THOMAS
Enrolei a toalha em meu quadril e peguei outra para esfregar no cabelo.
Abri a porta do banheiro e alguém batia na porta do meu quarto.
— Sr. Thomas?
— Sim. — troquei a toalha pelo roupão.
— Alguém está querendo muito falar com o Sr.
Esqueci o maldito celular na sala.
Abri a porta do quarto e ela me entregou o celular e foi direto pro banheiro.
Olhei na tela o nome da minha mãe.
Nove chamadas perdidas. Essa era a Dona Stefania, com toda a sua insistência e pressa para tudo.
Atendi e fechei a porta do quarto.
— Filho querido, já consegui uma babá pras crianças. — se animou do outro lado da linha.
Essa notícia com certeza tinha deixado meu estresse mais baixo, juntando com o que terminei de fazer no banheiro durante o meu demorado banho.
— Ótimo. — soltei as toalhas e escolhi uma roupa, enquanto segurava o telefone. — Imagino que ela venha trabalhar hoje.
Essa necessidade era de urgência.
Eu não consigo trabalhar e lidar com os dramas da transição de adolescente para maior idade do meu filho mais velho e a carência revertida em rebeldia da minha pequena Sophia.
— Ela só começa na segunda. — suspirou. — O que está fazendo?
— Quer mesmo saber? — coloquei o celular no viva-voz e fui passar o antitranspirante.
— Esquece, não precisa dizer mais nada.
— Também não estou fazendo o que você pensou. — peguei uma cueca na gaveta.
Nesta cidade só entra no meu caminho um monte de barangas. Entre ficar viúvo, me aliviando com as mãos e me sujar com uma baranga qualquer, fazendo a minha esposa se revirar no túmulo, eu escolho a primeira opção.
— Por que não avisou a babá que poderia começar hoje? — perguntei enquanto vestia uma calça.
— Hoje é sábado, querido. Você só tem mais um dia com a garotinha rebelde, fique tranquilo. Eu tenho fé de que essa pode ser a babá definitiva.
— Você tem que aumentar a sua fé, porque ela não funcionou nas últimas babás que trouxe com esse mesmo discurso para me tranquilizar.
Ela riu. — A fé move montanhas, mas controlar a Sophia é uma missão mais difícil, meu filho.
A ligação começou a ter interferência e eu olhei o que poderia ser. Era o Damon.
— Pois está bom, mãe. Vê se preparar psicologicamente essa coitada. Eu não quero ter que ficar pagando terapia para ninguém. — coloquei o cinto na calça. Ela fica rindo. — Vou desligar para atender o Damon.
— Ok! Amanhã eu te ligo de novo.
Encerrei a chamada e atendi o meu irmão.
— Onde está? — consegui escutar sua voz em meio a toda gritaria das crianças de fundo.
— Em casa. Por que? — peguei uma camisa dentre as várias que estavam em meu armário. Essa era lilás claro.
— Passe aqui, se não estiver muito ocupado. Quero falar com você.
— Como se a sua casa fosse perto da minha, não é? — arrumei os punhos e comecei a abotoar a camisa. — É algo importante? Algo que não possa falar ao telefone?
— É sobre o Hugo. Encontrei ele na boate do Dimitri, e em uma conversa curta. Ele me falou que quer ser treinado.
— E o que você veio fazer na boate do Dimitri?
— Negócios, Thomas. Você acha mesmo que eu tenho tempo de pensar em trair a Olívia? Eu não consigo nem pensar direito com os gritos dos meus filhos.
— Estou vendo. Mas e essa história de ser treinado? Ele nunca falou comigo.
Ele já iria fazer 18 anos. Estava mais do que na hora dele começar a aprender tudo. Mas tão teimoso eu fico até com medo de não entrar na linha.
— Então né…
— Não entendi porque ele falou a você e não a mim.
Estava feliz com o interesse do meu filho de seguir com o legado da família, mas fiquei surpreso que ele não procurou a mim primeiro.
— Eu também não sei o porquê. Mas queria que você ficasse sabendo, já que é o pai. E aposto que não vai abrir mão de querer ensiná-lo, assim como nosso pai nos ensinou.
