Helena
A porta de vidro se fechou atrás de mim com um barulho suave, quase elegante demais para combinar com meu estado interno.
Respirei fundo, tentando acalmar o coração acelerado enquanto observava o saguão silencioso da Lancaster Corporation.
Tudo ali parecia brilhante, frio e impecável. Uma perfeição que não combinava com a bagunça do meu mundo.
Era meu primeiro dia. E, honestamente, eu já me sentia fora do lugar.
— Helena Duarte? — uma voz feminina chamou.
Virei-me e encontrei uma recepcionista sorridente demais para aquela manhã cinzenta.
Confirmei com a cabeça, e ela me entregou um crachá com a logo da empresa com a cor prata.
Só o toque no metal gelado já me fez entender que eu estava entrando em um universo que nunca foi feito para mim.
— O senhor Lancaster já está no edifício — ela acrescentou, quase como um alerta.
Meu estômago revirou.
Damian Lancaster.
O CEO.
Meu novo chefe.
O homem cuja reputação soava como uma tempestade prestes a cair sobre qualquer um que ousasse cruzar seu caminho.
Peguei o elevador até o trigésima andar, que é o último. O andar parece ser todo dele.
As portas se abriram para um corredor amplo, silencioso e luxuoso demais para ser real.
Mármore escuro, paredes em vidro fosco, cheiro de café recém passado.
Senti minhas mãos suarem na mesma hora. A certeza de não pertencer àquele lugar me atravessou como um arrepio.
A primeira pessoa que vi foi ela.
— Então você é a novata — disse Beatriz, parada atrás de uma mesa branca impecável.
Seus olhos percorreram meu corpo como se avaliassem cada defeito.
— Espero que não atrapalhe.
— Eu só… vim para começar meu trabalho — respondi, tentando manter a voz firme.
— Todos dizem isso — ela rebateu, com um sorriso venenoso.
— O senhor Lancaster não tem paciência para erros.
Ótimo. Exatamente o que eu precisava.
Beatriz apertou um botão no telefone.
— O senhor Lancaster? A nova assistente chegou.
Silêncio.
Eu estava prestes a perguntar se era para entrar quando a porta do escritório abriu.
E ali estava ele.
Damian Lancaster.
Alto, impecavelmente vestido, cabelos escuros arrumados de forma quase artística e olhos que não deveriam ser permitidos a ninguém, profundos, intensos, analíticos… perigosos. Ele não simplesmente me olhou. Ele me estudou.
Meu coração parou.
Ou falhou.
Eu só sei que eu quis fugir pela porta de emergência.
— Srta. Duarte — ele disse, com uma voz grave que parecia envolver o ar ao redor. — Entre.
Beatriz se afastou, como se a simples presença dele mudasse a temperatura do ambiente.
Entrei no escritório e a porta se fechou atrás de mim, silenciosa, mas com o peso de uma sentença.
Damian caminhou até sua mesa — uma peça de madeira escura que parecia mais um trono moderno, e se recostou na cadeira de couro preto, os dedos entrelaçados.
— Você chegou cedo — ele observou.
— Achei apropriado no primeiro dia — respondi.
— De fato. — Ele inclinou levemente a cabeça. — Gosto de pontualidade. E de pessoas que sabem seu lugar.
Engoli seco.
Ele não sorriu. Não piscou. Apenas me observou.
A intensidade daquele olhar fazia parecer que ele estava descobrindo coisas sobre mim que eu mesma ainda não sabia.
— Trouxe seu currículo? — perguntou.
— Sim.
Entreguei. Ele nem olhou. Apenas deixou sobre a mesa.
— Eu já sei tudo o que preciso saber sobre você.
A frase caiu sobre mim como um balde de água fria.
Como assim?
— Mas… nos conhecemos hoje — arrisquei.
Damian sorriu pela primeira vez. Um sorriso pequeno, perigoso, arrogante.
— Todos dizem isso.
Por um momento, senti que a sala ficou menor, o ar mais denso.
Como se ele estivesse me puxando para algum tipo de campo gravitacional invisível.
— A partir de hoje, sua mesa será aqui, ao lado da minha porta , ele continuou, apontando para a mesa vazia no canto. — Quero você acessível.
Acessível?
Para quê?
— Eu… Sim claro — respondi.
Ele então se levantou.
Foi a pior coisa que poderia ter acontecido.
De pé, ele parecia ainda maior, ainda mais poderoso. Cada passo em minha direção parecia calculado para abalar minhas defesas.
Ele parou a menos de um metro de distância.
— Uma última coisa, Helena — disse meu nome como se estivesse testando sua textura na boca.
— Eu não tolero deslealdade. Nem segredos.
Senti a pele do pescoço arrepiar.
— Algum problema? — ele perguntou, inclinando levemente o rosto para me observar de perto.
Minha respiração travou.
— N-não, senhor Lancaster.
— Ótimo. Porque eu sempre descubro quando alguém mente para mim.
Ele passou por mim, a poucos centímetros, e o perfume dele , escuro, amadeirado, masculino — me envolveu como um aviso silencioso.
Enquanto ele saía, percebi que minhas mãos ainda tremiam.
Primeiro dia.
E eu já entendia perfeitamente tudo.
Aquilo não era um trabalho.
Era um território proibido.
E Damian Lancaster era o tipo de homem que não apenas estabelecia as regras…
Ele as quebrava quando queria.
E, o pior ainda, fazia questão de testar quem ousasse entrar no seu jogo.
E eu, sem querer, já tinha entrado.