Capítulo dois

1908 Words
   Cooper tomou outro gole de armagnac, e se questionou por quanto tempo ainda aguentaria o alvoroço de moças ao seu redor. Sua paciência estava no limite, e ele só poderia culpar a si mesmo por isso. A house party estava sendo um desastre. Dez dias na companhia constante de moças distintas já teria sido suficientemente r**m – ele havia se preparado para esta penitência. Mas deveria ter pensado que Magnolia selecionaria um bando barulhento de damas como ela – mimadas, vãs, insípidas e tolas. Cooper estava quase rígido de tanto tédio. E irritação – pois esperara poder observar as jovens de maneira não explícita, fazer uma seleção discreta e providenciar tranquilamente um casamento. Ah! Que piada! Sua desprezível prima tinha tanta discrição quanto um papagaio! Bustos leitosos erguiam-se, e estremeciam sob seu nariz a cada oportunidade. Ancas arredondadas saíam subitamente de seu esconderijo. E cada vez que ele entrava em um cômodo, pálpebras batiam tão fervorosamente que quase criavam uma corrente de ar. Ofereceram-lhe amostras de virtuosidade em harpa, piano e flauta, teve aquarelas colocadas sob o nariz, sua inspeção de especialista timidamente solicitada. Sua opinião masculina superior fora procurada e deferida em relação a todo tópico possivelmente existente, e seus pronunciamentos muito relutantes saudados com suspiros bajuladores e admiração melosa. Elas o abordavam de manhã, ao meio-dia e à noite – no jardim, no salão de jogos, na sala de café da manhã – até mesmo, uma vez, atrás dos estábulos, onde um homem tinha o direito de esperar alguma paz e tranquilidade. Mas não adiantava – as damas elegíveis o emboscavam, aparentemente, em todo canto da propriedade. Ainda assim, apesar da aversão opressiva à tarefa em suas mãos, Cooper estava determinado a escolher uma esposa. O problema era que Cooper não conseguia imaginar nenhuma delas como mãe de seus filhos. E, como Magnolia, todas elas desprezavam a vida rural. Isso era um problema. De certo modo, esperava que sua esposa vivesse em de Wellborn, com as crianças. Mesmo sabendo que poucas assim faziam. Sua própria mãe não o fizera. A mulher de Freddie vivia aparentemente feliz, durante o ano todo, nas regiões selvagens de Yorkshire com seu marido e filhos. A felicidade óbvia das crianças provocara uma profunda impressão em Cooper – seus próprios pais vinham para casa em intervalos raros, cujas visitas eram a ruína de sua jovem existência. Mas a mulher de Freddie parecia verdadeiramente amar seus filhos. A própria mãe de Cooper parecia amá-lo – na presença de outros. Assim, a mulher de Freddie poderia estar fingindo, mas ele não acreditava nisso. Ela também parecia amar ao marido. Mas Freddie era, Cooper sabia, uma pessoa digna de amor. Não era assim com Cooper. Fora claramente uma criança indigna de amor, e, por isso, era um homem indigno de ser amado. Mas faria tudo ao seu alcance para assegurar a seus filhos uma chance de serem dignos de amor. E com isso de serem amados. – Oh, que tarde acolhedora e deliciosa! – exclamou Magnolia. – Vamos passear no terraço antes do jantar. Venha Cooper, como meu hóspede de honra, você deve escoltar a dama de sua escolha. Olhares femininos se voltaram para ele. Cooper amaldiçoou sua prima por tentar forçá-lo. Ela queria claramente o fim da house party para poder voltar à cidade e às milhares diversões por lá. Sorriu. Não dançaria conforme a música de nenhuma mulher. – Então, como bom hóspede, eu devo estar sob os cuidados de minha charmosa anfitriã. – Será que deveríamos, primo? Ele tomou o seu braço, não lhe permitindo escolha. Anna seguiu sem graça o cortejo, se sentindo totalmente envergonhada. Várias das jovens olhavam seu vestido, sussurrando e