O Castelo Não É um Lar

610 Words
A ala de hóspedes da Maison Elsemar era silenciosa demais. Élise Varnier, agora oficialmente residente temporária do castelo, observava seu novo quarto: paredes de pedra clara com cortinas de veludo azul-acinzentado, uma cama larga demais para uma só pessoa e uma escrivaninha que parecia mais uma relíquia de museu do que algo funcional. Um vaso com flores brancas fora deixado sobre a mesa, provavelmente por algum mordomo diligente, e havia uma pilha de lençóis dobrados com perfeição militar aos pés da cama. Ela suspirou. Ainda era manhã, mas já sentia o peso de um mês inteiro naquele lugar. Não que odiasse castelos. Mas aquilo ali… não era um lar. Era bonito, frio, controlado. Como o homem que o governava. Cassian de Elsemar. Ela ainda se perguntava como ele soubera seu nome. Por que escolhera justamente ela? Não era a melhor da clínica, nem a mais experiente. Mas ali estava, instalando-se no coração da mansão da família mais influente de Velançay, enquanto o próprio duque andava como uma sombra vestida de terno pelas escadarias. Na hora do almoço, Élise foi conduzida ao solário onde August costumava comer. O menino já estava lá, sentado em uma cadeirinha alta adaptada, com um pratinho de cerâmica azul na frente. Alimentos separados com precisão: arroz simples, pedacinhos de frango sem tempero, e algumas rodelas de pepino. Ele não olhou para ela, mas também não se encolheu com sua presença. Um bom sinal. — Posso sentar aqui com você? — perguntou, mantendo a voz baixa. August não respondeu, mas também não protestou. Ela se sentou. Trouxe da bolsa um brinquedo de encaixe — nada barulhento, nada invasivo — e colocou sobre a mesa. Ele olhou com o canto dos olhos. Depois, lentamente, tocou uma das peças. — Essa é a peça do círculo — disse ela. — E essa aqui é o quadrado. Eles não brigam, só se encaixam cada um no seu lugar. August não respondeu, mas continuou tocando as formas. O olhar dele estava mais atento. Mais… curioso. Foi quando a voz de Cassian cortou o momento: — Ele não fala. Não precisa tentar forçar algo que não vai acontecer. Élise virou-se devagar. Ele estava ali, encostado à porta, de braços cruzados, observando como se estivesse testemunhando um erro. — Eu não estou forçando nada — respondeu com calma. — Estou oferecendo uma oportunidade. Cassian franziu levemente a testa, mas não retrucou. Apenas observou August por mais alguns segundos, e então se afastou. Depois do almoço, August permitiu que ela o acompanhasse até o quarto. Foi uma caminhada lenta, quase um ritual: ele tocava cada degrau da escada com a ponta do dedo antes de subir. Um hábito. Uma necessidade. No quarto, Élise se sentou na poltrona e observou enquanto o menino se deitava no chão, alinhando pequenos bloquinhos coloridos em uma linha precisa. Ela não disse nada. Não interrompeu. Apenas ficou. E August a deixou ficar. Mais tarde, já à noite, Élise caminhava pelo corredor da mansão quando ouviu vozes. Parou perto da biblioteca, onde a porta estava entreaberta. — Isso é imprudente, Cassian. Ela pode falar com a imprensa. Pode vender histórias. Você confia nela por quê? — era uma voz feminina, fria e afiada. — Porque August olhou para ela — respondeu Cassian, sem hesitar. — Isso não significa nada. — Para ele, significa tudo. Silêncio. Depois, passos. Élise se afastou rápido, antes que fosse vista. Mas no peito, algo pequeno e inesperado começou a florescer. Cassian, o homem de gelo, tinha falado com convicção. E tudo por causa de um olhar. August, pensou ela, você tem mais poder do que imagina. E talvez… eu também tenha mais do que pensei.
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