “Sua mãe está morta, ninguém virá atrás de você, monstro” A imagem da minha mãe ensanguentada no chão com o corpo perfurado por balas atormentava-me, com sangue a manchar as minhas mãozinhas, enquanto a sacudia com força, a tentar fazê-la acordar. “Você é como eu, Lyra” “Um monstro” *** O grito de horror que escapa da minha boca consegue me acordar, as mãos me apertam fortemente, grito de horror enquanto me afasto. — Lyra! Se acalme! — Não, não, não, ele está vindo atrás de mim, ele está vindo atrás de mim — Eu soluço, pegando minhas pernas e pressionando-as contra meu peito. — Ninguém vem atrás de você, Lyra. Não consigo registrar as vozes grossas que falam comigo, atordoado pelo pesadelo. — Eu não consegui salvá-la, não consegui, não consegui. Eu soluço mais alto, enquanto abraço meu corpo e enterro minhas unhas nos antebraços, a dor geralmente me ajuda a me concentrar, mas mãos fortes me impedem de continuar me machucando. — Princesa. Olho para cima, meus olhos azuis colidindo com o chocolate derretido, mel com manchas douradas. Jak. — Foi somente um pesadelo. Pisco, relaxando gradualmente meu corpo, minhas bochechas estão molhadas. Sinto um par de olhos me observando, Kael e Orion me encarando da porta, seus rostos sérios, não consigo decifrar suas expressões. Jak tenta soltar minhas mãos, mas eu as aperto entre as minhas. Eles são quentes e firmes, comparados ao meu toque frio e trêmulo. — Não vá — eu imploro. O tom fraco com que a minha voz se filtra incomoda-me, a oração que escapa aos meus lábios incomoda-me porque não devo esquecer quem são e o perigo que representam para mim. Lyra faz uma careta, mas acena com a cabeça. Os outros meninos entram na sala, mantendo distância. O ar na sala parece sufocante, os três homens me analisam sob seu olhar atento, os três impõem sua presença, me sinto pequeno sob seu olhar, não consigo fazer meu corpo parar de tremer levemente e meus sons respiratórios tremem com os soluços de antes. — Qual foi o pesadelo? — Kael questiona, encostado no batente da porta, com os olhos fixos em mim. Eu engulo saliva, faço caretas quando sinto minha garganta doer pelos gritos, eles devem ter me ouvido por toda a mansão. Que pena. Flávio, o guarda que garante que eu não escape e que me espancou alguns dias atrás em sua terrível tentativa de me fazer aprender a me defender, entra na sala e me entrega um copo de água. Sorrio levemente em gratidão e ele pisca de volta para mim, saindo da sala quando Kael faz um gesto para que ele saia. Tomo um grande gole de água e minha dor de garganta desaparece. — Acho que ir ao armazém me afetou um pouco, desculpe se te acordei. — O que há de tão especial no armazém? — Kael pergunta novamente. Hesito antes de responder, não consigo parar de pensar que tudo o que digo aqui será usado contra mim, que cada informação que dou pode ser demais, posso estar ajustando a alça do meu pescoço que eles puxarão em algum momento. Eles são o inimigo, não posso esquecer disso. Então, porque têm sido tão simpáticos comigo? — Não podemos ajudá-la se você não nos contar o que está acontecendo — diz Orion. — Ainda não entendo se eles querem me ajudar ou não, suas atitudes ainda não deixam isso claro para mim. — Por enquanto, queremos ajudar você, contente-se com isso — Kael salva. Hesito novamente em lhe contar meus problemas, embora eu decida fazê-lo de qualquer maneira. De qualquer forma, se eu não lhe contar agora, você descobrirá por conta própria. — Higor uma vez acorrentou minha mãe a uma das colunas do armazém, como punição. Ele ficou furioso com ela — ele fez uma pausa para tentar eliminar a memória da minha mente — Mãe havia roubado parte do dinheiro dele, embora somente. Ela fez isso porque, na última surra que meu pai me deu, ele havia quebrado algumas das minhas costelas, então ela precisava de atenção médica — eu explico — Ele ficou muito bravo,bateu na minha mãe, amarrou-a na coluna e deixou seus homens fazerem o que quisessem com ela. Ele me obrigou a ver tudo, porque