dando risinhos sufocados com olhares de deboche. Suas mães a ignoraram completamente, e dois dos homens convidados fizeram sugestões impróprias. Estava zangada, mas disse asperamente a si mesma que pouco adiantava expressar seus sentimentos – logo eles iriam embora, e seria deixada em paz novamente. A pálida jovem marquesa mantinha seu queixo altivo, ignorando os vis insultos lançados a ela pelos canalhas ignorantes, enquanto a carroça rodava. Anna esgueirou-se discretamente para o canto do terraço, e olhou por cima da balaustrada de pedra para a área de grama recentemente cortada e para os bosques mais além. Era uma vista verdadeiramente encantadora... – Aargh! Sai, b***a nojenta! – os gritos de Magnolia enchiam o ar. – Alguém tire isso de mim! Aargh! Anna correu para ver o que acontecera. O filhinho de sua prima, Georgie, obviamente fugira do seu quarto e fora passear com o cachorrinho que Anna lhe dera várias semanas antes. Ele estava diante de sua mãe, estendendo pateticamente um buquê desordenado de galantos em sua direção, os sapatos e calças cor de nanquim cobertos com lama, assim como seu cachorrinho. Esta era a causa do barulho – marcas de patas enlameadas sujavam o vestido de seda amarelo claro de Magnolia. Anna ainda estava tentando abrir passagem entre a multidão de hóspedes, quando lorde de Wellborn pegou o cãozinho, o suspendeu pelo cangote para o garotinho. Ela alcançou a criança no momento em que o discurso furioso de sua mãe se desencadeou sobre ele. – Como você ousa trazer este animal imundo para perto de mim, garoto m*l-educado! Está vendo o que ele fez? Este vestido está arruinado! O rostinho empalideceu em desespero. Sem dizer nada, Georgie oferecia o pequeno buquê de galantos. Magnolia o arrancou impacientemente de sua mão e o jogou no chão. – Não tente me agradar, Georgie! Veja o que você fez? Olhe para este vestido! Foi usado pela primeira vez hoje, é de um dos mais finos estilistas de Londres, e custou o olho da cara! Por que um garoto m*l-educado trouxe um animal nojento para um encontro civilizado? Quem lhe deu a permissão de sair do quarto? As faces do menininho empalideceram ainda mais. Seu corpinho tremeu de terror ao sentir o veneno na voz de sua mãe. Seu rosto se franziu de medo e ele apertava fortemente o cãozinho contra seu peito, em desespero. Este chorou e se debateu, tentando se soltar. Cooper observava, tenso como nunca estivera desde a época em que era um menininho. Sentiu pena do menino, mas não era seu papel interferir na disciplina de uma mãe a seu filho. Seria difícil para o menino perder seu querido cãozinho, mas era provavelmente melhor para Georgie que ele aprendesse agora, e não mais tarde. Os animais de estimação eram com certeza usados como chantagem para o bom comportamento de alguém. Uma vez que o menino tivesse aprendido a não se importar tanto, sua vida seria mais fácil. Cooper com certeza o descobrira deste modo... apesar da aprendizagem ter sido muito dura... três animais de estimação morreram por causa de sua desobediência quando ele tinha oito anos. Polly, sua companheira constante e sua melhor amiga, fora a última. Um dia a levara para caçar, em vez de terminar suas lições de grego, e seu pai mandara sacrificar Polly para ensinar a seu filho uma lição de responsabilidade. Cooper aprendera bem esta lição. Aos oito anos, aprendera a não se ligar a animais de estimação. Nem a mais nada. – Eu sinto muito pelo acidente infeliz, prima. – Você sente muito? – Magnolia continuou. – Sim, eu farei com que você sinta muito! As crianças são sua responsabilidade, então como pode ser que uma delas tenha tido a permissão de fugir do quarto? Cooper encostou-se em uma grande urna de pedra, cruzou os braços e observou friamente