Continuação do capítulo 1 Véu de estrelas parte 2

1266 Words
No início tudo era parte do romantismo que vivia, as cores, os aromas, as músicas e até a dança lhe fascinava. Mas aos poucos tudo foi perdendo o encanto. Primeiro ela presenciou uma prima de Ahmad ser obrigada a se casar com um homem três vezes mais velho. O choro da jovem era como uma faca afiada a cortar seu coração. Depois ela presenciou uma tia de Hamad ser espancada pelo marido por apenas receber um homem na sua casa sem usar o véu (hijab). E a gota da agua foi ao ouvir a mãe de Hamad dizer que mulher libanesa não precisava estudar e muito menos trabalhar fora. Tudo aquilo e suas pesquisas sobre o universo árabe serviram para despertar em Marina o ódio por sua cultura e forma de viver. Tudo que ela queria era fugir dali e sufocar o amor que tinha por aquele homem. __ Seu pai tentou me convencer a ficar no pais e se casar com ele, prometeu que nossa vida seria diferente, que não seria como eu imaginava, com agressões e privações. Mas eu não queria promessas, queria viver minha vida com a liberdade que tenho. E quando descobri que estava gravida peguei o próximo voou para o brasil e deixei tudo para trás. Os estudos, os amigos e meu único amor, seu pai! (Disse Marina sem perceber que as lágrimas rolavam por seu rosto) Aisha ouvia sua mãe com atenção, sentia muita pena dela e não se sentia bem em presenciar seu sofrimento. Tentou consolá-la com seu abraço: __ Mamãe, mas e se as promessas de meu pai fossem verdadeiras? Marina enxugou a face, encarou o rosto da filha: __ Eu fugi por você! Para te proporcionar uma vida tranquila, se fosse criada na família de seu pai talvez nem estudar no ensino médio você iria! __ A senhora disse “Talvez”, portanto não tinha certeza de que tudo seria tão r**m como imaginava. Eu compreendo que tenha sofrido e sempre pensou no meu futuro. Mas ele tinha o direito de viver a paternidade que você escolheu tira-la dele... Pela primeira vez na vida Aisha julgava sua mãe com palavras, pela primeira vez Marina sentia o peso do seu passado através da boca de sua filha. E foi muito desagradável encarar os olhos de Aisha e encontrar ali julgamento. Mais uma vez Marina subestimava a filha, lhe concedendo apenas a passividade para compreender as coisas. Espera apenas compreensão e gratidão por suas decisões, mas para sua surpresa a filha lhe surpreendia o contrário: __ O direito a paternidade é algo que nas terras árabes não se conhece como aqui no Brasil! Se você pesquisou tanto sobre a família de seu pai deveria saber que a mulher que se separa do marido não tem direito de ficar com a guarda dos filhos! Você acha que eu seria capaz de entregar você a seu pai, lhe condenando a um futuro longe de mim e infeliz? Se eu escolhesse dar a luz no Libano, seu pai teria todo o direito sobre você e a tomaria de mim... Aisha se mostrou tensa com o rumo que aquela conversa tomava. Uma coisa sua mãe tinha razão, ela já sabia basicamente quase tudo a respeito da cultura de seu pai e todas as coisas que sua mãe tentava justificar era parte do que Aisha já havia pesquisado. Porém Aisha não estava tão apavorada quanto sua mãe em ter consciência da realidade daquele povo. Marina esperava que a filha tivesse a mesma repulsa e revolta ao descobrir como viviam seus parentes no oriente médio e não que a filha se mostrasse insensível. Marina se levantou do gramado, sentia uma tensão muscular muito grande próximo a nuca. Respirou fundo e voltou a olhar Aisha, que parecia tranquila mesmo diante de revelações sobre sua chegada ao mundo. __ Eu não espero que me perdoe pelas escolhas que fiz, mas que entenda que tudo que fiz foi para protege-la! Eu amava seu pai Aisha, amei tanto que até coloquei em você o nome de uma irmã dele que morreu de anemia aos dois anos de idade e ele era muito ligado a ela. Mas, não poderia escolher entre amar um homem e sacrificar a vida da minha filha sob as regras rígidas de uma cultura que oprime mulheres. Escolhi abandonar esse amor, por sua felicidade... não me arrependo nem um dia se quer dessa escolha. Hoje você é como eu sonhei! Uma moça linda, cheia de vida, de sonhos e o mais importante: Você é livre! Aisha não estava disposta a magoar mais sua mãe com sua forma de compreender aquilo. Para ela sua mãe errou mesmo achando que estava fazendo algo correto. Aisha não achava justo em esconder de seu pai que eles tiveram uma filha e que vivia há dezoito anos no Brasil. Por essa razão depois dessa noite Aisha passou a intensificar sua pesquisa a respeito de sua família. Buscou meios de se conectar a seus parentes, descobriu uma família grande e numerosa que vivia em um vilarejo no Libano Karaoun (também chamada de Araon ou Al Karaon) é um vilarejo localizado no Vale do Beqaa, no Sudoeste do Líbano. O vilarejo se destaca por ser banhado pela represa do rio Litani. Por longos períodos do dia e da noite em suas horas vagas Aisha desvendava os segredos da sua história que sua mãe se empenhou a ocultar por anos. Descobriu que seu pai tinha duas esposas Fatma e Karima. E com as esposas tinha no total de seis filhos. O mais velho Ali era apenas um ano mais novo que Aisha e os demais todos crianças. Aisha era muito sozinha, sentia falta de irmãos e ao descobrir que tinha seis irmãos ficou encantada e admirava todos os dias os rostos de seus irmãos nas redes sociais. Enquanto sua mãe lhe passava uma imagem negativa dos árabes devido a sua experiência, Aisha buscava sua própria forma de interpretação de uma cultura tão diversificada. Aisha era uma moça muito inteligente e sabia que a maldade humana não estava impregnada em uma nação ou povo, a maldade para Aisha estava no ser humano independente de etnia ou religião. Naquela noite antes de se deitar ela foi desejar boa noite a sua mãe e a flagrou bebendo uma taça de vinho. Para sua mãe se mostrar tão fraca perante o álcool era porque realmente não estava bem e o motivo disso era a conversa que elas tiveram aquela noite no gramado. Marina bebeu um volumoso gole do vinho e sentiu satisfeita com a presença da filha aquele momento: __ A senhora está bem? (Disse Aisha se aproximando da cama) Marina sorriu, fez que sim com a cabeça e deixou que o choro saísse sem constrangimento na frente da filha. Aisha retirou a taça de vinho de suas mãos e a depositou sob o criado mudo. __ Ahmad Al-Sabbah, ficaria tão orgulhoso de saber que tem uma filha tão perfeita como você! (Disse Marina acariciando o longo cabelo castanho da filha) __ A senhora precisa deixar o passado para trás! Esse dia chegaria para nós duas. Agora o inevitável vai acontecer mamãe! Eu quero conhecer meu pai, quero tocar o rosto dele, abraçar meus irmãos... Mas isso não significa que abandonarei a senhora. Você irá comigo e estará o tempo todo ao meu lado para evitar que a família do meu pai me sequestre. __ Está ficando louca Aisha? Eu jurei nunca mais pisar naquela terra. Esse segredo sobre você seu pai nunca saberá, eu carregarei para o túmulo e a proíbo de ir para lá entendeu?
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