essa era minha lição, aparentemente eu tinha que ser mais forte e aguentar os golpes, senão minha mãe se preocuparia comigo e roubaria dinheiro de novo para me levar para o hospital, a culpa era toda minha, minha mãe sofreu porque me machucou. Nenhum dos caras na minha frente diz nada, eles me encaram, então eu continuo, não sei de onde vêm as palavras que eu digo, eu somente as deixo fluir. — Obrigado por destruir aquele armazém e as pessoas de lá, isso me fez sentir melhor. De alguma forma, isso fez com que essa memória horrível não fosse tão horrível agora. Orion se aproxima lentamente, estendendo a mão para mim como seu irmão fez esta manhã, embora a dele não esteja manchada de sangue no momento. — Acompanhe-me. Pego sem hesitar, assim como fiz com o irmão dele, ele me puxa até me pegar do colchão no chão e caminha comigo em direção às escadas que levam ao porão. Ainda estou usando as mesmas roupas desta manhã, só que meus pés estão descalços e meu cabelo está solto nas costas. O medo se infiltra em meu corpo quando o vejo me direcionar para algumas escadas um tanto escondidas, meu corpo visivelmente tenso sob seu controle, embora Orion continue puxando minha mão. Respiro fundo e decido segui-lo, mas não tenho muita escolha por causa do aperto que ele mantém na minha mão. Não sei por que, mas decido confiar um pouco nele e dar-lhe o benefício da dúvida, acreditando que ele não aproveitaria a oportunidade para me trazer e me atacar aqui após ter tido um momento tão vulnerável antes, embora a parte racional do meu cérebro confirme que. Ele realmente teria o poder de fazer isso, já que ele é um lobo, um dos homens mais temidos desta cidade que não tem empatia por ninguém além de si mesmo e de seus irmãos. Rumores dizem que ele é um psicopata, sendo o pior dos três, que não tem compaixão por nada nem por ninguém além de seus irmãos, que são seres tão distorcidos quanto ele. Minha mão parece minúscula na dele, suas mãos são um tanto calejadas, calos gerados pelo uso consecutivo de armas, é um aperto firme na minha mão, com seus dedos longos e masculinos, cheios de cicatrizes e tinta. Chegamos a uma espécie de quarto escuro, somente uma pequena luz branca ilumina o homem acorrentado a uma viga do teto, com as mãos esticadas sobre a cabeça cercadas por uma corrente grossa, a pegada não parece nada confortável, mantendo o contorno dos pulsos onde a corrente está localizada. É o mesmo cara do armazém, aquele que estuprou a mãe. Ele está nu, suas pernas são mantidas separadas por cordas amarradas em cada um de seus tornozelos, ele está suado e sua pele é sangue seco. O lado esquerdo de seu rosto está um tanto desfigurado pelos golpes que Connor lhe infligiu. — Eu estava aqui embaixo quando você gritou — ele explica, seguindo o fio dos meus pensamentos — Vou continuar, e você pode ficar aqui se for isso que quiser, talvez isso faça você se sentir melhor ao ver que ele receberá um pouco da dor que causou à sua mãe. Analiso suas palavras: é realmente distorcido da minha parte que eu realmente queira ficar e vê-lo sofrer? Vê como o Orion traz de volta um pouco de toda a dor que causou à minha mãe? Claro que sim, muito distorcido. Mas eu não me importo. Ninguém saberá o que aconteceu, ele será somente mais um pobre i****a que caiu nas mãos de lobos, ninguém saberá que eu estava em seu leito de morte. Eu aceno com a cabeça, um leve sorriso se instala em meu rosto, Orion permanece paralisado por alguns segundos observando-a, então ele caminha até a mesa onde suas coisas estão, coloca todas juntas de um lado da mesa e, sem aviso, coloca as mãos na minha cintura. E ele me senta à mesa, o que me deixa na mesma altura do rosto dele, já que a mesa é bastante alta. Ele sorri levemente quando percebe que fiquei paralisado pelo seu toque e então se vira, pega um balde e o enche com um pouco de água com uma torneira no fundo da sala, jogando-o em direção ao cara, que acorda assustado imediatamente.
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