Faltavam apenas 15 dias para o embarque dos atletas do skate junto com toda a delegação da CBSk (Confederação Brasileira de Skate) rumo às olimpíadas de Paris, a primeira a se realizar pós a pandemia que assolou o mundo inteiro. Parecia pouco tempo, mas não para Naty, Isadora e Bruna, para elas, parecia uma eternidade.
Elas já estavam classificadas para os jogos olímpicos há um ano. Precisaram guardar toda a ansiedade, nervosismo e empolgação por mais de 12 meses, agora que estava tão perto, tudo tinha se intensificado ainda mais. O sofrimento era maior do que no dia que receberam a confirmação de que seriam as representantes brasileiras da modalidade do skate street.
Era a segunda vez do esporte nas olímpiadas e haviam duas modalidades, o street e o park. Naty, Isadora e Bruna representavam o primeiro que consistia em realizar manobras em uma pista que imitava ruas, com escadas, corrimãos, etc. A modalidade do park era uma grande piscina oval em que os atletas percorriam fazendo suas melhores manobras.
Durante todo o ano de preparação, elas precisaram continuar treinando, porém com cuidado para preservarem o físico delas para o grande dia. Era uma corrida contra o tempo, não podiam se machucar, mas precisavam ter ainda mais confiança em suas manobras e quem sabe até aprender algo novo e poder replicar na competição.
Mas o skate era antes de tudo, um estilo de vida. A diversão era a primeira regra da prática que virou esporte apenas nos anos 90. Os atletas também se viam como uma grande família e uns torciam pelos outros, independente da bandeira que carregavam. A proibição do skate no Brasil transformou o hobby em ato político, era a forma dos jovens se expressarem contra o sistema e ocupar as ruas. Tudo isso fez desse universo muito diferente das outras modalidades olímpicas, com seus atletas de ponta e grande desempenho.
Entretanto, Naty, Isadora e Bruna nasceram em um momento que a prática já estava liberada, mas isso não quer dizer que elas não tenham herdado o espírito do esporte. Tanto é que, apesar de viverem em cidades diferentes, mantinham uma amizade longa e duradoura. Eram por vezes rivais em competições, mas fora delas eram cúmplices e confidentes. Inclusive, viajar nessa emoção juntas, era o que as tranquilizava um pouco.
Natália era da pá virada, como diziam os antigos. Não tinha um pingo de juízo. Já havia quebrado os dois braços, costelas, torcido o tornozelo e ganhado alguns pontos pelas suas aventuras. Não tinha o menor medo de tentar e errar. Aquela ali deixava a comissão técnica de cabelo em pé pelas suas estripulias. Nunca um fisioterapeuta precisou trabalhar tanto para colocar um atleta nos eixos de novo. Quando ela se recuperava de uma coisa, lá ia se machucar outra vez. Entretanto, sua coragem era sempre retribuída com o lugar mais alto no pódio.
Isadora tinha um grande inimigo, sua própria mente. Tinha sofrido tanto para chegar até ali, mas seu inconsciente ainda a testava, insinuando que não merecia, que não era boa o suficiente, que era uma grande impostora. Foi difícil para ela segurar as emoções nos últimos meses. Se dividia entre se achar louca por assumir tamanha responsabilidade e querer muito poder provar para todos que havia deixado para trás em sua pequena cidade, que ela era muito mais capaz e talentosa do que pensaram.
Já Bruna carregava o peso de viver o sonho que era do pai. Se o skate nunca fosse aceito nas olimpíadas, ela não teria problema nenhum com isso. Bruna só queria fazer o que gostava. Mas agora que havia chegado tão longe, sentia na pele a cobrança de ser a melhor e voltar com a medalha na mala para casa. O problema é que quando a diversão vira obrigação, parte do prazer morre junto. Equilibrar as duas coisas era o maior desafio para a nossa atleta.
Se até ali elas iam para campeonatos representam a si mesmas, se o uniforme que elas vestiam eram os seus próprios nomes, aquele era o momento que elas deixavam de ser atletas individuais para fazerem parte de uma equipe e levavam no peito a bandeira do Brasil. Era um passo e tanto para a carreira.
Mas uma coisa Naty e Bruna invejavam em Isadora, que era morar sozinha, longe dos pais, em um momento como esse. No auge do estresse e pressão às vésperas da viagem, dividir o mesmo teto com seus progenitores não é lá muita vantagem.
A pobre Bruna ainda tinha na bagagem emocional o término recente com o namorado da adolescência. Ela pôs um fim depois de 5 anos juntos. O motivo: traição do rapaz.
Sim, a poucos meses do grande evento, ela descobriu a pulada de cerca do garoto, que perdeu a chance de acompanhar o nascimento de uma grande estrela olímpica. Pelo menos era isso que a mãe dela repetia, que a perda era dele e blá blá blá. Já o pai de Bruna era mais radical, achava um alívio ver a filha sem distrações. E isso que o namorado era, um desvio de atenção.
Mas Bruna não queria ouvir nem os pitacos da mãe e muito menos as opiniões do pai. Portanto, passava os dias andando de skate nas ruas da cidade, ou em ligação de vídeo com as únicas que tinham ideia do que ela estava sentindo, Naty e Isadora.
Naquela manhã, foi como ver a mesma cena de novo, um disco arranhado, seu pai a acordou muito cedo, reclamando da falta de disciplina da filha. Depois criticou as escolhas alimentares de Bruna para o café da manhã. Irritada com as cobranças, acabou discutindo com ele, pegou o skate e saiu porta afora.
De fones de ouvido, tocando sua playlist favorita, Bruna ganhou as ruas, com o vento no rosto, aqueles instantes de liberdade que tanto amava. Era por aqueles momentos que ela havia escolhido o skate para a sua vida. Aérea a tudo que lhe rodeava, todos os problemas eram deixados para trás.
Bruna m*l teve chance de perceber o carro que vinha pela lateral e lhe atingiu em cheio, a jogando para o alto e destruindo o seu skate.
Bruna nem sentiu nada.
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Obrigada por acompanhar mais essa história. Amanhã tem mais, então não deixa de colocar o livro na sua biblioteca e me seguir por aqui para não perder as notificações.
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