Naty conheceu o skate com 4 anos de idade. O presente que o irmão mais velho recebeu, mas que logo deixou de lado por não conseguir se equilibrar em cima daquele pedaço de madeira com rodinhas. Já a garota não apresentava nenhuma dificuldade para andar naquilo e até se aventurava com algumas manobras. Os pais acharam graça da menina se divertindo com aquele brinquedo de menino e compraram os devidos equipamentos de segurança, capacete, joelheira, cotoveleira e deixaram a pequena Natália fazer suas estripulias.
Mas eles jamais imaginaram que a garota levaria aquela brincadeira tão a sério, que poucos anos depois estaria competindo em alguns torneios locais, muito menos imaginaram que ela os venceria. Não tiveram outra opção além de apoiá-la em sua escolha.
Naty era assim, com bem menos juízo do que as pessoas normais, amava uma aventura, um desafio, se superar sempre. Quando alguém dizia que ela não podia ou não conseguiria fazer algo, aí que se acendia uma chama que a consumia e não sossegava até provar que estavam todo errados. Ela sabia que era privilegiada por ter o apoio dos pais, quando muitos de seus colegas não tinham, mas ela tinha seus próprios obstáculos a vencer e muitas vozes a calar.
Com o bom desempenho e as vitórias nos campeonatos vieram os patrocínios ainda na adolescência. Porém a grande consagração de sua carreira foi quando conquistou uma das vagas para os jogos olímpicos. Aos 20 anos seria uma das três representantes do Brasil na modalidade do skate street.
Isadora veio de uma cidade pequena, teve uma infância difícil. Não sabia porque se sentia tão diferente das outras garotas, não tinha o mesmo gosto, os mesmos interesses, nem gostava de usar as roupas que elas usavam. Ouvia de todos “mas é tão bonita, porque se veste com essas roupas de garotos?” Ou coisas como “meninos gostam de garotas femininas, passe um batom”. Mas Isadora odiava os batons, as presilhas de cabelo, as saias e os esmaltes. Sonhava com os tênis que os meninos usavam, queria ser livre como eles e agir mais como eles do que como elas.
Na adolescência, descobriu também que, apesar de andar o tempo todo com os garotos, não sentia vontade de beijá-los. Com muita confusão, percebeu que esse desejo ela guardava para as meninas, justamente para aquelas com quem não tinha a menor identificação e fazia de tudo para parecer diferente. Como que tão de repente aquele sentimento tinha mudado? Isadora não sabia responder. Mas soube muito bem esconder.
Se as pessoas não entendiam o estilo dela, imagina se soubessem que ela também sonhava em beijar as garotas.
Porém, crescer escondendo quem se é de verdade deixa marcas. Isadora se tornou uma adolescente fechada, que sonhava em sair daquela cidade pequena e conseguir oportunidades de ter uma vida melhor do que a vida que seus pais tão simples podiam lhe proporcionar. Desejava ter dinheiro para os tênis Vans que os garotos usavam para andar de skate e ela achava tão lindo, sonhava com um skate novo também, o que ela tinha era herdado de um dos amigos ricos que trocava de shape sempre e dava os velhos para Isadora.
Inclusive, foi esse amigo que se inscreveu para um torneio em uma cidade próxima e insistiu para que Isadora o acompanhasse. Ela não tinha dinheiro e ele pagou tudo para ela. Acabou saindo de lá vencedora e seu amigo de tão humilhado pelo seu próprio resultado, desistiu de vez da vida de atleta. Com o título veio a primeira proposta de patrocínio, ela não era tão nova quando foi descoberta nesse esporte, era o fim de seus 17 anos, mas não podia ter acontecido em momento melhor. Isadora estava terminando o ensino médio e não sabia o que fazer para sair daquela cidade. Depois daquele torneio, ela tinha achado a solução.
Pouco tempo depois e com muitas outras medalhas, ela conseguiu sua independência, se mudar para um lugar maior e conquistou, com muita antecedência, uma vaga nas olimpíadas. Mesmo com tantas conquistas, ainda sentia que tinha algo a provar e dava seu máximo para vencer, porque uma derrota podia significar o fim de tudo pelo o que tinha lutado.
Bruna vinha de uma família de atletas. Seu pai era professor de educação física, tinha jogado futebol quando mais novo, mas nunca tinha tido muito sucesso para além dos times de base. Seus irmãos foram treinados desde muito novos no caminho dos esportes, o mais velho tinha se encantado pelo universo da natação e conquistou diversas medalhas em competições locais, porém nunca conseguiu muito destaque entre os grandes. O irmão do meio se dedicou às lutas, tinha tentado o judô por um tempo, mas acabou se encontrando mesmo no jiu-jitsu, para a tristeza do pai que insistia que ele escolhesse um esporte olímpico.
O mesmo aconteceu com Bruna, para agradar o pai, tinha jogado futebol, handebol e até vôlei na escola, mas não sentia prazer em nenhum deles. Conheceu o skate com 15 anos e foi paixão ao primeiro encontro. Entretanto, com as proibições e preconceitos que a prática tinha, seu pai não deixava que a garota treinasse, achava que era uma grande distração para Bruna, um tempo perdido que poderia ser investido nos esportes que realmente tinha alguma relevância, segundo o pai dela.
Bruna precisava deixar seu skate escondido na casa de amigos, mentir para os pais que ia estudar e de lá sair para praticar suas manobras. Por isso, só pode participar do primeiro torneio com 18 anos e também foi escondida. Tinha sorte de morar em uma cidade grande que eventualmente organizava competições. Em uma delas se inscreveu e terminou no lugar mais alto do pódio. Quando seus pais descobriram, Bruna ficou um mês de castigo, mas como já era maior de idade, as proibições de seus pais tinham cada vez menos peso. Continuou treinando, continuou competindo, até que dois anos depois garantiu seu lugar nos jogos olímpicos. O sonho que seu pai nutriu por anos e nenhum filho tinha conseguido realizar, Bruna alcançava com seu pedaço de madeira. Agora ele teria alguém por quem torcer pela televisão, apesar de tudo que havia feito para impedir aquele resultado.
Faltava pouco para que as três meninas, que se conheceram ao longo das competições que participaram e desenvolveram uma grande amizade, embarcassem rumo à grande conquista de suas vidas. Tinham lutado, desejado e conquistado a maior oportunidade que uma skatista podia sonhar, iam representar o país inteiro nos jogos que aconteciam apenas de quatro em quatro anos. Elas tinham muito a provar para elas mesmas, para os pais, para todos aqueles que desacreditaram nelas, para os patrocinadores e agora, para o país.
Seria uma grande aventura, uma jornada que passariam juntas, cheia de aprendizados, superações e descobertas. Se elas trariam medalhas, não podiam garantir, mas certamente não voltariam as mesmas garotas que eram antes disso tudo começar.
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