a cena. Notou o modo como a deselegante priminha usou seu corpo para cobrir o da criança, protegendo-o de sua própria mãe. Era uma manobra interessante – para uma parenta pobre. O menininho se apertava contra suas saias, o cãozinho enlameado ainda em seus braços. Cooper observou como a mão da moça repousou discretamente na nuca da criança. Ela a acariciou com pequenos movimentos tranquilizadores. Cooper notou o menininho relaxar sob sua p******o. Anna o segurou mais firmemente contra o corpo, ao mesmo tempo mantendo a fúria de sua prima focalizada em si. As palavras eram de desculpas, mas sua atitude sutilmente desafiadora. Fascinante, pensou Cooper. Será que a moça não tinha consciência do que arriscava ao desafiar sua prima? E a criança nem era sua. – O acidente foi minha culpa, prima – disse –, você não deve se zangar com o pobre Georgie, pois ele tinha a minha permissão para sair do quarto. E eu sinto muito por seu vestido estar sujo. Mas eu não posso permitir que o cãozinho seja morto. – Você? Você não pode? – gaguejou Magnolia. – Não, pois o cãozinho não pertence nem a Georgie, nem a você. A criança olhou para a moça. – O cãozinho é meu. Ele... foi um presente do... do pároco, e eu não posso permitir que destrua um presente por causa de um pouco de nervosismo... – Você não pode permitir? – Sim, cãezinhos serão sempre cãezinhos, e meninos e cães parecem atrair um ao outro, não é? É por isso que eu fiquei tão grata a Georgie, neste caso. – Grata? – Sim, muito grata, na realidade, porque eu tenho estado por demais atarefada ultimamente para exercitar cãozinho, e Georgie assumiu esta tarefa para mim, não é, querido Georgie? Ela balançou a cabeça para cima e para baixo de maneira encorajadora, e ele, confuso, assentiu de volta. – Sim, e qualquer dano que o cãozinho tenha feito em seu vestido deve ser posto em minha conta. – Mas... – Agora, Georgie, eu acho que você e o meu cãozinho já tiveram bastante excitação por uma noite, mas será que você faria mais uma coisa para mim? Ele assentiu com a cabeça. – Você poderia levar, er... Rover... – Satan – Georgie a corrigiu. – Sim, é claro, Satan. Você poderia por favor levar, er... Satan, para o canil e lavar a lama nele para mim? Como você vê, estou vestida para o jantar, e as damas não devem ir ao canil com seu melhor vestido. Suas palavras tiveram o efeito infeliz de atrair a atenção de todos para o seu “melhor vestido”. Ouviram-se alguns risos de escárnio, que ela ignorou com o queixo em pé. – O que é, meu amor? – disse. Sentindo-se culpado, ele estendeu um dedo imundo e apontou para a lama que agora riscava o seu vestido. Ela olhou para baixo e riu, em um caloroso tom de despreocupação. – Não se preocupe com isso, meu querido, quando a lama estiver seca, eu a escovarei até que saia. Agora, pelo amor de Deus, leve este cãozinho atentado, e limpe a vocês dois antes que outro acidente aconteça. Aliviado, o menininho saiu correndo com o cãozinho apertado no peito. – Você acha que é bom para você estar ao ar livre de noite em um vestido úmido e enlameado, prima? – interrompeu Anna. – Não gostaria que você pegasse um resfriado, e você sabe que é extremamente suscetível a isso... Batendo o pé, e com um safanão do vestido de seda amarelo-claro, Magnolia deixou o terraço, ordenando que sua criada fosse enviada a ela imediatamente. Anna dobrou-se, juntou as flores destruídas de Georgie e só então notou lorde de Wellborn. Sua expressão era ilegível, e seus olhos cinzentos de pestanas espessas a observavam impassivelmente. Que homem h******l, pensou. Esperando para ver se há mais atração por vir. Levantou o queixo com frio desprezo e passou por ele sem dizer uma palavra.
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