— Sem sombra de dúvidas. Aposto que aquele covarde teve medo do jeito duro como lido com as suas atitudes. Mas são coisas totalmente diferentes.
Escutei o Dimitri e o Hernando conversando de fundo.
— Reunião em família? Tô escutando dois tagarelas.
— Como se precisasse de motivos para esses dois bobalhões aparecerem. — suspirou.
Não sei por que o Damon não colocava esses dois para correr. Se fosse na minha casa eles iriam sair a ponta pés.
A boate de Dimitri é na nossa cidade. Estamos morando mais perto. Eu mudei de mansão há pouco atrás, mas parece tudo igual.
— Nossa mãe me falou que você está preparando uma festa de aniversário para o Hugo.
— Isso é coisa dela. Por mim seria só uma festa em família. Hugo nem merece pela raiva que me faz … — arrumei a gola da camisa na frente do espelho.
— Não sei se você ficou sabendo, mas ela também está planejando dá um carro de presente para ele.
— Ela pode até dar de presente, mas esse carro não sai da minha garagem até ele tirar uma carteira de motorista. E do jeito que ele quer dirigir, não tem escola que o aprove.
— Ele me parece um ótimo motorista. — Damon riu.
— Você tá rindo agora, mas deixa só o Ares crescer e amassar todos seus carros. Você vai acordar com uma dor de cabeça todos os dias. — agora era minha vez de rir.
— Até lá, vou evitar deixá-lo perto de qualquer carro. Mas quero saber como resolve, caso eu precise.
— Tenho meus meios. Mas se eu não fosse a p***a de um criminoso que tem uma grande influência, esse garoto já estaria na cadeia.
Ele riu.
— E ainda sim vai dá uma arma de presente pro garoto?
Por que não daria? É tradição.
— Nosso pai fez isso no meu aniversário de 16, até tenho ela guardada no meu cofre. Acho até que o Hugo está atrasado, comparado a mim. Na idade dele eu já acompanhava nosso pai nas reuniões. Mas o Enzo tem um parafuso a menos.
— Certo. Mas não coloque muita pressão no garoto. O temperamento dele pode até parecer com o seu, porém, ele não é você.
Isso era verdade. Não dava para eu me projetar no meu filho. Eu era complicado, mas seguia as regras.
— Você deveria conversar com ele, Thomas. Acho que o treinamento vai ser uma boa forma de você entendê-lo e conseguir se aproximar mais.
Quem diria que eu estaria ouvindo conselhos sobre como lidar com meu filho problemático.
— Suas palavras parecem fazer muito sentido. — admiti.
— Essa é sua forma de agradecer? — brincou.
— Entenda como quiser. — passei perfume.
— Antes que desligue...
Ouvi o Dimitri comentar algo com ele.
Peguei o telefone e saí do meu quarto.
— Creio que já esteja sabendo, que alguns dos Petrov apareceram em Vega.
Passei pela sala e avistei o Hugo com os amigos na sala.
— Sei de tudo. Mas mesmo assim, ainda vou seguir com meu plano. — fui para a cozinha.
— Que seria…
— Deixá-los à vontade para pegá-los de surpresa.
Peguei um copo no armário e a água na geladeira.
— Uma emboscada?
— Correto. — deu um gole.
— Essa é a primeira vez que você planeja antes de agir.
— Esse é um caso a parte, irmão. Não posso dar bobeira, os Petrov são muito espertos. Faz anos que estou esperando a minha chance. Aposto que eles pensam que não lembramos mais do que eles fizeram com as nossas vidas anos atrás. Igual a você, Damon. Que teve a esposa sequestrada, pariu sozinha na mata e age como se nada tivesse acontecido.
Me encostei na bancada da pia.
— Eu não me esqueci. Eu só não colocar a minha família de novo em risco. Você sabe muito bem dos altos e baixos que tive no meu relacionamento com a Olívia e faz anos que estamos em paz. — ele explicava pacificamente. — Mas isso não significa que quando você for, eu também não vou.
— E eu também. — Dimitri completou.
— Estou tomando o dobro de cuidado. — avistei uma das minhas garrafas de vinho vazia na lixeira. — Vou ter que desligar, Damon.
— Certo. Depois a gente se fala.
Encerrei a chamada e peguei a garrafa na lixeira.
— Quem foi que bebeu esse vinho? — perguntei às empregadas que estavam presentes na cozinha. O meu tom de voz é ríspido, porém é efetivo em chamar atenção.
Eu tinha a certeza que era o Hugo, mas queria tirar a limpo.
Tinha uma cozinheira ali, limpando o fogão e outra mais longe, porém no meu campo de visão, lustrando um móvel.
— Eu vou repetir de novo. E se não quiserem ser demitas, uma por uma, é bom abrirem a p***a da boca! — olhei para elas. — Quem pegou essa garrafa?
— Encontrei no quarto do Hugo, Senhor. — uma das empregadas falou, nervosa. — Acho que ele estava bebendo com os amigos.
— Como ele conseguiu pegar? Essa é da adega que mantenho trancada. Essa garrafa me custou mais de 5 mil euros! — analisei a safra.
Elas ficaram em silêncio. Isso já estava me irritando.
— Quero que me avisem tudo que meus filhos fazem na minha ausência. Entenderam? — fui mais incisivo.
Todas concordaram de cabeça baixa.
Passei pela sala.
— Hugo, vamos ter uma conversinha no meu escritório. — procurei o cômodo e o ouvi me seguir.
— O que queria falar? — fechou a porta e se virou para mim com a maior plenitude. Esse menino já está consumindo o resto de sanidade que eu carrego.
— Essa garrafa aqui, te faz lembrar de alguma coisa? — levantei na sua frente.
— Acho que é daquela coleção sua.
— Jura? — fui irônico. — Não se faça desentendido. Sei que foi você que estava bebendo com os amigos.
Virou a cara pro lado depois voltou a me olhar.
— Você não me falou que era proibido beber em casa. — deu de ombros.
— Você pode beber nas festas que vai, mas não quero nem você, muito menos seus amigos, mexendo no meu escritório ou minhas bebidas. E se inventar de beber nas festas, não inventa de dirigir. É pra isso que eu pago um motorista pra você.
— Acabou? — Se virou para sair.
— Espera. — ignorei seu deboche e lembrei do que meu irmão disse, também sentei na minha poltrona com uma postura péssima e abri a gaveta dos charutos. — Seu tio Damon me contou que você está querendo começar com o treinamento. Fico feliz.
Ele me olhou surpreso.
— Sim, estou muito interessado. — admitiu.
— Ótimo! Podemos começar com as aulas de tiro.
Quase vi um sorriso brotar do seu rosto.
— Por que não me leva para seu galpão de tortura? Também quero participar de seu plano contra os Petrov.
Estava gostando de ver que ele tinha sangue nos olhos como eu, mas os Petrov era uma vingança minha. Não poderia colocá-lo em risco, definitivamente não.
— Você ainda não está pronto para toda essa parte, Hugo. Vamos começar com o básico.
— Mas…
— Se insistir você será o torturado.
— Ok! — ele não insistiu.
Ele concordou de segunda? Essa foi fácil.
— Podemos começar os treinamentos na semana que vem. Depois de seu aniversário. — sugeri.
— Pode ser. — abriu a porta sem muito interesse na minha ideia. — Vou descer pro almoço.
Assenti.
Aposto que ele queria fazer essas coisas com o Damon, porque o meu irmão esquece que as coisas devem ser bem feitas. Ele simplesmente dá a arma e diz: atire.
É complicado fazer alguma coisa com o meu filho.
Depois da morte da mãe, ele ficou muito distante. Uma parte de mim acredita que ele me culpava por tudo que aconteceu, assim como eu.
Acendi o charuto e fiquei fumando junto a um pouco de whisky.
— Eu ainda vou acabar com os Petrov. Um por um. — bebi o uísque de uma vez e a bebida desceu rasgando a minha garganta.
Sentia o gosto amargo na minha boca e não era do uísque, era um gosto por vingança que me consumia todo maldito dia.
— O Nicolai me paga… Ele vai implorar pela sua morte, a cada tortura que vou faze-lo passar.